Resumo: Este é um relato de uma pesquisa realizada por alunos do Curso de Administração da Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira. A questão problematizadora da pesquisa foi a vigência e a eficácia do Código de Defesa do Consumidor no tocante a inadequação e insegurança dos produtos. Pretendeu-se saber como os preceitos jurídicos que proíbem a comercialização que produtos inadequados e inseguros se tornam vigentes de maneira efetiva. A hipótese inicial foi que os preceitos são efetivos de maneira apenas aparente. Para concluir a pesquisa, reuniram-se pesquisadores e alunos do Curso de Direito e foi ministrada às turmas uma aula interdisciplinar e conjunta com a intenção de aliar os aspectos práticos aos aspectos teóricos vistos pelos alunos do Curso de Direito. Para a reflexão que concluiu a pesquisa, o conceito de validade da norma jurídica adotado foi apoiado na “Teoria tridimensional do direito”, do jurista Miguel Reale.
Palavras-chaves: Direito. Código de Defesa do Consumidor. Administração. Sociologia Jurídica. Teoria Tridimensional do Direito
Sumário: 1. Introdução. 2. O conceito de vício de inadequação e de vício de insegurança, conforme a Lei 8078/90. 3. As pesquisas de campo: caçadores de vícios. 4. A vigência e a eficácia da Lei 8078/90, reflexões filosóficas para administradores e juristas. Referencias.
INTRODUÇÃO
Este é um relato de uma pesquisa realizada por alunos do Curso de Administração da Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira. No segundo semestre do ano de 2010, na Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira, o curso de Administração ofereceu aos seus alunos formandos (oitavo período), a disciplina eletiva “Código de defesa do Consumidor”. O objetivo geral da disciplina era instrumentalizar os alunos com a legislação nos assuntos pertinentes ao direito do consumidor e aproximá-los nos conceitos, vocabulários, procedimentos técnicos e jurídicos. Especificamente foram delimitados dois objetivos: Levar o aluno a ter uma visão panorâmica da matéria através da transmissão de conhecimentos enfocando a Proteção do Consumidor e seus Direitos Básicos, abordando as situações do dia-a-dia; transmitir ao aluno a possibilidade de examinar e interpretar os vários aspectos das práticas comerciais, relacionando-as aos casos previstos na legislação própria.
A metodologia de ensino adotada para a carga horária teórica foi aulas expositivas, leituras de textos legais (basicamente a lei e a jurisprudência pertinente) e debates entre os alunos com a orientação do professor. Para a carga horária prática a escolha foi a realização de pesquisas de campo em estabelecimentos comerciais da cidade, com a divulgação em sala de aula dos resultados obtidos visando a realização de estudos de caso com apresentação de possíveis resoluções das situações problemáticas propostas. A professora escolheu a realização das pesquisas de campo porque pretendeu que os alunos observassem no campo a existência real e concreta das normas jurídicas apresentadas na sala de aula.
Para as pesquisas de campo foi escolhido o tema “Qualidade de produtos e serviços, a responsabilidade pelo fato do produto e serviço e a responsabilidade por vício do produto e do serviço”. A matéria está posta na Lei 8078/90, Código de Defesa do Consumidor, no capítulo IV, que trata “Da Qualidade de Produtos e Serviços, da Prevenção e da Reparação dos Danos”. O Código trata de produtos e serviços; para a realização desse estudo foi restringida a pesquisa aos produtos e tão somente à constatação da existência de produtos que apresentassem vícios de inadequação ou insegurança.
Um produto é defeituoso (viciado) quando não oferece a segurança que dele se espera. Existem vícios de qualidade e quantidade do produto. Os vícios de qualidade dividem-se em vícios por inadequação (o produto é inadequado ao fim que se destina) e por insegurança (de defeito).
