Resumo: O presente trabalho acadêmico vem com o propósito de apresentar o Instituto da Arbitragem como um caminho alternativo na solução de controvérsias, tudo sob o ponto de vista internacional aliado às vertentes nacionais. Primeiramente será realizada uma abordagem geral acerca da arbitragem, juntamente com suas inovações legislativas. Em seguida demonstrar-se-á a busca pelo árbitro do ordenamento jurídico mais adequado na solução dos litígios, como também serão examinadas as especificidades da cláusula arbitral e do compromisso arbitral. Por fim, nos ateremos no controle que o Poder Judiciário esta apto a realizar nas decisões arbitrais, juntamente com os critérios observados na homologação de sentenças internacionais, possibilidade de medidas cautelares e a anulação da sentença.[1]
Palavra-chave: Arbitragem. Cláusula Arbitral. Poder Judiciário. Laudo Arbitral
1 INTRODUÇÃO
A globalização trouxe para o mundo a quebra das fronteiras estatais. Resta comprovado que nenhuma nação por mais forte que seja consegue sobreviver sozinha, sem interagir ou mesmo depender de outras.
As transações comerciais ultrapassam os limites territoriais, diminuindo as distâncias e unindo um planeta outrora dividido.
Com o crescente número de transações comerciais se tornou imprescindível um meio mais célere que viesse solucionar as controvérsias naturalmente vindouras destas transações, visto que o meio judicial se mostrava cada vez mais assoberbado e consequentemente moroso.
Diante desta realidade que trazia consigo necessidades ávidas em serem atendidas, o Instituto da Arbitragem se mostrou mais que um meio alternativo, tornando-se uma constante no meio comercial, seja ele internacional ou próprio de cada país.
A realidade mundial não nega, atualmente, estima-se que 90% dos contratos internacionais de comércio possuem a cláusula arbitral. Os números aumentam mais quando se analisam contratos referentes à construção de complexos industriais e projetos de construções similares, chegando a perfazer 100% a presença da cláusula arbitral.
Diante de tal fato pode vir a nascer a indagação, por que o comércio mundial tem recorrido tão ferozmente à arbitragem?
Uma transação comercial realizada entre partes domiciliadas em países diferentes traz consigo incertezas e inseguranças concernente a um possível litígio acerca de seus direitos no respectivo pacto comercial.
Nestes casos, somente a arbitragem é capaz de assegurar que nenhuma das partes incorrerá no risco de uma possível controvérsia sobre o negócio pactuado vir a ser resolvido pelo Tribunal Estatal da parte adversa.
Trazendo a realidade brasileira, ainda podemos encontrar outros motivos que levam à escolha da arbitragem. A conhecida e inevitável morosidade do Poder Judiciário em solucionar os litígios a ela encaminhados, a possível falta de conhecimentos técnicos dos magistrados em absorver a complexidade de uma transação comercial internacional, bem como a inexistência no Brasil de Varas especializadas em assuntos internacionais.
Com a instituição de um Tribunal Arbitral as partes abnegam seu direito de ver seu litígio resolvido pelo Estado, optando pela justiça privada, composto por um árbitro único ou a maioria deles, designados, em princípio pelas partes, ou por uma entidade por elas indicada.
Com isso, a Convenção de Arbitragem, por força de seus efeitos possui a prerrogativa de afastar a jurisdição das justiças estatais tanto do país de uma parte como de outro, garantindo um julgamento imparcial e livre de qualquer influência tendenciosa.
A ordem jurídica vislumbra na arbitragem um meio legítimo e eficaz de solução de litígios. Alicerçados na convenção de arbitragem, o árbitro exerce suas atribuições como um juiz de fato e suas decisões possuem efeito de coisa julgada com força executória semelhante as desenvolvidas por tribunais estatais.
O que antes constituía em um terreno desconhecido e pouco explorado, hoje a arbitragem internacional é dotado de um amplo aparato legislativo transnacional, formado por convenções internacionais, leis internas, regulamentos sobre a formação e manutenção de arbitragem, usos e costumes devidamente reunidos, instituições de arbitragem com bases sólidas e confiáveis. Isso tudo somado ao amplo número de profissionais e operadores do direito que se dedicam a aperfeiçoamento deste instituto, como árbitros, advogados, estudantes, doutrinadores, etc.
Pretendo com o presente trabalho elucidar pontos ainda controvertidos deste instituto, com elucubrações pertinentes ao caso e assim somar no universo acadêmico.
2 ARBITRAGEM COMO INSTITUTO ALTERNATIVO DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS
Hodiernamente, a possibilidade de resolução de um conflito comercial por meio da arbitragem é considerada, em muitos casos, o caminho mais viável.
Fora da esfera do judiciário esse meio alternativo constitui o meio mais utilizado para solução de litígios empresariais, e por sua natureza particular, possui características especialíssimas.
Formam a base da arbitragem os princípios da boa-fé e da autonomia da vontade das partes, assim como suas fontes podem ser contratuais e consensuais, mesmo que ordenamentos jurídicos estatais venham dela se ocupar.
Vale dizer que a possibilidade de ter seu conflito resolvido pela arbitragem é uma faculdade oferecida às partes, e por elas decidida, ou seja, é a chamada arbitragem voluntária, onde as partes decidem previamente ou na ocorrência do litígio solucioná-lo através deste instituto.
