Resumo: O presente artigo faz uma reflexão quanto ao modelo tradicional de resolução das lides, uma vez que o modelo vigente mostra-se insuficiente para o atendimento das demandas, decorrente do surgimento dos novos direitos, da lentidão e da morosidade processual, bem como o excesso de formalismo que agrava ainda mais a crise do Poder Judiciário. Dessa forma, é necessário buscar mecanismos e respostas céleres e inovadoras, que sejam capazes de dar efetivo acesso à justiça, assim como à prestação jurisdicional, com a finalidade de resolver os litígios. Abordará um novo modelo da solução dos conflitos para o descongestionamento do Judiciário, uma vez que este se encontra em crise, permitindo um melhoramento na prestação jurisdicional. Assim, analisar-se-á a mediação diante o projeto 166/2010 do novo Código de Processo Civil, bem como na Resolução 125/2010, a qual dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses.
Palavras-chave: Jurisdição. Crise. Meios alternativos. Conciliação. Mediação.
Abstract: This article reflects on the traditional model of resolving disputes, since the current model has proved insufficient to meet the demands arising from the emergence of new rights, the slowness and procedural delays, and excess formalism that exacerbates the crisis of the judiciary. Thus, it’s necessary to seek mechanisms and rapid and innovative responses that are able to provide effective access to justice, as well as the adjudication, in order to resolve disputes. Address a new model of conflict resolution for the decongestion of the judiciary, since this is in crisis, enabling an improvement in judicial assistance. So, we seek to further demonstrate the mediation the project 166/2010 of the new Code of Civil Procedure, as well as Resolution 125/2010, which provides for the National Judicial Policy for proper handling of conflicts of interest.
Keywords: Jurisdiction. Crisis. Alternative means. Conciliation. Mediation.
Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. A crise Estatal e a crise do Poder Judiciário frente à complexidade social. 3. Mediação: um meio alternativo ao processo tradicional 4. A mediação: novo Projeto do Código de Processo Civil e a Resolução 125/2010 CNJ. 5. Conclusão. Referências bibliográficas.
1. Considerações iniciais
Diante da crescente reivindicação de acesso à justiça e da complexidade social, em contraposição a instrumentos jurisdicionais que se apresentam insuficientes e ineficientes para atender de forma satisfatória o surgimento de várias demandas, faz se necessário buscar meios alternativos de solução de conflitos.
Vivenciamos um número excessivo de processos, o formalismo nas práticas forenses, a lentidão e morosidade processual, bem como o surgimento de novos direitos, que acabam prejudicando a eficiência e a celeridade na prestação jurisdicional.
É importante analisar as dificuldades enfrentadas pelo Poder Judiciário para que se tragam procedimentos que visem prevenir e resolver controvérsias a partir das necessidades e dos interesses dos litigantes. A provocação dos tribunais passa a ser subsidiária, não devendo ser a primeira porta como alternativa para a solução do conflito, salvo, é claro quando tratar-se de direitos indisponíveis, ou se tal provocação não for aconselhada.
Para demonstrar isso, abordar-se-á o instituto da mediação, analisando, inclusive, a figura do mediador. Na sequência, falar-se-á do Projeto de Lei 166/2010, que traz a mediação e a conciliação como auxiliares do sistema judiciário.
2. A crise Estatal e a crise do Poder Judiciário frente à complexidade social
Deve-se ter presente a crise do Estado[1], quando se trata da crise do Judiciário, haja vista que todas as crises criadas e fomentadas a partir da globalização cultural, política e econômica são decorrentes da crise estatal, resultante de um processo de enfraquecimento do Estado. Logo, é através dessa crise que se verifica a deficiência das demais instituições, tendo em vista que o direito, que é conhecido e aplicado, posto pelo Estado, assim o é porque seus textos são escritos pelo Legislativo e suas normas aplicadas pelo Judiciário[2].
A crise do Estado[3] contemporâneo se fez sentir em todo mundo. O enorme custo do Estado Social, em razão do agigantamento do Estado, cuja intervenção nas áreas econômicas e sociais teve como consequência um déficit público insustentável. Por isso, houve retração do papel do Estado, que se demite da prestação de serviços públicos industriais e comerciais.[4]
Essa crise do Estado contemporâneo justifica a necessidade de revisão de todos os papéis, tanto na esfera econômica quando nos modelos de regulação social e jurídica tradicionais. Tais modelos já não mais funcionam, o que deflagra a constatação de que o Estado vive uma crise que põe em xeque o desempenho das atribuições que lhe eram específicas. De fato, há tempos, a crise anuncia-se e, paralelamente, assiste-se à transformação das coordenadas espaciais e temporais da vida social[5].
