Resumo: Trata-se de artigo no qual objetiva demonstrar que o Poder Judiciário encontra-se fraturado. Por um lado, responde aos anseios de uma minoria dominante e por outro, possui um potencial emancipatório. Para tanto, utilizou-se como análise processos criminais nos quais os líderes do MST foram julgados e onde se pôde observar tal cisão.
Palavras-chave: Poder Judiciário – controle – emancipação.
Sumário: I – Introdução; II – O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra: uma breve história; III – A dupla face do Poder Judiciário; 1. O uso hegemônico do Direito; 2. Por um Poder Judiciário Emancipatório; IV – Considerações longe de serem finais; Referências bibliográficas.
I – Introdução.
Durante a ditadura, a questão agrária foi militarizada e os sem-terra foram presos como subversivos. Entre os anos de 1990 a 1992, o Brasil ficou sob a liderança política de Fernando Collor de Mello. Neste breve espaço de tempo, muita coisa foi realizada contrariamente, ou não foi implementada em conformidade, com os anseios sociais, como por exemplo, a não realização de desapropriação de terras por interesse social para fins de reforma agrária, além do programa de assentamentos, que já era precário e foi paralisado. Começaram, neste período, as mais fortes repressões contra os sem-terra, que não se limitavam às ações da força policial, valendo-se também da intervenção do Poder Judiciário como uma nova cerca para impedir as ocupações. Deu-se início à criminalização das ações das famílias sem-terra, com a judicialização da luta pela terra e pela reforma agrária, resultando em prisões e massacres de camponeses sem-terra.
Passou-se à judicialização da questão da terra como mais uma estratégia de repressão. O enigma que se utiliza em meio a toda uma história de exclusões do homem em sua busca pela terra vem junto com a humilhação e a aproximação que se faz por meio de discursos incriminadores, o mesmo acontecendo aos indígenas, em suas lutas pelas terras que lhes são sagradas, e aos quilombolas. Esses grupos, para atingir algumas conquistas contra os poderes hegemônicos, necessitam articularem-se em comunidades mais amplas e globalizadas.
Trago a este trabalho, que não tem a pretensão de esgotar o tema, questões referentes ao papel do Poder Judiciário em sua articulação com os movimentos sociais, por um lado apontando momentos em que o mesmo legitima e referenda discursos dominantes, enquanto agência de controle social, por outro lado destaco decisões judiciais que garantem e legitimam direitos dos cidadãos, tornando-se mais atento e sensível às questões sociais.
Objetivo demonstrar, no decorrer destes breves apontamentos, que o Judiciário brasileiro apresenta-se em conflito interno de várias ordens, oscilando entre os interesses da maioria da população local e global e os interesses capitalistas, evidenciando-se em várias áreas, como a questão agrária e ambiental.
Não obstante toda a querela em torno das ações políticas dos sem-terra, foi graças às ações do MST que a questão da terra ingressou definitivamente na agenda política do país, e, no dizer de Houtzager (2005:224), o Movimento contribuiu para a constitucionalização de normas e para o acesso à terra em várias partes do Brasil, redefinindo os direitos de propriedade, na prática, sendo as impetrações de Habeas Corpus uma forte arma contra a criminalização do Movimento.
Pesquisa realizada pelo IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais) identificou dois tipos de discurso sobre a questão entre juízes e promotores de justiça. Uma corrente adota uma postura crítica e reconhece a existência da parcialidade nas decisões, que pesam contrariamente ao Movimento, bem como admite a incapacidade da justiça tratar a questão agrária. Uma outra linha se auto-denomina “legalista” e prefere adotar a via da criminalização da luta pela reforma agrária, defendendo a neutralidade política da justiça ao mesmo tempo em que critica as concepções de direitos humanos.
É sob este olhar, de contradição interna, que demonstrarei como o juiz de primeira instância, juiz monocrático, é mais sensível às pressões dos grandes grupos, do poder dominante. Para esta análise, utilizar-me-ei de alguns julgados que criminalizaram a conduta do Movimento Sem-Terra, em razão das ocupações que realizaram, todas proferidas pelo MM. Juiz de Direito Dr. Átis de Araújo Oliveira, da Comarca de Teodoro Sampaio, conhecida área de conflito da região do Pontal do Paranapanema, situada no Estado de São Paulo, Brasil.
Em seqüência, trarei as reformas destas mesmas sentenças, onde se observa claramente a inadequação jurídica e processual das decisões monocráticas proferidas, bem como decisões do Supremo Tribunal Federal, que denotam a possibilidade de o Judiciário politizar-se[1], demonstrando assim que ainda se pode ter esperança quanto ao Poder Judiciário tornar-se mais inclusivo, incluindo-se no que se denomina legalidade cosmopolita subalterna (Santos, 2003).
Justifico minha opção pela análise de decisões judiciais criminais por observar que este é o caminho encontrado (a criminalização do MST) pelo grupo dominante para desqualificar o Movimento e enfraquecê-lo, junto à opinião pública[2]. É por meio do direito penal, por meio da criminalização, que o poder dominante tenta desqualificar a luta do Movimento. O direito moderno contribui sobremaneira para a consolidação da divisão e estagmentação de sociedade em classes. Assim, o que o direito penal vem tutelar e proteger são justamente aquelas rubricas que visam manter a posição de seus titulares[3].
O MST ao realizar ocupações em latifúndios que não cumprem sua função social e em prédios públicos, tem como objetivo maior fazer-se notar, chamar atenção para o problema que vai para além da reforma agrária e que envolve a exclusão dos trabalhadores realizada pelo mundo capitalista e acirrada pelo processo globalizatório atual. Essa é a estratégia habitual. Entretanto, em Pontal do Paranapanema, os alvos visados foram as terras já declaradas públicas e que, na década de 40, do século passado, o governo paulista assentiu na posse ilegal dos latifundiários.
A maior parte das terras do Pontal do Paranapanema foi objeto de grilagem desde a segunda metade do século XIX, com a formação do grilo[4] na fazenda Pirapó-Santo Anastácio, com área de 238 mil alqueires. Até a década de 90, os latifundiários grileiros não encontraram maiores problemas no assenhoreamento das terras devolutas do Pontal[5]. Com as ocupações realizadas pelo MST, nesta área, esta posse tranqüila dos grileiros foi abalada. Em julho de 1990, o Movimento realizou sua primeira ocupação no Pontal, no município de Teodoro Sampaio, na qual envolveu 800 famílias[6].
Na dinâmica de argumentações neste trabalho, primeiramente, situarei o Movimento Sem-Terra no contexto político, social e econômico brasileiro. Logo após, trarei as decisões judiciais que criminalizam o Movimento, respondendo às necessidades das classes e grupos dominantes e a reforma destas decisões, situando a necessidade de construção de um novo Poder Judiciário, mais atento às questões sociais, que permitam que as lutas sejam politizadas antes de serem legalizadas, conforme sinaliza Santos (2003:37).
Para tanto, utilizei-me de revisão bibliográfica autorizada e capaz de melhor fundamentar a argumentação que coloco, aliada ao pensamento de Boaventura Sousa Santos, por uma justiça contra-hegemônica, no sentido da legalidade cosmopolita subalterna.
