Resumo: O presente artigo aborda diversos aspectos relevantes e atuais da União Européia, enfatizando as vantagens e empecilhos da implantação da Constituição Européia em todos os países membros, bem como os impactos do Euro na ordem econômica européia, destacando as novas adesões em 2008.
Palavras chaves: União Européia. Constituição. Moeda Única.
Sumário: Introdução. I. Processo de unificação da união européia capítulo. II. A constituição da união européia capítulo. III. O euro e seu impacto na ordem econômica européia. Considerações finais. Referências
INTRODUÇÃO
Hodiernamente, os Estados têm flexibilizado a sua noção de soberania em busca de uma maior competição na economia mundial, em decorrência das grandes transformações sociais, políticas, da revolução tecnológica, intensificadas com a globalização.
Neste contexto ganha relevância a formação de megablocos econômicos, o declínio da territorialidade, a facilidade de intercâmbio entre pessoas e mercados, o desenvolvimento das empresas transnacionais e das instituições internacionais.
A União Européia emerge, pois, como a mais desenvolvida e avançada entidade supranacional, sendo assim, várias questões de ordem jurídico-econômico requerem maiores aprofundamentos e análises, tais como a sua evolução histórica, estrutura e perspectivas políticas, econômicas, jurídicas e sociais.
Abordar o processo de unificação européia é imprescindível para que se compreenda o seu poderio atualmente, os seus avanços e retrocessos em determinados momentos pontuais, destacando a expansão da moeda única européia; bem como as dificuldades enfrentadas para que a Constituição Européia passe a viger no ordenamento comunitário.
Far-se-á, inicialmente, no Capítulo I, uma contextualização histórica dos principais tratados firmados ao longo desse processo de integração, a fim de verificarmos as diferentes fases de integração que foram sendo vivenciadas pela atual União Européia ao longo dos anos. Em ato contínuo, serão expostas suas diversas características, enfatizando a sua estrutura altamente complexa.
O capítulo II discorrerá sobre os antecedentes históricos da criação da Constituição Européia, cuja finalidade é estreitar os laços de união política, legal e social entre os Estados, expondo, pois, a fase do projeto constitucional, da ratificação do texto pelos Estados-membros, bem como as dificuldades de sua aprovação dentro dos ordenamentos internos nacionais, nitidamente na França e na Holanda, onde houve a rejeição da Constituição na consulta popular.
No último capítulo, serão analisadas as questões mais relevantes referentes à introdução da moeda única no espaço da União Européia, como os motivos e dificuldades de sua implantação, seus reflexos internos e internacionais no mundo dos valores mobiliários. Observando, por conseguinte, o processo de alargamento da utilização do euro, as condições necessárias, como também o ingresso apenas em 2008 do Chipre e de Malta.
Por fim, concluir-se-á o presente trabalho, abordando seus pontos centrais, fazendo uma reflexão de todo o processo de unificação da União Européia, dando uma visão ampla desta unificação de maior profundidade e extensão mundial.
I: PROCESSO DE UNIFICAÇÃO EUROPÉIA
Pode-se considerar como o motor da criação da União Européia as repercussões negativas das duas grandes guerras mundiais que abalaram a Europa, fazendo brotar o sentimento de reerguer este continente, o que certamente seria facilitado com a união dos Estados.
Para atingir este grau de integração, os países tiveram que ir abdicando parte de sua soberania, relativizando o conceito antes absoluto de que o Estado só seria forte se o seu poder soberano fosse intocável, ilimitado. Neste sentido, pode-se mencionar a obra de Moraes (1995, p.135), na qual se observa a evolução do conceito clássico de soberania, atualmente adaptado às novas circunstâncias históricas e mutações porque passaram os Estados.
Ressalte-se que os objetivos da União são tanto econômicos e sociais, na medida em que ela busca promover tanto um progresso econômico e social e um elevado nível de emprego e de desenvolvimento equilibrado, sem fronteiras internas, quanto político, na tentativa de obter a afirmação de uma identidade da União no cenário internacional, através da criação da cidadania da União, de uma cooperação no domínio da justiça e dos assuntos internos, bem como do desenvolvimento e da manutenção do acervo comunitário.
A União não tem por objetivo acabar com os Estados para se lhes substituir, nem lhes retirar completamente as suas soberanias. Ela pretende, ao contrário, completá-los nas tarefas em que eles se revelam menos eficazes, e, nesse mesmo sentido, reforçá-los, proporcionando-lhes adquirir, através da União, a força de que sozinhos não dispõem. Há, nos termos dispostos por Reis (2000, p. 937), uma “soberania compartilhada”:
Daí nasce a teoria da soberania compartilhada, pela qual os Estados-Membros, num processo de integração, procede, à transferência de parcelas de seu poder, que passam a ser exercidas em conjunto por todos os Estados-Membros daquela Comunidade.
Assim, ao invés de Estados-membros absolutos e soberanos, passasse a ganhar significância a entidade supranacional. Esta supranacionalidade, segundo Reis (2001, p. 65), consistiria na existência de instâncias de poder e de decisão autônomas, sem submissão às interferências dos governos dos Estados que originaram a entidade comunitária.
Conforme trouxe Jéssica Naime (Disponível em: http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20050808100423.pdf?PHPSESSID=e8c4253ae5f4e1df29ce09fb427c8067), a integração da União Européia caminhou adotando inicialmente a na livre circulação de bens; depois, a livre circulação de serviços; posteriormente, a livre circulação de pessoas, para, ao fim, permitir a livre circulação de capitais através do Euro.Cada um desses pilares, ainda nos dizeres da autora foram sendo abrangidos conforme evoluía os níveis de integração, sendo que com o mercado comum os quatro pilares já teriam sido alcançados pelo bloco. E, por fim, haveria a união econômica e política, decorrente da consolidação dos pilares mencionados através da formulação comunitária de políticas em diversas áreas.
A União Européia teve como principal objetivo de sua criação a eliminação de guerras entre os países europeus, nitidamente em virtude dos abalos ocorridos com a Segunda Guerra Mundial.