Além do mais, a crise do Estado, cujos reflexos atingem o Judiciário, ratifica a falta de respostas plausíveis, por parte das instituições estatais, ante as expectativas geradas não só pela criação de novos direitos, mas também perante a realidade econômica e social na qual os conflitos estão inseridos. A exigência de uma ação estatal prolongada no tempo, que se oriente pelo presente e pelo futuro, diversa daquela até então realizada, cujo viés principal era o passado, promove a indeterminação e a indefinição geradas pela incerteza, aproximando o tempo do Estado ao tempo do mercado. Assim, expõe Garapon[6] que, aí, reside uma das causas do descrédito da regra, ou seja, lei descartável não é lei respeitada, é um risco de quebra jurídica.
Para Spengler, no contexto de crise, evidencia-se a preocupação com a efetividade/qualidade da prestação jurisdicional, cujo modelo conflitual caracteriza-se pela oposição de interesses entre as partes, que esperam pelo Estado (terceiro autônomo, neutro e imparcial) que deve dizer a quem pertence o direito. Atualmente, a tarefa de “dizer o direito” encontra limites na precariedade da Jurisdição moderna, incapaz de responder às demandas contemporâneas produzidas por uma sociedade que avança tecnologicamente, permitindo o aumento da exploração econômica, caracterizada pela capacidade de produzir riscos sociais e pela incapacidade de oferecer-lhes respostas a partir dos parâmetros tradicionais[7].
Ademais, o Poder Judiciário passou a ser alvo de severas críticas dirigidas ao seu funcionamento, tanto por parte da sociedade civil e dos demais poderes, como pelos próprios pensadores e operadores do direito, afetados por um descontentamento e uma frustração no que se refere ao exercício de duas funções e a repercussão extrajudicial dessas[8].
São bastante conhecidas as dificuldades arrostadas pelo Judiciário brasileiro, tais como: o aumento do número e da complexidade dos conflitos, a morosidade da prestação jurisdicional, as custas judiciais excessivas. Outros obstáculos que não podem ser esquecidos são: o sistema processual, a mentalidade dos juízes, que muitas vezes não estão abertos às necessidades sociais, além do excesso de formalismo[9]. Esse excesso de formalismo só prejudica aqueles que buscam respostas no Judiciário, pois podem se passar anos até que obtenham uma solução ao seu caso, através de uma sentença, a qual pode ser favorável ou não ao seu interesse, desprestigiando o sistema judicial.
Conforme se verifica no processo civil, a solução é imposta pelo Estado-juiz, cujo resultado consubstancia-se em uma decisão, que pode acolher ou rejeitar o pedido formulado pelo autor. Essa decisão pode também acolher esse pedido em parte, não cabendo a possibilidade de julgar empatada a demanda, havendo um ganhador e um perdedor. Estar-se-á diante do que costuma chamar de um ganha/perde[10].
3. Mediação: um meio alternativo ao processo tradicional.
O monopólio jurisdicional do Estado, “conquista histórica de garantia da imparcialidade, independência para o alcance da segurança jurídica e manutenção do estado de direito”[11] já não é suficiente para solucionar com celeridade e eficiência o volume de ações que afloram diariamente. Isso porque, o Estado-Juiz está incapacitado estruturalmente para acompanhar o crescimento populacional e a consequente multiplicação de litígios. Dessa maneira, concomitantemente ao monopólio jurisdicional, é necessário o incentivo aos meios extrajudiciais de resolução de conflitos,[12] no qual se insere a mediação.
As pessoas, em suas relações diárias, encontram obstáculos, de diversos fatores, para a solução tradicional de seus conflitos, dentre eles: a morosidade, o formalismo acentuado, o grande dispêndio com custas e honorários para a contratação de um advogado. Mas a par dessas questões já conhecidas, o modelo tradicional, em parcela significativa dos casos, não resolve a lide sociológica, mas apenas a lide processual. O Poder Judiciário, com sua estrutura atual, trata apenas superficialmente de conflituosidade social, dirimindo controvérsias, mas nem sempre resolvendo o conflito.[13]
Como salienta Grinover[14], a Justiça tradicional tem como objetivo julgar e sentenciar, enquanto a justiça informal visa a compor, conciliar e principalmente, prevenir conflito. Acrescenta ainda que o mecanismo contencioso não se ajusta a determinados tipos de litígios, em que se faz necessário atentar para os problemas sociais que estão à base da litigiosidade, mais do que aos meros sintomas que revelam a existência desses problemas.
