Estudo sobre as medidas cautelares no Anteprojeto de Reforma do Código de Processo Penal Brasileiro


Das medidas cautelares pessoais


O Anteprojeto visa sistematizar e atualizar as normas processuais penais, especialmente nos casos de tratamento da prisão, das medidas cautelares e da liberdade provisória, com ou sem fiança, busca superar as distorções produzidas Código de Processo Penal atual e com reformas sucessivas, que desfiguraram o sistema e, ao mesmo tempo, ajustá-lo às exigências constitucionais. 


Nesse sentido, as principais alterações do Anteprojeto são: 


– O tratamento sistemático e estruturado das medidas cautelares e da liberdade provisória;


– O aumento do rol das medidas cautelares, antes centradas essencialmente na prisão preventiva e na liberdade provisória sem fiança;


– A manutenção da prisão preventiva, genericamente, para garantia da instrução do processo e da execução da pena e, de maneira especial, para acusados que possam vir a praticar infrações de criminalidade organizada, de grave ofensa à probidade administrativa ou à ordem econômica ou financeira, ou mediante violência ou grave ameaça às pessoas;


– A possibilidade de o juiz substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar em situações taxativas, bastante restritas, indicadoras da inconveniência ou desnecessidade de se manter o recolhimento em cárcere;


– A impossibilidade de, antes de sentença condenatória transitada em julgado, ocorrer prisão que não seja de natureza cautelar;


– A valorização da fiança.


 Hoje o processo penal brasileiro oferece, a rigor, somente três medidas: a prisão preventiva (da qual as outras espécies prisionais, exceto a prisão temporária, são meras manifestações) e a fiança. Assim, é de fundamental importância o estabelecimento de outras tais como: recolhimento domiciliar, proibição de deixar a cidade ou o país, retenção de passaporte, proibição de exercício de cargo de direção em empresa, suspensão do exercício do pátrio poder, impedimento provisório para o exercício de profissão, etc.. Esse rol ira facilitar, inclusive, a adequação da medida com as necessidades cautelares. No tocante sobre a observância, quando da imposição ou manutenção de cautela pessoal, de princípios que são emanação do princípio constitucional da presunção de inocência: a) princípio da necessidade (somente se impõe a medida se o conjunto probatório provisório demonstrar a sua indispensabilidade); b) princípio da adequação (a medida cautelar imposta deve ser suficiente a obviar as necessidades cautelares do caso concreto. c) princípio da proporcionalidade (quando da imposição de medida cautelar o juiz deve fazer uma avaliação do processo em perspectiva e impor medida compatível com o provável deslinde do feito. Assim, não decretará a prisão preventiva quando a prova interina demonstrar que ao acusado, ainda que condenado, se concederá sursis, regime aberto ou poderá a pena privativa de liberdade ser substituída por outra espécie de pena); d) princípio da exceção: a prisão preventiva é a última ratio do sistema cautelar e dela somente se valerá o Estado quando todas as outras medidas não forem suficientes à satisfação dos objetivos cautelares. É claro que todos esses princípios, mesmo não legalmente previstos, já têm aplicação no processo penal brasileiro por representarem emanação constitucional do princípio da presunção de inocência.


A obrigação de atuação ex-officio é outro ponto importante a ser discutido nos casos de revogação da cautela máxima deve também passar a compor o Código. Assim, cessados os motivos que determinaram a imposição da prisão (máxime quando essa se dá por necessidade de produção probatória) o juiz, independentemente de provocação, deve revogá-la. Claro que, havendo um elenco cautelar, pode substituí-la por uma menos gravosa à liberdade do acusado.


As medidas cautelares estão divididas no Anteprojeto in verbis:


– Medidas cautelares pessoais, relacionadas com o suspeito, acusado;


– Medidas cautelares de natureza civil (reais), relacionadas com a reparação do dano


Das medidas cautelares pessoais


1) PRISÃO PROVISÓRIA: No Anteprojeto se subdividem em: prisão em flagrante, preventiva e temporária.


O anteprojeto inclui a regulamentação da aplicabilidade do instituto da prisão temporária no CPP, incluindo um capítulo destinado a prisão provisória, ocorrendo assim a revogação expressa da Lei. 7.960/89 que atualmente regula tal instituto.