II – O Movimento Dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra: Uma Breve História.
Com o caos agrário, iniciado por ocasião das sesmarias no Brasil, ainda no período colonial e fortemente agravado durante o período de ditadura militar, em razão do grave êxodo rural, por força da política que fora adotada, trabalhadores rurais decidiram resistir ao sistema imposto e, assim, em 07 de outubro de 1979, agricultores sem-terra do Rio Grande do Sul ocuparam a gleba Macali, em Ronda Alta[7].
O MST, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra , surgiu oficialmente em 1984 durante o 1º Encontro dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, em Cascavel (PR), sendo, no ano seguinte, organizado nacionalmente, momento em que se realizou o 1º Congresso Nacional dos Sem Terra, realizado de 29 a 31 de janeiro de 1985, em Curitiba, Paraná, com 1500 delegados representando 23 estados brasileiros.
O MST é um movimento social que luta não só pela reforma agrária, pelo direito ao acesso e permanência na terra, mas também por crédito, moradia, assistência técnica, escolas, atendimento à saúde e outras necessidades da família sem-terra que, assim como para todos os brasileiros, precisam ser supridas. Enfim, descobriu-se que a luta não é apenas contra o latifúndio, e sua nova forma de expressão, o agronegócio, mas também contra o modelo econômico neoliberal vigente nos dias atuais. A luta do MST é pela Reforma Agrária e pela transformação social.
III – A Dupla Face Do Poder Judiciário.
1. O Uso Hegemônico Do Direito.
A repressão possibilita a ilusão da segurança, encobrindo os sintomas da doença social com um sistema legal e julgamentos de valor moral. (Rusche & Kirchheimer, 1999)
Nesta seção trato de alguns processos, criminais, em sua maioria, e um cível, julgados no Pontal do Paranapanema, conforme explicitado na introdução do presente Ensaio. Analiso a decisão de primeira instância, que mais utiliza as ferramentas do direito para fins hegemônicos repressivos, perspassando brevemente pelas reformas destas decisões monocráticas, pois deixo a discussão da legalidade cosmopolita subalterna para a seção seguinte. Estas reformas, mesmo sendo, muitas das vezes, motivadas por falhas processuais, pode-se observar que não ocorrem aleatoriamente, fato capaz de indicar a intenção de criminalizar o Movimento, apesar de não ter argumentos válidos para tal.
As ocupações são atos políticos e como tal devem ser tratados. Entretanto, conforme se pode observar das decisões que aqui se traz, as mesmas são facilmente e propositadamente traduzidas em atos criminalizatórios. Ou seja, são discursos e práticas que mostram o receio que têm os poderes dominantes destas ações se proliferarem e se tornem exemplares a outros movimentos e lutas, por isso desqualificar o movimento com a efetividade da criminalização.
A judicialização da luta, por meio da criminalização das ocupações realizadas pelo MST, visa mesmo desterritorializar a luta, desmobilizar os manifestantes e, para o público em geral, mostrar sua incessatez e descabimento. As ocupações e os assentamentos têm relação direta uma a outra, no sentido de que as primeiras, em regra, determinaram aqueles. Assim, dentro desta lógica, inviabilizar as ocupações significa extinguir os assentamentos e, mais a frente, a própria reforma agrária.
Quando as ações humanas contradizem as idéias dominantes, elas são tidas como desordem, caos, anormalidade e perigo para a sociedade. É esta concepção positivista, burguesa, ainda muito impregnada em nosso mundo, que serve de desafio ao presente Ensaio, pois se observa que tudo que sai da “ordem”, da regra, ditada pela classe dominante, em atenção aos seus interesses e à perpetuação de sua dominação, é desqualificado e jogado no inconsciente coletivo como desastroso para a sociedade como um todo.
Inscrita à idéia de tensão entre regulação e emancipação da sociedade moderna, trazida por Santos (2002), podemos verificar que a concepção de solidariedade, integrante do processo emancipatório, foi deslocada e associada à idéia de caos, que se contrapõe à ordem, princípio regulatório. A solidariedade foi recodificada como caos e o colonialismo como ordem.
Houtzager (2005:224) identifica o início dos anos 90 do século passado como o momento da mudança de postura do MST em relação ao Judiciário e seus instrumentos legais. Entendo que assim o seja porque, com já afirmado, nesta época, sob o governo do ex-presidente Collor de Mello, tenha se intensificado a criminalização do Movimento. Foi o período inicial da judicialização da luta.
Assim como o próprio Estado Brasileiro, o Poder Judiciário também tem pouca tradição democrática, com sua atuação marcadamente repressora sobre as camadas populares, bem como suas íntimas ligações com as grandes oligarquias. O MST sofre diretamente este processo histórico de dominação e repressão, principalmente nos órgãos jurisdicionais de primeira instância das áreas de conflito, pois não raras vezes respaldam as posições dos latifundiários, utilizando estratégias como descuidar de algumas exigências ou cautelas legais para a concessão de liminares de reintegração de posse[8].
Neste sentido, pode-se observar a decisão de 11 de julho de 2002, proferida pelo MM. Juiz Átis de Araújo Oliveira, da Comarca de Teodoro Sampaio, conhecida área de conflito da região do Pontal do Paranapanema (São Paulo), no processo n.º 196/1999, onde Valmir Rodrigues Chaves, integrante do MST, foi denunciado por co-autoria em furto qualificado de duas cabeças de gado, ocorrido em março de 1999, na Fazenda Nova Esperança III, município de Euclides da Cunha Paulista, comarca de Teodoro Sampaio. Na referida decisão, acolhendo a manifestação do parquet, o MM. Juiz Átis decretou a prisão preventiva de Valmir, sob o argumento de que o mesmo estava foragido, pois não se conseguia localizá-lo. Em 07 de maio de 2003, a referida prisão foi revogada, por meio do Habeas Corpus n.º 439.012/0, impetrado perante o Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, sob a alegação de falta de motivação para decretação da prisão preventiva:
“Com o devido respeito, a circunstância de não se conseguir localizar o réu para intimação pessoal, e mesmo sua eventual evasão do distrito da culpa, não se mostram por si sós, isoladamente, suficientes para a medida extrema.(…)”
“Fosse a garantia de aplicação da lei penal, por si só, motivo bastante à prisão preventiva, esta haveria de ser decretada em todo e qualquer caso no qual citado o réu por edital e se fizesse revel, ou – como na espécie – em que não fosse localizado após a citação para ser intimado de atos processuais”.
Em outro processo, verifica-se, conforme se observa na decisão do acórdão em seguida, a fragilidade dos mandados de prisão preventiva, expedidos com falta de motivação para a aplicação da medida restritiva. Assim, vejamos o processo n.º 275/2000, no qual José Rainha Junior, Sergio Pantaleão, Marcio Barreto, Valmir Rodrigues Chaves e Zelitro Luz da Silva, todos líderes do MST, tiveram decretadas suas prisões preventivas, em 23 de maio de 2002, pelo MM. Juiz Átis.
