Poder de polícia

1.Autoridade x liberdade

Praticamente todo o Direito Administrativo trata de temas em que se colocam em tensão dois aspectos opostos: a liberdade individual e a autoridade da Administração Pública.


 Quando se trata de “poder de polícia”, de forma bem clara se colocam em confronto esses dois aspectos: de um lado, o cidadão que quer exercer plenamente seus direitos; de outro, a Administração Pública, que tem por incumbência condicionar o exercício daqueles direitos ao bem-estar coletivo, e ela faz isso usando seu poder de polícia.


2.Direitos individuais e limites


Os direitos individuais sofrem limitações e não há incompatibilidade entre os direitos individuais e os limites a eles impostos pelo poder de polícia do Estado. Guido Zanobini afirma que “a idéia de limite surge do próprio conceito de direito subjetivo; tudo aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado”


As limitações simplesmente integram o desenho do próprio perfil do direito e são a fisionomia normativa dele.


3.Fundamento


O fundamento do poder de polícia é o princípio da supremacia do interesse coletivo sobre o privado. Através dele, limitam-se os direitos individuais das pessoas em benefício do interesse coletivo. O exercício e o uso da liberdade e da propriedade devem estar entrosados com a utilidade coletiva.


4.Objeto


O poder de polícia é exercido pela Administração Pública sobre direitos, bens e atividades que afetem ou possam afetar a coletividade. Assim, o objeto do poder de polícia administração é todo direito, bem ou atividade individual que possa afetar a coletividade. Como podem afetar a coletividade, tais direitos, bens ou atividades exigem regulamentação, contenção e controle pelo Poder Público.


5.Conceito


Para Maria Silvia Zanella Di Pietreo o poder de polícia é “a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público.”


Em essência, o poder de polícia é a atividade da Administração Pública que impõe limites ao exercício de direitos e liberdades, em prol do interesse coletivo. É o mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual. Por ele o Estado detém a atividade dos particulares que se revelar contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social. Esse poder se reparte entre todas as esferas administrativas da União, dos Estados e dos Municípios.


O Código Tributário Nacional, no art. 78, traz o conceito legal do poder de polícia:


“Considera-se poder de polícia atividade administrativa pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.


6.Poder Legislativo e Executivo


O poder de polícia reparte-se entre o Poder Legislativo e o Executivo. As limitações ao exercício de direitos individuais são previstas em lei.


O Poder Legislativo cria, por lei, as chamadas limitações administrativas.A Administração Pública regulamenta as leis e controla sua aplicação preventivamente (através de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou repressivamente (através da imposição de medidas coercitivas – multas, embargos).


O Poder Público, assim, compreende tanto as leis que delineiam o âmbito da liberdade e da propriedade, quanto os atos administrativos que lhes dão execução.


7.Meios de atuação


O Poder Público se manifesta tanto através de atos normativos de alcance geral quanto de atos concretos e específicos.


Considerado o poder de polícia em sentido amplo (abrangendo as atividades do Legislativo e do Executivo), os meios de que se utiliza o Estado para seu exercício são:


1. atos normativos em geral:


– Leis:


Pela lei criam-se as limitações administrativas ao exercício dos direitos e das atividades individuais, estabelecendo-se normas gerais e abstratas dirigidas indistintamente às pessoas que estejam em idêntica situação;


– Atos normativos da Administração Pública:


Disciplinando a aplicação da lei, o Executivo pode baixar decretos, resoluções, portarias, instruções.


2. Atos administrativos e operações materiais de aplicação da lei ao caso concreto, compreendendo:


– Medidas preventivas com o objetivo de adequar o comportamento individual à lei (fiscalização, vistoria, notificação, autorização, licença);


– Medidas repressivas com a finalidade de coagir o infrator a cumprir a lei (interdição de atividade, apreensão de mercadorias deterioradas).


8.Polícia administrativa e Polícia judiciária


 O poder de polícia que o Estado exerce pode incidir tando na área administrativa quanto na área judiciária.


A doutrina costuma apontar como diferença o fato da polícia administrativa ter caráter preventivo, pois tem por objeto impedir ações anti-sociais, e a polícia judiciária ter caráter repressivo, pois tem por objeto punir os infratores da lei penal.