Outro tema a ser discutido é a questão da prisão preventiva. Atualmente não existe previsão legal de um prazo limite máximo que o acusado fiquei preso preventivamente, o que gera diversas distorções por falta de uma norma jurídica que define a questão. Atualmente tem entendido os tribunais que uma pessoa não pode ficar preso preventivamente por mais de oitenta e um dias. Com isso a proposta do Anteprojeto é de fixar um prazo razoável no máximo de seis meses de restrição de liberdade. Nesse sentido a prisão será de caráter excepcional como determina a Constituição Federal, caso o acusado não seja condenado passado os seis meses de restrição de sua liberdade, este deverá ser solto, contudo este não eximirá de responder o processo criminal.


No caso da prisão em flagrante, o Anteprojeto excluiu aplicação do flagrante impróprio (quando ocorre a perseguição do agente e depois é encontrado – Art. 302 III do CPP); e o flagrante presumido ou ficto (Quando encontrado o agente com a arma do crime ou objeto da vítima – Art. 302 IV do CPP).


Outro ponto importante é a regulamentação do flagrante preparado, atualmente este é considerado como fato atípico (falta de uma norma regulamentadora); uma vez que tal prisão é nula, pois seu conceito é quando a polícia provoca ao agente a praticar o crime, aproveitando o ensejo em aplicar a prisão em flagrante (Súmula 145 do STF)


2) FIANÇA – Tanto no Anteprojeto como atual Código de processo penal a fiança será aplicada nos casos de crime punidos com detenção ou prisão simples com pena fixada não superior a cinco anos desde que não aplicados com grave ameaça e violência. Porém ao contrário do atual CPP que trata que a concessão da fiança será concedida a autoridade policial, o Anteprojeto trata que a mesma será concedida e requerida de ofício ao juiz competente. O Anteprojeto houve uma ampliação da competência do judiciário para o requerimento da fiança. Destaca-se para concessão da fiança ainda a extensão do rol dos crimes inafiançáveis, tais como: Racismo, tortura, tráfico ilícito de drogas, terrorismo, os definidos em lei como hediondos e ação de grupos armados civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.


Das outras medidas cautelares pessoais


É uma inovação do Anteprojeto que visa à competência do juiz de fixar cumulativamente o arbritarmento de outras mediadas cautelares com a fiança oi de forma individual.


3) Recolhimento Domiciliar: O juiz poderá achar plausível que o acusado fique restrito em sua liberdade desde que esta seja feita em domicílio, podendo ainda, o acusado em se ausentar-se, desde que, este esteja autorizado judicialmente. Importante ainda ressaltar caso o acusado não tiver residência própria, este, poderá recolher-se através de abrigos públicos ou entidades assistenciais.


4) Monitoramento eletrônico: Tal medida deve ser aplicada nos crimes cujo o limite máximo da pena privativa de liberdade seja igual ou superior a oito anos. Para que ocorra o sucesso da aplicação dessa medida, esta deverá ser previamente informada ao acusado. Porém medida cautelar poderá ser descumprida, através do rompimento do dispositivo eletrônico ou da danificação do aparelho, desrespeitar os limites territoriais fixados  na decisão judicial e ainda deixar de manter contato  regular com a central de monitoramento eletrônico ou não atender a solicitação de comparecimento de presença.


5) Suspensão do exercício de função pública ou atividade econômica: O juiz poderá no caso em tela, determinar o afastamento da atividade pública, enquanto durarem a investigação do acusado. Nesse sentido a decisão do juiz será comunicada ao órgão público competente porém ainda que esteja na fase processual, não poderá a entidade pública promover anotações na ficha funcional ou profissional do acusado, salvo se for concluído o processo disciplinar autônomo ou sobrevier sentença penal condenatória transitada e julgada.


6) Suspensão das atividades de pessoa jurídica: Cabe ao juiz a facultatividade de aplicar a pena de suspensão da atividade empresarial das pessoas jurídicas de forma total ou parcial. Contudo essa sanção só será aplicada desde que, ocorra a comprovação que a empresa esteja cometendo crimes contra o meio ambiente, a ordem econômica, as relações de consumo ou que atinjam um numero expressivo de vítimas. Importante ainda analisar tal preceito, que antes do juiz tomar alguma decisão, este irá averiguar as conseqüências tanto trabalhistas (interesses dos empregados); e civis (interesses dos credores) baseando-se através do princípio da Função Social da empresa, e a manifestação do órgão público regulador caso se houver.