Atualmente, a mudança de paradigma está construindo novos rumos para os processos de mediação. Hoje, a proposta orientadora para a mediação considera que o conflito é também uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento. A superação da lógica determinista, binária, faz com que as práticas de mediação interessem-se pelas possibilidades criativas, brindando as diferenças, a diversidade e a complexidade. Apoiando-se em noções de construção social da realidade, as estratégias de mediação fornecem perspectivas para a participação dos atores sociais, que podem incrementar a sua capacidade para iniciar ações novas, atuar como protagonistas ao enfrentar e resolver conflitos e dilemas em suas vidas, assim como narrar novas e melhores histórias sobre os sistemas dos quais são parte e de seu lugar neles[15].
Ainda, nesse contexto:
“Na atualidade a mediação começa a ser um mecanismo mais comum nos programas de resolução alternativa das disputas, uma opção democrática e pedagógica para a intervenção de terceiros nos conflitos. Mas para entender bem a mediação é preciso elaborar uma clara compreensão do que entende por conflito. Qualquer teoria da mediação resta inadequada e insuficiente se não tem por base uma explícita teoria do conflito.”[16]
A sociedade está acostumada a uma visão negativa do conflito, existindo sempre a figura de um ganhador e um perdedor. Dessa forma, a mediação, por sua vez, encara o conflito de maneira positiva, oportunidade de crescimento e amadurecimento dos envolvidos, responsabilizando-os também pelo seu adequado tratamento, haja vista que não esperam que a solução seja “imposta” por um terceiro, como tradicionalmente ocorre no processo judicial.
Nesse aspecto, a mediação procura valorizar os laços fundamentais de relacionamento, incentivando, com o auxílio de um terceiro mediador, “o respeito à vontade dos interessados, ressaltando os pontos positivos de cada um dos envolvidos na solução da lide, para ao final extrair, como consequência natural do processo, os verdadeiros interesses em conflito.”[17]
A mediação possui vários objetivos, os quais se destacam a solução dos conflitos, ou seja, a boa administração do mesmo, a prevenção da má administração de conflitos, a inclusão social, através da participação efetiva, conscientização de responsabilidades e dos direitos, bem como acesso à justiça e a paz social[18], reforçando sempre a comunicação entre as partes.
Nesse sentido, Souza[19] explica que a mediação oferece muito mais sob o aspecto qualitativo aos envolvidos em um conflito jurídico, tendo em vista que é uma forma autônoma de resolução de conflitos, porque a solução encontrada para o problema, através de mediação, não é uma decisão imposta por um terceiro, mas alcançada consensualmente pelas partes através de um processo em que cada uma delas tem oportunidade de expor os seus interesses e as suas necessidades. Como decorrência, lhes é possível descobrir um caminho que atenda, tanto quanto possível, aos legítimos interesses e às necessidades de ambas.
Ainda, nessa crise judiciária instaurada, pode-se notar um verdadeiro caos jurídico, com o abarrotamento de processos – cada vez em número maior – devido ao número insuficiente de juízes para atender, de forma quantitativa e qualitativa, as demandas, e ao anacronismo da legislação processual. Isso acaba gerando demora na resolução dos processos e, como resultado, uma insatisfação que enseja a necessidade de criação de outros mecanismos para a resolução dos conflitos[20].
Cabe ressaltar que a sociedade moderna inquieta-se com os desafios que se opõem à efetivação do acesso à justiça, em decorrência da constatação de que o Estado não tem conseguido desincumbir-se de sua missão constitucional de solucionar, com celeridade e eficiência, os conflitos que lhe são apresentados por seus cidadãos[21].
Compete referir a importância em fortalecer a modernização da prestação jurisdicional brasileira, uma vez que isso já vem ocorrendo de forma acanhada em termos quantitativos e qualitativos. Em razão dos avanços da sociedade moderna que o Judiciário percebeu que a sua estrutura física, pessoal e política exige um suporte tecnológico, administrativo e comportamental, de forma a garantir aos cidadãos o acesso à justiça e à Jurisdição de forma adequada.