Neste processo, há informação de que José Rainha ameaçou, munido de espingarda, integrantes do MAST[9], afirmando que a terra em questão (Fazenda Guará-Mirim[10]) “seria deles” e que os integrantes do MST os expulsaram da área, e também, aos técnicos do Itesp (Instituto de Terras do Estado de São Paulo). O MM. Juiz afirma que o MST não aceita o assentamento de famílias ligadas ao MAST e o critério classificatório feito pelo Estado.
Em acórdão proferido pelo STJ, em 12 de novembro de 2002, o Ministro Relator Felix Fischer destaca a não existência de motivo para aplicação da medida assecuratória visto não haver “sinais concretos de atuação dos demais pacientes nas supostas atemorizações levadas a efeito no curso da ação penal” (p.5), tendo o decreto de prisão preventiva se valido apenas de depoimento de integrante de outro movimento social (MAST), além do fato de que a ameaça atribuída a José Rainha não ter sido objeto de aditamento à denúncia nem mesmo por ação penal autônoma, demonstrando a fragilidade do testemunho. Foram revogadas as prisões preventivas.
Para Foucault (2003), as ações judiciais são um modo de fazer circular os bens, sendo por isso que os mais poderosos visam controlar os litígios, impedindo que eles se desenvolvessem espontaneamente entre os indivíduos e porque tentaram apossar-se da circulação judiciária e litigiosa dos bens, o que implicou a concentração das armas e do Poder Judiciário, que se formava na época, nas mãos dos mesmos indivíduos (p.64). Na verdade, Foucault referia-se a uma característica presente na sociedade feudal, entretanto, pode-se perceber que pouco ou nada se alterou nesta estrutura, de lá para cá, podemos ainda ver os detentores do poder dominando o Judiciário, muitas vezes, ao seu bel interesse.
Com base neste entendimento, trago à discussão mais um processo, sendo este da esfera cível, no qual o MM. Juiz Átis demonstra bem como o Poder Judiciário responde aos anseios dos detentores do poder. Trata-se da decisão de 09 de junho de 2000, proferida pelo MM. Juiz já citado, em uma ação de manutenção de posse (Processo n.º 737/2000). Nesta decisão (fls. 35/37), o MM Juiz concede a medida liminar de manutenção de posse, sem realização de audiência de justificação, em favor dos autores Fernando Martins Antunes e Maria de Lurdes Batista Antunes alegando que, em 30 de maio de 2000, os integrantes do MST tinham “invadido” a Fazenda Santa Hida, de propriedade dos autores, ressaltando que a mesma era produtiva.
Ao deferir a expedição do mandado, ordena que o Movimento desocupe a região em cinco dias e, para justificar o prazo, faz uma interessante e escarnecida afirmação: “Prazo este mais do que suficiente para a saída do imóvel. Isto porque o conhecido ‘MST’ apresenta grau de organização quase que castrense e aquele que promove invasões de um dia para o outro evidentemente tem capacidade de retirar as pessoas do local.”
Em continuação, determinou que os integrantes do MST se afastassem 10 (dez) quilômetros da referida Fazenda. Tudo isso deveria ser observado (prazo de retirada e distância do imóvel) sob pena de cometimento de crime de desobediência. Os trabalhadores rurais se retiraram da Fazenda, mas permaneceram acampados na rodovia SPV-26. Segundo o Ofício n.º 42BPM, de 20/07/2000, compunham-se de cerca de 700 (setecentas) famílias cadastradas e aproximadamente 1.000 (mil) pessoas, entre homens, mulheres e crianças.
Como reação à decisão acima no que se refere à distância que os membros do MST deveriam manter da área ocupada, foi organizado um protesto nas proximidades do Fórum de Teodoro Sampaio. Foi elaborado, também, um pedido de reconsideração apresentado pelos advogados do Movimento, pedido este que fora negado, afirmando o Dr. Atis que “não se pode aceitar que diante da notoriedade da intranqüilidade causada pelos integrantes do chamado ‘MST’ que se permitisse ficarem ao lado da área de terras invadidas”, alegando, ainda que a medida é boa até mesmo para o MST, pois assim, evitar-se-iam eventos desagradáveis.
Interessante observar como o MM. Juiz tenta inverter os fatos, considerando a medida também boa para o MST, ou melhor, saber-se castrado em sua luta, é bom desde quando? Conforme afirma Foucault (2003:64), “vencer alguém é privá-lo de suas armas”. Na verdade, é exatamente isto que intentam fazer ao criminalizar o Movimento, uma vez que as ocupações nada mais são do que armas políticas utilizadas com o fim de pressionar o Governo a agir, e sem elas, significa inviabilizar a luta, vencer o Movimento, destruir as possibilidades dos oprimidos ocuparem em plenitude o espaço público a que têm direito.
Rusche & Kirchheimer (1999) afirmam que todo sistema de produção tende a descobrir punições que correspondam às suas relações de produção. A escravidão, como forma de punição, é impossível sem uma economia escravagista, a prisão com trabalho forçado é impossível sem a manufatura ou a indústria e a instituição de fiança para todas as classes da sociedade são impossíveis sem uma economia monetária. Assim, o desaparecimento de um dado sistema de produção faz com que a punição correspondente seja inaplicável, pois somente um desenvolvimento específico das forças produtivas permite a introdução ou a rejeição de penalidades correspondentes (p.19). Observam, estes autores que, com o declínio do trabalho forçado como um elemento essencial para a produção e com o desaparecimento da punição baseada em interesses fiscais, presentes no século XIX, a consciência social adquiriu um maior campo de atividade no desenvolvimento da punição.
Os fundamentos do sistema carcerário encontram-se no mercantilismo. Segundo os autores supracitados, a mais importante força responsável pela ênfase do encarceramento era o lucro, tanto no sentido restrito de fazer produtiva a própria instituição quanto no sentido amplo de tornar todo o sistema penal parte do programa mercantilista do Estado. O cárcere tomou várias formas e gradações de acordo com a gravidade do crime e a posição social do condenado.
Com o advento do Mercantilismo, o corpo humano tornou-se força produtiva. Assim, toda força que não pudesse ser utilizada como força de trabalho, era e continua sendo banida, reprimida. O aprisionamento como pena surge no início do século XIX, como instituição de fato e muda de enfoque: A prisão passa a visar mais a reforma psicológica e moral das atitudes e do comportamento dos indivíduos e menos a defesa geral da sociedade (Foucault, 2003).
“Toda a penalidade do século XIX passa a ser um controle, não tanto sobre se o que fizeram os indivíduos está em conformidade ou não com a lei, mas ao nível do que podem fazer, do que são capazes de fazer, do que estão sujeitos a fazer, do que estão na iminência de fazer” (Foucault, 2003:85)
O indivíduo passa a ser merecedor do encarceramento pela simples possibilidade do que possa vir a fazer. Para o autor das teses contidas Em a ordem do discurso (2000), a noção de periculosidade significa que o indivíduo deve ser considerado não ao nível das infrações efetivas a uma lei efetiva, mas das virtualidades de comportamento que elas representam (Idem, Ibdem,2003:85).
