Resumo: Crítica à função simbólica de textos constitucionais ao abordar seu significado social e político que possui relação inversa de sua concretização jurídica. A constitucionalização simbólica atua como mecanismo de bloqueio e politização do sistema jurídico, maculando as relações entre cidadão e Estado. Verifica-se a atuação de diferentes mídias como aliadas da obscuridade e ineficácia de normas constitucionais, através da manipulação de informação. Assim, objetiva-se objurgar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 06/2011) do Senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para adicionar o acesso a Internet no rol dos direitos sociais do cidadão no art. 6º da Constituição Federal, sob o âmbito da midiatização política.
Palavras – chave: constitucionalização simbólica, mídia, política, cidadania, emenda constitucional.
Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento 2.1. Politização do sistema jurídico e midiatização do sistema político. 3. Conclusão. Referências bibliográficas.
1. Introdução
Constituição é a organização jurídica fundamental de um país. É ela que constitui e define a estrutura do próprio Estado. As regras do texto constitucional são revestidas de superioridade no ordenamento jurídico. O núcleo temático desse diploma normativo trata da instituição e do exercício do Poder Estatal – sua organização e limitação – e define os direitos fundamentais das pessoas, constituindo seus destinatários todos os indivíduos, a sociedade e o próprio Estado que tem o dever de tutelar e respeitar esses direitos.
A Constituição Federal Brasileira, promulgada em 1988, em seu art. 60, dispõe que somente poderá ser emendada caso a proposta de emenda seja votada em cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos e possua 3/5 dos votos favoráveis dos respectivos membros. É através da Emenda Constitucional que o poder reformador, nas mãos do Poder Legislativo, atualiza e renova a Constituição para adaptá-la às novas realidades e valores da sociedade, na medida de sua evolução.
É passível de críticas o fato de sucessivas Emendas terem criado novos direitos constitucionais atropelando outros já previstos, que sequer tiveram sua regulamentação concretizada. A Carta Magna de 1988 já foi alterada por seis emendas de revisão e sessenta e seis emendas, fruto do poder constituinte derivado reformador.
Discute-se, assim, a função simbólica de textos constitucionais ao abordar seu significado social e político que possui relação inversa de sua concretização jurídica. São perversas as repercussões sociais de uma legislação constitucional normativamente ineficaz. A inovação tecnológica e o crescente acesso aos meios de comunicação em massa constituem fatores facilitadores da manipulação política da sociedade.
2. Desenvolvimento
2.1. Politização do sistema jurídico e midiatização do sistema político
A base cultural e educacional de uma sociedade deveria preceder a inovação e ao desenvolvimento. Azambuja (2003) considera que há quem negue ao povo a capacidade de formular julgamentos racionais, conscientes sobre os assuntos que devam ser objeto de opinião pública, entendem que a coletividade não tem aptidão nem conhecimento para refletir sobre problemas políticos. Incapacidade essa verdadeira que se faz sentir com a primariedade cultural e educacional da sociedade brasileira.
Para uma melhor compreensão da politização do sistema jurídico, necessário se faz entender o significado da expressão ciência política. Segundo Ferreira (2001, 153), ciência é o “conjunto metódico de conhecimento obtido mediante a observação e a experiência; saber e habilidade que se adquiri para o bom desempenho de certas atividades”. Ainda Ferreira (2001, 543) conceitua política como “modo acertado de conduzir uma negociação estratégica”. Portanto, conclui-se que o termo ciência política se refere não só ao controle da produção de informação, como também sua interpretação pública.
A mídia, nesse caso, é tida como ferramenta preponderante nas campanhas eleitorais. Os métodos sofisticados e as habilidades para a condução de uma campanha têm se situado entre publicitários, marqueteiros, pesquisadores, relações públicas e outros; substituindo as lideranças políticas, antes executadas pelos militantes. O objetivo dessa nova gama de cientista é simplesmente a vitória eleitoral. Uma sociedade desprovida de capacidade para julgar assuntos políticos fica suscetível à manipulação do sistema: tanto eletivo, quanto jurídico.
O que deveria funcionar como vinculação estrutural entre os sistemas político e jurídico, atua como mecanismo de bloqueio e politização do sistema jurídico, maculando as relações entre cidadão e Estado. De acordo com Neves (2007), os objetivos da legislação simbólica podem ser: confirmar valores sociais, demonstrar a capacidade de ação do Estado, e adiar a solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios.
A sobreposição do sistema político ao jurídico tem encontrado grande apoio nos meios de comunicação em massa, funcionando como canal de influência imediata de interesses particulares.