Na perspectiva de reestruturar o continente, os Estados passaram a conviver em uma nova realidade jurídica organizada, chamada Comunidade Internacional, já que os resultados militares, políticos, econômicos e sociais deste conflito mundial, levaram-nos a observar que não eram auto-suficientes, bem como que os entraves do subdesenvolvimento somente poderiam ser superados com a cooperação e integração dos povos. Assim, dispõe Robert Gilpin (2004. p. 303):
O movimento pela unificação européia deu passo decisivo no início da década de 1990. O fim da Guerra Fria em 1989, o colapso da ameaça soviética e sobretudo a reunificação da Alemanha em 1990 levaram os dirigentes europeus ocidentais a transformar, fundamentalmente seus objetivos, a lógica e agenda da integração. A súbita transformação da Alemanha estimulou os dirigentes políticos franceses e alemães a acelerar a unificação e criar um sistema político federal na Europa para consolidar freqüentemente a Alemanha reunificada numa estrutura institucional européia mais ampla.
No mesmo sentido destaca Jorge Horácio Schijman (2006, p. 10) ao tratar do contexto histórico que ensejou os primeiros passos em direção a criação de um bloco econômico:
Em la Europa de posguerra, lãs consecuencias de la despiadada guerra eran sintomas claros de los años traumáticos vividos em conflito; eran tiempos de incertidumbre, de desconfianza; había que recuperar la esperanza, se luchó para reivindicar los valores de la libertad, de la diversidad, de la vida; pero, muchos habían quedado em el caminho.
De forma democrática e seguindo as regras do Direito Internacional, a maior parte dos Estados que compõem a Europa Ocidental abraçou a idéia de se criar uma união política capaz de semear a paz e desenvolvimento econômico, mediante a redução das soberanias nacionais, como se observa nos dizeres de Jéssica Naime (Disponível em: http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO _ARQ_NOTIC20050808100423.pdf?PHPSESSID=e8c4253ae5f4e1df29ce09fb427c8067):
A União Européia (EU) é atualmente o maior bloco de integração regional entre Estados. Não só em função do número de membros – vinte e cinco – como também por causa do amplo escopo abrangido pela integração. Os tratados estabelecidos versam desde acordos comerciais, passando por união monetária e almejando até a consolidação de um Tratado Constitucional. A UE também distingue-se de outras organizações e esforços europeus em unificar-se pois seus Estados membros abdicaram de parte de sua respectiva soberania em prol da instituição, conferindo a ela poderes próprios e independentes que a possibilita atuar e promulgar atos equivalentes aos atos nacionais.
O ministro francês das Relações Exteriores, Robert Schuman, apresentou em público, em 9 de maio de 1950[1], o projeto de integração das siderurgias francesa e alemã sob o controle de uma autoridade comum, aberta a outros países europeus. Essa proposta articulada discretamente com o primeiro-ministro alemão Adenauer, consistiu no alicerce da CECA (Comunidade Econômica do Carvão e do Aço), fonte original do processo de integração européia.
Simpatizaram imediatamente com a idéia da Comunidade do Carvão e do Aço, a Holanda, a Bélgica e Luxemburgo, que já viviam, desde 1944, uma união aduaneira denominada Benelux [2], e a Itália.
Desta forma, em abril de 1951, depois de amplas discussões envolvendo os seis países acima mencionados, é instituído oficialmente pelo Tratado de Paris, a Comunidade Européia do Carvão e do Aço. Convalidando mediante esse pacto o compromisso de abdicarem parcela de suas soberanias na área econômica de produção de armamentos bélicos em favor de uma Alta Autoridade e da criação de um mercado comum.
Para ampliar a integração européia a toda a economia, em março de 1957, foram assinados em Roma os dois tratados que instituíram a Comunidade Econômica Européia (CEE), objetivando a criação de um mercado comum; e a Comunidade Européia da Energia Atômica (CEEA ou EURATOM), que se propunha a promover na Europa a utilização da energia nuclear para fins pacíficos.
Os anos que se seguiram foram fortemente marcados pela divisão do mundo em dois blocos econômicos, dominados pela guerra fria, onde de um lado estavam os países que adotavam o regime capitalista e do outro os países socialistas, comandados, respectivamente, pelos Estados Unidos da América e pela União Soviética.
Neste contexto, os países europeus ansiavam superar a hegemonia norte-americana e soviética, e, apenas através da cooperação entre eles poderiam atingir este objetivo.
Ao longo dos anos, várias adesões foram surgindo, iniciando-se com a adesão da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido (em janeiro de 1973) e prosseguiram com a adesão da Grécia (janeiro de 1981), da Espanha e Portugal (janeiro de 1986) e da Áustria, Finlândia e Suécia (janeiro de 1995), aumentando, significativamente, o número de países membros da Comunidade Européia.
Em sete de fevereiro de 1992, foi assinado, em Maastricht, o Tratado da União Européia, entrando em vigor em 1º de novembro do ano de 1993 e sendo alterado pelo Tratado de Amsterdã, de 1997, e pelo Tratado de Nice, de 2001.
O Tratado da União Européia representou uma nova fase no processo de integração da Europa, pois além de promover a unificação dos países europeus, eliminando as barreiras que dividiam a Europa e melhorando as condições de vida e de emprego, reafirmou o objetivo de assegurar a segurança e a liberdade de seus cidadãos, estabelecendo regras claras para a futura moeda única, a política externa e reforçando a cooperação em matéria de justiça e de assuntos internos.
Segundo o Tratado da União Européia, para ser considerado cidadão da União bastava ser detentor de nacionalidade de um Estado membro, sendo a cidadania da União complementar e reflexa da cidadania nacional, não a substituindo. Reforça-se, assim, a defesa dos direitos e dos interesses dos nacionais dos seus Estados-membros.
O processo de ratificação do Tratado de Maastricht, conforme Ana Paula Tostes (2004, p. 210), gerou uma crise na integração e revelou um abismo entre a aceleração da integração legal e a integração social na região, na medida em que a criação de uma cidadania única européia trouxe consigo uma carga de preconceito entre os Países Membros mais desenvolvidos e os menos, inclusive em razão do aumento de migrações dos indivíduos destes para aqueles.
No Tratado da União Européia estão presentes os princípios e os critérios de definição da repartição de atribuições entre os Estados e a União, assim como estabelece a distribuição de poderes entre os órgãos e instituições entre si. Não existe, entretanto, uma lista precisa e estável de atribuições da União nem dos Estados. O tratado contém apenas critérios que permitem ao Tribunal de Justiça construir a sua jurisprudência sobre a matéria.