Afirma-se que a diferença não é absoluta, pois a polícia administrativa tanto pode agir preventivamente, como pode agir repressivamente.


Diz-se também que a polícia judiciária, embora seja repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral, porque, punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma infração.


9.Discricionariedade e Vinculação


O Poder de Polícia será discricionário quando a lei deixa ao administrador certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos.Nesses casos, a Administração Pública terá que decidir qual o melhor momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas na norma legal.


Na escolha pela Administração Pública da oportunidade e conveniência de exercer o poder de polícia, e na graduação das sanções aplicáveis aos infratores é que reside a discricionariedade do poder de polícia.


Entretanto, será vinculado quando a lei estabelece que, diante de determinados requisitos, a Administração Pública terá de adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer possibilidade de opção.


10.Coercibilidade

As medidas de polícia adotadas pela Administração Pública se impõem de forma coativa. Todo ato de polícia é imperativo (obrigatório para seu destinatário).


Não há ato de polícia facultativo para o particular, pois todos eles admitem coerção estatal para torná-los efetivos. A coerção é indissociável da auto-executoriedade.O ato de polícia só é auto-executório porque dotado de força coercitiva.


11.Auto-executoriedade

É o poder da Administração Pública decidir e executar diretamente sua decisão, por seus próprios meios, sem precisar recorrer previamente ao Judiciário.


A auto-executoriedade não existe em todas as medidas de polícia e para que a Administração Pública possa usá-la, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público.


12.Limites

Como todo ato administrativo, a medida de polícia, mesmo que seja discricionária, sempre esbarra em limitações impostas pela lei, quando à competência e à forma, aos fins e ao objeto.


12.1 Competência e forma


Devem se observar às normas legais pertinentes à competência (o agente deve ser competente, ter competência legal para a prática do ato) e à forma (o revestimento exterior do ato, o modo pelo qual ele aparece, deve ser o previsto em lei).


12.2 Fins


O poder de polícia só deve ser exercido para atender ao interesse coletivo e se seu fundamento é o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, o exercício desse poder perderá sua justificativa quando utilizado para beneficiar ou prejudicar pessoas determinadas. A autoridade que se afasta da finalidade pública incidirá em desvio de poder e acarretará a nulidade do ato com conseqüências nas esferas civil, penal e administrativa.


12.3 Objeto


Quanto ao objeto, ou seja, o conteúdo, a autoridade sofre limitações, mesmo quando a lei lhe dê várias alternativas possíveis. Aplica-se aqui o princípio da proporcionalidade entre meios e fins, ou seja, o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger.Sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem-estar social.


13.Poder de polícia – delegação


A regra é da indelegabilidade da atribuição de polícia administrativa. Admite-se delegação, desde que outorgada a uma pessoa governamental e por meio de lei.


Para particulares, a delegação só pode acontecer em casos muito específicos, isto porque estar-se-ia outorgando a particulares cometimentos tipicamente públicos ligados à liberdade e à propriedade.


 


Bibliografia

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 6.ed. São Paulo: Atlas, 1999.

DI PIETRO. Direito administrativo.

MEDAUAR, Odete. “Poder de Polícia”. In: Revista de Direito Administrativo, n° 199. Rio de Janeiro: Renovar, jan/mar. 1995. p. 89:96.

MAYER, Otto. Derecho Administrativo Alemán, t. II. Buenos Aires: De Palma. 1951, p. 5.

BANDEIRA DE MELLO, Celso A. Curso de direito administrativo. 11a ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 559.

CAIO TÁCITO. Direito Administrativo, 1975. Apud: MOREIRA NETO, Curso… op. cit., 307.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. “Serviço público e poder de polícia: concessão e delegação. In: Revista Trimestral de Direito Público, v. 20. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 25.


Informações Sobre o Autor

Arion Alvaro Pataki


logo Âmbito Jurídico

Poder de polícia

1.Autoridade x liberdade

Praticamente todo o Direito Administrativo trata de temas em que se colocam em tensão dois aspectos opostos: a liberdade individual e a autoridade da Administração Pública.


