Sumário: 1. Considerações iniciais, 2. O princípio do federalismo e o imposto único IVA, 3. O IVA e a guerra fiscal, 4. O IVA (imposto sobre valor agregado) – ICMS de valor único, 5. Considerações finais. 6. Referências bibliográficas.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O Brasil adotou a forma republicana de governo. A constituição de 1988 atribui a República federativa do Brasil como união indissóluvel dos Estados e Municípios e do Distrito federal, atribui autonomia aos ente federativos. Diante deste posicionamento adotado pelo constituinte originário como ficaria a repartição tributária se o país adotasse o imposto único sobre o valor agregado (IVA).
O presente trabalho busca refletir o papel da repartição das receitas tributárias no Brasil, tendo em vista a guerra fiscal que vem sendo travada entre Estados produtores e Estados consumidores de produtos e serviços. Os Estados mais desenvolvidos discutem o uso pelos Estados mais probres do incentivo fiscal adotado por eles e que vem contribuindo para a transferência das fábricas para estes Estados considerados mais pobres.
O IVA adotado na maior parte do mundo é um imposto aplicado na União Européia que incide sobre a despesa ou consumo e tributa o “valor acrescentado” das transações efectuadas pelo contribuinte. Aqui no Brasil, este imposto é dividido em três impostos IPI (Imposto sobre produtos industrializados) de competência da União, ICMS de competência dos Estados Membros e do DF (Distrito federal) e o ISSQN de competência dos Municípios.
A perda de arrecadação é evidente, com a instiuição desta tripartição do IVA estabelece a partir daí um conflito entre os entes tributantes que muitas vezes abrem mão de receitas para atrair novos investimentos para os seus Estados. Esta forma de interagir prejudicando a arrecadação vem sendo combatida pelo CONFAZ (Conselho Fazendário) que tem um regramento rígido para a estabelecimento de isenções e redução do ICMS.
Neste contexto, é afirmativo e salutar a proposta que seria possível utilizarmos da via do imposto único para mercadorias e serviços sem ferir preceito constitucional da autonomia dos entes federativos.
O tema mostra relevante pois, em data recente, dia 21 de outubro de 2011, foi admitido em sede de repercussão geral o RE 628075 de relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, sobre a concessão de crédito de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) nos casos em que a operação inicialmente tributada seja feita em estado que concede, unilateralmente, incentivo fiscal.
Assim diz a notícia:
“No recurso, uma indústria questiona decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que legitimou a negativa do estado em estornar integralmente à empresa o ICMS por ela pago na compra feita em frigorífico do Paraná. A Receita Pública gaúcha concordou em restituir (em forma de crédito) apenas parcialmente o valor destacado nos documentos fiscais de venda, alegando que na operação realizada em território paranaense houve concessão ilegal de incentivo fiscal. O crédito concedido foi de apenas 5% sobre as compras realizadas no Paraná, embora a alíquota destacada na nota fiscal fosse de 12%.
De acordo com o RE, a decisão fere os princípios da separação dos Poderes e da legalidade, assim como o artigo 155, parágrafo 2°, inciso I, da Constituição, segundo o qual o ICMS deve ser recolhido de forma não cumulativa. Pelo dispositivo, o contribuinte tem o direito de abater do ICMS a pagar do montante pago pelo tributo na etapa anterior da operação e destacado no documento fiscal de compra. A norma constitucional visa evitar que o contribuinte pague duas vezes o mesmo tributo, fazendo com que ele incida somente no incremento de valor que o bem experimenta no processo produtivo.”
Podemos observar que o tema é de grande relevância e de muita valia para nossa reflexão, objeto de repercussão geral o recurso ainda será analisado e votado pela Corte do Supremo. No entanto, algumas experiências consagradas já são suficientes para discorrer sobre o assunto.