Foi solicitado, após o desenvolvimento das aulas com a exposição da matéria pertinente, que os alunos se dirigissem aos estabelecimentos comerciais, de sua escolha, da cidade de Luis Eduardo Magalhães, e procurassem identificar produtos viciados, nos termos da lei 8078/90. Para a formalização das pesquisas, os alunos deveriam apresentar uma declaração ao administrador do estabelecimento relatando o problema encontrado e a solução que o estabelecimento adotara para resolver o problema. O administrador assinaria a declaração.
Ao final das pesquisas, para concluir o assunto, a professora reuniu os alunos do oitavo período do Curso de Administração e os alunos do segundo período do Curso de Direito e ministrou às duas turmas uma aula interdisciplinar baseada no material coletado pelos futuros administradores. A intenção da aula conjunta foi aliar os aspectos práticos, os resultados da pesquisa realizada sobre a efetividade do Código do Consumidor na cidade de Luis Eduardo Magalhães, aos aspectos teóricos vistos pelos alunos do Curso de Direito; ambas turmas assim poderiam aprimorar seus estudos observando e discutindo a relação teoria/prática, o direito vivido no meio social. A professora conduziu a aula relatando e comentando os resultados da pesquisa, com a ajuda dos alunos do curso de Administração, e, em seguida, todos debateram a questão da validade da norma jurídica.
O Curso de Direito da faculdade Arnaldo Horácio Ferreira possuía, em 2010, em sua grade curricular, a disciplina “Sociologia Jurídica”. A sociologia jurídica era tratada como disciplina múltipla, polissêmica, complexa. Definiu-se na disciplina dois objetivos gerais: de um lado, o estudo de como o direito opera socialmente; de outro, a explicação sociológica do direito. O Objetivo específico primeiro da disciplina era analisar problemas com relação à efetividade da norma estatal no seio social, com vistas a responder à seguinte pergunta: em que medida as normas jurídicas recebem adesão dos atores em seu cotidiano? A intenção maior era produzir uma reflexão regional de leis abstratas ao analisar o direito vivido pelos atores regionais em suas práticas.
Para a reflexão que concluiu a pesquisa dos alunos Curso de Administração, apresentada aos alunos do Curso de Direito, o conceito de validade da norma jurídica adotado foi apoiado na “Teoria tridimensional do direito”, do ilustre jurista Miguel Reale. A opção pela definição do conceito operacional derivado da Filosofia Jurídica justifica-se porque a Filosofia Jurídica indaga das condições primeiras da validade do Direito, ou seja, da “validade da validade” em seus três aspectos: o ético, o técnico-jurídico e o histórico-social.
A questão problematizadora da pesquisa aqui relatada, é a positividade do Código do Consumidor, especificamente no tocante a inadequação e insegurança dos produtos. A pergunta que moveu a pesquisa consistiu em saber como os preceitos jurídicos que proíbem a comercialização que produtos inadequados e inseguros se tornam vigentes de maneira efetiva. A hipótese que se pretendeu confirmar foi que os preceitos, na maioria das vezes, são efetivos de maneira apenas aparente; as pessoas sabem da proibições, mas não cumprem a lei.
Considerou-se, para a apresentação das conclusões das pesquisas em aula conjunta, interdisciplinar, que a Sociologia Jurídica e a Filosofia do Direito são dimensões inseparáveis da unidade do fenômeno jurídico, pois portadoras de informações de natureza complementar. Considerou-se, ainda, que o fenômeno jurídico, além de exigir uma concepção de “totalidade”, quando o ordenamento jurídico se evidencia em suas perspectivas de vigência (ciência do direito), de sua eficácia (sociologia jurídica) e de sua legitimidade (filosofia do direito), reclama também a tríplice superação: superação da reprodução técnica do direito vigente, superação da reprodução ideológica dos valores incorporados no direito vigente e superação da reprodução histórica de uma dada sociedade. Decidiu-se pela interdisciplinaridade buscando também enfoques de natureza filosófica e antropológica, que permitissem a produção de uma teorização crítica do Direito, capaz não somente de atingir um conhecimento mais acurado da complexidade do fenômeno jurídico, bem como compreender a sua manifestação enquanto estrutura normativa de controle social.