 Quando se trata de “poder de polícia”, de forma bem clara se colocam em confronto esses dois aspectos: de um lado, o cidadão que quer exercer plenamente seus direitos; de outro, a Administração Pública, que tem por incumbência condicionar o exercício daqueles direitos ao bem-estar coletivo, e ela faz isso usando seu poder de polícia.


2.Direitos individuais e limites


Os direitos individuais sofrem limitações e não há incompatibilidade entre os direitos individuais e os limites a eles impostos pelo poder de polícia do Estado. Guido Zanobini afirma que “a idéia de limite surge do próprio conceito de direito subjetivo; tudo aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado”


As limitações simplesmente integram o desenho do próprio perfil do direito e são a fisionomia normativa dele.


3.Fundamento


O fundamento do poder de polícia é o princípio da supremacia do interesse coletivo sobre o privado. Através dele, limitam-se os direitos individuais das pessoas em benefício do interesse coletivo. O exercício e o uso da liberdade e da propriedade devem estar entrosados com a utilidade coletiva.


4.Objeto


O poder de polícia é exercido pela Administração Pública sobre direitos, bens e atividades que afetem ou possam afetar a coletividade. Assim, o objeto do poder de polícia administração é todo direito, bem ou atividade individual que possa afetar a coletividade. Como podem afetar a coletividade, tais direitos, bens ou atividades exigem regulamentação, contenção e controle pelo Poder Público.


5.Conceito


Para Maria Silvia Zanella Di Pietreo o poder de polícia é “a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público.”


Em essência, o poder de polícia é a atividade da Administração Pública que impõe limites ao exercício de direitos e liberdades, em prol do interesse coletivo. É o mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual. Por ele o Estado detém a atividade dos particulares que se revelar contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social. Esse poder se reparte entre todas as esferas administrativas da União, dos Estados e dos Municípios.


O Código Tributário Nacional, no art. 78, traz o conceito legal do poder de polícia:


“Considera-se poder de polícia atividade administrativa pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.


6.Poder Legislativo e Executivo


O poder de polícia reparte-se entre o Poder Legislativo e o Executivo. As limitações ao exercício de direitos individuais são previstas em lei.


O Poder Legislativo cria, por lei, as chamadas limitações administrativas.A Administração Pública regulamenta as leis e controla sua aplicação preventivamente (através de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou repressivamente (através da imposição de medidas coercitivas – multas, embargos).


O Poder Público, assim, compreende tanto as leis que delineiam o âmbito da liberdade e da propriedade, quanto os atos administrativos que lhes dão execução.


7.Meios de atuação


O Poder Público se manifesta tanto através de atos normativos de alcance geral quanto de atos concretos e específicos.


Considerado o poder de polícia em sentido amplo (abrangendo as atividades do Legislativo e do Executivo), os meios de que se utiliza o Estado para seu exercício são:


1.atos normativos em geral:


Leis:


Pela lei criam-se as limitações administrativas ao exercício dos direitos e das atividades individuais, estabelecendo-se normas gerais e abstratas dirigidas indistintamente às pessoas que estejam em idêntica situação;


Atos normativos da Administração Pública:


Disciplinando a aplicação da lei, o Executivo pode baixar decretos, resoluções, portarias, instruções.


2.Atos administrativos e operações materiais de aplicação da lei ao caso concreto, compreendendo:


Medidas preventivas com o objetivo de adequar o comportamento individual à lei (fiscalização, vistoria, notificação, autorização, licença);


Medidas repressivas com a finalidade de coagir o infrator a cumprir a lei (interdição de atividade, apreensão de mercadorias deterioradas).


8.Polícia administrativa e Polícia judiciária


 O poder de polícia que o Estado exerce pode incidir tando na área administrativa quanto na área judiciária.


A doutrina costuma apontar como diferença o fato da polícia administrativa ter caráter preventivo, pois tem por objeto impedir ações anti-sociais, e a polícia judiciária ter caráter repressivo, pois tem por objeto punir os infratores da lei penal.


Afirma-se que a diferença não é absoluta, pois a polícia administrativa tanto pode agir preventivamente, como pode agir repressivamente.