O Tratado da União Européia (TUE) ocupa uma posição hierárquica superior dentro da Ordem jurídica da União Européia, pois é o fundamento de validade das normas produzidas pelas instituições e órgãos da UE, de forma que as normas do TUE só poderão ser derrogadas por outras de igual valor, de acordo com os processos nele expressamente previstos.
Assim como, ocupa o TUE uma posição de superioridade hierárquica na relação que existe entre ele e o Direito dos Estados-Membros, uma vez que suas normas não podem ser derrogadas por normas provenientes destes, seja isoladamente ou em conjunto.
Importante assinalar que existe uma autonomia entre os diversos tratados constitutivos. Sendo assim, os tratados constitutivos das comunidades e, hoje, o tratado da União Européia são independentes uns em relação aos outros. Só em caso de lacuna de um, pode-se recorrer ao outro para integrá-lo.
A União Européia, com bases inicialmente fundamentalmente econômicas, passa a estar amparada, doravante, em três pilares. O pilar comunitário (a Comunidade européia), com suas instituições e órgãos próprios, e os outros dois pilares com caráter intergovernamental: a política externa e de segurança comum (PESC), por um lado, e a Cooperação Judiciária e em Assuntos Internos (CJAI), por outro.
Segundo o TUE o objetivo da CJAI é o desenvolvimento de uma cooperação estreita no domínio da justiça e dos assuntos internos, tais como: a política de asilo, o controle das fronteiras externas, a política de imigração, a cooperação aduaneira, dentre outras.
A partir da revisão de Amsterdam, conforme afirma Ana Maria Guerra Martins (2004, p. 171):
Deixa de fazer sentido estudar a União, de um modo tripartido, em que, de um lado, estão as Comunidades e, de outro, se encontram os pilares intergovernamentais. Pelo contrário, a União caminha no sentido da unidade e da uniformização dos processos, dos mecanismos e das instituições.
A Constituição Européia ainda está pendente de aprovação através de consulta popular em diversos países. Por este projeto, haverá uma reformulação total do sistema. Conseqüentemente, os três pilares se fundiriam, mantendo-se, entretanto, procedimentos específicos no domínio da Política Externa e de Segurança Comum, incluindo a política de defesa.
Em 2004, houve um novo alargamento da União Européia, que passou dos 15 países, para 25, após várias negociações, tendo os países candidatos que se sujeitar as condições de adesão, obedecendo os critérios jurídicos e os “critérios de Copenhaga”[3], foram eles: República Checa, Hungria, Polônia, Eslováquia, Estónia, Letônia e Lituânia, Eslovênia, Chipre e Malta.
Em janeiro de 2007, a Europa se tornou dos 27, com o ingresso da Bulgária e da Romênia, países que passaram por um processo mais lento de adesão, pois, desde 1995 pleiteavam o seu ingresso na EU.
Desta forma, como já mencionado, atualmente a União Européia é formada por vinte e sete países, sendo eles: Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Dinamarca, Irlanda, Reino Unido, Grécia, Portugal, Espanha, Áustria, Finlândia, Suécia, Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Estónia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta, Polônia, República Checa, Bulgária e Romênia.
Em 13 de dezembro de 2007, os dirigentes da União Européia celebraram o Tratado de Lisboa, acarretando diversas modificações nos seus tratados comunitários, visando à criação de mecanismos e de instrumentos necessários à inserção deste bloco no mundo global, bem como buscando responder a diversas exigências dos cidadãos, pois estes passaram a reivindicar maior transparência nas decisões e direções adotadas dentro da UE.
Por este Tratado se buscou dar maior força ao Parlamento Europeu, que é diretamente eleito pelos cidadãos da UE, bem como aos Parlamentos Nacionais, tornando, pois, a União Européia mais democrática.
Uma das grandes novidades deste Tratado, é que pela primeira vez se prevê expressa e literalmente a possibilidade de algum de seus Estados-membros se retirarem desta União.
É bem verdade que o grande objetivo do Tratado de Lisboa é tornar a Europa um ator de destaque no mundo altamente competitivo:
Hacer de Europa un actor en la escena global: combinando los instrumentos con que cuenta la política exterior europea a la hora de elaborar y aprobar nuevas políticas. Gracias al Tratado de Lisboa, Europa estará en condiciones de expresarse con más claridad ante sus socios internacionales. Se pondrán en juego todas las capacidades económicas, humanitarias, políticas y diplomáticas de Europa para fomentar sus intereses y valores en todo el mundo, respetando los intereses particulares de los Estados miembros en el marco de las relaciones exteriores. (Site oficial da União Européia. Disponível em: http://europa.eu/lisbon_treaty/glance/index_es.Htm)
O elevado grau de desenvolvimento da Comunidade Européia nos permite constatar um fato irrefutável: o processo de unificação européia tornou-se irreversível. Na verdade, esse processo de unificação encontra-se profundamente enraizado nas realidades políticas, econômicas e sociais da Europa atual.
II: A CONSTITUIÇÃO DA UNIÃO EUROPÉIA
O projeto das sociedades nacionais de construir uma identidade social e cultural, bem como de estreitar os laços de união política e legal demonstra a preocupação que as instituições européias têm em estabelecer uma Constituição Européia.
A criação de uma cidadania e de um ordenamento jurídico de caráter regional europeu visa reforçar, além dos instrumentos legais e institucionais, características culturais, interesses, crenças e valores entre os cidadãos que integram a União Européia.
Como destacou Ana Paula Tostes (Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-52582006000200005&script=sci_arttext &tlng=en), os esforços do governo comunitário em buscar desenvolver uma Constituição Européia ficaram explicados, principalmente, em razão da comoção nas sociedades dos Estados-membros em buscar dar maior legitimação do processo de integração, garantindo maior eficácia para as suas políticas, do que em trazer alterações dos poderes exercidos pelas suas instituições.
