Resumo: O presente artigo analisa a proteção ambiental, sob a perspectiva do direito laboral. O meio ambiente e seus princípios são analisados sob a ótica do local de trabalho, fazendo uma analogia com as regras previstas na própria CLT.
Palavras-chave: Meio ambiente do Trabalho. Tutela. Princípios.
Com o avanço tecnológico, novas formas de trabalho foram surgindo mitigando cada vez mais o conceito que temos a respeito das relações de trabalho. A subordinação, a jornada de trabalho, dentre outros fatores da relação de emprego já não são tão clarividentes assim como eram uma década atrás.
Embora essas condições de trabalho estejam se adequando a nova realidade social e tecnológica, não resta dúvida que para exercer seu labor o trabalhador ainda necessita de um local de trabalho, seja ele fornecido pelo próprio empregador, como na maioria dos casos acontece, seja a própria residência do trabalhador. Ainda que se trate do chamado teletrabalho sempre haverá um espaço físico no qual esse trabalhador desenvolverá sua atividade. Assim o local é um elemento inerente as condições de trabalho, é o ambiente no qual desenvolverá as atividades empregatícias, e no qual ele se insere.
A lei conceitua o meio ambiente como sendo o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas (Lei 6938/81, art. 3º, inciso I).
O meio ambiente do trabalho (como local onde o trabalhador está inserido) é uma das espécies do meio ambiente, consoante disposto no artigo 200, VIII da CF. Assim comungamos da abordagem feita por LENZA[1], separando o meio ambiente sob quatro aspectos:
“Meio ambiente natural ou físico: é a correlação entre os seres vivos e o meio em que vivem, sendo constituído pelo solo, ar atmosférico, água, energia, flora e fauna.
Meio ambiente cultural: aponta a história e a cultura de um povo, as suas raízes e identidade, sendo integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico e turístico.
Meio ambiente artificial ou humano: é o espaço urbano construído, destacando-se edificações e também os equipamentos públicos, como as ruas, espaços livres, parques, áreas verdes, praças, etc.
Meio ambiente do trabalho: local aonde o trabalhador exerce sua atividade, espécie de meio artificial.”
Na lição de FIORILLO[2] a proteção do direito do trabalho é distinta da assegurada ao meio ambiente do trabalho, porquanto esta última busca salvaguardar a saúde e a segurança do trabalhador no ambiente onde desenvolve suas atividades. O direito do trabalho, por sua vez, é o conjunto de normas jurídicas que disciplina as relações jurídicas entre empregado e empregador.
A Constituição Federal de 1988 destaca a importância da manutenção do meio ambiente para a vida humana. Nesse contexto, o legislador constitucional também sempre se preocupou com o meio ambiente do trabalho adequado, seguro e saudável, vez que pela interpretação sistêmica tais valores são direitos humanos fundamentais do cidadão trabalhador, insculpidos nos incisos III e IV do artigo 1º, bem como nos artigos 6º, 7º XXII todos da Carta da República.
Como bem explana GARCIA[3] “Tem-se, assim, verdadeiro sistema jurídico de tutela do meio ambiente do trabalho, reconhecido pela Constituição da República, em seu art. 200, inciso VIII, e que, como já mencionado, integra o meio ambiente em sentido global (Art. 225 da CF/1988)”.
O artigo 225 da Constituição preleciona que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
No entanto quando se trata de meio ambiente do trabalho a primeira condição que o empregador está obrigado a cumprir é assegurar aos trabalhadores o desenvolvimento das atividades em local seguro, salubre, ou seja, um ambiente que lhe proporcione qualidade de vida.
Conforme narra NASCIMENTO[4], a proteção jurídica à saúde do trabalhador é da maior importância com o direito do trabalho, porque diz respeito não apenas à qualidade de vida do trabalhador, mas também, sua integridade física e a seu bem-estar, ressaltando corretamente, a doutrina, que o meio ambiente do trabalho está inserido no meio ambiente geral, de modo que é impossível ter qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, já que o homem passa grande parte de sua vida no ambiente de trabalho.
Diante dessa preocupação com o meio ambiente, especialmente a do trabalho, as normas trabalhistas deixaram apenas de buscar a proteção a incolumidade física do trabalhador, passando a se preocupar também com incolumidade moral deste buscando uma adaptação do trabalho ao homem, proporcionando-lhe um ambiente além de saudável, equilibrado, no qual possa inclusive produzir mais. Aplicam-se ao meio ambiente do trabalho além das normas de segurança e medicina do trabalho, os princípios ambientais vez que pertencem ao ambiente como um todo.
Os princípios ambientais como da prevenção, da precaução, da educação, do poluidor pagador e do desenvolvimento sustentável, são facilmente aplicados ao meio ambiente do trabalho, por mera interpretação sistêmica, conforme passaremos a expor.
O princípio da prevenção institui o dever de evitar danos ao meio ambiente. Esse princípio vem salientado em diversas convenções, as quais apontam para necessidade de prever, prevenir e evitar na origem as transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente.
O princípio em questão tem grande incidência na proteção do meio ambiente do trabalho, principalmente pelas regras de prevenção insculpidas no texto celetista. É fácil percebermos os reflexos desse princípio especialmente no capítulo destinado a Segurança e Medicina do trabalho. Podemos elencar como medidas preventivas do meio ambiente do trabalho, dentre outras, as seguintes disposições:
“a) Art. 156 que trata da competência das Delegacias Regionais do Trabalho (Atual Superintendência Regional do Trabalho e Emprego) em fiscalizar cumprimento de normas de segurança e medicina do trabalho, orientação, adoção de medidas preventivas inclusive obras e reparos em qualquer local de trabalho;
b) O art. 157 que determina as empresas adotar medidas de prevenção, bem como cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;
c) O artigo 160 que determina a inspeção previa do estabelecimento antes de iniciar o empreendimento.
d) Norma Regulamentadora 9 que estabelece a obrigatoriedade da elaboração e implementação, do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA). “
Já o princípio da precaução institui que: “quando uma atividade representa ameaças de danos ao meio ambiente ou à saúde humana, medidas de precaução devem ser tomadas, mesmo se algumas relações de causa e efeito não forem plenamente estabelecidas cientificamente” (Declaração de Wingspread – 1998).
