Por mais que seja organizada a atividade bancária, não deixará de haver o risco de se causar dano ao seu usuário[1]. Este risco é inerente aos bancos em suas relações com seus clientes em praticamente todos seus atos. Isto se torna maior e mais crescente em decorrência da tecnologia usada nos serviços bancários. A automação das tarefas de uso dos clientes torna suas vidas mais práticas e rápidas, porém há uma perda expressiva e proporcional na segurança dessas transações.
Os bancos cada vez mais se esforçam em oferecer comodidade, dispondo de meios modernos de utilização de serviços. Assim surgiram as portas giratórias, os cartões magnéticos, terminais eletrônicos e serviços pela INTERNET. Todos estes foram avanços tecnológicos alcançados pelos bancos modernos. Juntamente com este avanço vêm surgindo as preocupações inerentes a eles, tais como a responsabilização por danos causados. Essa especialização profissional faz com que o particular procure e confie cada vez mais no profissional, sendo que para este, a responsabilidade civil aumenta também na mesma proporção.[2]
Portanto, quanto mais os bancos evoluíram, tanto mais evoluiu a sua responsabilidade civil. Em seu início rudimentar existia somente a visão subjetivista da culpa, era este o único e principal elemento norteador de reparações na ordem civil e os bancos não fugiam à regra. Hoje também, o Novo Código Civil não destoa tanto do código de Clóvis Beviláqua ao prescrever qual o tipo de responsabilidade civil dominante, ou seja, a teoria subjetivista voltada para a culpa como elemento centralizador.
Porém, essa situação foi se relativizando e enfraquecendo aos poucos nas mãos da doutrina e jurisprudência e perdurou somente até o aparecimento da segunda fase que se baseia na culpa presumida. O Supremo Tribunal Federal já havia se pronunciado por intermédio da súmula nº 28, no qual os bancos seriam responsáveis pelo risco de cheque falso.[3] Por intermédio desta presunção de culpa, a responsabilidade encontra-se predominantemente com o agente passivo causador do fato danoso e permanece com ele até a real comprovação fática de que não agiu com culpa.
Por fim, sobreveio a fase em que atualmente se encontra a grande maioria dos atos bancários sujeitos à responsabilização. Com a adoção da teoria objetiva, abstrai-se totalmente da culpa, que não deixava de ser imenso óbice para a sociedade em geral usufruidora dos serviços bancários. Esta divisão em fases não significa em termos absolutos uma divisão concreta do caráter civil das atividades bancárias, mas unicamente o modelo predominante aplicado e aceito pela classe jurídica.[4]
Assim, veio a teoria do risco em bom momento socorrer a todos inclusos na sociedade desprotegida, em especial a quem não tem o contrato como elemento probatório essencial de imputação de culpa. Essa teoria do risco profissional tem levado sempre a jurisprudência em acertadas decisões a buscar indenizações morais e materiais ao cliente, atuando de forma protetora.[5] Isto se deve de maneira especial pela razão de que os bancos se relacionam de maneira com seus clientes de forma contratual, enquanto que em relação a terceiros pode ser extracontratual.
Um outro grande aspecto a ser tomado com relevância sobre a atividade bancária é a sua característica de serviço público. A grandiosidade dos bancos que atuam em todo território nacional em sua maioria, como também, a importância de sua função para a sociedade, fazem dos bancos verdadeiros meios de atuação pública.
Muito embora, exista uma diferença entre serviço público e serviço ao público. Como sabemos, a primeira é praticada com exclusividade pelo Estado e por quem ele delegue ou outorgue estas funções. A segunda, porém, é praticada pelos bancos, pois como dominam essencialmente o crédito do país, atuam de forma dinâmica como verdadeiros agentes públicos na distribuição desse crédito e, por fim, na sua intermediação.[6]
Este fato normativo de nosso ordenamento está contido no artigo 1º da lei 4.595/64, ao incluir os bancos entre os elementos integrantes do Sistema Financeiro Nacional, sendo inclusive fiscalizados por órgãos governamentais em decorrência disso. Esta é uma das razões principais da adoção da responsabilidade civil objetiva em relação aos bancos, tal como semelhantemente ocorre com o Estado.
Quanto à adoção desse tipo de responsabilidade, a doutrina não é unânime. No Brasil, por exemplo, na década de 40, em parecer de Odilon de Andrade, foi muito discutida a teoria do risco profissional em sua aplicação aos bancos, influenciado por Vivante e Ramela, ambos autores estrangeiros. Preconiza esta teoria que da mesma forma que são elevados os proveitos profissionais dos bancos, através de exorbitantes lucros, na mesma proporção, deve ser sua responsabilização para eventuais danos causados aos seus clientes.[7]
Entretanto, em detrimento da enorme importância da teoria do risco-profissional ou risco-proveito, a maioria opina em direção da adoção da teoria do risco criado, pelo motivo de melhor se adaptar ao caso. Podemos perceber que ela é mais abrangente, por incluir não somente os agentes que auferem lucro, mas também se vierem sofrer prejuízo.
Uma segunda vantagem do risco-criado em comparação ao risco-proveito é no campo processual, pois nesta será necessário comprovar a obtenção de lucro efetivo no desempenho de atividade, enquanto que aquela, não tem essa mesma exigência probatória para a vítima do dano.[8]
Igualmente aplicada, a teoria do risco, em relação ao trabalho realizado por seus prepostos nas suas relações com os clientes bancários, pode gerar às vezes conseqüências jurídicas relevantes para a responsabilidade civil. Da mesma forma que as demais empresas em nosso país, prevalece a teoria da representação em nosso ordenamento jurídico, que ressalta não caber ao agente que se relaciona negocialmente com outro dentro do estabelecimento empresarial e que retém todos os caracteres de um preposto, indagar se se trata realmente de fiel representante da empresa.
Analisando o tema da responsabilidade civil dos bancos, vemos que a própria jurisprudência aparenta ainda não ter se afirmado sobre o assunto. É o que demonstra ultimamente o Superior Tribunal de Justiça em decisão que contraria julgados anteriores, no qual publicou acórdão em que decidiu pela responsabilidade subjetiva do banco, divergindo totalmente das vertentes jurisprudenciais anteriores. Dessa decisão muito recente podemos retirar um trecho do relator, Ministro Fernando Gonçalves do Superior Tribunal de Justiça:
O uso do cartão magnético com sua respectiva senha é exclusivo do correntista e, portanto, eventuais saques irregulares na conta corrente geram responsabilidade para o banco se provado ter agido com negligência, imperícia ou imprudência na entrega do numerário.[9]
Esperamos sinceramente que o egrégio tribunal reveja mais uma vez sua posição sobre o assunto para que não sejam colocadas mais dúvidas sobre o consciente popular a respeito da definição de seus direitos.
Informações Sobre o Autor
Mauro Henrique Pereira dos Santos
Bancário, bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão e pós-graduando em Direito Civil e Processual Civil