Com efeito, a arbitragem obrigatória é aquela em que Estado impõe compulsoriamente às partes solucionar determinados tipos de controvérsias por meio da arbitragem. Apesar de existente em vários países, esse tipo de arbitragem não existe no Brasil, por entender-se que violaria o principio da indeclinabilidade do Poder Judiciário.
Sendo assim, um dos propósitos fundamentais da arbitragem será sempre o de contemplar as expectativas das partes a fim de solucionar a contenda em questão.
O árbitro escolhido pelas partes tem sua competência independente do Estado e seu ordenamento jurídico, e para exercer suas tarefas recebe seus poderes e tem sua missão definida nos termos da Convenção de Arbitragem, sendo esta a sua lei.
Diferentemente do ocorrido em uma mediação ou conciliação, o árbitro, ao analisar o caso concreto, imporá sua decisão às partes, devendo, no entanto, sempre respeitar a ordem pública e observar os interesses do Estado e da coletividade.
Mesmo os efeitos de uma decisão arbitragem serem, em suma, limitados às partes do litígio, as consequências são sentidas por toda a comunidade de negócios, seja ela nacional ou internacional, no sentido de muitas vezes servir de paradigma para futuras controvérsias. Por isso, sua consonância com os ordenamentos estatais coercitivos é primordial para a estabilidade e segurança das relações comerciais e econômicas.
2.1 ARBITRAGEM NO ÂMBITO NACIONAL E INTERNACIONAL
Em princípio não há diferença entre arbitragem interna e arbitragem internacional, ambas se ocupam da solução de litígios, mediante aplicação de regras previamente escolhidas pelas partes, por julgadores não governamentais por elas designados, cujas decisões são passíveis de execução forçada, bem como coerção dos juízes ou tribunais estatais.
Há ainda as arbitragens interestatais, com características e peculiaridades próprias. Inserida no Direito Internacional Público, tem como árbitros os chefes de Estado. A função desta modalidade de arbitragem é a busca da solução dos diversos litígios presentes nas relações interestatais, inclusive, podendo ser conflitos comerciais.
Ademais, os princípios basilares que regem ambas são os mesmos, autonomia das vontades das partes e a boa-fé.
A determinação da nacionalidade de uma arbitragem se faz necessária por alguns motivos, são eles: a fixação da lei que irá regular a arbitragem, que em princípio, será dessa nacionalidade; a fixação do tribunal estatal que poderá vir a ter jurisdição sobre o processo arbitral, na necessidade de uma intervenção estatal como a obtenção de uma cautelar ou mesmo na imposição judiciária de se realizar a arbitragem; e por fim, identifica o procedimento a ser seguido na execução do laudo arbitral.
Na Lei Modelo da UNCITRAL[2], são dedicadas disposições separadas para a arbitragem interna e internacional, alguns países como a França, adotaram esta separação. Já países como Brasil, Holanda e Inglaterra dispensaram as mesmas disposições legais para as duas formas de arbitragem.
Sob a ótica da Lei brasileira, nº 9.307/96 [3], não há coloquialmente arbitragem internacional, mas sentença arbitral estrangeira, conforme coloca os artigos 34 a 40 do respectivo dispositivo legal, que vem tratar apenas da homologação das sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro, para fins de execução na justiça brasileira.
Para caracterizar a arbitragem como interna ou internacional, a legislação brasileira utiliza-se somente do critério geográfico, ou seja, se o Tribunal Arbitral tiver sede no país, a sentença arbitral será nacional, concretizando uma arbitragem interna, mesmo que, por ventura, estejam envolvidas partes sediadas no exterior, houver incidência de leis estrangeiras ou mesmo objeto conectado a país diverso.
Desta forma, se conclui que a legislação brasileira não se deteve em definir arbitragem internacional, mas se limitou na elucidação da sentença arbitral estrangeira. Conforme observa Carlos Augusto da Silveira Lobo, “teremos de nos contentar em dizer que seria internacional a arbitragem comercial que produz uma sentença conectada a sistemas legais de dois ou mais países: o em que foi proferida e o(s) em que deverá ser executada”[4].
2.2 LEI Nº 9.307/96 E SUAS INOVAÇÕES NO DIREITO BRASILEIRO
No período antecessor a Lei nº 9.307/96, o ordenamento jurídico brasileiro não favorecia a prática da arbitragem no país. Porquanto, o Código de Processo Civil não conferia os efeitos de afastar o juízo estatal e consequentemente a obrigação de instituir a arbitragem à cláusula compromissória, mas tão somente ao compromisso.
Essa postura anacrônica tornava a arbitragem obsoleta, visto que a parte não confiante em seu direito, diante do litígio concreto, tendia a não cumprir a cláusula compromissória negando-se ao compromisso, e se valendo da tradicional morosidade judiciária.
Essa era a realidade brasileira até a publicação da Lei nº 9.307 em 23 de Setembro de 1996, seguida pela declaração de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal por via do Agravo Regimental em Sentença Estrangeira nº 5.206-7 em 2001[5]. Com isso, arbitragem passou a ser uma constante na rotina comercial e empresarial, e constituindo objeto de estudo dos doutrinadores e operadores do direito.