No entendimento de Martins Filho[22], o Judiciário do Terceiro Milênio deverá ter determinadas características, que privilegiem a qualidade técnica de suas decisões – uma Justiça Social efetiva, o baixo custo de sua estrutura – a acessibilidade a todos, a celeridade na prestação jurisdicional e na concentração de demandas – a coletivização do processo. Daí, a necessidade de modernização da estrutura do Judiciário para se tornar “pilar da cidadania”.
Portanto, é indispensável a efetivação dos procedimentos processuais capazes de dar maior celeridade, haja vista o surgimento de novas demandas oriundas dos novos direitos, como veremos a seguir.
4. A mediação: novo Projeto do Código de Processo Civil e a Resolução 125 CNJ
A Comissão Temporária de Reforma do Novo Código de Processo Civil[23], no Senado, aprovou, no dia 01 de dezembro de 2010, o relatório do Senador Valter Pereira (PMDB-MS), o qual trata do novo texto do Código de Processo Civil. O documento recebeu alterações, inclusive propostas pelo Ministério da Justiça, devendo ser avaliado pelo Plenário do Senado na próxima semana[24].
O relator do projeto afirmou em entrevista à Agência Brasil, que o novo código, que possui 1.008 artigos, pretende dar rapidez aos processos e evitar que as controvérsias sejam, necessariamente, resolvidas na Justiça. Com isso, a conciliação passa a ser feita antes do início do processo, enquanto que os recursos incidentais, sobre decisões do juiz que tenham menor importância, ficam para o fim do processo, no momento da apelação de quem perdeu a causa[25].
Outra medida que pretende evitar a judicialização dos conflitos é a criação do mediador, que poderá exercer a atividade independentemente de sua formação profissional para atuar nas conciliações. Segundo Valter Pereira, a regulamentação e a remuneração da atividade deverão ser feitas posteriormente[26].
A mediação é um instrumento que vem crescendo e mostrando-se apta no tratamento dos conflitos. Dessa forma, o novo Projeto do Código de Processo Civil inseriu a conciliação e a mediação em seus dispositivos. No entanto, no que diz respeito à mediação, o legislador preocupou-se com a atividade de mediação feita dentro da estrutura do Poder Judiciário[27].
O novo Código de Processo Civil surge como forma de política pública, no intuito de facilitar o acesso dos brasileiros à justiça, uma vez que se reduzirá o número de demandas e de recursos que dificultam o andamento dos processos. A expectativa é a de que se reduza pela metade o tempo de trâmite de uma ação no Judiciário, permitindo mais rapidez e celeridade nos processos.
O novo CPC em seu artigo 135 trata da realização de conciliação ou mediação, a qual deverá ser estimulada por magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. O § 1º refere que o conciliador poderá sugerir soluções para o litígio e o § 2º dispõe que o mediador auxiliará as pessoas em conflito a identificarem, por si mesmas, alternativas de benefício mútuo[28].
Ressalta-se a figura dos conciliadores e dos mediadores judiciais, uma vez que deve se tornar peça chave no combate à morosidade da Justiça. Essa expectativa foi registrada durante a primeira sessão de discussão do projeto (PLS 166/10) de reforma do Código de Processo Civil (CPC) no Plenário do Senado. Segundo salientou o relator da matéria, senador Valter Pereira (PMDB-MS), esses personagens terão atuação destacada entre as chamadas “formas alternativas de resolução de conflitos”[29].
O projeto, acrescenta o relator, seguiu três linhas mestras: reduzir a litigiosidade, simplificar procedimentos na Justiça e dar clareza e transparência a algumas questões. “A Justiça que tarda é a que não é feita“, enfatiza o senador Valter Pereira, exemplificando com processos que se arrastam por tantos anos que o cliente desiste ou morre antes de obter uma solução. Por essa razão, o novo CPC procurou, segundo Pereira, legitimar práticas a que a Justiça já está recorrendo, como a conciliação e a mediação, formas que resgatam o entendimento e a negociação para tentar solucionar os conflitos, evitando novos processos[30].
Ademais, a adoção da conciliação e da mediação judicial como meio de composição de conflitos representa um avanço. Entretanto, apesar de sua positivação, no que se refere à mediação judicial sofrer algumas críticas, em virtude da essência do instituto da mediação, ela pode ser vista por outro ângulo, ou seja, ter um reconhecimento quanto ao tema, uma vez que esse se encontra em constante evolução.