Ainda segundo a referida autora (TOSTES, Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-52582006000200005&script=sci_arttext &tlng=en), restam evidentes os objetivos da criação de uma Constituição Européia:
Fica mais claro, com tudo isso, a compreensão sobre a idéia de Constituição, que marca simbolicamente esse Tratado da União Européia. Há neste atual projeto da integração regional européia a pretensão de fortalecer uma noção de território e identidade social comuns. Está na base da condição de se estabelecer uma “Constituição”, entretanto, a existência de uma cidadania comum no território da União, e esta, embora implementada juridicamente há mais de uma década, vem sendo assimilada muito lentamente desde a sua invenção. Problemas identificados na ocasião da ratificação de Maastricht permanecem sem solução até a fase da ratificação do Tratado da Constituição, como o da aceitação de uma identidade coletiva comum regional.
De acordo com os dados fornecidos no site oficial da União Européia (Disponível em: http://europa.eu/abc/12lessons/lesson_12/index_pt.htm), o Projeto do Tratado Constitucional teve origem em dezembro de 2001, quando o Conselho Europeu convocou uma Convenção, sob a presidência de Valéry Giscard d’Estaing, visando garantir uma maior unidade e cidadania jurídica, legal e social.
Participaram da Convenção um total de 105 membros, sendo composta por representantes dos Estados-membros e dos países candidatos, parlamentares da União Européia e dos Estados Nacionais, bem como por membros da Comissão Européia.
Aprovou-se o Tratado, consensualmente, em 2003, sendo que apenas fora formalmente assinado em Roma, no ano de 2004, para, ato contínuo, passar a fase de aprovação dentro do ordenamento jurídico dos Estados-membros.
Conforme Jéssica Naime (Disponível em: http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20050808100423.pdf?PHPSESSID=e8c4253ae5f4e1df29ce09fb427c8067), além da ratificação do Tratado pelos Estados integrantes da União Européia faz-se necessários a sua aprovação dentro do ordenamento nacional, para que a Constituição Européia seja adotada e implementada.
Destaque-se que, em alguns Estados, como na Alemanha, esta aprovação ocorre somente no âmbito parlamentar, mas, em outros, como no caso da França, dos Países Baixos e da Inglaterra, por exemplo, o referendo popular é obrigatório.
Neste sentido, tem-se as lições de Ana Paula Tostes (Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-52582006000200005&script=sci_arttext &tlng=en), expondo uma das justificativas para que alguns países adotassem a exigência de consulta popular para a aprovação da Constituição Européia:
Sendo assim, países como a Dinamarca, a Noruega, a Irlanda, a França e, recentemente, a Holanda, só para exemplificar, consideraram a consulta popular fundamental em situações variadas em que o processo de integração se intensificava e, como dito anteriormente, com a chamada da população à participação vieram também resistências e mesmo rejeições. Vozes de resistência obtiveram condições de obtenção de ressonância na medida em que os meios de comunicação e veiculação de informação e formação passaram a tomar conhecimento e comentar o processo de integração, suas condições, possibilidades e conseqüências. Falta ainda compreender estas vozes de resistência, pois elas não parecem uníssonas, visto que razões diferentes orientam o discurso que rejeita a integração ou os caminhos que ela tem seguido.
Interessante mencionar que muito embora a maioria dos Países Membros da EU tenha ratificado o Tratado da Constituição, este fora rejeitado em plebiscito realizado em 2005 na França e nos países Baixos. Ocasionado, por conseguinte, a necessidade de uma maior reflexão, transparência e divulgação dos objetivos e conteúdos do referido Tratado, para tentar convencer os cidadãos europeus quanto à necessidade de sua aprovação.
Saliente-se que para alguns especialistas, a recusa no referendo francês e holandês em 2005, não traria tantos dados, pois, segundo eles já estaria em vigor de acordo com os acordos e tratados europeus vigentes uma Constituição Européia, pelo menos no sentido técnico, como se observa na entrevista de Sérgio Costa e Denilson Werle com Hauke Brunkhorst (Disponível em: <www.scielo.br/pdf/nec/n76/05.pdf>):
É de fato correto que há muito já existe uma constituição européia no sentido técnico. Desde os tratados de Roma, cujo centenário será comemorado em 2007, existem órgãos de poder específicos da comunidade européia, com competências legislativas e jurisdições específicas, e uma série de novos direitos, que, no início, se concentraram num núcleo de liberdades comerciais e de movimentação econômica, mas que, no entanto, mais tarde se estenderam para muito além disso. Já em 1963, o tribunal europeu entendeu, a partir dos tratados comuns, que, com a fundação da comunidade, foram criados direitos de cidadania específicos para os cidadãos europeus em seu conjunto. Isso exigiria forçosamente, conforme o tribunal argumentou na ocasião, reconhecer e representar juridicamente, nos casos de direito de apelação, uma base dupla de legitimação da união. De um lado, está a clássica base de legitimação intergovernamental, os tratados entre os Estados; de outro, uma base de legitimação na qual, pode-se dizer, a comunidade européia de cidadãos, constituída ou em processo de constituição, representa um sujeito de legitimação independente dos tratados entre Estados e das nações, aos quais cada cidadão europeu pertence.
No site oficial da União Européia (Disponível em: http://europa.eu/abc/12lessons/lesson_12/index_pt.htm), encontram-se as principais disposições da Constituição, sendo elas: (1) O Presidente do Conselho Europeu passa a ser eleito por maioria qualificada, para um mandato de 2 anos e meio, podendo ser renovado uma única vez; (2) A eleição do Presidente da Comissão exige maioria simples dos membros do Parlamento Europeu, de acordo com a proposta do Conselho Europeu; (3) Cria-se o posto de Ministro dos Negócios Estrangeiros Europeu; (4) O Tratado incorpora a Carta dos Direitos Fundamentais; (5) Reforça os poderes do Parlamento Europeu, no que atine aos atos legislativos e orçamentais; (6) Esmiúça as competências e responsabilidades entre a União Européia e os seus Estados-membros.
Quanto ao aspecto de direitos fundamentais, também há inovação nesta Magna Carta (União Européia. Disponível em: <http://europa.eu/scadplus/constitution/democracy_pt.htm>):
O texto da Constituição reafirma os direitos ligados à cidadania europeia e define, pela primeira vez, os fundamentos democráticos da União. Estes fundamentos democráticos baseiam-se em três princípios: o princípio da igualdade democrática, o princípio da democracia representativa e o princípio da democracia participativa. Por último, o Título VI, consagrado à vida democrática, agrupa igualmente certas disposições até então dispersas nos Tratados, nomeadamente as relativas à transparência, ao acesso aos documentos e ao papel do Provedor de Justiça Europeu.