Posteriormente, veio a adesão à Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, conhecida como “Convenção de Nova Iorque” , pelo Decreto 4.311 de 23 de Julho de 2002[6]. Tal feito, junto com a Lei de Arbitragem, sedimentou o ingresso do Brasil no mundo da arbitragem internacional, fomentando as transações comerciais internacionais, visto o Brasil ter se tornado um país mais confiável com a garantia de que as sentenças arbitrais aqui prolatadas serão igualmente conhecidas e executadas nos países que se subordinam à aplicação da Convenção de Nova Iorque à reciprocidade.
No Direito Brasileiro as inovações trazidas pela Lei nº 9.307/96 foram bastante significativas, tanto na arbitragem nacional como na prática da arbitragem internacional.
No campo nacional, duas mudanças principais podem ser observadas, a possibilidade de execução específica da cláusula compromissória e a equiparação do laudo arbitral a uma sentença judicial, dispensando assim a necessidade de homologação pela autoridade judiciária, conforme arts. 4º, 18 e 31, respectivamente da Lei 9.307/96[7].
Com a edição do supramencionado dispositivo legal foram equiparados tanto no campo interno como no internacional, os efeitos da cláusula compromissória e do compromisso arbitral. Desta forma, a adoção da cláusula compromissória na constituição contratual, desde já obriga a instauração do juízo arbitral. A igualdade coercitiva entre ambas, cláusula e compromisso, é confirmada na utilização do termo “convenção de arbitragem”, de acordo com o artigo 3º da Lei 9.307/96, in verbis:
“Art. 3º: As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.”
Vale salientar que, na prática brasileira ainda se exige a celebração dos dois instrumentos para a celebração do juízo arbitral sempre que as partes previamente não estabelecerem de forma expressa a forma de instauração da arbitragem. Entretanto, se uma das formas já vier inserida na cláusula compromissória, uma das partes não pode mais, unilateralmente, revogar o acordado e recorrer ao judiciário.
Quanto à segunda inovação no campo nacional trazida pela Lei de Arbitragem, de fato foi equiparado o laudo arbitral a sentença judicial, perfazendo a ideia de que o árbitro é o juiz da arbitragem, e a sua decisão, a sentença arbitral, produz coisa julgada material, só podendo ser desconstituída pela decretação de nulidade da sentença, categoricamente tratada nos artigos 32 e 33 da respectiva Lei.
Na seara internacional, a instauração da arbitragem também prescinde da celebração mútua da cláusula arbitral e do compromisso, uma vez que a cláusula por si só é suficiente para instauração do juízo arbitral, regra já adotada por convenções internacional incluindo a de Nova Iorque[8].
Inovações igualmente relevantes também foram trazidas pela Lei de Arbitragem, a dizer, a extinção da necessidade de dupla homologação dos laudos arbitrais produzidos no exterior e a admissibilidade da via postal para a citação da parte domiciliada no Brasil [9].
Sendo assim, para a homologação de sentenças arbitrais advindas do estrangeiro não se faz mais necessária a homologação judicial destas nos seus países de origem, absolutamente, para no Brasil serem executadas basta que tenham sido devidamente homologadas pelo Superior Tribunal de Justiça.
Cabe frisar que a mencionada Lei atribuiu requisitos específicos para a homologação de laudos arbitrais sucedidos no exterior, diversos dos exigidos para a homologação de sentenças estrangeiras.
Outro ponto é a desnecessidade que a citação da parte domiciliada ou residente no Brasil seja apenas realizada por carta rogatória, passando a ser admitida a citação por via consular, diplomática ou por via postal, com os devidos trâmites legais, conforme o parágrafo único do artigo 39 da Lei de Arbitragem, in verbis:
Art. 39. (…)
Parágrafo único. Não será considerada ofensa à ordem pública nacional a efetivação da citação da parte residente ou domiciliada no Brasil, nos moldes da convenção de arbitragem ou da lei processual do país onde se realizou a arbitragem, admitindo-se, inclusive, a citação postal com prova inequívoca de recebimento, desde que assegure à parte brasileira tempo hábil para o exercício do direito de defesa.”
Todavia, mesmo com essas possibilidades de citação, a sentença arbitral estrangeira não será admitida se for comprovado que a parte brasileira deixou de exercer seu direito de defesa por falta de tempo hábil.
Todas essas realizações trouxeram à arbitragem brasileira eficácia nunca dantes visualizada, e consequentemente mais credibilidade do ponto de vista internacional.
3 LEGISLAÇÃO APLICADA A ARBITRAGEM NOS CONTRATOS INTERNACIONAIS
Ainda hoje, inexistem no Brasil critérios mais expressivos que delimitem as lides suscetíveis à arbitragem. Todavia, de acordo com a Lei 9.307/96, a arbitragem é permitida para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis[10].
É cogente para as partes conhecer os limites impostos pelo Estado à arbitragem, afinal, na medida que uma lide não for a ela suscetível, toda a convenção de arbitragem será nula, bem como todo o desenvolver dos procedimentos, por ventura, já adotados, incluindo eventual decisão já proferida.
As regras a serem seguidas no procedimento arbitral são escolhidas com certa liberdade pelas partes e na ausência destas pelos árbitros. O Regulamento da UNCITRAL garante ao Tribunal o poder de dispor sobre o processo, no que as partes forem omissas, e a estabelecer regras processuais supletivas na omissão das partes e do Tribunal.