2. O PRINCÍPIO DO FEDERALISMO E O IMPOSTO ÚNICO IVA.
Federalismo é a denominação feita à relação entre as diversas unidades da Federação, tanto entre si, quanto com o Governo Federal. Trata-se de um sistema político em que Municípios, Estados e Distrito Federal, sendo independentes um do outro, formam um todo que valida um governo central e federal, que governa sobre todos os membros acima citados, (http://pt.wikipedia.org).
O caput do artigo 1º da CF/88 inicia com o seguinte enunciado: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito. O artigo 18 da mesma Carta Costitucional completa: A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
Todos os entes da federação do Brasil possuem autonomia administrativa e política, com capacidade para criar e modificar a ordem jurídica além de cumprir a execução de suas atribuições competentes.
Diante desta autonomia política e administrativa o que dizer de um tributo que fosse somente de competência da União, retirando o poder de instituição dos Estados e Municípios. Há que ressaltar que os Municípios muitas vezes insastisfeitos com a parcela que arrecada se reunem e já por várias vezes os seus representantes foram ao Congresso Nacional reinvindicar uma melhor distribuição das receitas tributárias, a chamada “Marcha dos Prefeitos a Brasília”.
Preocupado com essa desproporção o Constituinte brasileiro criou o fundo de participação dos municípios. Mas, o objetivo deste trabalho é questionar a viabilidade de um imposto único para mercadorias e serviços. Nos demais países que adotaram este regime foi aprovado, não trazendo muitos problemas aos países que adotam este tipo de exação.
O IVA Europeu incide sobre a generalidade das operações econômicas efetuadas quer no interior do território nacional quer com o exterior, nomeadamente: Transmissões de bens e prestações de serviços efectuados em território nacional; Operações intracomunitárias efectuadas no território nacional; Importações de bens. (http://pt.wikipedia.org)
A grande questão está se há possibilidade de adotarmos esse modelo no Brasil, muito embora o IPI não cause muitos problemas quanto a sua uniformização por ser um tributo federal. O ICMS traz grandes entraves jurídicos que dão ao imposto um perfil bastante complexo.
Se não fosse o bastante a Constituição regular tal tributo, lei complementar e regulamentos do CONFAZ colocam limites na “Guerra” que os Estados vem travando para atração de novos investimentos. A Constituição Federal em seu artigo, 155, § 2º, XII, g, delegou a lei complementar a competência para regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
O Senado Federal por ser órgão de representação dos Estados cabe a regulação e a fixação de alíqotas do tributo tema trazido no art. 155, § 2º, V – é facultado ao Senado Federal: a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução de iniciativa de um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros; b) fixar alíquotas máximas nas mesmas operações para resolver conflito específico que envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros.
O Senado estabelece entre outros regramentos a uniformidade do tributo e pacificação fiscal. A solução seria a extinção do ICMS e do ISSQN e a criação de um imposto único Federal, a primeira vista pode ser simples, no entanto, criar um imposto como este retirando dos Estados, DF e Municípios este poder de tributação seria politicamente não recomendado. Outrossim, muitas vezes os Estados e municípios utilizam a redução do tributo como forma de barganha e atração de novos investimentos.
A continentalidade do pais impõe uma mudança de postura, o imposto único tal como modelo Europeu poderá vir a ser uma alternativa sustentável em meio a este modelo de tributação adotado no Brasil, extremamente oneroso para cadeia do setor produtivo brasileiro.
3. O IVA E A GUERRA FISCAL
O imposto único sobre mercadorias e serviços no Brasil poderia além de desonerar o contribuinte estabelecer regras mais claras na arrecadação dos impostos de bens e serviços. É defensável a tese de que com o imposto único os Estados e Munícipios perderiam em muito politicamente, mas regras claras trazendo uma melhor qualidade ao tributo e uma melhoria na sua distribuição poderia alavancar o crescimento do país, principalmente em áreas de desenvolvimento atrofiado.
