Breve exposição acerca dos concursos públicos

Resumo: Trata-se de uma singela contribuição ao estudo do Direito Administrativo-Constitucional, demonstrando, em breves linhas, as nuances e divergências sobre os concursos públicos.


Palavras-chave: concurso público – impessoalidade – moralidade – prorrogação – ato vinculado – nomeação – direito subjetivo.


Sumário: 1 – Introdução; 2 – Requisitos e Natureza Jurídica da prorrogação dos Concursos; 3 – Nomeação dos aprovados; 4 – Conclusão.


1 – Introdução


Numa conceituação clássica, o mestre Hely Lopes Meirelles expõe que concurso público “é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam os requisitos da lei”.[1]


Atualmente, adotando uma concepção principiológica, Dirley da Cunha Júnior pontua que os concursos públicos se revestem de “caráter ético e moralizador, e visam assegurar a igualdade, a impessoalidade e o mérito dos candidatos”.[2]


Nossa Carta Magna, em seu art. 37, inciso II, reconhecendo o caráter ético e indispensável dos concursos públicos sobre o prisma da moralidade e da igualdade, prega a exigência de sua realização, excepcionando-o apenas nas restritas hipóteses previstas na própria Constituição Federal.


Nessa temática, a realização do concurso público se impõe apenas para os cargos e empregos públicos, dispensando-se esta exigência em relação às funções temporárias (art. 37, IX, da CF) e de confiança (art. 37, V, da CF).


Outrossim, por expressa previsão constitucional, também não se impõe à realização de concurso público para os cargos em comissão (art. 37, II e V, da CF).


Cabe ainda ressaltar, conforme expõe o mestre Alexandre de Moraes que, a partir da Constituição de 1988, “a absoluta imprescindibilidade do concurso público não mais se limita à hipótese singular da primeira investidura em cargos, funções ou empregos públicos, impondo-se às pessoas estatais como regra geral de observância compulsória, inclusive às hipóteses de transformação de cargos e a transferência de servidores para outros cargos ou para categorias funcionais diversas das iniciais, que, quando desacompanhadas da prévia realização de concurso público de provas ou de provas e títulos, constituem formas inconstitucionais de provimento no serviço público, pois implicam o ingresso do servidor em cargos diversos daqueles nos quais foi ele legitimamente admitido”.[3]


Assim sendo, após breve e sucinta exposição introdutória, trataremos de questões mais conflitantes como, por exemplo, os requisitos e a natureza jurídica do ato administrativo que prorroga o concurso público, bem como a existência ou não de direito subjetivo à nomeação dos aprovados.


2 –Requisitos e Natureza Jurídica da prorrogação dos Concursos


Realizado o concurso público, o seu prazo de validade será de até 2 (dois) anos, prorrogável uma vez, por igual período.


Em primeiro lugar, notamos que a prorrogação do certame está vinculada à inexistência de prorrogação anterior e que ultrapassado o prazo inicial não é mais possível prorrogar-se o prazo de validade do concurso.[4]


Ademais, de acordo com a previsão constitucional e seguindo os ensinamentos do mestre Diógenes Gasparini, é de se salientar que esse prazo pode ser um qualquer, desde que respeitado o teto máximo (3, 6, 12, 18 ou 24 meses), ou seja, o prazo de validade do certame pode ser menor, mas jamais poderá ser maior que dois anos.[5]


Completando ainda, o saudoso mestre paulista explica que “se a lei for omissa e o edital silenciar a esse respeito, o prazo de validade do concurso é de dois anos, não um outro que a entidade titular do cargo, emprego ou função que se está preenchendo entender ser o correto”.[6]


Observa-se, portanto, do exposto, que a prorrogação do concurso público está atrelada ao mesmo lapso temporal estipulado inicialmente, ou seja, o prazo da prorrogação, que só ocorrerá uma vez, deverá equivaler ao prazo originário estipulado para a validade do certame.


Outrossim, a previsão constitucional acerca dos concursos públicos nos dá a idéia de que a prorrogação dos certames é ato meramente discricionário, ou seja, trata-se de ato submetido apenas à oportunidade e conveniência do Administrador Público.


Entretanto, conforme rico trecho de nossa jurisprudência, “o princípio da razoabilidade é conducente a presumir-se, como objeto do concurso, o preenchimento das vagas existentes”.[7]


Desta forma, seguindo esta esteira de raciocínio, a doutrina mais recente aponta que, existindo candidato aprovado dentro do número de vagas inicialmente previstas, a prorrogação do concurso público torna-se ato vinculado, que não se submete à esfera de subjetividade do administrador. Neste caso, a prorrogação do concurso público depende apenas da existência de vagas e da inexistência de prorrogação anterior, fugindo da esfera de discricionariedade do Administrador.


Para essa corrente, a qual me filio, esgotado o objeto do concurso público, o surgimento de novas vagas dentro do prazo de validade fica adstrito inteiramente à conveniência e a oportunidade da administração,[8] surgindo para esses candidatos mera expectativa de direito[9]. Neste caso, já preenchidas as vagas inicialmente previstas no edital, torna-se faculdade do Administrador Público a prorrogação do certame, bem como a criação de novas vagas. Por outro lado, havendo candidato aprovado dentre do número de vagas previstas inicialmente no edital, a prorrogação deixa de ser ato discricionário, tornando-se ato vinculado, ou seja, trata-se de ato administrativo que não se submete a subjetividade do Administrador.