Apesar de toda liberdade conferida, as regras da UNCITRAL não se olvidaram em garantir igualdade de condições entre as partes na disputa, além do direito de apresentarem suas razões em qualquer estágio do processo, conforme artigo 18 do Regulamento, in verbis:
“Art. 18- Igualdade de tratamento das partes:
As partes devem ser tratadas em pé de igualdade e devem ser dadas a cada uma delas a possibilidade de fazerem valer seus direitos.”
Comumente, os tribunais têm interpretado que quando as partes optam pela sede da arbitragem elas implicitamente escolhem as regras procedimentais daquele foro.
A Lei 9.307/96 prevê que as partes poderão decidir pela resolução do litígio por meio dos princípios gerais do direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais do comércio, a lex mercatoria[11].
Cabe ainda elucidar a possibilidade de um tribunal arbitral decidir uma lide por equidade, conforme assim pactuada pelas partes. Nestes casos, os árbitros se vêem dispensados de aplicar normas jurídicas abstratas, inclusive as de natureza cogente provenientes de tratados internacionais. Mesmos nestes casos, as decisões arbitrais serão de mérito.
3.1 APLICAÇÃO DO DIREITO PELO ÁRBITRO
Da mesma forma que um juiz estatal, um árbitro também aplica o direito ao caso concreto. E, antes de tudo deve decidir qual o direito aplicável conforme as normas de direito internacional privado aplicáveis às relações jurídico-obrigacionais da lei do foro, e a partir daí decidir as causas materialmente, salvo tenha sido exercido pelas partes a autonomia da vontade neste aspecto também.
A lei a ser aplicada pelo árbitro da resolução da lide deve primeiramente respeitar a vontade das partes quando da celebração da convenção arbitral. Observa-se que o principio da autonomia das vontades que instaura a arbitragem também deve ser plenamente respeitado quando for determinada a lei a ser aplicada.
Vale dizer que, em uma arbitragem nacional, envolvendo somente partes brasileiras, aqui domiciliadas, com relações pactuadas, celebradas e executadas no país, pode ser regulada por uma lei estrangeira, caso isso perfaça a vontade das partes, salvo hipóteses de fraude à lei e ofensa à ordem pública.
A escolha do ordenamento jurídico a ser aplicado pode ser feita a qualquer momento do processo. Tanto na hora da celebração contratual, vindo como cláusula autônoma, ou posteriormente ao surgimento da controvérsia.
Contudo, caso as partes não tenham previamente estipulado qual a Lei aplicável ao litígio, cabe ao árbitro com perfeita liberdade fixar a lei a ser aplicada ao mérito da questão, sem precisar, para tanto, necessariamente, recorrer às regras de conexão do lugar da arbitragem ou de qualquer outro lugar, principalmente quando entender aplicável o ‘princípio da proximidade’ no caso concreto.
Pelo ‘princípio da proximidade’ o árbitro deve buscar, na solução da controvérsia, a lei mais próxima da realidade das partes e do próprio litígio, o que não precisa ser, necessariamente, vincular-se apenas à questões territoriais.
Esse e outros princípios se encontram previstos dentro da UNIDROIT – Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado, que teve seu Estatuto Orgânico adotado em 1940 pela Assembléia Geral dos estados Membros. No Brasil foi aprovada pelo Decreto de nº 884 de 1993[12].
Diverso do que ocorre com o juiz estatal, para o tribunal arbitral inexiste qualquer lei do foro, afinal a competência dos árbitros para decidir uma lide advém tão somente da convenção de arbitragem, sendo a localização da sede do tribunal meramente casual.
Como ocorre em grande parte dos casos, na arbitragem privada internacional, o laudo não é executado no país da sede do tribunal arbitral, que quando escolhido de forma casual, as partes não tem quase nenhuma relação. Assim, almejando a efetivação do laudo arbitral, o tribunal precisa observar os direitos dos países em que as partes pretendem executar o mesmo, caso não seja cumprido voluntariamente.
Outro ponto que torna necessária essa observância é a possibilidade de recurso perante o Poder Judiciário competente, que será o da sede do tribunal arbitral.
3.2 VALIDADE E AUTONOMIA DA CLÁUSULA ARBITRAL
Como já colocado no presente trabalho, não existe mais qualquer distinção cogente entre a cláusula arbitral e o compromisso, ambos possuem a mesma força coercitiva, variando apenas o momento em que cada um é praticado. Para tanto, foi criada a nomenclatura ‘Convenção de Arbitragem’, na qual as partes mutuamente consentem em submeter suas controvérsias ao julgamento de árbitros alheios a qualquer sistema judiciário estatal, vinculando-se à decisão proferida pelo tribunal.
No caso da convenção não vir designando os árbitros competentes para solucionar a contenda, e nem mesmo estabelecer os métodos de escolha, a Lei Modelo da UNCITRAL prevê à autoridade judiciária a competência de nomeação do tribunal, o qual logo que instalado, será o habilitado para dar prosseguimento processual.
Não obstante suas inovações, a Lei 9.307/96 manteve a possibilidade do compromisso seguir-se à cláusula arbitral, mesmo com a previsão de supressão pela sentença arbitral, conforme o parágrafo 7º do artigo 7, in verbis:
“Art. 7º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim. (…)
§ 7º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.”