Acredito que a realização das pesquisas aqui relatadas, do modo como foram realizadas e concluídas, constitui uma reflexão sobre o papel do aluno na produção do seu conhecimento, sobre esse mesmo papel na difusão do conhecimento e, ainda, sobre o peso relativo do conhecimento no contexto social, histórico e econômico do qual o aluno faz parte.
Acredito, sobretudo, na possibilidade de virem a ser os resultados um relato motivador para um olhar em conjunto sobre as perspectivas e caminhos para concretização de mudanças possíveis e necessárias no desenvolvimento do trabalho realizado pelas instituições que lidam com os direitos do consumidor na cidade de Luis Eduardo Magalhães.
O CONCEITO DE VÍCIO DE INADEQUAÇÃO E DE VÍCIO DE INSEGURANÇA, CONFORME A LEI 8078/90
A Lei nº 8.078/90 foi publicada no Diário Oficial da União na data 12 de setembro de 1990. Consoante o exposto no seu art. 118, ela entrou em vigor cento e oitenta dias após a publicação. A Lei 8078/90, mais conhecida como Código de Defesa do Consumidor, é um conjunto de normas que regulam as relações de consumo; veio para proteger o consumidor, que faz compras ou contrata algum serviço. Nessa relação jurídica, o consumidor é considerado hipossuficiente (parte mais fraca), pois ele não dispõe de controle sobre a produção de bens e serviços postos à sua disposição. Assim, a lei protege o consumidor e coloca os órgãos e entidades de defesa do consumidor a seu serviço.
A relação de consumo é de extrema importância para o bom andamento da economia na sociedade e, por isso, deve ser regulada com maior atenção. Como exemplo da importância atribuída pela sociedade às leis que protegem o consumidor, o IBEDEC (Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo) tem como objetivo estatutário orientar as relações de consumo, o consumidor e os fornecedores e considera a Lei 8.078/90, a mais importante ferramenta de Justiça Social depois da Constituição Federal. Entendem muitos juristas, políticos, consumidores, fornecedores e muitos cidadãos, que a lei assegura aos consumidores vários direitos e protege não só o patrimônio, como também a vida e a saúde, com punições para quem a descumpre.
Para as pesquisas de campo realizadas pelos alunos do Curso de Administração, foi escolhido o tema “Qualidade de produtos e serviços, a responsabilidade pelo fato do produto e serviço e a responsabilidade por vício do produto e do serviço”. A matéria está posta na Lei 8078/90, no capítulo IV, que trata “Da Qualidade de Produtos e Serviços, da Prevenção e da Reparação dos Danos”. O Código trata de produtos e serviços; para a realização desse estudo foi restringida a pesquisa aos produtos e tão somente à constatação da existência de produtos que apresentassem vícios de inadequação ou insegurança.
O produto adquirido pelo consumidor deve corresponder a exatamente aquilo que dele se espera. A justa expectativa dos consumidores e do público em geral frente aos produtos lançados no mercado é a de que eles funcionem regularmente, de acordo com a finalidade para a qual foram desenvolvidos e que, simultaneamente, ofereçam segurança aos seus usuários.
Para proteger a legítima expectativa que tem o consumidor na qualidade e utilidade do produto, o Código adotou o “Princípio da Confiança”, segundo o qual o produto deve proporcionar ao consumidor exatamente aquilo que ele esperava ou deveria esperar quando o adquiriu.
O fornecedor deve assegurar ao consumidor a correta utilização do produto, proporcionando-lhe as informações necessárias para tal, a fim de evitar que eventuais danos venham a ocorrer pela imperícia natural dos consumidores. O fornecedor deve prestar informações de forma clara, precisa e sem ambigüidades, de modo a não induzir o consumidor em erro.