O modelo adotado atualmente de tributação no Brasil tem criado grandes entraves no crescimento econômico a tributação elevada afasta novos investimentos, além de onerar por demais o contribuinte. Consequentemente, muitos Estados e municípios para atrair mais empreendimentos para suas regiões utilizam do artifício da redução dos impostos, para o investidor a primeira vista soa como algo extremamente vantajoso, pois, desonera sua carga de tributos, mas para o ente público ocorre uma perda de arrecadação.
A chamada “guerra fiscal” vem contribuindo para grandes embates não só sob o ponto de vista fiscal, mas também sob a ótica jurídica vem sobrecarregando os tribunais Superiores. Há varios julgados no STF coibindo esta prática por parte dos Estados a chamada “Guerra Fiscal”, julados recentes como ADI 3674 / RJ – RIO DE JANEIRO, Julgamento: 01/06/2011, cuja ementa:
“TRIBUTO – “GUERRA FISCAL”. Consubstancia “guerra fiscal” o fato de a unidade da Federação reduzir a alíquota do ICMS sem a existência de consenso, mediante convênio, entre os demais Estados.”
Outrossim, ADI 3794 / PR – PARANÁ, Julgamento: 01/06/2011 :
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS. ICMS. BENEFÍCIOS FISCAIS. NECESSIDADE DE AMPARO EM CONVÊNIO INTERESTADUAL. ART. 155, XII, G DA CONSTITUIÇÃO. Nos termos da orientação consolidada por esta Corte, a concessão de benefícios fiscais do ICMS depende de prévia aprovação em convênio interestadual, como forma de evitar o que se convencionou chamar de guerra fiscal. Interpretação do art. 155, XII, g da Constituição. São inconstitucionais os arts. 6º, no que se refere a “benefícios fiscais” e “financeiros-fiscais”, 7º e 8º da Lei Complementar estadual 93/2001, por permitirem a concessão de incentivos e benefícios atrelados ao ICMS sem amparo em convênio interestadual. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.”
O legislador brasileiro não pode ficar na contramão destas discussões, omisso a realidade brasileira que impera. Estados que discutem entre si investimentos utilizam de artíficios muitas vezes incostitucionais para garantir uma maior política de atração de negócios.
Esta política de transferências de arrecadação de um Estado para outro pejudica não só os Estados que no final das contas perdem em arrecadação, mas também os contribuintes dos impostos que por causa desta guerra fical, muitas vezes são forçados a restrigirem o fluxo de negócios (compra e venda). Isto tudo por que um Estado ao lançar um tipo de benefício como este impede a transferência de capital ou de recursos para outro Estado concorrente.
Em especial quanto aos créditos do ICMS que muitas vezes não são aceitos por Estados concorrentes, por causa desta “guerra fiscal”. Em entrevista recente o Ministro da Fazenda atento a discussão que vem sendo travada nos tribunais Superiores principalmente no STJ, atenta para o fato que:
mesmo admitindo que será uma negociação dura, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, defendeu ontem a proposta do Palácio do Planalto — redução das alíquotas interestaduais do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) de 12% a 17% para 3% a 4% — como solução para acabar com a guerra fiscal entre estados. Ele ressaltou que, entre todas as distorções produzidas, a mais nociva está no estímulo às importações, a exemplo do modelo de Santa Catarina e Espírito Santo. “A medida faz o manufaturado nacional perder ainda mais competitividade em relação ao importado e exporta empregos, justamente no momento em que a concorrência externa se agudiza”, sustentou. O titular da área econômica fez uma forte defesa pela adoção de uma alíquota única — a saída para impedir o leilão de incentivos às empresas e a perda de arrecadação. (https://planejamento.gov.br)
É consenso até entre as autoridades federais que o modelo atualmente adotado vem prejudicando não só a arrecadação, mas o crescimento econômico do país, reduzindo atração de novos empregos. Outrossim, perdendo o manufaturado nacional competitividade com o importado. Isto não só provoca um desequilíbrio na balança comecial, pois o importado torna-se mais barato do que o produto fabricado no Brasil, mas afeta todo o setor produtivo, desde a indústria de base que fica sem vender seus equipamentos para indústria nacional por causa da falta de novos empreendimentos no país quanto ao mercado produtivo que diante de um produto importado melhor e de menor preço é desestimulado a plantar novas sementes de negócio.