Diz-se também que a polícia judiciária, embora seja repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral, porque, punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma infração.


9.Discricionariedade e Vinculação


O Poder de Polícia será discricionário quando a lei deixa ao administrador certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos.Nesses casos, a Administração Pública terá que decidir qual o melhor momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas na norma legal.


Na escolha pela Administração Pública da oportunidade e conveniência de exercer o poder de polícia, e na graduação das sanções aplicáveis aos infratores é que reside a discricionariedade do poder de polícia.


Entretanto, será vinculado quando a lei estabelece que, diante de determinados requisitos, a Administração Pública terá de adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer possibilidade de opção.


10.Coercibilidade

As medidas de polícia adotadas pela Administração Pública se impõem de forma coativa. Todo ato de polícia é imperativo (obrigatório para seu destinatário).


Não há ato de polícia facultativo para o particular, pois todos eles admitem coerção estatal para torná-los efetivos. A coerção é indissociável da auto-executoriedade.O ato de polícia só é auto-executório porque dotado de força coercitiva.


11.Auto-executoriedade

É o poder da Administração Pública decidir e executar diretamente sua decisão, por seus próprios meios, sem precisar recorrer previamente ao Judiciário.


A auto-executoriedade não existe em todas as medidas de polícia e para que a Administração Pública possa usá-la, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público.


12.Limites

Como todo ato administrativo, a medida de polícia, mesmo que seja discricionária, sempre esbarra em limitações impostas pela lei, quando à competência e à forma, aos fins e ao objeto.


12.1 Competência e forma


Devem se observar às normas legais pertinentes à competência (o agente deve ser competente, ter competência legal para a prática do ato) e à forma (o revestimento exterior do ato, o modo pelo qual ele aparece, deve ser o previsto em lei).


12.2 Fins


O poder de polícia só deve ser exercido para atender ao interesse coletivo e se seu fundamento é o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, o exercício desse poder perderá sua justificativa quando utilizado para beneficiar ou prejudicar pessoas determinadas. A autoridade que se afasta da finalidade pública incidirá em desvio de poder e acarretará a nulidade do ato com conseqüências nas esferas civil, penal e administrativa.


12.3 Objeto


Quanto ao objeto, ou seja, o conteúdo, a autoridade sofre limitações, mesmo quando a lei lhe dê várias alternativas possíveis. Aplica-se aqui o princípio da proporcionalidade entre meios e fins, ou seja, o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger.Sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem-estar social.


13.Poder de polícia – delegação


A regra é da indelegabilidade da atribuição de polícia administrativa. Admite-se delegação, desde que outorgada a uma pessoa governamental e por meio de lei.


Para particulares, a delegação só pode acontecer em casos muito específicos, isto porque estar-se-ia outorgando a particulares cometimentos tipicamente públicos ligados à liberdade e à propriedade.


 


Bibliografia

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 6.ed. São Paulo: Atlas, 1999.

DI PIETRO. Direito administrativo.

MEDAUAR, Odete. “Poder de Polícia”. In: Revista de Direito Administrativo, n 199. Rio de Janeiro: Renovar, jan/mar. 1995. p. 89:96.

MAYER, Otto. Derecho Administrativo Alemán, t. II. Buenos Aires: De Palma. 1951, p. 5.

BANDEIRA DE MELLO, Celso A. Curso de direito administrativo. 11a ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 559.

CAIO TÁCITO. Direito Administrativo, 1975. Apud: MOREIRA NETO, Curso… op. cit., 307.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. “Serviço público e poder de polícia: concessão e delegação. In: Revista Trimestral de Direito Público, v. 20. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 25.


Informações Sobre o Autor

Arion Alvaro Pataki

Acadêmico de Direito


logo Âmbito Jurídico

Poder de polícia

Prerrogativas e sujeições são os elementos fundamentais do Direito Administrativo. A autoridade da Administração está em confronto com a liberdade individual, visando à garantir o bem comum, o interesse público.

Poder de polícia é condicionamento do exercício dos direitos individuais ao bem-estar coletivo.