Surge para o fornecedor uma dupla obrigação: fornecer produtos adequados às suas próprias finalidades; e não colocar no mercado produtos que ofereçam riscos, além dos que lhe são ínsitos e de conhecimento geral.
Todavia, é utópico o modelo ideal de produção, baseado na inexistência de produtos com avarias. O surgimento e alargamento do processo de industrialização, que tem como característica principal a produção em série, proporcionou o crescimento da incidência de vícios e defeitos nos produtos, pois não há um controle individual da adequação e segurança de cada unidade que é lançada no mercado. Daí advém que os produtos defeituosos acabam sendo um resultado marginal e inexorável da produção industrial.
Os “vícios de inadequação” são aqueles que afetam a prestabilidade do produto, prejudicando seu uso e fruição ou diminuindo o seu valor. Ocorrem também quando a informação prestada não corresponde verdadeiramente ao produto, mostrando-se, de qualquer forma, impróprio para o fim a que se destina e desatendendo a legítima expectativa do consumidor. A inadequação pode ocorrer na “qualidade” do produto, ou na sua “quantidade”. Os vícios de inadequação tratados no art. 18 e seguintes da Lei 8078/90.
“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas” (BRASIL, 1991).
Os produtos impróprios para o uso e consumo são: Os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos; os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação; os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam.
Sobre os vícios na quantidade do produto, a lei diz:
“Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: (BRASIL, 1991).”
A inadequação, portanto, pode ocorrer na qualidade do produto, quando afeta sua prestabilidade e utilização, ou na sua quantidade, quando o peso ou a medida informada não corresponder à prestada pelo fornecedor ou à indicada na embalagem. Por isso, a classificação dessa espécie de vícios em vícios de inadequação na qualidade e vícios de inadequação na quantidade.
Os “vícios de insegurança” são aqueles defeitos que fazem com que o produto seja potencialmente danoso à integridade física ou ao patrimônio do consumidor. Eles ocorrem quando o produto não apresenta a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração a sua apresentação, o uso e os riscos normais, a época em que foi colocado em circulação, dentre outras circunstâncias. Tem ínsito um perigo de dano patrimonial ou extrapatrimonial. Para a caracterização dos vícios de insegurança foram estudados os arts. 12 a 17 da Lei n.º 8.078/90.
“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – sua apresentação;
II – o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III – a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado (BRASIL, 1991).
Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:
I – o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
II – o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
III – não conservar adequadamente os produtos perecíveis” (BRASIL, 1991).
Foi solicitado, após o desenvolvimento das aulas com a exposição da matéria pertinente, que os alunos se dirigissem aos estabelecimentos comerciais, de sua escolha, da cidade de Luis Eduardo Magalhães, e procurassem identificar a existência dos produtos viciados, nos termos da lei 8078/90.
AS PESQUISAS DE CAMPO: CAÇADORES DE VÍCIOS
Inicialmente a professora pediu aos alunos que produzissem um texto escrito sobre as relações entre os direitos do consumidor e o curso de Administração, especificamente sobre as implicações das leis que protegem o consumidor no contexto do futuro profissional de Administração.
Para as pesquisas de campo foi restringida a pesquisa tão somente à constatação da existência de produtos que apresentassem vícios de inadequação ou insegurança. Foi solicitado, após o desenvolvimento das aulas com a exposição da matéria pertinente, que os alunos se dirigissem aos estabelecimentos comerciais, de sua escolha, da cidade de Luis Eduardo Magalhães, e procurassem identificar produtos viciados, nos termos da lei 8078/90.
Para a formalização das pesquisas, os alunos deveriam apresentar uma declaração ao administrador do estabelecimento relatando o problema encontrado e a solução que o estabelecimento adotara para resolver o problema. O administrador assinaria a declaração. Saliente-se que constaria na referida declaração o seguinte termo: “esta declaração é tão somente para fins de aproveitamento acadêmico, não servindo para outros fins”. Prevendo a possibilidade de recusa à assinatura, a professora optou pela não exigibilidade da mesma, bastando a descrição dos fatos pelo aluno.