Caso em que, oportuno se faz analisar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 06/2011 do Senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para adicionar o acesso a Internet no rol dos direitos sociais do cidadão no art. 6º da Constituição Federal. A justificação inserida na proposta relata que “o Brasil ainda ocupava, em 2008, apenas a 69ª posição, entre 193, na lista da UIT (União Internacional de Telecomunicações)” . Esta parece ser uma preocupação mais política do que social.
Caso a emenda seja aprovada, o Estado se tornará o provedor imediato do serviço e isto se traduz no direito constitucional à Internet passando a ser custeado com o dinheiro público, uma vez que o ensino público do país está cada vez menos eficiente.
Essa Emenda torna o acesso à Internet exigível pelo cidadão e cria uma responsabilidade para o Estado. Para que esse direito se faça valer, como muitos outros que já estão inseridos na Constituição, deverá ser acionado pelo cidadão através de advogados, o que dificilmente suprirá a necessidade dos menos favorecidos.
Essa Proposta de Emenda também pode ser analisada sob o âmbito da midiatização política. Nesse caso, a mídia – entenda-se todos os meio de comunicação em massa – atua no funcionamento da própria esfera política, não age apenas como mediadora entre poderes, mas tem sido caracterizada por alguns doutrinadores como um quarto poder. Ao ocupar o lugar das mediações, que seria próprio da política, a comunicação midiática monopoliza tendencialmente a enunciação pública.
Manin (1995) ao elaborar uma análise do governo representativo divide-o em três momentos: Parlamentarismo, Democracia do Partido e Democracia do Público.
Interessante se faz incorporar nesta discussão esse último momento que estabelece uma nova relação entre políticos e eleitores por meio do uso intensivo de técnicas de comunicação. A dependência do noticiário tem sido acusada de ter ajudado a erodir o sistema eleitoral, uma vez que os candidatos estariam sendo forçados às banalidades da política da imagem, ou seja, a mídia impondo à política sua organização e dinâmica.
Uma característica que talvez tenha sido a propulsora da Democracia do Público, é o fato de que os canais de informação, nos quais se forma a opinião pública, são, ilusoriamente, constituídos de neutralidade – no sentido de não estarem diretamente ligados a partidos políticos. Embora não haja filiação partidária, os meios de comunicação expressam sua preferência política.
Devido ao grande número de eleitores e temas eleitorais os candidatos são apresentados à sociedade através dos debates públicos transmitidos pela mídia. Essa perspectiva enfatiza a necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos políticos ante a centralidade da mídia e fragilidade institucional dos partidos políticos. Assim, as inovações tecnológicas nas campanhas eleitorais se traduzem na transformação da estrutura social e da forma da democracia. Nota-se aqui o fato do Brasil ser referência mundial no avanço da tecnologia eleitoral e estar exportando seu modelo para outros países.
Dessa forma, tanto no nível do intercâmbio político como no da legislação simbólica, o funcionamento do sistema político nas democracias da sociedade moderna está sendo cada vez mais determinado pela mídia. Quanto mais modernos e inovadores os meios de comunicação, maiores são as dificuldades de controle sobre a manipulação da opinião pública.
3. Conclusão
A introdução da cultura audiovisual, nas relações sociais e políticas, se expande tanto mais, quanto maior for o grau de primariedade cultural de uma sociedade. A intervenção midiática sobre a cultura social sistematizou a manipulação informativa.
Inúmeros são os efeitos sociais da influência da mídia no sistema político – tanto pré como pós eleição. A priori, orientados por seus cientistas políticos, partidos têm usado a seu favor a ignorância política do povo, aliada ao sentimento de revolução e subversão, para disseminar campanhas idealistas. A posteriori, utilizam o direito com o fim de pacificação social, despreocupados com a falta de concretização jurídica dos diplomas normativos.
No atual cenário político, a “videopolítica” tem gerado partidos de baixo tono ideológico e com agregação pragmática de interesses. Afetando, assim, as correlações dialéticas entre liberdade e igualdade, entre ordem e poder reduzindo correspondentemente os níveis de autonomia individual, de acordo com Landi (1992).
A liberdade e a igualdade são os principais componentes da democracia. Sendo assim é imprescindível que haja harmonia entre o direito da liberdade e dever da igualdade, a transparência em todos os atos político é uma responsabilidade social e não se pode permitir que o exercício de um abnegue o outro, estando a seguridade dessa premissa com suas bases na eficácia jurídica das normas constitucionais.
Informações Sobre os Autores
Bruna Carvalho Moura Avelar
graduada em Letras Bacharelado pela Unifeob, São João da Boa Vista, acadêmica de Direito da Unifenas/Alfenas
Sonia Boczar
Mestra em Direito de Estado pela Universidade de São Paulo, Professora titular das disciplinas de Direito Constitucional e Processo Constitucional na Universidade José do Rosário Vellano – UNIFENAS