Conforme já mencionado, atualmente, o Tratado da Constituição ainda está pendente de aprovação dentro do ordenamento nacional de quase todos os Estados-membros da União Européia, para que possa efetivamente entrar em vigor.
Um dos maiores problemas para a não aprovação imediata da Constituição Européia é em virtude de haver uma distância entre o sofisticado avanço nos âmbitos jurídico, econômico e institucional e a informação, a participação e a conscientização a respeito das conseqüências desse processo para as populações da região.
Nos dizeres de Ana Paula Tostes (Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-2582006000200005&script=sci_arttext &tlng=en):
Podemos identificar razões semelhantes às que levaram à crise de Maastricht na resistência ao projeto de criação de uma Constituição européia atualmente. Sabemos que o processo de mais de meio século de integração não obteve participação popular, entretanto, sabemos também que valores e crenças são construídos socialmente e podem gerar estratégias de ação coletiva.
Observa-se, portanto, que um dos problemas da rejeição da Constituição nos países mencionados ocorreu em virtude da falta de transparência e de divulgação do mesmo, que, como várias outras normas comunitárias foram impostas de cima para baixo, sem que a maior parte da população tenha acesso ao que se passa.
Além do mais, está sendo fortalecido o xenofobismo dentro do continente europeu, principalmente após o ingresso dos países antes membros da extinta URSS, que, por terem uma economia mais fragilizada acabam por incentivar a migração rumo aos países mais desenvolvidos dentro do continente europeu, aumentando a luta por emprego.
Como bem destacou Jéssica Naime (Disponível em: http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20050808100423.pdf?PHPSESSID=e8c4253ae5f4e1df29ce09fb427c8067), um dos problemas do avanço também é a falta de identidade cívica supranacional, bem como a diferença econômica existente dentro da própria União:
A UE então depara-se com o mesmo desafio de quando da adesão dos Estados ibéricos e grego. Os dez países possuíam economias de base agrícola e grandes disparidades quanto ao desenvolvimento social. Essas divergências de estruturas social e econômica culminam, mais uma vez, em pressões sobre as políticas distributivas da UE, além de suscitarem novas preocupações acerca dos impactos de possíveis fluxos migratórios. O grande benefício trazido com esse alargamento em termos de ampliação de mercado contrasta-se com seus custos: os possíveis subsídios dispensados aos novos membros para reestruturação de suas economias podem ser maiores do que suas contribuições ao orçamento comunitário
Assim, para que possa ser expandida a União, deve ser incentivado a divulgação e o debate de um projeto legal e constitucional pluralista e democrático.
Conforme Ana Paula Tostes (Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-2582006000200005&script=sci_arttext &tlng=en):
Temos indícios suficientes para apontar duas implicações da integração regional européia, no que se refere à recepção social. A primeira é que na região da integração há resistências ideológicas, não simplesmente à integração mas também ao pluralismo e à democracia, e existem resistências históricas, sobre as quais podemos avaliar uma eventual graduação no âmbito das tradicionais dimensões políticas européias: radicais de esquerda e radicais de direita. Além disso, naturalmente, no que diz respeito à construção de uma nova identidade coletiva, mais ampla e inclusiva do que a identidade nacional, existem comportamentos e reações diferenciadas de acordo com a sociedade nacional. Mesmo que o mapeamento detalhado destas diferenças ainda não tenha sido realizado, a relação entre a consolidação de uma identidade coletiva européia única e uma cidadania legitimada pela aceitação popular é clara.
A criação de uma Constituição, portanto, tem de passar antes por uma construção real de uma identidade coletiva, e não apenas aparente, buscando compatibilizar as culturas e eliminar as desavenças e discriminações.
Além de que tem de ser incentivado o debate sobre esta unidade constitucional supranacional, dando transparência e democratização ao processo de integração jurídica que se pretende adotar, valorizando os laços de união da comunidade, para garantir regras comuns mais claras e organizadas do que as que já vêm sendo seguidas.
Destaca-se, portanto, que a rejeição deste modelo de integração jurídica, que busca construir uma identidade civil européia, é uma forma de dizer não ao projeto inteiro da integração nos moldes em que vem sendo desenvolvido.
III O EURO E SEU IMPACTO NA ORDEM ECONÔMICA EUROPÉIA
Desde a extinção do padrão dólar, o processo de criação de um sistema monetário dentro do continente europeu foi sendo incentivado, culminando, como se verá, na implantação do Euro e seu alargamento para demais países integrantes da União Européia.
Desde o fim da segunda Guerra Mundial até o começo da década de 70, a Europa usufruiu um período de estabilidade monetária, fruto do sucesso da Conferência de Bretton Woods.
Esta célebre conferência, realizada em New Hampshire, nos Estados Unidos, em 1944, teve o mérito de conceber toda a estrutura sistemática da economia mundial do pós-guerra, fruto da desconfiança nas propriedades auto-reguladoras dos mercados e da força das idéias de planejamento e intervenção do Estado na economia, tentando estabilizar as finanças internacionais, evitando novas crises do capitalismo (como o crack da Bolsa de Nova Iorque), sob a liderança da maior potência militar e econômica do mundo na época, os Estados Unidos.
Ressalte-se, pois, que desta conferência emergiu uma nova ordem financeira internacional, que, nos dizeres de André Moreira Cunha (Disponível em: <www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-31572006000400001&script=sci_arttext-117k>) procurava combinar a estabilidade propiciada pelo regime de câmbio fixo do antigo padrão ouro – que prevaleceu entre 1876 e a Primeira Guerra Mundial, com a flexibilidade requerida dos governos nacionais.
Este sistema consagrado em Bretton Woods, portanto, segundo Amaury Patrick Gremaud (GREMAUD; VASCONCELOS, 1999, p. 517), concebia um regime de taxas fixas, porém reajustáveis, conforme acordado entre os países, diferentemente do extinto padrão-ouro, que não permitia o ajustamento em caso de desequilíbrio financeiro-monetário em um Estado.