Para ilustrar o acima esposado, trago outra decisão de 23 de maio de 2002, proferida no processo n.º 229/2002, pelo MM. Juiz Átis, no qual Edenilton Henrique Batista, José Lauro dos Santos, Ismael Vidal, Edison Lourenço de Souza, José Guilherme dos Santos, Alcides Gonçalves e Rosalina Rodrigues de Oliveira Acorsi, todos integrantes do MST, foram denunciados pelos crimes de quadrilha, furto, dano e incêndio, tendo o técnico do Itesp (Instituto de Terras do Estado de São Paulo) noticiado no Boletim de Ocorrência que os mesmos impediram a realização de trabalhos de topografia para divisão da área em lotes, e em seguida deram início ao furto de cerca da Fazenda Guaná-Mirim (já anteriormente citada), que havia sido arrendada pelo Estado para fins de reforma agrária.
O MM. Juiz Átis, na sua decisão de decreto de prisão preventiva dos líderes do Movimento, proferida em 23 de maio de 2002 e tendo por motivação a perturbação da ordem pública na região do Pontal do Paranapanema, afirma que “os responsáveis por tais ações são as pessoas componentes da liderança do MST, dentre eles os representados. Liderança essa, que a teor dos depoimentos, não quer que outras pessoas[11] sejam assentadas na área arrecada pelo Estado, exceto àquelas vinculadas ao MST.”
Em 10 de fevereiro de 2003, as referidas prisões foram revogadas, por meio do Habeas Corpus n.º 386.660-3/9, impetrado perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, sob a alegação de a conduta de cada um dos pacientes não fora individualizada quando do decreto de prisão preventiva. O Eminente Relator, Dr. Canguçu de Almeida, identifica na decisão o forte estigma que os membros do Movimento carregam, ou seja, inerente aos discursos a tese de que bastaria participar do MST para ser criminoso e merecer a prisão, até perpétua, caso o ordenamento jurídico admitisse.
“Mas, ao assim decidir, o magistrado esqueceu-se da exigência induvidosa, que lhe era trazida pelo dever de bem fundamentar, de ressaltar de que forma, em que circunstâncias, a partir de quando e mercê de quais gestos, os pacientes, especificadamente, não o grupo, em seu todo, colocaram em risco a ordem pública, a paz social, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.”
“Aceitou a autoridade judiciária, em nome de todo o agrupamento, a responsabilidade dos acusados, admitindo que eles, tão somente por serem ‘sem-terra’ e por integrarem o movimento, estavam a aperfeiçoar as circunstâncias a que alude o art. 312 da lei penal adjetiva.”
“A todos imputou-se comportamento anárquico, sem que fosse posto em destaque, no despacho que lhes custou a prisão preventiva, o que tenham feito uns a outros. Fossem dez, quinze, vinte ou cem, os denunciados, todos acabariam presos preventivamente, desprezadas quaisquer indagações ou pesquisa a propósito do efetivo agir comprometedor da ordem pública” (Grifos meus).”
No mesmo processo, em 26 de julho de 2003, novo mandado de prisão preventiva foi expedido sob a alegação de que uma testemunha ouvida em assentada realizada no referido dia “informou que tais pessoas teriam lhe dito que caso fossem presas ainda seus familiares estariam soltos”. Com esta simples afirmação e sem qualquer prova, o MM. Juiz decreta a prisão preventiva e faz uma associação explícita do MST e o PCC[12] ao afirmar que
“é óbvio e claro a intenção (sic) de intimidar a testemunha. Até porque ainda que as altas esferas governamentais não queiram reconhecer, assim como se fazia até bem pouco tempo em relação ao denominado PCC, o conhecido MST se constitui nos dias de hoje um poder de fato nesta região do Pontal do Paranapanema”.
Em 04 de novembro de 2003, as referidas prisões foram revogadas, por meio do Habeas Corpus n.º 398.885-3/8, impetrado perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, sob a alegação de que a fase instrutória da acusação já estava concluída, não havendo possibilidade de se frustrar a instrução criminal, conforme alegação do MM. Juiz a quo.
Como afirma Boaventura (2001), na legislação da colônia, o direito do trabalho era nada mais do que uma forma privilegiada de criminalização dos povos colonizados. Assim, permanecemos, na era pós-colonial, onde aqueles que lutam pelo seu direito de trabalho e vida digna, são fortemente criminalizados e desqualificados em suas práticas.
Em outro processo (n.º 46/1997), em decisão proferida em 25 de junho de 2003, o MM. Juiz Átis decreta a prisão provisória de Marcio Barreto, membro do MST. Ao proferi-la, o Juiz, mais uma vez demonstra sua antipatia pelo Movimento, rotulando seus participantes como criminosos, como se verifica a seguir, garantindo assim, a ordem do discurso ou o discurso da ordem no sentido da manutenção do status quo vigente:
“Necessária, portanto, a custódia cautelar não só para a oitiva do sentenciado (pessoa que não tem destino certo e sempre mudando seu endereço, já que ligado ao MST), mas também para que a ordem pública não seja atacada com novos crimes”.
Interessante notar que diversos e múltiplos discursos rotulam o trabalhador rural em questão como criminoso como se pode verificar em diferentes outros processos. O primeiro item a se ressaltar é quando o Juiz afirma que o Sr. Marcio não possui destino certo, já que ligado ao MST, deixa implícita a noção subjetiva de alguém que não se fixa, que não tem paradeiro e não a noção de ausência de domicílio. Tal inversão associada ao conjunto ligado ao MST, deixa antever à população o grau de periculosidade imposto ao réu. Não obstante o mau uso terminológico da palavra, o pior veio em seguida, ao afirmar que a prisão preventiva se fazia necessária para assegurar que a sociedade estaria livre da ocorrência de novos crimes. Trata-se de segregação social límpida e cristalina, partindo-se do pressuposto de que o sr. Marcio, por integrar o MST, irá certamente cometer novos delitos, e por certo é perigoso, sendo ainda discursos que reafirmam discursos dominantes e, conseqüentemente, relacionados ao poder vigente.
No processo n.º 261/2000, José Rainha Junior, Cledson Mendes da Silva, Manoel Messias Duda, Roberto Rainha, Sergio Pantaleão, Diolinda Alves de Souza, Antonia Agostinho, André Luiz da Silva, Clécio Gomes da Silva Leal, Mauro Barbosa dos Santos, Josino Linfante Garcia, Marcio Barreto, Valmir Rodrigues Chaves, todos integrantes do MST, foram denunciados por furto qualificado.
O MM. Juiz Átis de Araújo Oliveira decretou, em 25 de outubro de 2002, a prisão preventiva de Sergio Pantaleão, Marcio Barreto e Valmir Rodrigues Chaves sob alegação de que os mesmos estavam foragidos. Sergio teve sua prisão revogada pela 15ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo por nulidade de citação. Interessante notar que o relator do Habeas Corpus n.º 430717/8, Dr. Fernando Matallo, revogou a prisão preventiva sob aspectos processuais, mas não poderia “perder a oportunidade” para fazer coro com aqueles que visam o fim da luta social, também rotulando o Movimento com palavras discriminatórias ao afirmar que
“os antecedentes indicados às fls. 430/455 demonstram que os pacientes fazem da prática delituosa, em especial àquelas contra o patrimônio alheio, um meio de vida, o que deve ser obstado com a segregação social, tudo a garantir a ordem e paz públicas, constantemente ameaçadas”.