7) Proibição de frequentar determinados lugares: O juiz poderá restringir a locomoção do acusado, tais como: proibir de freqüentar determinados lugares, como eventos ou gêneros expressamente indicados na decisão judicial fundamentada, tendo em vista, as circunstâncias relacionadas ao fato apurado.


8) Suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, embarcação ou aeronave: Umas das grandes conquistas da extensão das medidas cautelares, foi esse tópico, pois visa o critério de rigor para crimes cometidos tanto na terra (Trânsito), mar (embarcação) e ar (aeronave). O juiz poderá suspender a habilitação do acusado, visando impedir que este fique colocando em risco a vida de outras pessoas. Porém esta medida poderá ser provisória, enquanto durar a fase processual, ou definitiva se este for considerado culpado através de sentença penal condenatória transitada e julgada. Ainda ressalta que tal medida deverá ser comunicada aos órgãos responsáveis pela emissão do documento, fazendo uma leitura conjunta com a parte final do art. 583, §3 do Anteprojeto do CPP.


9) Afastamento do lar ou do outro local de conveniência com a vítima: Esse preceito visa proteger a integridade da vítima que se achar ameaçada pelo acusado. Porem tal afastamento só deve ser efetivado, quando for verificado nos crimes praticados com violência ou grave ameaça a pessoa, podendo o juiz aplicar tal medida.


10) Proibição de ausentar-se da Comarca ou do País: O objetivo desse instituto é de simplesmente em garantir que o acusado não foge durante a instrução processual. Visando garantir a investigação e a realização dos atos processuais, o juiz se achar necessário poderá ainda exigir que o acusado entregue do passaporte ou de outros documentos pessoais em um prazo determinado e ainda comunicar as autoridades competentes através de um ofício sobre a decisão aos órgãos de controle marítimos. Aeroportuários e de fronteiras. Caso o acusado precisar viajar, este deverá obter uma autorização judicial permitindo a sua viagem.


11) Proibição de se aproximar ou manter contato com pessoa determinada: O juiz deverá analisar as circunstâncias relacionadas ao fato, através da sua concepção poderá aplicar ao acusado que este fique afastado fisicamente da vítima, não podendo aproximar-se desta e ainda proibida de manter uma ligação direta com uma pessoa próxima a vítima. A decisão judicial deverá ainda fixar um limite de distanciamento obrigatório, bem como, os meios de contatos interditos. 


12) Suspensão de registro de arma de fogo e de autorização para porte: Essa medida só será aplicada nos crimes praticados com arma de fogo, mesmo que esta seja de forma tentada. Nesse caso, o juiz poderá suspender a autorização para o uso, inclusive, tal media poderá ainda ser aplicado aos integrantes de órgãos de segurança pública. Enquanto durarem seus efeitos a decisão judicial impedirá a renovação do registro e da autorização para o porte de arma de fogo, esta deverá ser comunicada ao sistema nacional de armas e a polícia federal.


13) Suspensão do poder familiar: Caso o crime seja praticado mediante integridade física, bens ou interesses do menor, o juiz poderá suspender de forma total ou parcial o exercício do poder familiar, tirando a guarda dos pais e colocando ao Estado. Ainda ressalta que o limite máximo da pena deverá ser superior a quatro anos. Importante ainda mencionarmos que o dispositivo ainda trata da competência do juízo civil, caso o pedido de suspensão ou extinção do poder familiar for formulado antes nessa esfera, baseando-nos mesmos fatos, não será competente o juízo criminal para aplicar a medida cautelar.