É inegável, portanto, a contribuição da mediação para o processo. Depreende-se de todo o exposto que é necessária uma nova base científica para o processo, numa revisão metodológica, com a releitura do conceito de jurisdição. Neste terceiro milênio deve-se priorizar uma coexistência pacífica entre as partes, estimulando o diálogo e participação dos protagonistas do conflito, preservando-se as relações, voltada, portanto a uma maior humanização do conflito[31].
Segundo Azevedo[32], todo este contexto enseja uma revisão paradigmática que pautam o processo, para o atingimento dos escopos do processo, especialmente os escopos sociais, dentre os quais se insere a pacificação social. Uma mudança de mentalidade, portanto, capaz de dar conta desta releitura de conceitos e absorção de novas práticas, tanto em sede judicial como extrajudicial.
Diga-se de passagem, que a mediação e conciliação não excluem outras formas extrajudiciais de resolução de conflitos, sendo essa questão prevista no art. 144 do projeto de lei.
Bacellar[33] afirma que a conciliação e a mediação fazem com que o processo não tenha execução e não tenha recursos. Essa solução pacífica é muito importante, pois estes institutos trazem o desafogamento do Judiciário, permitindo que os julgadores se voltem para questões mais complexas, podendo analisar caso a caso de forma fundamentada.
Ademais, cabe salientar alguns pontos que foram positivados no PLS 166/10, como a escolha do mediador. Para Pinho:
“A escolha do mediador também é uma questão que mereceu tratamento adequado no Projeto. As partes podem escolher livremente o mediador ou o conciliador, havendo consenso entre elas acerca do nome deste profissional. Se não houver acordo, haverá um sorteio entre os profissionais inscritos no Tribunal (art. 146 do Projeto), que, por sua vez, manterá um registro de todos os habilitados por área profissional, que preencherem os requisitos[34] exigidos, entre os quais, apresentar certificado de capacitação mínima, por meio de curso realizado por entidade credenciada pelo Tribunal”[35].
Em razão disso, verifica-se que o Judiciário torna-se mais cidadão, porque traz, para dentro do Código, institutos como a conciliação e a mediação, com a finalidade de desafogar o Judiciário, na tentativa de diminuir a lentidão e a morosidade dos processos. O que se pode observar é que a mediação, aos poucos, vai se fazendo presente, porém o mais importante é a mudança na forma de pensar dos operadores do Direito, é fazer com que estes tenham uma cultura no acordo, permitindo que surjam métodos alternativos capazes de resolver os conflitos existentes entre as partes.
Pinho, nesse aspecto, pondera que, com o passar do tempo, espera-se que ocorra o amadurecimento da sociedade, no sentido de que passe a ter um papel mais ativo na procura de soluções e no gerenciamento dos conflitos, abandonando a atual postura de recorrer sempre e de forma automática ao Judiciário, uma vez que a regra ainda é o litígio, ou seja, buscar a Jurisdição antes mesmo de tentar dialogar com a parte contrária ou mesmo considerar a hipótese de recorrer a um meio alternativo para a solução daquele conflito[36].
Analisa-se ainda, a Resolução 125 do Conselho Nacional de justiça[37], publicada em 29 de novembro de 2010, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário.
A Resolução trata sobre a ampliação do acesso à justiça e da pacificação do conflito por meio dos métodos consensuais, considerando que a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que sua apropriada disciplina em programas já implementados nos país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças, sendo imprescindível estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais.
Segundo entendimento de Morgana Richa[38], a resolução conseguiu o efeito de ser um normativo nacional, com diretrizes, concepções estruturais e modelos para se colocar em funcionamento, mas preservou as peculiaridades e as especificidades do sistema, ponderou, observando que prevaleceu no CNJ a ideia de que a Semana Nacional de Conciliação não pode ser extinta. É impressionante a força que demonstra o Poder Judiciário ao trabalhar de forma uníssona, afirmou, lembrando que a comunicação que se consegue com a sociedade nessa semana não é encontrada em nenhum outro projeto do CNJ.
Ainda, a resolução prevê a criação de núcleos permanentes de métodos consensuais de solução de conflitos e de centros judiciários de solução de conflitos e cidadania[39], bem como prevê bancos de dados, nos tribunais, sobre as atividades de cada centro de conciliação.