A turma era formada por 30 (trinta) alunos. As pesquisas forma realizadas aos sábados, em horário de aula.
Todos os alunos encontraram produtos viciados e todos procuraram conversar com os responsáveis pelos estabelecimentos. Foram encontrados alimentos congelados armazenados de forma incorreta (temperatura acima do permitido), freezers com alimentos diversos (carne e sorvete), produtos com a data de validade vencida, produtos com peças quebradas, produtos sem etiqueta de preço, etc. Apenas 4 (quatro) responsáveis assinaram as declarações.
Para a apresentação nesse relato das impressões e constatações dos alunos, escolhi aleatoriamente a amostra e optei pela transcrição exata das palavras dos mesmos, sem correções. Foi privilegiada a mensagem do texto e não a correção gramatical ou ortográfia.
Tatiane Neumann, em sua pesquisa de campo, encontrou em um supermercado da cidade latas do produto achocolatado “Nescau”, com o prazo de validade vencido e alertou o gerente. Ela conta em seu relatório que o gerente retirou os produtos da prateleira e repôs esta com produtos com data de validade a vencer. Quando solicitada a produzir um texto sobre as relações entre os direitos do consumidor e o curso de Administração a aluna escreveu:
“De todo o exposto, percebe-se a relação existente entre a Administração e o CDC, visto que sua utilização é algo corriqueiro em nosso dia-a-dia, muitas vezes em coisas simples. Cabe ainda ressaltar a importância de que administradores e consumidores privilegiem o desenvolvimento equilibrado e também a justiça social, onde cada qual atue em harmonia com as normas e os princípios estabelecidos, já que o CDC tenta ser um instrumento extraordinário na concretização da cidadania e da justiça social, sendo de utilidade ímpar para a nossa sociedade brasileira.”
Daniele Fraporti também considera que O Código de Defesa do Consumidor será um instrumento útil para a sua profissão porque
“Uma determinada empresa só terá real desenvolvimento e conseqüente crescimento se estiver pautada em valores éticos e, cabe ao administrador considerar que o respeito ao consumidor passa a ser uma estratégia fundamental ao bom desempenho empresarial, podendo este nortear-se pelo Código de Defesa do Consumidor (…)”
João Ramos, outro aluno, escrevendo inicialmente sobre a ligação existente entre a área da administração e os direitos do consumidor, afirmou:
“O administrador tem a função de gerir uma organização, cuja esta irá produzir bens ou serviços aos consumidores, cabe ao administrador conhecer quais suas obrigações e seus direitos legais existentes nessa relação muitas vezes frágil entre organização e consumidor. Enfatizando o administrador de media e pequenas empresas que muitas vezes tem o contato direito com o consumidor, deve saber quais os direitos do consumidor para que não haja nenhum problema entre as partes e se eventualmente aconteça o administrador terá habilidade e conhecimento para resolver corretamente o problema.”
Já o aluno Anderson Kolln observou
“Que na grande maioria dessas empresas há uma falta de profissionalismo por parte dos administradores em não ver a forma em que está sendo feito o atendimento ao cliente, que na sua maioria sai lesado pela falta de uma boa educação e a falta de cumprimento de seus direitos. No entanto, nós, futuros administradores temos que observar todos esses “erros’ que ocorre no nosso dia a dia em empresas que freqüentamos e tirar exemplos de como NÃO devemos atender a um cliente, cuidar com o que promete para tal e verificar se esta sendo cumprido (…)”
Valério Vinhal pensa do mesmo modo:
“Assim como administrador pretendo assumir uma postura diferente (…) reconhecer o rpoblema se ele realmente existir e solucioná-lo, ao invés de fazer “vista grossa” ou se negar a assumir o erro cometido (…)”
Todos os alunos encontraram problemas nos estabelecimentos; a maioria dos problemas foi resolvida na hora mesmo, apesar da negativa em assinar as declarações. A maioria dos responsáveis se negou a assinar tais declarações; segundo os alunos, isso ocorreu devido ao medo das pessoas em se comprometer assumindo os erros.
