Resumo: Violência na era da globalização, no sistema penal máximo x cidadania mínima, constitui o objeto central deste estudo, abrangendo a problemática do sistema penal na cultura punitiva na era da globalização neoliberal, de outro, e pari passu, a problematizarão do déficit na dimensão da cidadania, que a contrário sensu, ímpar minimização.[1]
O código da Violência na era da globalização, no sistema penal máximo x cidadania mínima, constitui o objeto central deste estudo, abrangendo a problemática do sistema penal na cultura punitiva na era da globalização neoliberal, de outro, e pari passu, a problematizarão do déficit na dimensão da cidadania, que a contrário sensu, ímpar minimização.
Constatando as desigualdade dos espaços da pena e da cidadania, maximizados x minimizados, e de seus respectivos potenciais, reguladores x emancipa tórios, verifica-se a conversão dos problemas sociais (crime-pena), quando deveriam ser apreendidos em um espaço de cidadania, e de outros campos apontados para a necessidade de reversão deste processo.
O conceito de sistema penal (criminalidade x criminalização), e cidadania no senso comum, e para além do senso comum, a análise de problemas , do gênero, violência contra a mulher, violência agrária e transito, são lutas de mulheres vítimas de homens violentos, luta contra o Estado e proprietários vitimados, luta pela segurança no transito contra condutores violentos de veículos, no senso comum , existem homens bons e maus.
A função do sistema penal seria de controlar a totalidade das condutas dos homens maus, a criminalidade para garantir a boa vida dos homens bons (cidadania).
Se tudo radica no sujeito, se sua bondade ou maldade são determinantes de sua conduta, as estruturas e as relações sociais podem ser imunizadas contra toda culpa.
Os etiquetados como criminosos podem então ser duplamente culpabilizados:
a) Seja por obstaculizarem a construção de sua própria cidadania, eis que não fazem por merecer, de acordo com a liberdade de vontade supostamente detêm, e a moral do trabalho, que dela se deduz;
b) Seja por obstacularizarem o exercício da cidadania alheia, que crescentemente se encontra no cárcere gradeado de sua propriedade privada.
No livre-arbítrio, quanto mais se anuncia o aumento da criminalidade, mais ocorre o aumento da culpabilização punitiva, o mercado da culpa e da responsabilidade individual e, portanto do Direito e do sistema penal – o espaço pena, é inesgotável, construindo assim uma cidadania puramente seletiva, quanto ao mundo do mal, e acessível ao mundo do bem.
A interação entre os processos de construção social da cidadania e da criminalidade pelo sistema penal que se constrói e se reproduz, a sua vez, o senso comum da violência, identifica (e politicamente manipulada), com a violência criminal, ou seja, com a criminalidade visível.
Nesta lógica, o resultado é sempre o mesmo, nesta ciranda punitiva, criminoso= violento=mal=pobre e/ ou excluído.
A criminologia crítica tem possibilitado a desconstrução e a ultrapassagem desse senso comum da criminalidade, da cidadania e da violência, bem como das soluções a que conduzem, a abertura de novas visões, novos discursos e novas práticas.
A cidadania é a dimensão de luta pela emancipação humana, os sujeitos, e sua defesa, o sistema penal é dimensão do controle e regulação social, radica a produção de instituições sociais e não a proteção do sujeito, ainda que em nome dele fale ou se legitime.
“Enquanto a cidadania é dimensão de construção de direitos e necessidades, o sistema penal é dimensão de restrição de violação de direitos e necessidades, enquanto a cidadania é luta pela informação da igualdade jurídica e da diferença das subjetividades, o sistema penal é dimensão de reprodução da desigualdade de desconstrução das subjetividades, em definitivo, enquanto a cidadania é dimensão de inclusão, o sistema penal é dimensão de exclusão social.” Pag. 22.
Quanto à criminalidade representada por nossa ideologia penal, àquela que se associa de imediato a pobres e negros, com marginais, marginais com desempregados e traficantes, sem terra como vagabundos e violentos, e assim por diante, e que reproduz o sistema penal.
Existe um sistema penal formal, composto pelas instituições (Leis-Politica, MP,Justiça-prisão), nesta perspectiva, a criminalização não apenas reproduz a divisão entre o bem e o mal e a não cidadania, como responsabiliza os mesmos como não cidadãos, que reproduz, pelo infortúnio da criminalidade, vale dizer, por sua própria criminalização, e por obstaculizar o exercício da cidadania.