Já na arbitragem internacional, advindo a manifestação das partes em utilizar a arbitragem como forma de resolução das controvérsias existentes ou futuras, tudo é empreendido para que a mesma seja concretizada, suprindo-se as omissões da convenção, sem qualquer necessidade de formalização por compromisso, sendo este realizado apenas quando não existir uma cláusula compromissória válida.
Pelo princípio da autonomia ou separabilidade, atualmente consagrado nos regulamentos constitucionais e legislações sobre arbitragem, a convenção é totalmente independente do contrato, mesmo fazendo parte de seu conteúdo.
Uma das consequências desta autonomia reside no fato de que uma possível nulidade contratual não possui o condão de anular a convenção de arbitragem, ou seja, sua validade não depende da validade do contrato no qual esta inserida. Desta feita, com a legitimidade conferida à cláusula há a manutenção da competência dos árbitros para decidir sobre a arguição de invalidade do contrato principal e suas devidas consequências.
Ainda há a possibilidade do contrato ser válido e a cláusula não, cabendo aos árbitros verificar se todos os requisitos da arbitragem foram respeitados e por fim decidir sobre a existência de sua própria competência.
Outro ponto resultante desta separação é a possibilidade das partes elegerem uma lei para reger o contrato e outra para a convenção de arbitragem, sem qualquer prejuízo.
A validade da cláusula arbitral é plenamente defendida pelos tribunais judiciários internacionais, que tendem sempre a garantir sua execução. Na ocorrência de uma controvérsia contratual que traga em seu conteúdo a previsão da arbitragem, se a causa for ingressada em tribunais judiciais, estes se declararão incompetentes, rejeitando ou suspendendo a ação, remetendo as partes à arbitragem. O mesmo possivelmente acontecerá se o tribunal arbitral intentado for diverso do estipulado pelas partes na convenção.
4 ATUAÇÃO JURISDICIONAL SOBRE O LAUDO ARBITRAL
Os árbitros em um processo são livres para seguirem suas convicções e elaborarem suas decisões, que não precisam ser unânimes. Todavia, as mesmas precisam ser fundamentadas, mesmo quando tomadas por equidade.
Assim como os juízes estatais, os árbitros no exercício de sua função julgadora têm o dever de agir segundo prediz a ética processualista. Os princípios da imparcialidade, da livre convicção também são conferidos aos julgadores na arbitragem.
Publicada a decisão, as partes poderão requerer a correção de erros materiais, tipográficos ou de cálculos que constem da decisão, além da possibilidade de solicitar aos árbitros a interpretação das sentenças que porventura sejam dúbias.
No julgamento de uma lide, o árbitro decide sob as pretensões das partes como um juiz de fato e de direito. Sua decisão, a sentença arbitral, possui força jurisdicional na forma, elementos, efeitos, força obrigatória e exeqüibilidade como título executivo judicial. Sendo assim, o controle judicial da sentença arbitral é mitigado não apenas pela lei, mas também pela própria natureza da atividade arbitral.
Tal controle, é encarado com uma forma de compelir os árbitros a conduzirem seus processos com cautela e prudência, principalmente no que tange os regramentos legais imperativos aplicáveis ao caso e o respeito a ordem pública.
Mesmo assim, essa intervenção jurisdicional, muito embora cogente, deve ser realizada com contenção, na medida em que não venha a prejudicar a arbitragem como instituição legítima que configura. Sobre isto, oportunas palavras são apontadas por Ricardo Ramalho Almeida:
“O controle judicial da sentença arbitral, conquanto necessário e desejável, como via de remediação de ilegalidades e desvios intoleráveis, deve, entretanto, pautar-se pela moderação e pelo respeito à vontade negocial que esta na origem do pacto arbitral, considerando, ainda, o caráter jurisdicional da atividade desempenhada pelo árbitro”[13].
Existe um interesse geral reconhecido pelo Estado, de que por meio da arbitragem os conflitos sejam solucionados com a referida aplicação das regras de direito. Trata-se de uma espécie de delegação da própria função jurisdicional, sem para tanto, existir qualquer intervenção jurisdicional estatal adicional, salvo se para coibir as mais graves violações de princípios fundamentais.
Sendo assim, o mérito da causa, como também possíveis equívocos na substância do julgamento, não devem ser controlados pelo poder estatal, assim como, a apreciação dos fatos e provas pelos árbitros não comportam censuras, seu pronunciamento é soberano e definitivo.
4.1 RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DE LAUDOS ARBITRAIS ESTRANGEIROS
Os trâmites necessários para reconhecimento e execução dos laudos arbitrais estrangeiros primordialmente se encontram na Convenção de Nova Iorque, que trata exaustivamente da questão. Tanto que seus ditames podem ser aplicados aos laudos arbitrais proferidos por Estados não-membros, salvo se o Estado reconhecedor do laudo, ao ratificar ou aderir a Convenção, tenha ressalvado seu direito de só aplicá-la aos Estados membros da mesma.
Cada Estado membro da Convenção tem como princípio reconhecer um laudo arbitral estrangeiro como vinculante e consequentemente o executar de acordo com suas próprias normas processuais.
