Resumo: O presente artigo tem como objetivo principal fazer um estudo exauriente das penas que serão aplicadas às pessoas jurídicas quando as mesmas cometerem atos criminosos contra o meio ambiente. Preliminarmente, há de se aceitar em sua inteireza que referida responsabilidade tem previsão tanto constitucional, quanto legal, para depois chegarmos ao entendimento de que todas as penas estabelecidas no artigo 21 da Lei n.9605/98 são totalmente passíveis de serem aplicadas aos entes coletivos. Por último, faremos um estudo detalhado das penas de multa, restritivas de direitos e de prestação de serviços à comunidade.
Palavras-chave: Responsabilidade penal pessoa jurídica – Previsão constitucional e legal – Modalidades de penas a serem aplicadas.
Abstract: This paper's main objective is to do a study exauriente penalties that will apply to corporations when they commit criminal acts against the environment. Preliminarily, one has to accept in its entirety is expected that this responsibility both constitutional and legal, and then we come to understand that all penalties set forth in Article 21 of Law n.9605/98 are fully capable of being applied to collective entities . Finally, we make a detailed study of fines, restriction of rights and provision of community services.
Keywords: Criminal liability corporation – Forecast constitutional and legal – Methods of penalties to be applied.
Sumário: 1. Introdução; 2. Doutrina e jurisprudência contrária à aplicação de penalidade; 3. Das penas criminais aplicáveis às pessoas jurídicas; 4. Da pena de multa; 5. Das penas restritivas de direitos; 6. Da prestação de serviços à comunidade; 7. Das Considerações finais. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
Dia-a-dia tem nos mostrado o quanto tem crescido a criminalidade em nossos meios. Observamos que além das pessoas naturais, os entes coletivos estão cometendo delitos, principalmente quando se retrata ao meio ambiente.
Tendo em vista o alto crescimento da criminalidade, nossa Constituição Federal trouxe previsão expressa da responsabilidade penal da pessoa jurídica (art. 225, §3º), sendo tal conteúdo posteriormente regulamentado pela Lei n. 9.605/98 (art. 3º).
Esta mesma lei extravagante acima citada cuidou de relacionar as penas a serem aplicadas quando as pessoas jurídicas forem condenadas por cometimento de delitos contra o meio ambiente, o que fez nos artigos 21 a 24 do referido diploma legal, sendo este o principal objeto de estudo deste trabalho, ou seja, aprofundar na pesquisa das penas a serem aplicadas aos entes coletivos.
2. Doutrina e jurisprudência contrária à aplicação de penalidade
Responsabilidade penal da pessoa jurídica representa, ainda no círculo doutrinário, um tema de constantes divergências, havendo estudiosos que não aceitam a afirmação que a Constituição Federal de 1988 consolidou em nosso ordenamento jurídico maior referido instituto, sendo após dez anos, previsto em legislação infraconstitucional (art. 3º da Lei n. 9.605/98).
Relevante tornou-se o posicionamento de Sílvia Cappelli[1] quando afirmou: “ dado que as Constituições Federais anteriores jamais previram tal hipótese, certo é convir que a Carta Magna vigente teve o intuito de inovar prevendo a possibilidade de que a legislação infraconstitucional venha a contemplar delitos ambientais perpetrados por pessoas jurídicas. Evidentemente que, respeitado o Princípio da Legalidade, não haverá nenhum óbice para que tal possa ocorrer, dada a hierarquia das normas.”
Muito importante também relatar a afirmação de Guilherme José Purvin de Figueiredo[2]: “o que a Lei 9.605/98 consagrou em cumprimento ao disposto no art. 225, § 3°, da Constituição Federal, foi a responsabilidade penal da pessoa jurídica — este sim um grande avanço do Direito Brasileiro na luta contra a impunidade diante de crimes ambientais. Nesse sentido, é de uma importância vital que os recentes e consecutivos acidentes ecológicos ocorridos em nosso país por uma mesma e riquíssima sociedade de economia mista estatal (pessoa jurídica de direito privado, portanto), sejam investigados com a seriedade que merecem, em especial para fins de ressarcimento civil dos danos causados.”