Do preconceito pela mudança do senso comum sobre a criminalidade e o sistema penal, de fato, desenvolvida com base no paradigma etiológico, não encontra, depois da desconstrução contra ele criminologia desenvolvida com base no paradigma social, o modelo positivista de combate a criminalidade através do sistema que chega ao século XXI, por motivos evidentemente políticos e não científico, mais fortalecido que nunca. Dessa forma na ciência não tem ultrapassado o espaço acadêmico para alçar o espaço público da rua e provocar a necessária transformação cultural no senso comum sobre a criminalidade e o sistema penal, a superação do modelo de controle punitivo em que se insere.
Na base desse paradigma, a criminologia é definida como uma ciência causal-explicativa da criminalidade, tendo por objeto a criminalidade concebida como fenômeno natural, casualmente determinado, assume a tarefa de explicar as suas causas segundo o método cientifico ou experimental, e o auxilio das estatísticas criminais oficiais e de prever os remédios para combatê-la.
O pressuposto positivista é que a criminalidade é um meio natural de comportamentos de indivíduos que os distinguem de todos os outros comportamentos e de todos os outros indivíduos. Sendo a criminalidade pré constituída no Direito Penal (crimes Naturais) que, com exceção dos chamados artificiais, não faz mais do que reconhecê-la e positivá-la, seria possível descobrir as suas causas e colocar a ciência destas a serviço do seu combate em defesa da sociedade.
A resposta sobre as causas do crime, foi dada pelo médico Italiano Lombroso, que sustenta, inicialmente a tese de criminosos nato, a causa do crime é identificada no próprio criminoso partindo do determinismo biológico ( anatômico – fisiológico) e psíquico do crime e valendo-se do método de investigação e analise própria das ciências naturais ( observação experimentação), procurou comprovar hipótese confrontando os grupos não-criminosos com criminosos dos hospitais psiquiátricos e prisões, procurou dessa forma individualizar nos criminosos e doentes anomalias anatômica e fisiológicas vista como constantes naturalísticas que denunciavam, o tipo antropológico delinqüente, uma espécie à parte do gênero humano, a cometer crimes.
Características da criminalidade, com base nesta investigação, posteriormente criticada foi a epilepsia e a loucura moral.
Ferri, admitiu por sua vez, uma tríplice serie de causas ligadas a etiologia do crime: individuais (orgânicas e psíquicas), físicas (ambiente) e sociais (ambiente social), e, com elas ampliou a originária tipificação Lombrosiana a criminalidade. Sustentava também que a criminalidade em decorrência do livre arbítrio, mas resultado previsível determinado por esta ordem dois fatores, que conformam a personalidade de uma minoria de indivíduos como “socialmente Perigosa”.
Daí a tese fundamental de que ser criminoso constitui uma propriedade da pessoa que a distingue por completo dos indivíduos normais. Estabelece-se uma divisão aparentemente “cientifica” entre o submundo da criminalidade, equiparada a marginalidade e composta por uma minoria de sujeitos potencialmente perigosos e anormais (o mal), e o mundo , decente, da normalidade, representado pela maioria na sociedade (o bem). O fundamento para esse potencial de periculosidade social que os positivista identificaram com a anormalidade e situaram no coração do Direito Penal, que justifica a pena como meio de defesa social e seus fins socialmente úteis: a prevenção especial positivista , recuperação do criminoso mediante a execução penal) assentada na ideologia do tratamento que impõe por sua vez, o principio da individualização da pena como meio hábil para a elaboração de juízos de pro gnose no ato de sentenciar. Instaura-se, dessa forma, o discurso de combate contra a criminalidade ( o mal), em defesa da sociedade (o bem), respaldado pela ciência. A possibilidade de uma explicação “cientificamente”, fundamentada das causas enseja, uma luta contra a criminalidade, erigindo o criminoso em destinatário de uma política criminal de base, igualmente, científica. O sistema penal é mais conhecido como um processo articulado e dinâmico de criminalização ao qual concorrem todas as agencias do controle social formal, até o sistema penitenciário e os informais, família, escola, saúde, educação, mercado de trabalho e mídia, em decorrência de sua rejeição aos modelos de comportamentos é seletiva e, podem ser consideradas isoladas das outras, mas requer, alto grau, integrado que permita aprender o funcionamento do sistema como um todo. Dias e Andrade, 1984, pag. 373.