O inciso II do artigo 157 da CLT menciona o referido princípio ao dispor que “ cabe as empresas instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais”. O artigo 168, §3º determina que o Ministério do Trabalho estabelecerá, de acordo com o risco da atividade e o tempo de exposição,a periodicidade dos exames médicos.
Caso ainda ocorra qualquer modificação substancial nas instalações, inclusive equipamentos, a empresa fica obrigada a comunicar, prontamente, à Superintendência Regional de Trabalho e Emprego. Todas essas medidas visam a observância do princípio da precaução no ambiente laboral.
Pelo princípio da educação podemos entender que visa a participação de todos na tutela do meio ambiente, efetivando o princípio da prevenção, fixando a idéia de conscientização quanto a manutenção do meio ambiente equilibrado. Esse princípio pode ser observado nos artigos 157 e 158 da CLT, já que atribui às empresas e aos empregados observar as normas de segurança e medicina do trabalho.
Por vez, o princípio do poluidor pagador que num primeiro momento impõe ao poluidor o dever de arcar com as despesas de prevenção com o meio ambiente e em um segundo momento ocorrido o dano que o mesmo seja responsabilizado pela sua reparação.
Esse princípio tem ampla aplicação ao meio ambiente do trabalho, visto que incumbe a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (antiga Delegacia Regional do Trabalho) aplicar as penalidades cabíveis por descumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho inclusive em casos de reiteração (Art. 156, III; Art. 201 CLT). Não obstante se sobrevier dano ao trabalhador este poderá recorrer ao Poder Judiciário propondo as eventuais reclamações para reparação do dano causado, oriundo da não observância das regras de proteção ao meio ambiente do trabalho, podendo ser indenizado por assédio/dano moral, indenização por dano material (lucros cessantes e pensionamento) e inclusive indenização por danos estéticos, se houver.
Além da penalidade administrativa e da reparação do dano causado aos trabalhadores, poderá a empresa poluidora do meio ambiente do trabalho que causar danos a seus empregados, responder regressivamente perante a Justiça Federal pelos gastos efetuados pelo órgão previdenciário (INSS) na concessão de eventual benefício acidentário. Nesse contexto o princípio do poluidor pagador incidirá em três etapas, na área administrativa através do SRTE, na esfera judiciária pela reparação do dano causado ao empregado, e de forma regressiva em eventual ação proposta pelos procuradores federais do órgão previdenciário.
Por fim destacamos o princípio do desenvolvimento sustentável. Esse princípio relata que os recursos ambientais não são inesgotáveis, sendo certo que as empresas precisam se ajustar de forma a buscar harmonia entre a economia mundial e o meio ambiente. Esse princípio tem efeito no ambiente trabalhista em face da exploração da Mão de obra humana condicionada a um meio ambiente de trabalho degradante, extremamente insalubre ou perigoso, de forma que a empresas deixam de investir em um ambiente seguro como forma de reduzir custos com objetivo de colocar produtos à venda com preços abaixo dos praticados no mercado. Tal prática tem sido denominada pela doutrina como “Dumping Social”.
O princípio do desenvolvimento sustentável visa conciliar as normas de proteção, saúde e higiene do trabalho ligadas ao meio ambiente do trabalho com um produto final que seja competitivo no mercado do trabalho, sem que haja necessária deterioração do meio ambiente laboral.
Por derradeiro, defendemos a tese de que é plenamente aplicável os princípios do Meio ambiente ao meio ambiente do trabalho, seja porque este é uma espécie daquele, seja porque não há qualquer impedimento ou interpretação contrária a tal aplicação no ambiente laboral como podemos averiguar.
Importante frisarmos ainda que embora a tutela ao meio ambiente seja obrigação de todos, essa proteção é um dever principalmente das partes envolvidas nessa relação, ou seja, do empregador conforme supra destacado e também do empregado (art. 158, I e II da CLT), sob pena deste último incorrer em Justa causa, inclusive (art. 158, parágrafo único da CLT).
Mesmo diante de toda a proteção ao meio ambiente do trabalho, tais normas ainda não são efetivamente cumpridas, como mostram as estatísticas de acidente de trabalho, visto que muitos dos empregadores ainda possuem uma cultura atrasada em relação ao meio ambiente especialmente a do trabalho. A fiscalização por sua vez deixa a desejar especialmente nos métodos de coerção para que o empregador mantenha um ambiente de trabalho saudável, seguro e salubre.
Portanto, em que pese a proteção e manutenção do ambiente ser um dever de todos, especialmente do Estado, no que toca ao meio ambiente do trabalho, faz-se necessário a intervenção do Poder Judiciário, pelo empregado de forma individual ou coletiva, por meio de seu sindicato ou por meio do Ministério Público do Trabalho visando senão a proteção preventiva, buscar repressivamente a indenização pelos danos causados ao meio ambiente do trabalho que refletem especialmente na saúde e vida do trabalhador.
Informações Sobre o Autor
Weliton José da Silva Balduino
Especialista em Direito Constitucional pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso. Professor da Faculdade de Direito (Graduação) da Universidade de Cuiabá.Advogado Trabalhista Colaborador do Escritório Pedrosa Consultoria