Nas décadas de seu funcionalmente, que foi de um pouco mais de duas décadas, houve taxas recordes de crescimento de renda e estabilidade econômica, recuperou-se os fluxos do comércio, possibilitando a reconstrução da Europa e do Japão, como também o avanço na industrialização nos países em desenvolvimento, consolidando, pois, nos dizeres de André Moreira Cunha (Disponível em: www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-31572006000400001&script =sci_arttext – 117k): “uma visão de complementariedade entre as ações dos estados nacionais e dos mercados”.
Ocorre, entretanto, que em meados da década de 70, o referido sistema entrou em crise. Tal fato, para Fernando Ferrari Filho (Disponível em: www.scielo.br/pdf/rec/v10n2/01.pdf), deu-se no contexto em que os Estados Unidos apresentavam sérios problemas de desequilíbrio fiscal, em virtude dos gastos com a Guerra do Vietnã, acarretando preocupação nas autoridades monetárias dos principais países que mantinham com eles superávits comerciais, de que os Estados Unidos não seriam capazes de sustentar a posição do dólar como moeda de reserva internacional, negligenciando o papel do dólar ao privilegiar suas reservas cambias em ouro, ocasionando redução substancial das reservas da economia norte-americana.
Diante disto, em 1971, Nixon – presidente dos EUA – suspendeu unilateralmente a conversibilidade do dólar em ouro, rompendo com as regras acordadas em Bretton Woods. A partir disso, o dólar não teve mais um valor estável e os Estados europeus tiveram de reexaminar suas políticas monetárias.
Com a impossibilidade de encontrar uma moeda forte para as trocas internacionais que substituísse a moeda norte-americana, tornou-se necessária uma solução no próprio âmbito da Comunidade. Salientando-se, também, que as ondas de gigantescos aumentos dos preços do petróleo, em 1973 e1979, contribuíram para novos e maiores temores.
A crise mencionada abriu espaço para uma ordem liberal nas finanças internacionais, marcadas por idéias neoliberais de expansão do capital financeiro no espaço dos mercados globais, nitidamente em virtude da era da globalização.
Segundo Thomas Fridman (2005, p. 281), os países passaram a perceber que a abertura dos mercados, possibilitando a competição, era “o único caminho sustentável para que uma nação se liberte da pobreza”, já que facilita a entrada de tecnologias, investimentos financeiros, necessitando, pois, flexibilizar e reformar algumas de suas normas, entre elas as constitucionais, para permitir esta inserção no mundo globalizado.
Grande parte dos líderes europeus acreditava que apenas com a criação de uma moeda única européia surgiria um mercado interno unificado dentro da EU, fortalecendo a sua integração. Desde o Tratado de Roma, a unificação do mercado europeu se deu principalmente através da diminuição de barreiras ao comércio, e, por conseguinte, seria necessário criar uma moeda única, para facilitar o comércio internacional, diminuindo riscos e custos.
Em 1971 entrou em vigor o Sistema Monetário Europeu (SME), com a finalidade de impedir desvalorizações acentuadas de moedas, que afetariam negativamente o comportamento do comércio exterior e dos fluxos de capitais no interior da EU. Criando, para tal, uma moeda virtual, a European Currency Unit (ECU), formada por uma série de moedas européias, cuja principal era o marco alemão.
A European Currency Unity foi um embrião de uma moeda única, que só existiu por ora nominalmente, como uma forma de conciliação contábil para facilitar cálculos dentro das instituições da comunidade, não circulando, porém, como meio de troca. O seu valor era o resultado da soma do valor de cada moeda nacional, conforme o peso de sua respectiva economia, dividida por 12, o número dos Estados-membros no momento.
O Mecanismo Europeu de Taxa de Câmbio estabeleceu uma relação de paridade entre as moedas nacionais, bem como foram fixadas margens restritas de flutuação. A cada vez que uma ou mais moedas nacionais corriam o risco de superar as margens de flutuação, os bancos centrais dos Estados-membros deviam intervir para manter o curso das suas moedas nos limites previstos.
Para que se pudessem saldar as intervenções dos bancos centrais nacionais, os Estados-membros depositavam 20% de suas reservas em ouro e 20% de suas reservas em dólares no Fundo Europeu de Cooperação Monetária. Assim, as moedas européias, ligadas umas às outras pelo Mecanismo Europeu de Taxa de Câmbio, moviam-se como um bloco contra o dólar e outras moedas.
Este sistema trouxe bons resultados, acarretando, por conseguinte, a entrada de novos adeptos[4]; contornando crises financeiras agudas em alguns países, como na Itália e na Irlanda; bem como incentivando o aprofundamento da união monetária.
Em 1988, criou-se um comitê, presidido por Jacques Delors, visando criar um cronograma para a implantação da União Monetária Européia (UME). Dos trabalhos do Comitê resultou o chamado Relatório Delors em 1989.
Neste relatório havia uma estratégia gradual para a adoção da unificação monetária, iniciando, em 1990, com a remoção de controles de capitais mais importantes e o aumento da independência dos Bancos Centrais domésticos. A aceitação formal do relatório deu-se no Encontro de Cúpula de Maastricht, em 1991, que culminou na assinatura do Tratado.
Com o Tratado de Maastricht, em 1993, a Comunidade Européia resolveu vencer uma nova etapa, com novos objetivos – deixava de ser somente um mercado comum para então se tornar uma união econômica e monetária, uma união política e social.
O escopo da UEM foi o de substituir as moedas nacionais por uma moeda única, conforme aconteceu com a implantação do euro. Onze países participaram do lançamento da nova moeda em 1º de janeiro de 1999: Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Finlândia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos e Portugal. O Reino Unido, Suécia e Dinamarca não aderiram a essa primeira fase do euro, apesar de terem cumprido as exigências[5], por temerem as conseqüências da perda da soberania que representa o fim da emissão de sua moeda própria. A Grécia teve seu ingresso retardado por não preencher as condições exigidas até março de 1998, ingressando no Euro apenas em primeiro de janeiro de 2001.
Apesar de não ser adotado por todos os paises integrantes da comunidade, a grande maioria das Bolsas dos países desta decidiram que, a partir de 4 de janeiro de 1999, as negociações, as cotações, a difusão dos preços e a liquidação das operações financeiras passariam a ser efetuadas em euros.