Após a liberação, no dia 18 de fevereiro de 2003, mais uma vez o MM. Juiz a quo tentou efetuar a prisão preventiva de Sergio, alegando para tanto que o mesmo havia induzido o Tribunal a erro, afirmando que o acampamento em que o mesmo havia declarado que estaria, segundo o Oficial de Justiça, já havia sido desmanchado. Em novo Habeas Corpus, julgado em 01 de abril do mesmo ano, o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, novamente revogou a prisão, afirmando que o acampamento só havia se desfeito após a prolação do Acórdão anterior e, mesmo que tivesse sido antes, “num universo pequeno como Teodoro Sampaio não seria difícil ao Sr. Oficial saber para onde se mudara o acampamento.”
Entretanto, para a honra da justiça, vozes dissonantes se fazem ouvir. Deste modo, os outros dois membros do MST acusados no mesmo processo, Marcio e Valmir, tiveram suas prisões revogadas por meio do Habeas Corpus n.º 27856-SP (2003/0054532-1), em 10/06/2003, pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, sob alegação de que evasão e presunção de que os pacientes voltariam a delinqüir, mesmo sem evidência, não são motivos para a decretação da prisão preventiva, tanto que o E. Relator afirma, ao conceder a revogação da prisão preventiva, que:
“Registre-se, diversamente do afirmado no acórdão hostilizado, que os pacientes são obreiros rurais integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que lutam e sacrificam-se por mais razoável meio de vida, onde a dignidade social somente pode ser restaurada no momento em que se fizer a verdadeira, necessária e indispensável reforma agrária no País. Enquanto campear a incerteza de seus resultados e for incerta a atuação política, encontrar-se-á a revolta justa e a insatisfação crescente dos menos favorecidos nos contextos econômico, social e político do Brasil.”
Como se observa das decisões trazidas, o encarceramento realmente se dá em razão de quem é o indivíduo, de sua classe, do grupo ao qual pertence, sendo assim determinada a capacidade e a probabilidade de cometimento de crimes.
Somente no ano de 2002, o MM. Juiz Átis de Araújo Oliveira decretou 18 prisões preventivas contra integrantes do MST, cabendo ressaltar que todas foram cassadas pelos Tribunais, visto não apresentarem os requisitos legais que dessem azo ao encarceramento. O mesmo se pode averiguar da colação de julgados aqui trazida. Nítida é a tentativa de criminalizar e de enclausurar os membros do MST, tentando, principalmente, atingir seus líderes, para assim enfraquecer não só o Movimento, mas desqualificar a luta pela reforma agrária como um todo e, porque não afirmar, desmobilizar outros movimentos sociais que se colocam contra-hegemônicos.
Importante afirmar que, como diria Santos, temos que reinventar a emancipação social, utilizando o direito como um dos instrumentos para tal, e, assim, o Judiciário é engrenagem importante, lembrando, neste sentido, que a emancipação visa mudar as regras do jogo, “sacudir” os sistema imposto e torná-lo mais inclusivo.
2. Por um Poder Judiciário emancipatório.
Há vozes dentro do Judiciário destoantes dos discursos dos grandes proprietários de terras, não significando em acatamento de tudo que o Movimento diz e pensa, mas sim uma disposição democrática de permitir que esta voz seja reconhecida legitimamente, ou seja, que se desfaçam os preconceitos e os sectarismos contra o movimento social e popular (Garcia, 2000:87). Neste sentido, vale a pena trazer trecho da ementa do acórdão proferido pelo Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, da 6ª Turma do STJ (HC n.º 5574/SP – 97.0010236-0):
“Movimento popular visando implantar a reforma agrária não caracteriza crime contra o Patrimônio. Configura direito coletivo, expressão da cidadania, visando implantar programa constante da Constituição da República. A pressão popular é própria do Estado de Direito Democrático. (…)
A Constituição da República dedica o Capítulo III do Título VII à Política Agrícola e Fundiária e à Reforma Agrária. Configura, portanto, obrigação do Estado. Correspondentemente, direito público, subjetivo de exigência de sua concretização.
No amplo arco dos Direitos de Cidadania, situa-se o direito de reivindicar a realização dos princípios e normas constitucionais.
A Carta política não é mero conjunto de intenções. De um lado, expressa o perfil político da sociedade e, de outro, gera direitos.
É, pois, direito reclamar a implantação da reforma agrária. Legítima a pressão aos órgãos competentes para que aconteça, manifeste-se historicamente.
Reivindicar por reivindicar, insista-se, é direito. O Estado não pode impedi-lo. O modus faciendi, sem dúvida, também é relevante. Urge, contudo, não olvidar o princípio da proporcionalidade – tão ao gosto dos doutrinadores alemães.
A postulação da reforma agrária, manifestei em Habeas Corpus anterior, não pode ser confundida, identificada com esbulho possessório, ou a alteração de limites. Não se volta para usurpar a propriedade alheia. A finalidade é outra. Ajusta-se ao Direito. Sabido, dispensa prova, por notório, que o Estado, há anos, vem remetendo a implantação da reforma agrária.
Os conflitos resultantes, evidente, precisam ser dimensionados na devida expressão. Insista-se. Não se está diante de crimes contra o Patrimônio. Indispensável a sensibilidade do magistrado para não colocar, no mesmo diapasão, situações jurídicas distintas. (…)
Tenho o entendimento, e este Tribunal já o proclamou, não é de confundir-se ataque ao direito de patrimônio com o direito de reclamar a eficácia e efetivação de direitos, cujo programa está colocado na Constituição. Isso não é crime; é expressão do direito de cidadania”.
Compreendo como Gramsci (1988) que hegemonia é o poder espiritual da classe dominante e que esta é hegemônica não só porque detém os meios de produção e o poder do Estado (controle político, jurídico e policial), mas, principalmente, porque suas idéias e valores são dominantes[13], é que entendo que o processo de globalização no qual vivemos deve ser entendido não somente em seu aspecto econômico, mas também, político, social e cultural. Assim, entenderemos os motivos pelos quais os explorados e dominados sentirem-se no justo e legítimo direito de recusar a dominação e a exploração evidenciada sob formas variadas de violência, revoltando-se e alinhando-se junto a outros que padecem dos mesmos mecanismos impostos de manutenção do status quo.
A partir dos anos 90, a luta foi judicializada e o Judiciário passou a servir aos propósitos dos grandes interesses econômicos, sendo mesmo utilizado de forma conservadora e hegemônica, criminalizando os movimentos sociais. O MST não ficou longe deste processo. Entretanto, logo se verificou que o melhor caminho era a utilização da mesma arma e contra-atacar com instrumentos garantidos pelo próprio sistema judicial. É o uso contra-hegemônico do Judiciário.