Para Di Pietro (2002:108), segundo a idéia de Zanobini (1968, v.4:191), “a idéia de limite surge do próprio conceito de direito subjetivo: tudo aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado”.

Ainda Di Pietro (2002:108), segundo Cavalcanti (1956, v.3:6-7), sugere que o poder de polícia “constitui um meio de assegurar os direitos individuais porventura ameaçados pelo exercício ilimitado, sem disciplina normativa dos direitos individuais por parte de todos” e é “limitação à liberdade individual, mas tem por fim assegurar esta própria liberdade e os direitos essenciais ao homem”.

O fundamento do poder de polícia é o princípio da predominância do interesse público sobre o particular. É a supremacia da Administração sobre os administrados.

Polícia vem de politeia que designava todas as atividades da cidade-estado.

Na Idade Média o príncipe detinha o jus politiae que era tudo necessário à boa ordem da sociedade civil, em contraposição à boa ordem moral e religiosa das autoridades eclesiásticas.

No século XV, na Alemanha, o jus politiae volta a significar toda a atividade do Estado. O príncipe dispunha de todos os poderes de ingerência na vida dos cidadãos, sempre no pretexto de alcançar o bem estar coletivo. Mas, entretanto, estabeleceu-se distinção entre polícia e a justiça. As normas baixadas pelo príncipe, em relação à administração, eram aplicadas sem possibilidade de apelo dos indivíduos aos tribunais. As normas que ficavam fora de alcance do príncipe e eram aplicadas pelos juízes chamavam-se de justiça. O direito de polícia do príncipe enfraqueceu-se a ponto de atingir normas apenas internas de administração. Em seguida, a polícia viu-se ligada à idéia de coação. Foi a partir desse momento que se começou a distinguir a atividade de polícia das demais atividades administrativas, hoje conhecidas como de serviço público e fomento.

Na fase de Estado de Polícia, então, o jus politiae representava uma série de normas postas pelo príncipe e que se colocavam fora do alcance dos Tribunais.

Nascido o Estado de Direito, surge o princípio da legalidade, princípio pelo qual o próprio Estado se submete às leis por ele mesmo criadas.

O Estado de Direito desenvolveu-se baseado nos princípios do liberalismo, onde a preocupação reinante era a de assegurar ao indivíduo uma série de direitos subjetivos, dentre os quais a liberdade. A atuação do Estado era uma exceção e só poderia limitar o exercício dos direitos individuais para assegurar a ordem pública. A polícia administrativa era uma polícia de segurança.

O Estado liberal, no entanto, foi obrigado a transformar-se em intervencionista e sua atuação atingiu também a ordem econômica e social.

O conceito clássico de poder de polícia era o de que o mesmo compreendia a atividade estatal que limitava o exercício dos direitos individuais em benefício da segurança.

Hoje, no Brasil, o poder de polícia é a atividade do Estado que consiste em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público.

Esse interesse público diz respeito a setores como: segurança, moral, saúde, meio ambiente, defesa do consumidor, patrimônio cultural, propriedade, etc.

Artigo 78 do CTN: “considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.

O exercício do poder de polícia é um dos fatos geradores de taxa.

Quando se diz que o poder de polícia é a faculdade de limitar o exercício de direitos individuais, pressupõe-se previsão legal.

O Poder Legislativo cria as chamadas limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas quando exerce o poder de polícia.

A Administração Pública, no exercício daquele mesmo poder de polícia, regulamenta as leis e controla sua aplicação, preventivamente, por meio de ordens, notificações, licenças ou autorizações, ou repressivamente mediante a imposição de medidas coercitivas. 

 

Bibliografia: Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. SP: Atlas, 2002. Zanobini, Guido. Corso di diritto amministrativo. Milão: A. Giufrè, 1968, v.4. Cavalcanti, Themístocles Brandão. Tratado de direito administrativo. SP-RJ: Freitas Bastos, 1956. t.3. __________. Curso de direito administrativo. 2ª edição dos Princípios Gerais de Direito Administrativo refundidos e atualizados. SP-RJ: Freitas Bastos, (+/-  1950).


Informações Sobre o Autor

Francisco Mafra.

Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.


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