“O filho estigmatizado como “ovelha Negra” pela família, o aluno como “ difícil” pelo professor, e o mercado de trabalho entre outros, são uma espécie de controle social . Hassemer, 1984,p 82; Conde , 1985,p. 37.
Com base da criminologia critica, a investigação se desloca, em suma, dos controladores e, remetendo a uma dimensão política de poder de controlar, pois ao chamar atenção para a importância do processo interativo para a construção e a compreensão da realidade social da criminalidade, demonstra também como as diferenças nas relações de poder influenciam esta construção ( Hulsman, 1986, p. 127).
Sob a denominação da criminologia critica, em sentido lato, um estágio avançado de evolução radical englobando um conjunto de obras que, desenvolvendo um pouco as indicações dos teóricos da reação social e do conflito e os resultados a que haviam chegado os criminológos radicais e novos, chegam, por dentro dessa trajetória, à superação deles. Nesta revisão critica aderem a uma interpretação materialista. ( Pavarini, 1988, p. 155-156 e 163-164). Em uma visão materialista, as relações de poder e propriedade, em que se estrutura conflitivamente, a sociedade capitalista. A criminologia critica recupera, portanto, a análise das condições objetivas, estruturais e funcionais que originam, na sociedade capitalista, os fenômenos de desvio, interpretando-os separadamente, conforme se tratem de condutas das classes subalternas ou condutas das classes dominantes a chamada criminalidade de colarinho branco, dos detentores do poder econômico e político, a criminalidade organizada etc.
O progresso da análise do sistema penal como sistema de direito desigual está constituído pelo transito da descrição da fenomenologia da desigualdade á interpretação dela, isto é, ao aprofundamento da lógica desta desigualdade. Este aprofundamento, evidencia o nexo funcional que existe entre os mecanismo seletivos do processo de criminalização e a lei de desenvolvimento da formação econômica em que vivemos, e também a s condições estruturais próprias da fase atual deste desenvolvimento em determinadas áreas ou sociedades nacionais. ( Baratta, 1991, p.167).
Isto significa que a realidade social está constituída pelas relações de produção, de propriedade e poder moral dominante, significa reproduzir ideologicamente as relações e a moral dominante.( Baratta, 196, p. 90).
O enfoque se desloca para o comportamento desviante dos mecanismos de controle social, em especial para o processo de criminalização, que o momento crítico atinge sua maturação na criminologia e ela tende a transforma-se de uma teoria da criminalidade em uma teoria critica e sociológica do sistema penal. A contribuição fundamental da criminologia da reação social e crítica: a lógica da seletividade como lógica estrutural de operacionalização do sistema penal e sua relação funcional com dominação classista, evidencia, por sua vez, há muito focalizado pelo senso comum no popular de que prisão é para preto, pobre e a prostituta”.
A criminalidade se manifesta como comportamento da maioria, antes que uma minoria perigosa da população e em todos os estratos sociais, mas a criminalização é, com regularidade, desigual ou seletivamente distribuída.
Esta seletividade do sistema penal, maioria criminal, especialmente das classes altas, regularmente criminalizada, se deve, fundamentalmente a duas variáveis estruturais, a primeira é à incapacidade estrutural de o sistema penal operacionalizar, através das agencias policial e judicial, toda a programação da Lei penal, dada a magnitude da sua abrangência, pois está integralmente dedicado a administrar uma reduzidíssima porcentagem das infrações, por outro lado, se o sistema penal, concretizasse o poder criminalizante programado, provocaria uma catástrofe social. Se todos os furtos, todos os adultérios, todos os abortos, todas as defraudações, todas a s falsidades, todos os subornos, todas as lesões, todas as ameaças, todas as contravenções penais etc. fossem concretamente criminalizadas, não haveria habitante que não fosse criminalizado. Diante da absurda suposição, absolutamente indesejável, de criminalizar reiteradamente toda a população, torna-se obvio que o sistema penal está montado para que a legalidade processual não opere em toda sua extensão. ( zaffaroni,1991, p. 26).
Deste ponto de vista, a impunidade, e não a criminalização, é regra no funcionamento do sistema penal (Hulsman,1986,p.127).