Todos os alunos acreditam ser o Código do Consumidor um instrumento importante de justiça social e para a construção da cidadania. Todos percebem a necessidade do conhecimento da lei para o melhor desempenho profissional.
Os alunos ficaram entusiasmados com a realização das pesquisas, participando ativamente; inclusive, a maioria dos alunos realizaram mais de uma pesuisa, visitando vários estabelecimentos e produzindo vários relatórios.
A VIGÊNCIA E A EFICÁCIA DA LEI 8078/90, REFLEXÕES FILOSÓFICAS PARA ADMINISTRADORES E JURISTAS
Para a reflexão que concluiu a pesquisa, o conceito de validade da norma jurídica adotado pela professora foi apoiado na “Teoria tridimensional do direito”, do ilustre jurista Miguel Reale. A opção pela definição do conceito operacional derivado da Filosofia Jurídica justifica-se porque a Filosofia Jurídica indaga das condições primeiras da validade do Direito, ou seja, da “validade da validade” em seus três aspectos: o ético, o técnico-jurídico e o histórico-social.
Miguel Reale afirmou que a Filosofia do Direito é a ciência das condições transcendentais da validade jurídica, ou seja, das condições segundo as quais se tornam possíveis as indagações que, no plano das relações empíricas, são realizadas pela Sociologia Jurídica. É a Filosofia do Direito que se empenha na pesquisa dos valores que dão legitimidade ética ao sistema do Direito e aos institutos jurídicos particulares.
Assim, no plano das condições empíricas de eficácia (das pesquisas realizadas pelos alunos), as indagações que a Sociologia Jurídica realiza são passíveis de problematização (sistema perguntas/respostas) a partir do conhecimento das condições primeiras da validade do direito (Filosofia do Direito).
O jurista ensinou sobre três aspectos essenciais da validade da norma jurídica: a vigência, a eficácia e o fundamento. A vigência é tida como a validade formal ou técnico-jurídica, a eficácia como a validade fática, e o fundamento axiológico como validade ética. Há na norma, segundo Reale, uma relação necessária entre validade formal (norma), fática (fato)e ética (valor). Quando se indaga sobre o Direito, a correlação do Fato, valor e norma deve estar sempre presente um como momento dos outros dois.
Segundo Miguel Reale, a Sociologia Jurídica, que cuida das condições empíricas da eficácia do Direito, não pode deixar de apreciar a atualização normativa dos valores no meio social. O sociólogo do Direito, recebendo os valores e as normas como experiência social concreta, tem como meta de sua indagação o fato da efetividade dos valores consagrados em normas positivas. Já o jurista, enquanto tal, considera valor e fato em razão da normatividade, a qual é o seu objetivo específico. Por sua vez, o filósofo do Direito indaga das condições transcendental-axiológicas do processo empírico da vigência e da eficácia.
A validade formal ou vigência diz respeito ao processo de formação da norma; vigente é a norma emanada do poder competente com obediência aos trâmites legais. De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, a lei começa a vigorar a partir da data da publicação ou a partir da data que ela mencionar (vacatio legis). A partir da data que a lei mencionar ela se torna obrigatória (LICC, art. 1º) e ninguém pode furtar-se a sua observância, alegando que não a conhece (LICC, art. 3º).
A Lei nº 8.078/90 foi publicada no Diário Oficial da União na data 12 de setembro de 1990. Consoante o exposto no seu art. 118, ela entrou em vigor cento e oitenta dias após a publicação. A Lei 8078/90 é mais conhecida como Código de Defesa do Consumidor. A lei veio para proteger as pessoas consumidoras, que fazem compras ou contratam algum serviço.