Santos (2006:372) conceitua globalização contra-hegemônica como sendo “o conjunto vasto de redes, iniciativas, organizações e movimentos que lutam contra as consequências econômicas, sociais, políticas e culturais da glogalização hegemônica e que se opõem às concepções de desenvolvimento mundial a estas subjacentes, ao mesmo tempo que propõem concepções alternativas”. É a luta contra-hegemônica, contra a exclusão social, que implica, segundo Santos (2006), em uma ampla “redistribuição de recursos materiais, sociais, políticos, culturais e simbólicos”. Neste sentido, afirma ainda, com magestria, que a legalidade cosmopolita é de suma importância para a globalização contra-hegemônica, sendo mesmo essencial à emancipação social.
A outra face do Judiciário é contra-hegemônica, tomada de assalto por aqueles que nunca tiveram suas vozes ecoadas dentro do sistema e que se valem agora dos próprios instrumentos constitucionalmente garantidos para valerem seus direitos. Tenho dúvida se o MST quer se ver incluído no contrato social estabelecido ou se busca outro. Se quer se ver incluído, em que medida é realmente contra-hegemônico? Não seria então luta pela inclusão na hegemonia reinante? Mas eles lutam pela transformação de paradigma social… é nesta medida que são contra-hegemônicos e passaram a perceber que o direito, apesar de historicamente respaldar os interesses dominantes, podia ser utilizado também para se emancipar… é o caso da advocacia popular que se utiliza do todos os recursos e instrumentos assegurados pela Constituição Federal.
A tragédia fundiária brasileira é reduzida à dogmática do esbulho possessório, mas alguns acórdãos vão na contra-mão da linha dominante. Assim, transcrevo pequeno trecho da decisão liminar, de 17/09/1998, do Desembargador de plantão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Rui Portanova no Agravo De Instrumento (AI n.º598.360.402) intentado por José Cenci e outros contra a ordem de expedição de mandado de reintegração de posse (processo n.º 25782, oriundo da 2ª Vara Cível da Comarca de São Luiz Gonzaga) a favor da empresa Merlin S/A Indústria e Comércio de Óleos Vegetais. Neste Acórdão, o E. Desembargador afirma que “não compete ao Poder Judiciário encontrar soluções para o assentamento e fixação de famílias pobres e miseráveis, cuja atribuição é em tudo debitável ao Poder Executivo”. Destaca, ainda, que o próprio Judiciário acredita nas promessas vindas do Executivo, no sentido de que vão fazer reforma agrária e acabar com a violência no campo (RENAP, 2001:17).
“(…) Como disse acima, o Poder Judiciário, assim como o povo em sua maioria tem acreditado nas promessas de melhora nas condições de vida dos pobres. Mas o que se vê é que os que governam o Estado e o País beneficiam mais os ricos do que os pobres. Para os ricos, as soluções são rápidas e os gastos vultuosos em nome de uma modernidade que nunca chega.”
“Contra os pobres, os governantes são violentos. O Governo federal, ou difama os sem-terra, acusando-os de plantar maconha, ou ofende nossos pais, chamando-os todos de vagabundos. O Governante do Estado não é menos violento com os pobres. Aqui, a reforma agrária não é questão de política, é questão de polícia. Por isso, é rápido em providenciar verdadeiras operações de guerra, para atender a decisão do juiz. Tanto quanto parece, nosso governo estadual e nacional, não gostam dos pobres. Para este julgador, nas condições atuais, a paz no campo só virá com uma verdadeira reforma agrária.”
Entretanto, como demonstrado na seção anterior, por meio das decisões trazidas, ainda não são todos os magistrados que possuem esta visão mais ampla do sistema que compõe o nosso ordenamento jurídico e, até por questões políticas e ideológicas, ainda criminalizam o Movimento, com o fim de desqualificar a própria luta. Na crise da tensão entre regulação e emancipação, os Tribunais[14] aparecem mais e tem mais visibilidade e onde são mais recrutados é justamente na área criminal, sendo a estigmatização uma forte aliada neste processo.
Em Habeas Corpus n.º 33.204 – PR (2004/0007030-0), cujo relator foi o E. Ministro do STJ, Dr. Paulo Gallotti, impetrado em favor de Elemar do Nascimento Cezimbra, Francisco de Assis Moretti e Pedro Bernardo dos Santos, todos líderes do MST, presos preventivamente, em 27 de Agosto de 2003, sob acusação de ilícitos penais em continuação, em Laranjeiras do Sul, Paraná. Assim, o E. Ministro relator, afirma que
“Muito embora haja afirmações nos autos de que o grupo teria planejado previamente a retirada dos grãos, o que poderia, em tese, configurar a formação de quadrilha se houvesse indícios suficientes de autoria e materialidade, a denúncia está assentada apenas na própria existência do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.”
“O vocábulo “quadrilha”, em um dos seus conceitos, segundo Aurélio, configura um bando de ladrões, assaltantes ou malfeitores.”
“O MST tem por vezes, o que é público e notório, praticado atos com os quais a maioria da sociedade não concorda, mas não se pode dizer que seus integrantes constituem um bando de malfeitores, de bandidos e de assaltantes. Num país marcado por uma estrutura agrária sabidamente injusta, com distorções sociais inaceitáveis, a meu ver, e respeitando profundamente quem não concorde com essa compreensão, não há como deixar de reconhecer a legitimidade da organização social de trabalhadores rurais na busca da obtenção de um pedaço de chão para plantar, para viver, para dar um mínimo de dignidade às suas famílias. (grifos meus).”
As mudanças na lei que impliquem em redução da exclusão social pode derivar de várias fontes, incluindo a esfera legislativa e executiva, para além de um forte protagonismo judicial. O MST aparece no Judiciário como réu, em regra, e para a defesa de seus membros, recrutou renomados advogados para lutarem no braço da justiça; é o uso contra-hegemônico da lei e dos direitos, tornando-se a ponte entre os dois mundos com lógicas tão distintas, como os movimentos sociais e a Judiciário[15].
Percebeu-se que era importante ingressar com força na esfera judiciária e fazer dela uma aliada. Segundo Madalena Duarte, “ao lutar na arena jurídica, os movimentos sociais não só tornam visível a sua identidade de sujeito colectivo, capaz de criar direitos, como, reivindicando, depois, a concretização e a protecção judicial dos mesmos, contribuem para implementar novas práticas sociais e políticas e garantem às minorias que defendem um mínimo de inclusão na sociedade”. (2004:09)
Tratando da região de São Paulo, especificamente da região do Pontal, sob análise, pode-se afirmar que o juízo monocrático é extremamente conservador. Entretanto, nota-se que os juízes de grau de recurso estão mais comprometidos com uma visão constitucionalista da lei e mais atentos às questões dos direitos humanos. Em 13 de maio de 1991, criou-se a Associação de Juízes para a Democracia, em São Paulo (atualmente em âmbito nacional), com a vontade de reunir magistrados comprometidos com o resgate da imagem do juiz, “por meio de uma participação transformadora da sociedade, num sentido promocional dos direitos fundamentais[16]”.