Destacam-se como vantagens de se ter uma moeda única, o surgimento de condição mais favorável aos aumentos dos investimentos, uma vez que todos estarão com o mesmo câmbio, a facilitação das operações transfronteiriças realizadas por viajantes e consumidores, eliminando os encargos com as operações cambiais e facilitando a comparação de preços.
Outra finalidade do euro é de reforça o caráter de unicidade do mercado, estabilizando os preços, sendo, pois, uma moeda capaz de competir, e, quiçá, superar o dólar americano.
Houve a ampliação da União Européia nos anos de 2004[6] e 2006, passando de 15 membros para um total de 27. Os novos Estados-membros eram obrigados a estabelecer os critérios de convergência para a “zona euro”.
Observe-se, contudo, que a economia desses países era mais frágil e susceptível de grandes variações cambiais, e, portanto, a eles foi dado um maior período de adaptação de suas economias, para que apenas quando atingissem um certo grau de estabilidade, com um baixo nível de déficit e de dívida públicos, adotassem integralmente o euro.
Recentemente, em 01 de janeiro de 2008, houve a adesão de mais dois países à “zona euro”, são eles: Chipre e Malta[7], passando, pois, a moeda única a ser utilizada em quinze países.
Conforme dados obtidos no site oficial da União Européia (Disponível em: http://ec.europa.eu/commission_barroso/president/focus/cyprus-malta/index_ pt.htm/ Acesso em: 13/01/2008): “as notas e moedas em euros começaram a circular em Chipre e Malta em 1 de Janeiro, à taxa de 0,585274 libras cipriotas e 0,429300 liras maltesas”.
De acordo com dados oficiais[8], no segundo dia da entrada destes países já tinham sido levantados aproximadamente 150 milhões de euros dos bancos e caixas eletrônicos.
Salienta-se que há alguns contratempos referentes à adesão do euro por estes dois países, pois a população teme que a introdução desta nova moeda possa acarretar um aumento no preço das mercadorias e serviços, já que agora utilizarão uma moeda mais forte. Mas, buscando prevenir esta superinflação, foram tomadas algumas medidas preventivas pelo Governo, como por exemplo a tarifação dos preços das duas moedas.
Interessante ponderar que outros países integrantes da União européia ainda não tiveram o direito de ingressar na Zona Euro, ou seja, os países necessitam ter maior equilíbrio e solidez econômica para estarem totalmente integrados a este bloco econômico.
Inclusive, há investimentos e incentivos de órgãos comunitários, injentando fundos na economia dos países mais fracos, para que estes possam atingir as exigências necessárias para adoação da moeda única.
Tais fatores vêm causando alguns questionamentos nos setores mais conservadores dos países mais fortes, na medida em que discordam com estas ajudas financeiras, por entenderem que seria mais rentável se o capital fosse aplicada dentro de seu país, ao invés de utilizado para salvar uma economia fragilizada. Os conservadores ainda temem a proliferação de imigrantes em seus territórios e a concorrência em virtude da mão-de-obra ser mais barata nos países recentemente ingressados na UE.
Para dar suporte à moeda única, criou-se um Sistema Europeu de Bancos Centrais independentes, tendo como principais partícipes o Banco Central Europeu (BCE) e os Bancos Centrais nacionais. Aquele tinha como objetivo primordial, obter a estabilidade dos preços.
Segundo Celeste Cristina Machado Badaró (Disponível em: http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CES_ARQ_DESCR20070711104155.pdf?PHPSESSID=477963571165afe9a45230eb4b5baf76. Acesso em: 14/01/2008), com a entrada em vigor do euro, toda a autoridade monetária passou para o Banco Central Europeu, que convive com os bancos centrais nacionais existentes em cada país que adota este moeda única.
Desta forma, o conselho do BCE se reúne a cada dois meses com os representantes dos bancos centrais nacionais para discutirem e tomarem decisões sobre a política monetária que será adotada.
Uma das características marcantes da estrutura institucional do Banco Central Europeu é a completa separação entre as autoridades monetárias e as autoridades fiscais. Assim, nos dizeres de Tiago de Menezes Soares, (Disponível em: http://www.teses.usp.br):
Desse modo, a política monetária assume um caráter multinacional, supra regional, centrada que está np BCE, enquanto a política fiscal assume um caráter nacional, sob o controle dos governos nacionais membros da UME, embora esteja limitada pelos critérios quanto ao déficit público e a dívida pública (especificados no Pacto de Estabilidade e Crescimento). […] A importância do pacto reside no fato de que este rege as políticas econômicas dos países membros, bem como dos que aspiram a tal condição.
Embora com pouco ano de sua implantação, é possível se verificar os sucessos obtidos com o euro. A adoção da moeda única foi relevante para a unificação do mercado europeu, e, para tornar a União Européia uma grande superpotência, que, paulatinamente, vai quebrando o poderio, antes absoluto dos Estados Unidos da América.
Destaque-se que a adoção de uma moeda única na União Européia impõe reflexos importantes no dia-a-dia de todos os agentes econômicos inseridos neste contexto, onde aqui se inclui desde o cidadão comum até diversas instituições tais como bancos, instituições financeiras, bolsas de valores, empresas, afetando até mesmo o sistema monetário internacional. Nos dizeres de Celeste Cristina Machado Badaró (disponível em: www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CBO_ARQ_BOLET20070711104004.pdf?PHPSESSID=1cc490e7117c43d63680f899fa7a0472):
Basicamente, todas as decisões econômicas importantes de uma economia recaem sobre sua política monetária. Por isso, a unificação monetária foi um passo delicado no processo de integração européia. Além disso, a moeda é um elemento da identidade nacional, em especial na Europa, onde algumas moedas, como o antigo dracma grego, tinham milhares de anos de existência. A constituição do euro foi, então, uma tentativa de fortalecer a identidade européia.