Entre os vários argumentos utilizados pela doutrina negativista, um deles possui nexo lógico com o objeto de estudo deste trabalho. Afirma-se que a pessoa jurídica não possui capacidade de ser sujeito passivo da aplicação de penalidade, no sentido de que seria impossível aplicar pena privativa de liberdade aos entes coletivos.
Realmente tal constatação é fática, seria impossível aplicar esta espécie de pena na pessoa jurídica, mas ao mesmo tempo temos que ressalvar a não exclusividade de previsão desta única pena em nosso ordenamento jurídico, uma vez que existem outras espécies de pena, como as penas pecuniárias, perda de bens, interdição temporária, e até mesmo dissolução.
Apesar de isolada, temos também posicionamento da jurisprudência negando a aplicação de penas às pessoas jurídicas quando as mesmas cometerem delitos ambientais, conforme exposto abaixo:
“Todavia, me parece que o nosso direito ainda não se aparelhou, convenientemente, de institutos claros e precisos, necessários a que se efetive essa punição. Deveria tê-lo feito de modo sistemático, na própria Parte Geral do Código Penal. Mas nem mesmo na Lei n. 9.605/98 isso aconteceu (…)Note-se que não estão devidamente cominadas as penas que se aplicariam, especificamente, em cada tipo penal transgredido pela pessoa jurídica, limitando-se, a lei, a tratar da aplicação das penas às pessoas jurídicas, de forma genérica – artigos 21 a 24 – sem observar princípios constitucionais que seriam imprescindíveis para a correta utilização deste novo instrumento político-criminal de prevenção como, por exemplo, o da individualização”. TRF2, Primeira Turma, Apelação Criminal n° 1996.51.11.0272905. Julgado em 12 de dezembro de 2007.
“Admita-se, para argumentar, que determinado magistrado decida em determinado processo aplicar as penas detentiva e pecuniária, previstas nesse artigo 38, após concluir pela condenação de pessoa jurídica. Tratando-se de penas cumulativas, é obrigatória a sua aplicação, não se podendo optar por uma ou outra. Não havendo ressalva quanto à Pessoa Jurídica não há como aplicar pena detentiva, ou corporal, ou privativa de liberdade, em caso de eventual condenação. (…) A norma sem preceito ou sem sanção é inexistente. (…) É a consagração do princípio nullum crimen, nullapoena sine lege, inserido no art. 5, XXXIX da CF também no art. 1, CP. É verdade que o art. 21 da Lei 9.605/98 define as penas para a pessoa jurídica, acontece que o legislador limitou-se a prever um rol de sanções penais, deixando de especificar quais as condutas passíveis de serem imputadas às pessoas jurídicas, assim comprometendo a compreensão e a aplicação imediata da lei. (…) Em consequencia, e existindo o art. 21 estabelecendo quais as penais relacionadas com as empresas, restaria suprida a falha, aceitando-se como completa, então, a norma penal. As penas seriam aquelas expressamente previstas em capítulo distinto. Ocorre que nem todos os crimes podem ser praticados pela pessoa jurídica. (…) Ora, a empresa não pode praticar os crimes desses arts., 29 e 34, específicos para a pessoa física, como parece claro pela leitura dos tipos penais correspondentes. Não se sabe, então, por falta de previsão expressa da sanção correspondente, ainda que mediante remessa ao art. 21, se o crime definido no art. 38 pode ou não ser cometido por pessoa jurídica. O que não se pode é apretexto de prestigiar a intenção do legislador em punir as empresas responsáveis por crimes ambientais, fazer em comum esforço ou algo parecido para suprir falhas. Se enquadrada a conduta delituosa na figura propícia abstrata do preceito primário da norma penal, a respectiva regra secundária lhe dá a sanctio