A seletividade do sistema penal, em segundo lugar, s deve a especificidade da infração e das conotações sociais dos autores, pois a impunidade e criminalização são orientados pela seleção desigual de pessoas de acordo com seu status social, e não pela incriminação igualitária de conduta objetiva e subjetiva considerada em relação ao fato-crime, conforme preconiza a dogmática Penal.
O sistema penal se dirige quase sempre contra certas pessoas, mas contra certas condutas legalmente definidas como crime e acende suas luzes sobre o seu passado para julgar no futuro o fato-crime presente, priorizando a especulação de “quem” em detrimento do “que”. De modo que a gravidade da conduta criminal não é, por si só, condição suficiente deste processo , pois os grupos poderosos na sociedade possuem a capacidade de impor ao sistema uma quase que total impunidade das próprias condutas criminosas. (zaffaroni,1987, p. 22 e 32); Baratta,1982,p.35, 1991, p. 172,e 1993,p.49).
Enquanto a intervenção do sistema geralmente subestima e imuniza as condutas às quais se relacionam com a produção dos mais altos, embora mais difusos danos sociais (delitos econômicos, ecológicos, ações da criminalidade organizada, graves desvios dos órgãos estatais), superestima infrações de relativamente menor danosidade social, embora de maior visibilidade, como delitos contra o patrimônio, especialmente os que tem como autor indivíduos pertencentes aos estratos sociais mais débeis e marginalizados. (Baratta, 1991,p.61).
Isto significa, enfim, que a impunidade e criminalização, em vez de serem condicionadas pelas variáveis que formalmente vinculam a tomada de decisões (os códigos legais e o instrumental dogmático) dos agentes do controle social formal (polícia, MP, Juízes), e que deveriam reenviar à conduta praticada, são condicionadas por variáveis latentes e nõ legalmente reconhecidas que reenviam à “pessoa” do autor (e da vítima). A clientela do sistema penal é constituída de pobres (minoria criminal), não porque tenha maiores chances de serem criminalizados e etiquetados como delinqüentes. As possibilidades de resultar etiquetados, com as graves conseqüências que isto implica, se encontram desigualmente distribuídas de acordo com as leis de um second code constituído especialmente por uma imagem estereotipada e preconceituosa da criminalidade.
Portanto, pode-se concluir que, a criminalidade, etiqueta do criminoso é um bem negativo que a sociedade reparte com o mesmo critério de distribuição de outros bens positivos, o status social e o papel das pessoas: fama, patrimônio, privilégios etc.), mas em relação inversa, e em prejuízo das classes sociais menos favorecidas. Criminalidade é o exato oposto dos bens positivos (do privilegio). E, como tal, é submetida a mecanismo de distribuição análogos, porém em sentido inverso à distribuição destes.
Considera-se assim que “ a variável principal da distribuição desigual do status de delinqüente parece ser, a luz das investigações recentes, a posição ocupada pelo autor potencial na escala social. ( Baratta,1982,p.43).
Tratam-se em ultima instância, da recondução do sistema penal, a um sistema seletivo classista, e de violência institucional, como expressão e reprodução da violência estrutural, isto é, da injustiça social.
È importante então pontualizar como essa mudança de paradigma permitiu evidenciar o déficit casual do paradigma etiológico e de construir seus fundamentos a partir da constatação de que o substrato ontológico que confere a criminalidade não se apóia, em absoluto, sobre a criminalidade como fenômeno ou fato social, mas sobre o direito e o sistema penal.e, ao identificar os criminosos com os autores das condutas legalmente definidas como tais e, mais do que isso, como sujeitos etiquetados pelo sistema como criminosos, identifica população criminal, com a clientela do sistema penal. Sua dependência metodológica, estende-se ao resultado da própria operacionalidade, altamente seletiva, do sistema penal. E precisamente essa situação de dependência na qual a criminologia positivista se encontra na própria definição de seu objeto de investigação resultantes, que dão lugar ao profundo questionamento de seu status científico levando a concluir que “ a sua pretensão de proporcionar uma teoria das causas da criminalidade não tem justificação do ponto de vista epistemológico.(Baratta, 1982,p. 29 e 1983,p. 146).
A defesa social é, portanto, uma ideologia extremamente sedutora, enquanto é capaz de enriquecer o sistema repressivo vigente, com os tributos da necessidade, da legitimidade e da cientificidade. O poder da mídia na legitimação do sistema penal alcança, sob a globalização neoliberal.
Informações Sobre o Autor
Lucilene Abreu Martins
Acadêmica de Direito.