Este aprofundamento da integração econômica européia fez com que diversas empresas atuantes nestes paises repensassem seu posicionamento estratégico, reorganizando-se internamente, fundindo-se. Esmiuçando as conseqüências e vantagens da adoção da moeda única para os países europeus, observa-se os ensinamentos de Gomes (2005, p. 46):
Com a instituição da união monetária, Estados-membros da União Européia contam com uma moeda forte, capaz de concorrer com o dólar norte-americano, ao mesmo tempo que consolidam o mercado comum, eliminando os entraves decorrentes da conversibilidade das moedas nos seus mercados internos, pois uma única moeda estará em vigor em todo o mercado comum, possibilitando maior competitividade, intercâmbio comercial e melhor comparação de preços.
A adoção desta moeda única é algo irreversível, e de igual maneira será a tendência de aproximação dos ordenamentos jurídicos no tocante as regras de funcionamento de mercado, dos institutos de direito comercial, principalmente o societário. Não esquecendo também do direito cambiário e de mercado de capitais.
De acordo com o atual presidente da Comissão Européia, Durão Barroso (UNIÃO EUROPÉIA, Disponível em: <http://ec.europa.eu/commission _barroso/president/focus/cyprus-malta/index_pt.htm.> Acesso em: 15/01/2008), quando parabenizava os países do Chipre e Malta pela sua bem sucedida preparação para a adesão à zona euro, o euro beneficia tanto as empresas como os cidadãos:
O euro é uma moeda forte e estável. Paralelamente às reformas económicas empreendidas pela UE e pelos Estados-Membros, o euro é uma das razões pelas quais a economia europeia tem continuado a crescer, apesar de alguns desafios difíceis causados pelos elevados preços da energia e dos produtos de base.
Os contratos também deverão ser alvo de modificações tendentes à uniformização na medida em que o contrato também é um grande fator de circulação de riquezas dentro da atividade econômica.
O Euro ratifica a grande tendência de globalização que surgiu após o fim do regime socialista, onde busca unificar mercados e concentrar forças nas mãos de alguns poucos, determinando circuitos produtivos e financeiros.
Saliente-se, pois, que o capitalismo foi se readaptando e obtendo um verdadeiro “Grande Salto Adiante”, havendo, nos dizeres de Erick Hobsbawn (2006, p. 264): “uma substancial reestruturação e reforma do capitalismo e um avanço bastante espetacular na globalização e internacionalização da economia”.
Relativamente ao sistema financeiro internacional, o Euro está sendo um excelente concorrente para o dólar, na medida em que atualmente chega a superá-lo. A importância da União Européia dentro do cenário econômico vai se equiparando a dos Estados Unidos, mobilizando grande parte do comércio mundial, sendo fonte relevante de investimentos internacionais.
Outro ponto a ser destacado é que esta nova moeda reduziu a atuação do iene japonês das transações internacionais.
A opção de renunciar à soberania monetária pelos Estados-membros da EU e ser a favor da administração coletiva da coordenação macroeconômica possui um grande cunho representativo para a Europa unida do século XXI e para seu subseqüente papel internacional.
CONCLUSÃO
Hodiernamente, afirma-se, sem sombras de dúvida, que a União Européia é o mais arrojado, moderno e eficiente processo de integração regional que se materializou na superfície terrestre.
Detentora de um gigantesco mercado comunitário responsável por desencadear um notável crescimento e desenvolvimento econômico conjunto e dotada de uma avançada estrutura jurídico-institucional, na qual democraticamente, concretiza-se o princípio da soberania compartilhada.
A União Européia é o produto de uma civilização e um orgulho por ser responsável por criar e modelar, ao longo de sua história, as bases culturais que hoje são padrões para grande parte da humanidade.
Horizonte para todos aqueles processos de integração regional que surgem nos quatro cantos do globo, a União Européia, pelas próprias peculiaridades e particularidades de seu povo e de sua história, continuará sendo uma estrela solitária, pois dificilmente se criará algo similar em qualquer outra parte, pelo menos nos próximas décadas.
Conforme todo o exposto, verificou-se que a ordem interna da União Européia constitui uma organização jurídico-institucional própria, autônoma, distinta e hierarquicamente superior às ordens jurídicas dos Estados-membros.
Existem, na União Européia, várias situações de transferências de competências para a Comunidade, entidade supranacional. Mas, a soberania dos Estados permanece. Havendo, na verdade, uma delegação consentida de atribuições, com o fim de alcançar objetivos comuns de desenvolvimento e prosperidade dos povos europeus.
Observaram-se os progressos e dificuldades de implantação efetiva de uma Constituição européia, que embora ratificada pelos Estados-membros, ainda está pendente de aprovação no ordenamento de diversos países, tendo, inclusive, sido rejeitadas as consultas populares na França e nos Países Baixos.
Inferiu-se, pois, que o projeto das sociedades nacionais de construir uma identidade social e cultural, bem como de estreitar os laços de união política e legal, dependerá de uma maior transparência nas decisões e nas normas supranacionais.
Assim, para que possa ser expandida a União, havendo uma verdadeira comunidade política, com um único texto constitucional, deve ser incentivado a divulgação e o debate de um projeto legal e cívico pluralista e democrático. Caso isto não ocorra, haverá o risco de se fortalecerem ainda mais as reações racistas e xenófobas entre membros dos Estados integrantes da UE.
Diante de todas as características, instituições e órgãos analisados, pôde-se concluir que a União Européia aproxima-se muito de um modelo estadual, inclusive estando próxima de ter uma Constituição Européia vigente em todos os seus Estados-membros.
Por fim, tem-se a importância da instituição da Moeda Única – o EURO – como uma maneira de fortificar ainda mais a economia da União Européia e trazer mais um elo de ligação entre os seus Estados-membros.
É de bom alvitre ressaltar que o Euro está sendo um excelente concorrente para o dólar, inclusive atualmente chega a superá-lo. Desta forma, resta evidente que a União Européia vai fortalecendo seu destaque e atuação dentro do cenário econômico, mobilizando grande parte do comércio mundial, sendo fonte relevante de investimentos internacionais.
Adicionalmente, as funções que o euro possa assumir futuramente enquanto “moeda mundial” e seu papel eventual de desafio à hegemonia internacional do dólar representarão a conseqüência natural da confirmação e solidificação do poder econômico da União Européia no plano internacional.
Informações Sobre o Autor
Sancha Maria F. C. R. Alencar
Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais em Buenos Aires na Universidad del Museo Social Argentino. Mestranda em Direito Constitucional Econômico pela Universidade Federal da Paraíba. Advogada.