juris aplicável, em que a pena vem expressamente combinada. Se as duas penas devem ambas ser impostas. (…) Seria fácil definir em cada dispositivo a pena correspondente à pessoa jurídica, tal como sendo feliz o legislador ao definir as suas espécies nos arts. 21, 22 e 23, os dois últimos depoimentos estabelecendo regras específicas quando se tratar de pessoa. (..) O que não se admite é deixar a critério do julgador escolher qual dos crimes elencados na nova lei pode ser praticado pela pessoa jurídica. Por isso mesmo é que o delito praticado pela pessoa jurídica é sempre o delito de co-autoria necessária, sendo certo que a pessoa moral não pode cometer delitos, senão por ações de seus dirigentes, enfatiza o subscritor da apelação em exame. O que não se pode tolerar, sob pena de sérias violações a princípios legais e constitucionais, é desconsiderar os equívocos e omissões da nova lei. Ainda que previsto na Lei de Introdução ao Código Civil que na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Dando pouca importância à sistematização penal, à definição clara e precisa dos tipos penais relacionados com delitos ambientais, o legislador de 1998 perdeu grande oportunidade para elaborar legislação exemplar, trazendo à vigência lei repleta de equívocos e que dificultam a sua exata compreensão. As imprecisões técnicas, os conceitos vagos e as violações à Constituição Federal são as verdadeiras causas que fazem da Lei n° 9.605/98 uma lei que nasceu pedindo reforma. Urgente reforma. Por isso mesmo já se escreveu: "O mundo jurídico aguardava ansiosamente a regulamentação ordinária do dispositivo constitucional da responsabilidade penal das empresas. Lamentável é que tenha vindo de maneira tão deficiente e lacunosa" (Sérgio Salomão Shecaira, Boletim do IBCCrim 65, ed. Especial, pg 3). Em conseqüência do exposto, e prejudicados os demais temas trazidos pela empresa, dá-se provimento ao recurso da Mancepar – Associação Mantenedora de Cemitérios particulares, para reconhecer a inépcia da peça acusatória inicial e em conseqüência anular a ação penal, desde o seu início, decisão que se entende mais abrangente do que a sentença absolutória.” TJSP, Décima Câmara do Quinto Grupo da Seção Criminal, Apelação Criminal n° 11494003600. Julgado em 12 de março de 2008.
No que tange a tais penas, vale a pena transcrever o posicionamento de Munoz Conde[3], onde mesmo sendo contrário à aplicação da responsabilidade penal da pessoa jurídica, ressalta que: “pessoalmente, parece-me que o atual Direito Penal dispõe de um arsenal de meios específicos de reação e controle jurídico penal das pessoas jurídicas. Claro que estes meios devem ser adequados à própria natureza desses entes. Não se pode falar de penas privativas de liberdade, mas de sanções pecuniárias; não se pode falar de inabilitações, mas sim de suspensão de atividades ou de dissolução de atividades, ou de intervenção por parte do Estado. Não há, pois, por que se alarmar tanto, nem rasgar as vestes quando se fala de responsabilidade penal das pessoas jurídicas, senão simplesmente ter consciência de que unicamente se deve escolher a via adequada para evitar os abusos que ao seu amparo se realizam”.
Conforme muito bem explanado pelo doutrinador acima referenciado, não temos como alicerçar o fundamento negativista de reconhecimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica pelos simples fato de tais entes não serem passíveis de receberem pena privativa de liberdade, sendo que nosso arcabouço jurídico fez a previsão de outras espécies de penalidade, que inclusive são totalmente possíveis de serem aplicadas às pessoas jurídicas, de acordo com o que veremos logo em seguida.