O objetivo precípuo da Convenção é o de favorecer o reconhecimento das sentenças arbitrais estrangeiras. Em razão disso, a parte interessada pode optar pela aplicação do direito de origem interna ou de outros tratados, multilaterais ou bilaterais, desde que facilitem mais a validação da sentença.
A Lei 9307/96 considerou a realidade mundial ao dispor que a sentença arbitral estrangeira será reconhecida ou executada no Brasil em conformidade com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno, ou na ausência destes, serão consideradas as legislações de origem interna.
Em rigor, os princípios presentes na Convenção foram adotados pela Lei de Arbitragem[14], conforme demonstra seu artigo 38, que enumera os motivos que resultam na denegação da sentença arbitral estrangeira, in verbis:
“Art. 38. Somente poderá ser negada a homologação para o reconhecimento ou execução de sentença arbitral estrangeira, quando o réu demonstrar que:
I – as partes na convenção de arbitragem eram incapazes;
II – a convenção de arbitragem não era válida segundo a lei à qual as partes a submeteram, ou, na falta de indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi proferida;
III – não foi notificado da designação do árbitro ou do procedimento de arbitragem, ou tenha sido violado o princípio do contraditório, impossibilitando a ampla defesa;
IV – a sentença arbitral foi proferida fora dos limites da convenção de arbitragem, e não foi possível separar a parte excedente daquela submetida à arbitragem;
V – a instituição da arbitragem não está de acordo com o compromisso arbitral ou cláusula compromissória;
VI – a sentença arbitral não se tenha, ainda, tornado obrigatória para as partes, tenha sido anulada, ou, ainda, tenha sido suspensa por órgão judicial do país onde a sentença arbitral for prolatada.”
A extinção da exigência do duplo-exequatur retirou a necessidade do laudo arbitral ser reconhecido judicialmente tanto no país em que foi proferido, quanto no país em que será executado. Assim, para os países membros da Convenção de Nova Iorque, qualquer laudo arbitral estrangeiro será reconhecido judicialmente e executado tal como um laudo nacional, após dito processo ter se concretizado, haja vista a paridade determinada pelo ordenamento jurídico pátrio dos efeitos jurídicos emanados de um laudo arbitral com a sentença judicial.
Vale lembrar que, com a Emenda Constitucional nº 45 de 31 de Dezembro de 2004, houve a transferência do juízo competente de homologar as sentenças arbitrais estrangeiras do Supremo Tribunal Federal para o Superior Tribunal de Justiça, seguindo, em especial os ditames da Resolução 09/2005 do STJ.
A sentença estrangeira arbitral para ser homologada no sistema brasileiro deve tão somente ser submetida a um exame formal e delibatório, não sendo avaliado o mérito do julgado ou mesmo questionado o direito utilizado pelo árbitro.
Para tanto, o único aspecto material analisado é sua conformidade com a ordem pública, ou seja, a coerência de seus resultados e efeitos com as exigências da ordem pública de vertentes internacionais, tal como as nacionalmente concebidas.
Em harmonia com a Convenção de Nova Iorque, o direito brasileiro previu expressamente o controle dos requisitos extrínsecos da sentença, de inexistência de violação à ordem pública ‘nacional’, sendo esta interpretada como a ordem daquele país, de que trata a Convenção de Nova Iorque, e não somente como a ordem pública ‘interna’.
Desta feita, só será permitido o indeferimento da homologação à sentença arbitral estrangeira nos casos específicos supramencionados, com a ocorrência de uma insustentável discrepância entre o modo como o laudo fora conduzido e produzido, e de outro os princípios mais fundamentais de juridicidade reconhecidos no país como irrenunciáveis.
Sendo competente o juízo homologatório da sentença arbitral estrangeira, este somente pode impedir o reconhecimento e a execução ex-officio quando, em congruência com sua lei do foro (lex fori), o objeto da lide não for suscetível a arbitragem, ou como dito, a sentença arbitral viole a ordem pública. Abaixo podem ser visualizadas decisões do STF e do STJ que recusaram a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras:
“SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SEC 6753 / UK – REINO UNIDO DA GRA-BRETANHA E DA IRLANDA DO NORTE. SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA. Julgamento: 13/06/2002. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. EMENTA: SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM. INEXISTÊNCIA. COMPETÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. HOMOLOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O requerimento de homologação de sentença arbitral estrangeira deve ser instruído com a convenção de arbitragem, sem a qual não se pode aferir a competência do juízo prolator da decisão (Lei 9.307, artigos 37, II, e 39, II; RISTF, artigo 217, I). 2. Contrato de compra e venda não assinado pela parte compradora e cujos termos não induzem a conclusão de que houve pactuação de cláusula compromissória, ausentes, ainda, quaisquer outros documentos escritos nesse sentido. Falta de prova quanto à manifesta declaração autônoma de vontade da requerida de renunciar à jurisdição estatal em favor da particular. 3. Não demonstrada a competência do juízo que proferiu a sentença estrangeira, resta inviabilizada sua homologação pelo Supremo Tribunal Federal. Pedido indeferido”[15].
Todos os demais casos passíveis de denegação de homologação devem ser invocados pela parte interessada, para que sejam devidamente considerados pelo juízo homologatório, sendo intolerável o repúdio a sentenças estrangeiras pelo simples fato de terem sido alcançadas com soluções diversas das esperadas quando aplicado o direito nacional.