Disposições finais


As medidas cautelares pessoais deverão estar mencionadas na decisão judicial, e esta ainda terá que obedecer aos limites máximos de 180 dias nos casos de: monitoramento eletrônico, suspensão do exercício de função pública ou atividade econômica, suspensão das atividades de pessoa jurídica. Já nos casos de Recolhimento Domiciliar, Suspensão do exercício de função pública ou atividade econômica e Suspensão do poder familiar o limite máximo será de trezentos e sessenta dias. Contudo nas hipótese de Proibição de freqüentar determinados lugares, Suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, embarcação ou aeronave, Afastamento do lar ou do outro local de conveniência com a vítima, Proibição de ausentar-se da Comarca ou do País, Proibição de se aproximar ou manter contato com pessoa determinada e Suspensão de registro de arma de fogo e de autorização para porte o limite máximo será de setecentos e vinte dias.


Aplicação das outras medidas cautelares pessoais quando findo o prazo ainda admite a possibilidade de prorrogação do mesmo. Em caso de necessidade o magistrado poderá ainda adotar outras medidas cautelares desde que haja comprovação da necessidade de aplicação.


Outra inovação do Anteprojeto é da possibilidade de cumular o tempo de recolhimento domiciliar com a pena privativa de liberdade, na hipótese da fixação inicial do regime aberto na sentença penal condenatória. Porém no caso se substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos será computado o tempo de duração das medidas cautelares tais como:  recolhimento domiciliar, monitoramento eletrônico, Suspensão do exercício de função pública ou atividade econômica,proibição de freqüentar determinados lugares e Suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, embarcação ou aeronave.


Poderá o Ministério Público supervisionar o cumprimento de qualquer medida de caráter pessoal.


Caso o acusado descumpre injustificadamente uma das medidas cautelares imposta, o juiz deverá de oficio ou a requerimento do Ministério Público ouvir a defesa e analisará a necessidade da decretação da prisão preventiva ou de substituição da medida anteriormente imposta por outra cautelar, ocorrendo à interrupção de prazos na seção das disposições finais.


14) DA LIBERDADE PROVISÓRIA


Uma das principais mudanças do Anteprojeto é dedicar um capítulo a parte ao instituto da liberdade provisória, que atualmente encontra-se inserido juntamente com o instituto da fiança. Trazendo uma leitura confusa sobre os institutos na qual, o instituto da liberdade provisória faz presumir que está disputando espaço junto com a fiança, pois o capítulo do atual Código de processo penal trás, mas referências ao instituto da fiança do que da Liberdade provisória do acusado. Ainda ressalta que o instituto da liberdade provisória encontra-se esparsos no código processual vigente, tendo que o leitor tentar fazer uma interpretação da norma vigente.


A liberdade provisória é um instituto processual que permite o réu em responder o processo em liberdade até o transito em julgado.  No ordenamento atual o réu preso em flagrante poderá responder em liberdade o processo, este deverá poderá requerer a liberdade provisória vinculada (Art. 310, parágrafo único do CPP); a fiança (Art. 323, I do CPP) e o relaxamento da prisão (Art. 5°, LXV, da CF/88)


Destarte, o Anteprojeto, trás ausência da necessidade do juiz conceder a liberdade provisória ao acusado, independentemente deste ouvir o Ministério Público, neste caso o magistrado verificará a necessidade verus adequação, em conceder a liberdade ao réu, entretanto este deverá comprometer-se através do termo de comparecimento a todos os atos processuais, especialmente nas hipóteses abaixo:


a) Não havendo fundamento para conversão da prisão em flagrante em preventiva ou aplicação de outra medida cautelar pessoal, nos termos, quando tratar-se do recebimento do auto de prisão em flagrante o juiz deverá arbritar a fiança ou aplicar outras medidas cautelares mais adequadas às circunstâncias do caso;


b) Cessando os motivos que justificam a prisão provisória ou outra medida cautelar pessoal


c) Findo o prazo de duração da medida cautelar pessoal anteriormente aplicada


Imperioso ressaltar, que em caso do réu não comparecer o ato processual sem prévia justificação quando intimado, o juiz deverá de oficio ou a requerimento do Ministério Público ouvir a defesa e analisará a necessidade da decretação da prisão preventiva ou de substituição da medida anteriormente imposta por outra cautelar, ocorrendo à interrupção de prazos na seção das disposições finais.



Informações Sobre o Autor

Elisa Maria Nunes da Silva

Redatora – Bacharel em Direito – Pós-graduada em Direito Público e Tributário pela Universidade Cândido Mendes – UCAN/AVM


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