Outro ponto que devemos nos ater, e que já estava implantado no espírito do legislador constituinte originário é que, apesar da responsabilidade criminal da pessoa jurídica está prevista na Constituição Federal de 1988, não se pode aceitar posicionamentos doutrinários que negam a responsabilidade civil e administrativa dos entes coletivos ao se acolher a penal, conforme nos lembra muito bem o magistrado Fausto de Sanctis[4]: “por fim, a responsabilidade civil ou administrativa não pode impedir a responsabilidade penal dos entes coletivos. Em primeiro lugar, porque esse tipo de responsabilidade possui, respectivamente, o escopo de reparar o dano causado ou meramente preventivo (no sentido de se impedirem maiores prejuízos à coletividade), enquanto a responsabilidade penal possui o de punir os atos que causam perturbação da ordem pública. Em segundo lugar, não se pode deixar de mencionar a possibilidade de decisões de cunho administrativo serem objeto de ingerências políticas, o que tem levado ao descrédito desse tipo de sanção. Acrescente-se que, dotado o ato administrativo de auto-executoriedade, não é incomum abusos no exercício desse poder.”
3. Das penas criminais aplicáveis às pessoas jurídicas
Fazendo comentários a respeito da lei dos crimes ambientais, Édis Milaré[5] afirmou que “a Lei 9.605/98 cumpriu ao mesmo tempo duas missões: deu efetividade ao ideário constitucional de apenar as condutas desconformes ao meio ambiente e atendeu as recomendações insertas na Carta da Terra e na Agenda 21, aprovadas na Conferência do Rio de Janeiro, acolitando os Estados a formularem leis direcionadas à efetiva responsabilidade por danos ao meio ambiente e para a compensação às vítimas da poluição. Embora denominada Lei dos Crimes Ambientais, trata-se na verdade, de instrumento normativo de natureza híbrida, já que se preocupou também com infrações administrativas e com aspectos da cooperação internacional para a preservação do ambiente.”
Em campo ambiental a aplicação da pena às pessoas jurídicas tem como objetivo primordial assegurar a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado e sadio para as presentes e futuras gerações, tendo um horizonte focalizado na prevenção, apresentando-se como uma barreira para que os entes coletivos não cometam infrações ambientais.
Damásio Evangelista de Jesus[6] nos ensina que “na prevenção geral o fim intimidativo da pena dirige-se a todos os destinatários da norma penal, visando a impedir que os membros da sociedade pratiquem crimes. Na prevenção especial a pena visa o autor do delito, retirando-o do meio social, impedindo-o de delinqüir e procurando corrigi-lo.”
Nossa Constituição Federal teve a preocupação de arrolar as espécies de penas que podem ser aplicadas em nosso ordenamento jurídico, fazendo no artigo 5º, inciso XLVI:
“Art.5º, XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a). privação ou restrição de liberdade;
b). perda de bens;
c). multa;
d). prestação social alternativa;
e). suspensão ou interdição de direitos.”
Partindo de uma premissa geral, verificamos que nosso Código Penal dispõe que ao magistrado, no momento de proferir a sentença condenatória no âmbito criminal, poderá aplicar as seguintes espécies de pena: privativas de liberdade, restritivas de direitos e de multa (art. 32 do CP). Tal mandamento legislativo fez a previsão em sua dimensão individual, não se aplicando em sua inteireza aos entes coletivos.
Legislação extravagante infraconstitucional, fez a previsão expressa da metodologia de aplicação das penas às pessoas jurídicas que cometerem crimes contra o meio ambiente, podendo ser observados nos artigos 21 a 24 da Lei n. 9605/98.
“Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:
I – multa;
II – restritivas de direitos
III – prestações de serviços à comunidade.
Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:
I – suspensão parcial ou total de atividades;
II – interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;
III – proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.
§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.
§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.
§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.
Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:
I – custeio de programas e de projetos ambientais;
II – execução de obras de recuperação de áreas degradadas;
III – manutenção de espaços públicos;
IV – contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.”