Nesse aspecto, o ministro Gilmar Mendes, do STF, referiu que atualmente a existência de grande quantidade de processos em tramitação no Judiciário é o que leva a uma taxa de aproximadamente 86 milhões, existindo hoje, a necessidade de se fazer uso sistemático da prática da conciliação. “A taxa de congestionamento mostra que um em cada três cidadãos brasileiros possuem ao menos uma ação na Justiça”, enfatizou ele, ao completar que “não existe outra alternativa a não ser a busca de modelos alternativos de solução de conflitos, como a conciliação, para dar celeridade e fazer com que o Judiciário atue de forma ativa”[40].
Ainda, nesse sentido, diz Kasuo Watanabe[41] que a redução dos processos judiciais é muito importante, mas ela é uma consequência da pacificação das partes conflitantes. Com essa pacificação, abre-se o caminho para a conciliação e para uma mudança de consciência da sociedade sobre como solucionar os seus conflitos de maneira pacífica. Acrescenta que a resolução do CNJ ganha ainda mais importância em se tratando de um país como o Brasil, em que tanto o Judiciário quanto os cidadãos estão acostumados a uma cultura da sentença, da solução de conflitos adjudicada pela autoridade estatal.
5 Considerações finais
Face ao crescente volume de causas que são submetidas ao Poder Judiciário, este não mais consegue solucioná-las de forma célere e eficaz, conforme espera a sociedade. Diante disso, faz-se necessária a busca por alternativas de acesso à justiça, das quais se destaca a mediação, cuja prática vem tomando relevo.
Independente da causa a ser solucionada, a mediação pode ser iniciada antes mesmo da proposição formal de qualquer ação em juízo, no andamento do processo, ou em qualquer fase em que haja discordância sobre algum ponto que seja considerado essencial e não esteja sendo devidamente cumprido.
O destaque do uso da mediação para a resolução de conflitos familiares se dá, entre outros fatores, pela alta dose de sentimentos por detrás do conflito, cuja compreensão pela outra parte é preciso para que se construam soluções satisfatórias a ambas.
É o mediador, um terceiro competente e imparcial que, no ambiente informal da mediação, auxilia o diálogo entre as partes para a construção dessas soluções, construção que se configura em um verdadeiro exercício de cidadania. Diferentemente da Justiça do Estado, o qual um terceiro elabora uma sentença com base nos fatos e pedidos trazidos na peça vestibular, sem solucionar verdadeiramente o conflito.
Devemos incentivar o uso de alternativas criativas ao modelo tradicional de justiça, sem desprestigiá-lo [42], sobretudo nas demandas onde há/houve afeto, relações familiares, competindo tal tarefa ao Judiciário e aos operadores do direito. Afinal, o Estado Democrático de Direito implica em uma justiça eficaz, célere e ao alcance de todos.
Por fim, pode se concluir a importância da mediação para o processo, bem como na solução dos litígios, uma vez que surge para contribuir no meio jurídico e nas comunidades, como forma de prevenção da má administração de conflitos, acesso à justiça, pacificação e solidariedade social.
Informações Sobre os Autores
Taise Rabelo Dutra Trentin
Mestre em Direito Público na Universidade de Santa Cruz do Sul -UNISC, pós-graduada em direito empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Pós-graduada pelo Escola da Magistratura do Rio Grande do Sul – AJURIS, e advogada. Integrante do Grupo de Pesquisas “Políticas Públicas no tratamento dos conflitos”, e integrante do grupo de Pesquisas “Políticas Públicas para a Inovação, Proteção Jurídica da Tecnologia e Desenvolvimento”, vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito, Mestrado e Doutorado, da UNISC e certificado pelo CNPQ
Sandro Seixas Trentin
Advogado. Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL e Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera – UNIDERP. Professor no curso de Pós-graduaçãoo em Direito Civil na Universidade Luterana do Brasil ULBRA. Participou como integrante do Grupo de Pesquisas Políticas Públicas no tratamento dos conflitos coordenado pela Prof. Pós-Dra. Fabiana Marion Spengler e do Grupo de estudos de Políticas Públicas para a Inovação e a Proteção Jurídica da Tecnologia coordenado pela Prof. Pós-Dr. Salete Oro Boff vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito Mestrado e Doutorado da UNISC e certificado pelo CNPQ