3 – Nomeação dos aprovados


Com o brilhantismo que lhe é peculiar o mestre Hely Lopes Meirelles ensina que “pelo concurso afastam-se, pois, os ineptos e os apaniguados que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantêm no poder leiloando empregos públicos”.[10]


Destarte, a despeito da eticidade e do caráter isonômico que sempre nortearam os concursos, durante muito tempo, entendeu-se que o candidato aprovado, independentemente do número de vagas previstas no edital, adquiria apenas expectativa de direito quanto à nomeação. Deste modo, vencido o concurso público o candidato conquistava o direito de não ser preterido, mas a conveniência e a oportunidade de provimento do cargo ficavam à inteira discrição do Administrador.


Entretanto, recentemente, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o candidato aprovado em concurso, dentro do número de vagas, adquire direito subjetivo de ser nomeado.[11]


Esse pensamento adverte que “a partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessidade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital”.[12]


No mesmo sentido de nossa jurisprudência, Dirley da Cunha Júnior expõe que “não é legítimo que a Administração Pública, após desgastante concurso público, frustre as justas expectativas de candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital”. Segundo ele ainda “a nova dogmática constitucional dos direitos fundamentais, com a sua centralidade no sistema jurídico, tem exigido maior respeito aos direitos dos candidatos aprovados em concurso público, não havendo muito espaço para as opções discricionárias da Administração Pública”.[13]


Noutra colocação alicerçada por essa temática, Marçal Justen Filho salienta que “os princípios da objetividade e da atividade administrativa impedem que o aparato estatal seja movimentado a propósito de caprichos ou termos irracionais. Se o Estado promove um concurso público (inclusive efetuando despesas para sua realização), impondo sacrifícios aos particulares e deles exigindo disponibilidade para a assunção imediata, não se pode admitir o exercício arbitrário da competência de promover concurso público”.[14]


Com essas colocações, é de se entender, que não há mais espaços para ingerências administrativas. Exige-se, assim, que o Poder Público se vincule a seus atos, não criando expedientes meramente inúteis e sem qualquer eficácia. A realização de concurso sem a intenção de contratar os candidatos aprovados dentro do número de vagas é medida que dispende, imotivadamente, recursos públicos e que, nos dias de hoje, não deve ser admitida.


4 – Conclusão


Os Concursos Públicos, de acordo com a previsão constitucional, são ferramentas indispensáveis para os fins de moralidade e de igualdade, além do que, nos dias de hoje, trazem, ainda, como pano de fundo, a questão da eficiência e do respeito ao mérito dos aprovados.


A prorrogação do certame se submete apenas à inexistência de prorrogação anterior e a necessidade de observar o mesmo prazo previsto inicialmente. Havendo candidatos aprovados dentro do número de vagas previstas no edital o ato de prorrogação do certame torna-se vinculado. Caso as vagas previstas já estejam totalmente providas têm se por esgotado o objeto do concurso, cabendo ao Administrador, neste caso, a discricionariedade de prorrogar ou não o certame e de criar e prover novas vagas que não aquelas previstas originariamente no edital.


 Nos dias de hoje, de acordo com parcela de nossa jurisprudência e doutrina, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas, adquire direito subjetivo de ser nomeado. Este entendimento respeita, sem dúvida, àqueles que foram aprovados, evitando à quebra de suas justas expectativas de nomeação, respeitando ainda os direitos fundamentais e os princípios da eficiência e da praticidade da Administração Pública que não deve mais realizar certames desnecessários e sem compromisso com os gastos públicos.


      


Notas:

[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 22ª ed., 1997, p. 380

[2] CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Administrativo, Podium, 7ª ed., 2009, p. 244.

[3] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional, Atlas, 24ª ed., 2009, p. 349.

[4] STF, AI 452.641-AgR, Min. Nelson Jobim, J. 30.09.2003, DJ. 05.12.2003.

[5] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, Saraiva, 9ª ed., 2004, p. 174.

[6] GASPARINI, Diógenes. Direito…, cit., p. 174.

[7] STF, RE 192568-0 PI, 2ª T., Min. Marco Aurélio, J. 23.04.1996, DJ. 13.09.1996.

[8] STJ, Min. Gilson Dipp, 5ª T., RMS 18621/DF.

[9] STJ, Min. Arnaldo Esteves, 5ª T., RMS 25501/RS.

[10] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito…, cit., p. 380.

[11] STJ, Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª T., RMS 22957/MS, DJ. 23.06.2008.

[12] STJ, Min. Paulo Medina, 6ª T. RMS 20718/SP, J. 04.12.2007.

[13] CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso…, cit., p. 246/247.

[14] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo, Saraiva, 2ª ed. 2006, p. 205.


Informações Sobre o Autor

Diego da Silva Ramos

Assessor Jurídico-Legislativo e Advogado


logo Âmbito Jurídico