Fazendo uma rápida análise da lei supracitada, vislumbramos o fato da raridade de casos de penas restritivas de liberdade em se tratando de crimes ambientais para a pessoa física, uma vez que as condenações são inferiores a 04 anos, admitindo-se a substituição por restritivas de direitos, nos termos do art. 7º, I da Lei n. 9605/98. Conforme podemos observar acima, as penas para os entes coletivos irão se restringir à de multa, restritivas de direitos ou prestação de serviços à comunidade.
Doutrinadores da seara ambiental fizeram algumas críticas relacionadas a esta previsão acima citada, conforme nos relata Paulo Affonso de Leme Machado[7], faz uma crítica ao rol de penas aplicadas à pessoa jurídica dizendo que “poderiam ter sido inseridas outras penas, como foram no art. 72 da Lei 9.605/98, referente às sanções administrativas: destruição ou inutilização do produto; suspensão de venda e fabricação do produto; demolição de obra; suspensão de registro. O Poder Judiciário teria condição de tornar mais eficaz a reprimenda penal ao aumentar o leque de penalidades adaptáveis às necessidades ambientais e aos crimes cometidos.”
4. Da pena de multa
Tendo em vista o fato de as penas de multa a serem aplicadas às pessoas jurídicas que cometerem infração criminal no aspecto ambiental não receberem disciplina na Lei n. 9605/98, a mesma será calculada de acordo com os critérios estabelecidos no Código Penal, sendo que de acordo com a referida lei (art. 18), caso a pena se revela ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo de acordo com aquele Código, poderá ser aumentada até 3 (três) vezes, tendo em vista o valor da vantagem auferida. Tal critério se aplica tanto às pessoas físicas quanto jurídicas, o que tem levantado críticas da doutrina, conforme nos relata Édis Milaré[8] quando junta as críticas de Sérgio Salomão Shecaira: “Melhor seria se houvesse transplantado o sistema dias-multa do Código Penal para a legislação protetiva do meio ambiente, fixando uma unidade específica que correspondesse a um dia de faturamento da empresa e não em padrão de dias-multa contidos na Parte Geral do Código Penal. Da maneira como fez o legislador, uma grande empresa poderá ter uma pena pecuniária não condizente com sua possibilidade de ressarcimento do dano ou mesmo com vantagem obtida pelo crime.”
Vale a pena transcrever o artigo 18 da Lei 9.605/98 quando dispõe:
“Art. 18 – a multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá se aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.”
Doutrina tem se levantado em face desta ausência de previsão da pena de multa na própria lei de crimes ambientais, justificando que, mesmo sendo aplicada no máximo pelas regras do Código Penal, de acordo com o artigo 18 acima citado, poderá não ser suficiente a penalidade aplicada ao ente coletivo, podendo a multa não ser congruente com o faturamento da empresa. Podemos colacionar o posicionamento de Shecaira[9] quando afirma que: “solução mais eficaz seria a transferência do sistema de dias-multa do Código Penal para a Lei 9.605/98, impondo uma unidade específica que correspondesse a um dia de faturamento da empresa, e não no padrão de dias-multa contido na Parte Geral do Código Penal. Conforme o estabelecido, uma empresa de grande poder econômico poderá vir a experimentar pena pecuniária não condizente com sua possibilidade de ressarcimento do dano, ou mesmo com a vantagem obtida pelo crime (SHECAIRA, 1998, p. 06).
Fausto de Sanctis[10] nos observa que “este tipo de pena consiste na obrigação imposta à pessoa jurídica condenada de pagar uma soma em dinheiro ao tesouro público”. Para uma eficácia real deste tipo de pena, ela deve ser proporcional à importância da pessoa jurídica, à gravidade da infração cometida e aos benefícios esperados ou obtidos com esta, pois, caso contrário, não se chegaria a uma verdadeira prevenção criminal.” Posteriormente prossegue em seu posicionamento nos seguintes termos: “Impõe-se considerar que no caso de pagamento de multa não se pode permitir a dedução fiscal de seu montante, por não se cuidar de despesa justificável”. Entendimento contrário levaria ao comprometimento da eficácia criminal desse tipo de sanção. Tal medida consistiria em um non sens, já que o mesmo Estado, que puniu, não poderia aceitar o abatimento de tributo pelo pagamento de multa, uma vez que esta não teria mais qualquer efeito inibitório. Sem dúvida que desfigurada estaria a reprovabilidade da conduta.”