4.2 EXECUÇÃO DE LAUDOS ARBITRAIS NACIONAIS
A realidade jurídica brasileira anterior a Lei 9307/96 dificultava em demasia a resolução de litígios pela arbitragem. Seja pela exigência da homologação judicial para um laudo arbitral se tornar exeqüível, seja pela obrigatoriedade de perfazer o compromisso arbitral, a verdade era que o instituto da arbitragem consistia em um processo dificultoso, cercado de impedimentos e incertezas.
Com o advento da Lei de Arbitragem importantes inovações foram trazidas, sobretudo, no que concerne à execução dos laudos arbitrais.
A sentença proferida pelo árbitro passou a ser equiparada a uma sentença judicial, sendo aquele agora também igualado a um juiz de direito. Com os mesmos efeitos que uma sentença produzida pelo Poder Judiciário, a decisão arbitral passou a ser exeqüível per si, prescindindo de qualquer homologação judicial.
Outro ponto que provocava bastante instabilidade na concretização da arbitragem era a exigência de se perfazer o compromisso arbitral mesmo com a perfeita existência da predecessora cláusula arbitral.
Recorrente era a situação de um processo transcorrer na mais perfeita normalidade, e ao final a parte vencida, que em momento algum havia declarado qualquer nulidade processual, vir a alegar na falta do compromisso a existência de uma, como forma de se eximir de seu óbice final[18].
Isso tudo foi superado pela Lei 9307/96, que trouxe ao instituto da arbitragem mais segurança e seriedade em seus atos, assim como a solidez e a autonomia em seus julgamentos.
4.3 MEDIDAS CAUTELARES NA ARBITRAGEM
Apesar de suas especificidades e sua eficácia cogente a arbitragem não possui a mesma força presente nos processos judiciais, que têm a disposição um amplo aparato de medidas coercitivas.
Frente a isto, quando uma parte estiver coibida a se submeter a arbitragem ou já estiver assim procedendo, poderá ver resguardado seu direito por meio judicial através de medidas cautelares ou coercitivas. Essa possibilidade encontra resguardo no parágrafo 2º do artigo 23 do Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), regulamentado em 1998[19], in verbis:
“Artigo 23 – Medidas Cautelares e Provisórias (…)
§ 2º: As partes poderão, antes da remessa dos autos ao Tribunal Arbitral, e em circunstâncias apropriadas a partir daí, requerer a qualquer autoridade judicial competente que tome as medidas cautelares ou provisórias pertinentes. O requerimento feito por uma das partes a uma autoridade judicial para obter tais medidas, ou a execução de medidas similares ordenadas por um Tribunal Arbitral, não deverá ser considerada como infração ou renúncia a convenção de arbitragem, bem como não afetará os poderes e a competência reservados ao Tribunal Arbitral. Qualquer pedido ou medida implementada pela autoridade judicial deverá ser notificada sem demora à Secretaria. Esta, por sua vez, deverá informar tal fato ao Tribunal Arbitral.”
A demora na instauração do processo arbitral, com todos os seus trâmites, pode acarretar na deterioração total do objeto do litígio, vindo a tornar a arbitragem completamente inócua. A possibilidade de se requere cautelarmente ao judiciário o resguardo deste é uma forma também de assegurar a viabilidade arbitral.
De acordo com a situação, o juiz pode vir a decretar uma medida cautelar antes mesmo do início da arbitragem, como medida preparatória, submetida a todas as regras do Código de Processo Civil.
Outro ponto é, mesmo tendo instaurado o processo arbitral, se fizer necessária a concessão de uma cautelar. Como é atribuição exclusiva do Poder Judiciário conceder qualquer medida cautelar é defeso ao árbitro tal atitude, por não serem dotados do ius imperium, conforme parágrafo 4º do artigo 22 da Lei 9307/96, in verbis:
“Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante requerimento das partes ou de ofício. (…)
§ 4º Ressalvado o disposto no § 2º, havendo necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa.”
Para tanto, o magistrado analisaria o fumus boni iuris e o periculum in mora, na habitual cognição sumária, evitando apenas que sua decisão importe em indevida manifestação acerca do mérito da causa, que tão somente deve ser analisada pela arbitragem, conforme a vontade das partes em disputa.
O árbitro no exercício de suas atribuições não possui legitimidade para impor às partes medidas de caráter cautelar, ou mesmo designar diligências a serem solucionadas coercitivamente. Como já exposto tais medidas apenas podem ser decretadas pelo Judiciário, pois somente a este fora concedido o poder de sanção, contudo, pode o árbitro decretar uma medida, faltando-lhe apenas a força cogente.
Com a instituição da arbitragem e consequente nomeação do árbitro responsável levanta-se a seguinte questão, seria este ou o Tribunal Arbitral competentes para determinar a revogação da medida liminar anteriormente concedida pelo Poder Judiciário?
Vale lembrar que o objetivo de uma cautelar é tão somente a de assegurar que os interesses das partes na disputas não sejam depredados pela morosidade no alcance da solução final do conflito. Desta feita, a decisão alcançada por cautelar não é definitiva, mas tão somente provisória e subsidiária, vindo a serem substituídas pela decisão que vier a analisar o mérito da causa.