Contou-se, ainda, com a participação, nesta nova mentalidade do Judiciário, mais voltada às questões sociais, a partir de 1992, com o IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), e, em 1996, com a criação da RENAP (Rede De Advogados e Advogadas Populares), estando esta intimamente ligada ao MST (entre outras formas de manifestações e movimentos populares). Conta-se, ainda, com a Rede Social De Justiça E Direitos Humanos, que compreende uma rede de juristas que procuram buscar resultados práticos contra as denúncias de violações de direitos humanos ocorridas no Brasil[17]. Tudo isso corresponde a um dos fortes elos de ligação entre o Movimento e o Judiciário.
Dentro da idéia da globalização hegemônica e neoliberal, devemos ver agora a idéia de direito na sua relação com a emancipação, também, em um nível global. Na esteira do pensamento de Boaventura, da mesma forma que a globalização neoliberal acirrou a dominação e a exclusão, por outro lado engendrou condições para os diversos movimentos contra-hegemônicos, de todo mundo, se unissem em projetos emancipatórios. Enfim, o direito como instrumento contra-hegemônico, a fim de politizar as questões sociais visando mesmo a transformação.
Assim, a globalização por baixo, deve colocar em prática a política e legalidade cosmopolita subalterna, que inclui duas áreas vitais, nomeadamente a política e o direito, inserindo-se dois processos de essencial importância, quais sejam , “a acção colectiva global, que opera através da articulação de redes transnacionais de ligações locais/nacionais/globais; e as lutas locais ou regionais/nacionais, cujo êxito induz a reprodução noutros lugares ou o funcionamento em rede com lutas paralelas em curso noutras paragens” (Santos, 2006: 372). É neste contexto que o MST se insere, com sua estratégia de luta pela emancipação social[18].
Bastante ilustrativo de que o direito pode ser usado de modo contra-hegemônico, desde que tenha atores envolvidos e atentos e, portanto, com uma nova mentalidade, transcrevo, na íntegra, por demonstrar todo o exposto, o voto do E. Ministro do STJ, Dr. Paulo Medina, no supra mencionado Habeas Corpus n.º 33.204 – PR (2004/0007030-0), ao se referir ao advogado de defesa dos líderes do MST, Dr. Elmano de Freitas da Costa.
“Sr. Presidente, hoje, encontrei-me, no meu amanhecer, relendo a luta pelo Direito, e, em certa passagem, havia um acusado em que o seu defensor, voltando às autoridades, estava a bradar: “Eu exijo a lei”.
Nobre Advogado, tenho observado a sua luta no parlamento da Advocacia em defesa de causas legítimas, sociais e econômicas. E V. Exa. vem hoje, bradando contra a preventiva, exigindo o cumprimento da lei.
Isso é muito saudável, quando em um País tão banalizado por desinteresses à ordem jurídica, surge o advogado – já nos falava Henry Rompert – com essa força, com essa pujança, para pronunciar-se na defesa de seus constituintes: “Eu exijo a lei”. Exigir a lei, hoje, é a razão de ser da formação da consciência de cada um de nós. Disse o Ministro Paulo Gallotti “respeitemos a lei”.
Penso que não se cumpre a lei quando se acusa a esmo, como aqui se fez; penso que não se cumpre a lei quando se permite acusar e, mais grave, permite-se receber a acusação quanto ao respaldo da lei, sem o mínimo probatório. Sem o convencimento do que será, afinal, não se pode permitir a instauração de uma ação penal da perseguição penal pública ou privada, porque senão não, e, por isso, V. Exa. tem que dizê-lo, repetindo sempre: “Eu exijo a lei”.
Mas nós vamos mais além: exigimos a lei, mas temos a esperança de que a sociedade brasileira compreenda a legitimidade dos movimentos envolvendo os trabalhadores sem terra e exija a transformação social do campo, exija as conquistas sociais e exija a ruptura da desigualdade econômica. Vai além da lei, vai à legitimidade da consciência de cada um no dever que nos impõe de voltarmos aos interesses maiores do povo do nosso País.
Não somente V. Exa., no Parlamento, não somente os que estão no Governo e os que fazem oposição ao Governo, mas, nós, também, integrantes do Poder Judiciário, que somos apolíticos, mas não somos alheios à sociedade, não somos fechados às opiniões sociais, não somos silentes à brutalidade que esmaga aqueles que querem ascender para a sua dignidade pessoal.
Então, nós, que já tivemos a recompensa de decidirmos mais de uma vez em favor do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, hoje, estamos mais recompensados quando o Ministro Paulo Gallotti recorda – não o disse diretamente – quando, na bravura da sua mocidade, engajava em movimentos que refletem a sua formação haurida das lições de seu pai.
Então, V. Exª., vindo a esta Casa – e venha tantas vezes quando o quiser e se fizer necessário, espero que nem tantas isso se faça necessário -, pode estar certo que, nesta Corte, encontrará homens da lei, homens do Direito, homens da Justiça, que, sem parcialidade, lhe reconhece e se submetem às suas exigências: “Eu exijo a lei”.
Se assim o é, e nada mais tendo a acrescer ao voto do Sr. Ministro Paulo Gallotti, senão de solidarizar-me às suas palavras, S. Exa., que já me proporcionou tantas lições e que, nas suas pegadas, caminhei pelas políticas sociativas do meu País, quero dizer, com muito orgulho, que, hoje, renovando esse nosso encontro de idéias, de ideais e de responsabilidade social, podemos conceder, por nossa consciência, o habeas corpus em favor do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, porque assim exige a lei.”
IV – Considerações longe de serem finais
Historicamente, o campo sempre foi área de grande interesse econômico e político, onde a desigualdade, em todo o tempo, se fez presente e com ela a violência institucional e estrutural, por parte daqueles que intencionam manter seu poder. No Brasil, as sesmarias deram início à caótica estrutura agrária, com a bipolaridade marcada entre os latifúndios e aqueles que são alijados do acesso à terra. Hoje, o cenário não se faz diferente.
Como toda ação provoca uma reação, após a ditadura militar, os trabalhadores rurais viram a necessidade de sua organização para pleitear o acesso e permanência na terra. Tal mobilização teve forte contra-reação, culminando, a partir dos anos 90 do século passado, com um novo paradigma de opressão contra os trabalhadores rurais sem-terra: a criminalização dos membros dos movimentos sociais. Passou-se a utilizar a mão repressora do Judiciário para tal intento e o caráter marcadamente conservadorista deste órgão serviu bem a seu propósito.
Antes, a polícia agia a serviço de um sistema produtivo que necessitava de mão-de-obra abundante e dócil. A sociedade européia proletarizou os camponeses e impôs, na cidade, a disciplina da falta de trabalho. Hoje, quem dita as regras são os mercados financeiros, que dirigem o mundo e somente produzem especulação. Os problemas sociais foram reduzidos a problemas policiais, e como os membros do MST, em especial, passaram a ser tratados como criminosos, a opinião pública também se esquivou de apoiá-los, havendo um clamor social por penas cada vez mais duras, como acontece tradicionalmente.