5. Das penas restritivas de direitos
No que tange às penas restritivas de direitos, as mesmas estão previstas na Lei n. 9605/98 no seu artigo 22, que fazem referência à suspensão parcial e total da atividade, interdição temporária do estabelecimento, obra ou atividade e a proibição para contratar com o Poder Público.
Suspensão das atividades de uma entidade revela-se necessária quando ela atinge uma violação intensa contra a saúde humana e contra a incolumidade da vida vegetal e animal, uma vez que tal pena tem reflexo inegável na vida econômica da empresa.
De acordo com os ensinamentos de Celeste Leite dos Santos Pereira Gomes[11] dispõe que: “a suspensão das atividades de uma entidade revela-se necessária quando a mesma age intensamente contra a saúde humana e contra a incolumidade de vida animal e vegetal. É pena que tem inegável reflexo na vida econômica de uma empresa. Mesmo em época de dificuldades econômicas, e até de desemprego, não se pode descartar sua aplicação. “Caso contrário seria permitir aos empresários ignorar totalmente o direito de todos a uma vida sadia e autorizá-los a poluir sem limites.”
Quando da aplicação de tal penalidade deve o magistrado ter bastante cautela no intuito de se evitar um prejuízo maior para o meio social, como muito bem nos observa Kist[12]: “visando evitar a ocorrência de uma demissão em massa, quando da aplicação de suspensão parcial ou total das atividades, bem como da interdição temporária do estabelecimento, obra ou atividade, deve o magistrado estabelecer medidas impeditivas para o despedimento dos trabalhadores, não podendo ocorrer ainda a suspensão ou redução da remuneração dos obreiros, ao passo que com a ocorrência desta ocorreria a transferência do encargo sancionador aos funcionários, quando é a pessoa jurídica que deve arcar com a responsabilização por seus atos ilícitos.”
Já a interdição equivale ao embargo ou paralisação da obra, do estabelecimento ou da atividade.
No intuito de melhor aprendermos a respeito do instituto, vale a pena colacionar as preciosas lições de Paulo Affonso Leme Machado[13], quando afirma que: “a interdição equivale ao embargo ou paralisação da obra, do estabelecimento ou da atividade. A continuidade da obra ou da atividade do estabelecimento deve levar o juiz a determinar abertura de inquérito policial para apurar o cometimento do crime do art. 359 do CP – desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito – para que se possa finalmente condenar a entidade à pena de multa.”
Também como modalidade repressiva às pessoas jurídicas que cometerem crimes ambientais pode fazer referência às proibições de contratar com o Poder Público, sendo em processo licitatório ou não. Modalidade de proibição estende-se ao recebimento de subvenções ou subsídios do Poder Público.
Novamente, lançaremos “mão” das lições de Paulo Affonso Leme Machado[14] quando explica que: “a contratação com o Poder Público, com o processo licitatório ou sem este, fica proibida com a cominação desta pena. Este dispositivo tem como conseqüência o impedimento de a empresa condenada apresentar-se às licitações públicas. Ainda que a licitação seja anterior ao contrato com o Poder Público, não teria sentido no prazo da vigência da pena que uma empresa postulasse contrato a que não tem direito. O dinheiro público, isto é, o dinheiro dos contribuintes, só pode ser repassado a quem não age criminosamente, inclusive com relação ao meio ambiente.”