4. O IVA (IMPOSTO SOBRE VALOR AGREGADO) – ICMS DE VALOR ÚNICO.
A luz da proposta do Minstro da fazenda é salutar tecermos comentários ao que podemos chamar de imposto único para o ICMS. Mantega defende a redução das alíquotas interestaduais de 12% a 17% para 3% a 4%, os Estados produtores, portanto, arrecadadores refutam esta tese pois para eles haveriam uma perda de arrecadação. No entanto, qualquer proposta de reforma tributária há perdas de arrecadação.
A reforma tributária é feita não para aumentar a carga tributária mas, para reduzir o peso que ela tem sobre o contribuinte. A proposta de reforma tributária é feita para uma melhor dinâmica na arrecadação, diminuir a fuga de investimentos e reduzir a sonegação fiscal. Caso os Estados não pensem assim, todos ao final saem perdendo, não só os produtores que diante da guerra fiscal e incentivos fiscais de outros Estados perdem impostos por causa do deslocamento do setor produtivo, mas também, os estados consumidores que não tem uma política justa de arrecadação tributária.
Outro ponto importante nessa temática é o fundo de participação dos Estados criado para contrabalançar os desequilíbrios existentes entre os Estados ricos e pobres do Brasil, o FPE já não contempla a realidade vivida por estes. A realidade proposta na Carta Magna já não supre as necessidades atuais dos Estados. Há desta forma, uma necessidade urgente de reforma do fundo dos Estados atendendo aos seus anseios e da população.
O imposto único viria como um meio pacificador das tensões vividas pelos entes políticos. Se não adotarmos o modelo europeu que potencializa a tributação em um único imposto federal, a proposta de um ICMS único poderia acalentar o conflito vivido entre os Estados, mas ainda, restringir a criação de leis inconstitucionais que acabam sobrecarregando o judiciário.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A busca de mecanismos que melhorem a arrecadação e contribua para a sustentabilidade do pacto federativo é tarefa que deve ser discutida e proposta não só pela doutrina autorizada, mas pelas autoridades que como legítimos representantes devem se posicionar em favor do cresmento do país.
O imposto único é uma proposta que deu certo em grande parte do mundo e é uma experiência bem sucedida em pasíses como Portugal onde a taxa normal de IVA é de 23% desde Janeiro de 2011. No entanto existem taxas de imposto reduzidas de 6% e 13% (desde 01/07/2010) – aplicáveis a determinadas importações, transmissões de bens e prestações de serviço, sendo a taxa de 6% aplicada aos chamados bens de primeira necessidade como os produtos alimentares básicos (arroz, massas e água, por exemplo). (http://pt.wikipedia.org)
O brasil não pode ficar refém desta política de tributação atualmente adotada no paísvque afasta investimentos e promove a perda de arrecadação. Se a experiência do imposto único federal para os entes políticos é politicamente impossível por causa da perda da autonomia, a tese do ICMS único pode se tornar uma alternativa não tão eficaz mas, muito melhor do que a posta atualmente.
Toda medida que possa causar um impacto significativo na qualidade da arrecadação, criando mais postos de trabalho e desonerando o peso dos impostos sobre o contribuinte é válido. Ficar parado e aceitar a estrutura já solidificada é ato falho, e deve ser combatido, novas idéias devem ser sustentadas e acrescentadas, pois ao final toda a sociedade sai ganhando com uma estrutura tributária mais eficiente.
Informações Sobre o Autor
Ulisses Gomes Araujo
Graduado em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS, Pós-graduando em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera-Uniderp – LFG