A prisão foi a solução encontrada pelo grupo dominante para manter sua hegemonia e retirar o apoio da população ao Movimento, pois nenhum “cidadão de bem” irá se aliar à “bandidagem”, palavra frequentemente associada aos discursos desqualificadores. O confinamento é, antes de tudo, um modo de utilizar ou neutralizar uma parcela considerável da população que não é necessária à produção e para a qual não há trabalho a integrar e, igualmente, “não há” terra para todos, principalmente enquanto a maior parcela das áreas rurais estiverem nas mãos de grandes empresas transnacionais para a prática do agronegócio.
A globalização jurídica neoliberal em curso traz em si uma concepção despolitizada da mudança social cujo único critério é o Estado de Direito e a adjudicação judicial a um sistema judicial honesto, independente e eficaz (Santos, 2003: 10), na medida em que o direito conservador neoliberal pretende baixar os custos das transações, definir com clareza e defender os direitos de propriedade, fazer aplicar as obrigações contratuais e instituir um quadro jurídico minimalista (p. 11). Outro ponto que entendo seja uma exigência deste direito é o acirramento do controle penal, pois é através da criminalização que o poder dominante consegue, além de deslegitimar aqueles que não interessam ou são contrários aos seus propósitos, eliminar, pela segregação, esses mesmos desvalidos.
As ocupações coletivas são fortes instrumentos de luta e de mobilização que o Movimento se utiliza com vistas a chamar atenção para o problema no campo, para a implementação da necessária reforma agrária. As sentenças proferidas pelo Juiz Átis aqui trazidas demonstram como o juiz de primeira instância está mais suscetível às influências locais e, pelo seu conservadorismo nato, bem responde aos anseios dominantes e hegemônicos, para perpetuação da (des)ordem rural, punindo e expedindo ordens de prisões aos líderes do MST, sem mesmo dar atenção à questões processuais básicas, pois a única intenção é o encarceramento pelo simples fato de pertencerem ao Movimento. É a punição pelo que são e não pelo que fizeram, além de lutarem pelos seus ideiais de liberdade e cidadania, pelas suas famílias, pelas suas vidas.
A classe dominante, para manter o status quo, sempre necessitou de um direito que legitimasse e a garantisse. Assim, todo o sistema jurídico e seu aparato material e instrumental, serviu a este intento. Neste sentido sempre correu o uso hegemônico do direito. Na referida dupla face do Judiciário, indicado já desde o título do presente Ensaio, esta pertence ao grupo hegemônico e dominante, conservador e positivista. A área dos grandes interesses econômicos e transnacionais.
Para se romper com este paradigma, deve-se apostar em uma justiça transformadora, opositiva e contra-hegemônica, indo em busca da necessária legalidade cosmopolita subalterna, restaurando, diminuindo, ainda como afirma Santos (2003), a distância entre as expectativas e experiências sociais, com atenção voltada à intensa politização do direito. Essa é a outra face do sistema judicial, com a qual os movimentos sociais tomam a frente.
A mesma arma utilizada para desmobilizar o Movimento, que é a Justiça, acaba por servir ao próprio Movimento, tendo em vista as jurisprudências positivas em favor dos trabalhadores rurais. A mesma mão que criminaliza, emancipa por outro, bastando para isso, analisar a questão não como caso de polícia, como se observa facilmente nas decisões de primeira instância, mas sim como caso de política, refletidas nos acórdãos colecionados aqui.
Decisões como estas mencionadas na última seção do presente Ensaio nos dão esperança de que, no futuro, operadores do direito consigam enxergar a diferenciação entre condutas realmente lesivas ao patrimônio de outrem e atos de cunho eminentemente políticos, com o fim de pressionar o poder público à realização, no caso, da tão almejada reforma agrária e seus consectários, um dos objetos de luta do MST.
Conforme se pode observar com as breves transcrições das decisões aqui colacionadas, o Poder Judiciário brasileiro ainda se mantém tradicionalmente conservador, como se reflete nas decisões de primeira instância. Entretanto, o Judiciário precisa mesmo se reformar e se redirecionar, assumindo o que se poderia chamar de responsabilidade social do Judiciário, buscando uma nova versão, uma nova roupagem e caminhar na direção de uma justiça mais voltada para as questões sociais de extrema relevância, sendo mais redistributiva.
Enquanto estudante de direito, candidatei-me à monitoria do escritório modelo de minha universidade, na ocasião, para a área trabalhista. Inquirida pela banca, um dos professores, em razão de minhas respostas, disse-me, muito contrariado: “o que você quer é a revolução por meio do direito?”. Naquele momento, percebi que não iria ser monitora, pois ou aquele professor desacreditava no Direito e no seu potencial contra-hegemônico ou então o mesmo nunca aceitou esta face do Judiciário. Entretanto, como toda crise engendra mudanças e todo lado tem seu oposto, devemos sim buscar uma justiça social, uma justiça que entenda e atenda às questões que mais importam à sociedade como um todo. A responsabilidade social do Judiciário, apropriando-me de terminologia das próprias empresas, deverá se fazer presente neste contexto revolucionário, propugnando a favor dos direitos humanos dos cidadãos.
Como já mencionado, os advogados sociais, ou populares, são a ponte, o elo de ligação entre os movimentos sociais e o Poder Judiciário. Cada vez mais esses obreiros jurídicos se especializam e lutam lado-a-lado com aqueles que sofrem diretamente a exclusão e não tem mais a quem recorrer. Entretanto, nas questões agrárias, ainda se socorrem do Judiciário sempre na condição de defesa. Creio seja importante mudar de pólo, no sentido de se buscar uma condição ativa na implementação das ações, criminais, cíveis e administrativas, para assim se poder melhor utlizar o potencial emancipatório inserido deste Órgão.
O Poder Judiciário está, diante da dupla face aqui trazida, dividido, fraturado entre seu conteúdo conservador e seu potencial contra-hegemônico. Ruptura e contradição esta marcada pelo próprio mecanismo de dualidade, de posição e de oposição, de ponto e contra-ponto. Entretanto, este quadro encoraja mais ao grandes proprietários de terra, que somente ganham com o conflito interno do sistema judicial. Por isso a luta dentro do Judiciário é importante. Como já afirmamos, necessário até se pensar mudar de lado no polo passivo das ações e ingressar com demandas que favoreçam àqueles que lutam pelo acesso e permanência na terra.
Assim, só podemos pensar em uma justiça livre desta “dupla personalidade” e cumpridora de sua responsabilidade social, se também tivermos operadores do direito repaginados, mais atentos às questões sociais, mais sensíveis, e esta mudança de mentalidade, como se diz, começa em casa, começa na faculdade, formando profissionais, de modo contínuo, que buscarão a igualdade, reconhecendo e respeitando as diferenças.
Informações Sobre o Autor
Cristiane de Souza Reis
advogada, Mestre em Ciências Criminais pela Universidade Cândido Mendes (Rio de Janeiro/Brasil) e Doutora em “Direito, Justiça e Cidadania” pela Universidade de Coimbra (FEUC/FDUC- Portugal) . Foi professora de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Cândido Mendes e foi assessora da presidência da Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro. É, ainda, Membro do Instituto Jurídico Interdisciplinar da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (IJI/FDUP)