6. Da prestação de serviços à comunidade
Como última modalidade legal de se penalizar as pessoas jurídicas pode-se citar a prestação de serviços à comunidade, prevista no art. 23 da lei n. 9605/98. A mesma objetiva que o próprio infrator repare o prejuízo, determinando o Judiciário que ele venha prestar serviços ou custear programas ambientais, caso seja impossível a reparação do dano causado, em entidades públicas ou privadas.
Fausto Martin de Sanctis[15] nos ressalva que: “a aplicação de uma sanção de prestação de serviços à comunidade, como, por exemplo, a doação mensal de certa quantidade de produtos fabricados a uma entidade assistencial, a utilização gratuita do maquinário social por uma entidade filantrópica durante certo período de tempo, livraria o Estado de ter de executar uma sanção penosa de suspensão de atividades, e a pena alcançaria fins outros que não apenas da prevenção e ressocialização do ente coletivo.”
7. Das Considerações finais
Ao final da presente pesquisa, podemos entender que, apesar de divergências entre os doutrinadores e uma pequena parcela da jurisprudência, a responsabilidade penal da pessoa jurídica por cometimento de delitos ambientais, há de se reconhecida por seus fundamentos constitucionais (art. 225, §3º da CF), bem como pela legislação infraconstitucional (art. 3º da Lei n. 9605/98).
Neste trabalho, apesar de expormos alguma situação de maneira geral, procuramos nos concentrar nas penas criminais que podem ser aplicadas aos entes coletivos, sendo as mesmas trabalhadas como objeto principal deste estudo.
Partindo-se da premissa que nosso ordenamento jurídico brasileiro fez previsão expressa da responsabilidade criminal da pessoa jurídica, dissecamos as penas aplicáveis a tais entes, sendo elas as penas de multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade, conforme rol estabelecido no artigo 21 da Lei n. 9.605/98.
Referências bibliográficas
CAPPELLI, Sílvia. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica em Matéria Ambiental: uma necessária reflexão sobre o disposto no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, publicado na Revista de Direito Ambiental n. 1, editora Revista dos Tribunais, São Paulo.
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KIST, Ataides. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Leme: Editora de Direito. 1999.
Notas:
[1] CAPPELLI, Sílvia. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica em Matéria Ambiental: uma necessária reflexão sobre o disposto no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, publicado na Revista de Direito Ambiental n. 1, editora Revista dos Tribunais, São Paulo, jan/mar 96, pp.100/106.
[2] FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Crimes ambientais e responsabilidade penal objetiva. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 48, dez. 2000. Disponível em: . Acesso em 04 de junho de 2012
[3] MUÑOZ CONDE, Francisco. Principios politicocriminales que inspiram el tratamiento de los delitos contra el orden socioeconómico en el proyecto de codigo penal español de 1994, p. 16/17.
[4] Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 45.
[5] MILARÉ, E. Direito do ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.462.
[6] JESUS, D. E. de. Direito penal – parte geral, São Paulo: Saraiva, 2003.p. 519.
[7] MACHADO, P. A. L. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 656.
[8] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente, Op. cit., p.364.
[9] SHECAIRA, Sérgio Salomão. A responsabilidade das pessoas jurídicas e os delitos ambientais. Boletim IBCCRIM, São Paulo, n. 65, p. 3, abr. 1998, Edição Especial. P.06.
[10] SANCTIS, F. M. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 144 e 145.
[11] GOMES, C. dos S. P. Crimes contra o meio ambiente: responsabilidade e sanção penal, São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p.83.
[12] KIST, Ataides. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Leme: Editora de Direito. 1999. p.122.
[13] MACHADO, P. A. L. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 658.
[14] MACHADO, P. A. L. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 658.
[15] SANCTIS, F. M. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999. p.148 e 149.
Informações Sobre o Autor
José Eliaci Nogueira Diógenes Júnior
Procurador Federal Membro da Advocacia-Geral da União. Pós-graduado em Direito Ambiental e Urbanístico. Pós-graduado em Direito Processual Civil e Trabalho. Pós-graduado em Direito Constitucional. Professor Universitário.