A norma foi emanada do poder competente com obediência aos trâmites legais, A autoridade das referida lei é tecnicamente inconteste, ainda que o conteúdo da mesma não seja cumprido.
Sobre a eficácia, ou validade fática, entramos na seara da Sociologia Jurídica. A Sociologia Jurídica pergunta: em que medida as normas jurídicas recebem adesão dos atores em seu cotidiano? No caso aqui relatado a pergunta foi pela medida da adesão das pessoas envolvidas pela Lei 8078/90.
Segundo Miguel Reale, o problema da eficácia da norma jurídica tem a ver com a questão de se saber se as pessoas a quem a norma se destina ajustam ou não o seu comportamento, em maior ou menor grau, às prescrições normativas. Para responder sobre a eficácia da norma jurídica é necessária a pesquisa empírica, pois aqui é o plano experimental. Refere-se o plano experimental ao reconhecimento e cumprimento efetivo da norma por parte da sociedade. Refere-se, ainda, aos efeitos sociais que emergem de seu cumprimento. As pesquisas de campo realizadas pelos alunos do Curso de Administração foram realizadas com o intuito de saber a eficácia das mencionadas leis no meio social de Luis Eduardo Magalhães, em Agosto de 2010.
Constataram os alunos que as pessoas tem conhecimento da lei, da sua vigência e a cumprem na medida que podem e que lhes é exigida, visto que, muitas vezes, bastou uma conversa com o responsável para que o problema fosse resolvido. A questão que colocaram na aula conjunta foi falta de fiscalização por parte de um órgão com competência para aplicar as punições. Acreditam os alunos que impunidade influencia na medida da obediência à lei.
Como exemplo, temos a afirmação do aluno Rogério Voss:
“A grande maioria dos empresários sabe que a lei já está em vigor, porém devido à falta de fiscalização e a cobrança pelos consumidores os mesmos descumprem esta resolução, principalmente nos pequenos centros, o mesmo se aplica a seus funcionários. O despreparo dessas pessoas para tais situações é o reflexo de como nós brasileiros somos ainda acomodados e descrentes na nossa lei (…)”
A validade ética ou fundamento axiológico tem a ver com os objetivos das normas jurídicas. Parte-se do princípio de que a norma jurídica deve atingir um certo propósito, uma finalidade, ao tentar realizar valores (utilidade, liberdade, ordem, segurança, saúde, etc). Ensina Miguel Reale que o fundamento, no plano filosófico, é o valor ou o complexo de valores que legitima uma ordem jurídica, dando a razão de sua obrigatoriedade. Todo o ordenamento jurídico de um povo origina-se de valores, e deles recebe seu sentido e significado. Para o jurista, uma regra tem fundamento quando visa a realizar ou tutelar um valor reconhecido necessário à coletividade. De acordo com esse entendimento, não se legisla sem finalidade e o Direito é uma realização de fins úteis e necessários à vida, ou por ela reclamados.
Os fundamentos éticos da lei 8078/90, traçados pelos alunos pesquisadores, podem ser percebidos nas suas afirmações sobre seus comportamentos enquanto alunos-consumidorers e enquanto futuros fornecedores ou administradores. Todos os alunos acreditam ser o Código do Consumidor um instrumento importante de justiça social e para a construção da cidadania e, ainda, percebem as dificuldades para a concretização da lei. Todos percebem, também, a necessidade do conhecimento da lei para o melhor desempenho profissional.
Informações Sobre os Autores
Celia Cristina Muraro
Professora Coordenadora do Curso de Direito da UNYAHNA – BA, Mestre em Educação pela UFMT/IE Cuiabá – MT
Andréa Elisa Silva Bernardes
Ms. Professora, Coordenadora do Curso de Administração e Coordenadora Pedagógica na Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira – FAAHF
Bruna Mizuki
Mestranda, Professora e Coordenadora do Curso de Direito na Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira – FAAHF