Visto isso, tido que a única função das cautelares é a de garantir uma eficaz prestação jurisdicional, e com tal característica efêmera, pode vir a ser revogada a qualquer tempo pelo árbitro, responsável pelo processo principal, caso este venha concluir que o perigo que outrora ameaçava o objeto do litígio se extinguiu.
É salutar relembrar que quando o juiz estatal concedeu a liminar o fez sob cognição sumaria, mesmo porque não poderia adentrar o mérito de uma questão submetida à arbitragem. Sendo assim, após analisar as razões das partes, sopesando as provas produzidas, o árbitro pode vir a concluir diversamente do juiz estatal, manifestando-se em definitivo.
A possibilidade de revogação por parte dos árbitros de uma decisão cautelar judicial, em nada ofende a soberania do Poder Judiciário, simplesmente sedimenta a ideia de fracionamento da atividade jurisdicional em pública e privada.
4.4 ANULAÇÃO DA SENTENÇA ARBITRAL
Por constituir em espécie da justiça privada, a arbitragem sempre fora cercada de muitas incertezas. As inovações trazidas pelas convenções internacionais, bem como internamente a Lei 9307/96, trouxe a este instituto mais credibilidade.
A presença do controle judicial e a consequente possibilidade de anulação de uma sentença arbitral veio sedimentar na arbitragem um caminho seguro na solução dos litígios.
O Poder Judiciário responsável pela Ação de Anulação da Sentença Arbitral será o do país onde a arbitragem teve sua sede, isto no que concerne a sentenças internacionais. É salutar explicitar que ‘sede’ não é uma vinculação física, ou seja, não é o local onde houve as audiências, diligências, ou mesmo o domicilio dos árbitros ou das partes. A sede será aquela livremente convencionada pelas partes, ou no silêncio destas, pelos árbitros que vierem a administrar o procedimento.
Quando há uma sentença arbitral prolatada no Brasil, seja ela interna ou internacional, ela será equiparada a uma sentença judicial e, por conseguinte submetida ao Judiciário brasileiro, inclusive em sua possível ação anulatória.
A problemática surge quando as sentenças arbitrais são prolatadas no exterior. Diverso do que ocorre com as sentenças judiciais que possuem a competência brasileira prevista pelo art. 88 do CPC, a sentença arbitral não tem sua competência assim designada.
A Lei de Arbitragem não contempla a possibilidade da propositura da ação anulatória no Brasil de sentença arbitral prolatada no exterior, pelo simples fato de entender que ação não existe juridicamente, a qual até ser homologada, não pode surtir qualquer efeito no território nacional. Desta feita, se não homologada não há sentença e neste caso não pode se submeter a uma ação anulatória.
Com a homologação pelo STJ da sentença arbitral estrangeira, se tem realizado o crivo judicial necessário para incorporá-la ao universo jurídico brasileiro, passível de surtir efeitos em todas as esferas legais. Por esse motivo não é cabível qualquer ação anulatória de uma sentença que já teve seu conteúdo analisado pelo processo homologatório.
5 CONCLUSÃO
Há décadas a arbitragem é utilizada nos países desenvolvidos, e teve sua regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro com a promulgação da Lei 9.307 de 1996, a conhecida Lei da Arbitragem.
Hoje ela é apontada como o método mais eficiente na resolução de conflitos, contribuindo demasiadamente para o descongestionamento do Poder Judiciário.
A autonomia das vontades das partes é a base da arbitragem, manifestada na medida que são elas que decidem primeiramente pela instituição arbitral, definindo os procedimentos que regerão o processo, estipulando o prazo final para conclusão, assim como escolhem os árbitros que julgaram a lide.
Salvo as peculiaridades que podem ser encontradas em diversos países, é certo que o Poder Judiciário se encontra assoberbado e moroso. Diante desta realidade as vantagens apresentadas pela arbitragem são inúmeras.
A facilidade em se instituir um tribunal arbitral, a agilidade com que as controvérsias são solucionadas, a celeridade mediante a qual o tribunal pode atuar aliado ao baixo custo processual, são alguns dos motivos que justificam a escolha da arbitragem.
A possibilidade de se escolher seus julgadores confere à arbitragem um caráter seguro e confiável, em razão de se poder ter profissionais qualificados e peritos nos assuntos tratados, especialistas na solução dos litígios com conexões internacionais e relacionadas ao comércio.
O sigilo que envolve os litígios bem como todo o procedimento arbitral, vem como forma de evitar exposições desnecessárias que causem execrações públicas difíceis ou impossíveis de serem reparadas.
Os infindáveis recursos presentes no sistema jurídico dificultam a resolução de uma lide, principalmente quando as causas são de grandes valores. Os prazos de conclusão de um processo arbitral são previamente estipulados, e a possibilidade de se recorrer contra um laudo perante a justiça estatal é limitado.
Hoje existe toda uma gama de convenções e Leis que servem de arcabouço para a arbitragem, definem com a maior precisão a forma como deve ser conduzido seu processo.
A autonomia assegurada à cláusula arbitral, tanto na sua independência perante o compromisso arbitral, quanto na sua não vinculação a validade do contrato; a queda da exigência do duplo-exequatur; e a firmação do laudo arbitral como sentença extrajudicial plenamente executável, foram imprescindíveis para a sedimentação do instituto da arbitragem no universo comercial internacional.
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Cynthia Cinara Carvalho Lima