A Emenda Constitucional nº 62/09 e a extinção dos sequestros de rendas públicas

Resumo: O presente artigo tem por escopo discorrer acerca da questão da extinção dos pedidos de sequestros de rendas públicas, tendo em vista o advento da Emenda Constitucional nº 62/09.

Em suma, buscou-se analisar decisões atuais proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que determinaram prosseguimento dos sequestros, contrariando o artigo 97, § 13, do ADCT.

Palavras-Chaves: Extinção; Sequestros de Rendas; Emenda Constitucional nº 62/09.

Abstract: The scope of this article is to analyze the question of the extinction of claims of kidnappings of public revenues, due to the advent of Constitutional Amendment 62/09.

Keywords: extinction; claims; kidnappings of public revenus; Constitutional Amendment 62/09

Sumário: 1. Advento da E.C. 62/09. 2. Das decisões de extinção dos sequestros pós E.C. 62/09. 3. Suspensão da segurança. 4. Considerações Finais

1. Advento da Emenda Constitucional nº 62/09

A Emenda Constitucional nº 62/09, publicada em 12/12/09, alterou o regime do pagamento dos precatórios, inserindo várias novidades e mantendo outras disposições sem alterações.

Sua constitucionalidade já está sendo debatida junto ao Judiciário, porém as ADIs encontram-se pendentes de julgamento.

Sabe-se que a situação dos precatórios no Brasil é uma questão muito complicada e delicada. Estima-se que a dívida judicial de Estados e Municípios esteja próxima dos R$ 100 bilhões. Assim, não se chega a nenhuma outra conclusão senão a de que alguma providência havia de ser tomada pelo poder público.

Importante ressaltar que o valor dos precatórios, antes da Emenda 62, aumentavam desarrazoadamente, por conta do cômputo dos altíssimos juros compensatórios, aproximadamente, em 24% ao ano, sendo afastados, expressamente, pela Emenda mencionada e substituídos, agora, por 6% a.a da caderneta de poupança   (§ 12 do art. 100 da CF).

Em verdade, sabe-se que os dois parcelamentos anteriores se mostraram insuficientes para resolver ou, ao menos, amenizar essa imensa dívida pública.

De modo geral, embora com algumas lacunas e imperfeições, a Emenda 62 foi introduzida em nosso sistema constitucional como mais uma tentativa de efetivar a quitação do estoque de precatórios existentes e dos que surgissem no transcorrer da vigência do regime especial que seria adotado.

Como a intenção deste trabalho não é de analisar pormenorizadamente as modificações introduzidas pela Emenda 62, apontaremos somente algumas das modificações que se mostram importantes para a conclusão deste trabalho.

Uma importante mudança a ser citada é aquela referente à atualização de valores que, agora, após a expedição dos precatórios até o efetivo pagamento, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios.

Outra inovação importante com as novas disposições constitucionais é que desapareceu o fundamento para os sequestros de receita que vinham sendo requeridos com fundamento no art. 78, § 4º, do mesmo ADCT (inserido pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/2000), diante do que dispõe o art. 97, § 13, do ADCT.

De acordo com a sistemática introduzida pela emenda em questão, lei complementar poderá estabelecer regime especial para pagamento de crédito de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e prazo de liquidação.

Ressalte-se que, enquanto não editada a lei complementar que poderá estabelecer, em definitivo, o regime especial de precatórios, ficam valendo somente as regras do artigo 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, isto significa dizer que, em tal período de ajuste, fica inaplicável o artigo 100 da Constituição Federal, à exceção de certas normas permanentes, como a preferência a idosos e portadores de doenças graves; compensação com a dívida ativa; precatórios no pagamento de imóveis leiloados; correção somente pelo índice da caderneta de poupança, entre outras.

Tal qual se infere do § 4º, art. 97 do ADCT, a conta especial dos depósitos será administrada pelo Tribunal de Justiça local, mesmo que os precatórios sejam expedidos pelos tribunais trabalhistas.

Note-se que os preceitos trazidos pela E.C. 62/09 estão plenamente em vigor, pois sobre eles recai presunção de constitucionalidade e sequer houve liminar nas Adi(s) 4357, 4372, 4400 e 4425.

2. Das decisões de extinção do sequestro pós e.c.62/09

Ao ser editada a Emenda Constitucional 62/2009, atinente ao regime de precatórios, a posição inicial da Presidência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo foi no sentido da extinção dos pedidos de sequestro de rendas públicas, quando a apreensão efetiva do numerário ainda não tivesse ocorrido, por se considerar, em tal caso, inexistente seja situação jurídica consolidada, seja ofensa a ato jurídico perfeito ou a direito adquirido.

Frise-se inexistir qualquer ilegalidade na decisão de extinção do pedido de sequestro, ante o advento da Emenda Constitucional nº 62/09, uma vez que sua aplicação é imediata, abrange todos os precatórios pendentes de atendimento e, ademais, suas disposições obstam a decretação de sequestro de rendas em qualquer hipótese, desde que o ente público esteja adimplente quanto ao repasse mensal de valores ao Tribunal de Justiça, previsto na citada emenda.

A Emenda Constitucional n° 62/09 estabeleceu que, enquanto os entes devedores estiverem realizando pagamentos de precatórios pelo regime especial, não poderão sofrer sequestro de valores, exceto no caso de não liberação tempestiva dos recursos na forma prevista no inc. II, §1º, do art. 97, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Assim, uma vez optando pelo regime especial para pagamento de precatórios, a Fazenda Pública devedora não mais sofrerá sequestro de suas contas, a não ser que deixe de efetuar o depósito mensal, em conta especial, do correspondente a 1/12 (um doze avos) do valor apurado percentualmente sobre as respectivas receitas correntes líquidas, nos termos do inc. II, do §1º.

No entanto, na prática, tais decisões de extinção de sequestro foram alvo de mandados de segurança com pedido liminar, sendo que muitos tiveram suas liminares deferidas.

O argumento utilizado pelos impetrantes foi de que o direito já havia consolidado, pois muito antes da E.C. 62 tinham-se reunido todos os requisitos indispensáveis, de acordo com a Lei de Introdução ao Código Civil, segundo a qual "consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer…".

3. Suspensão da Segurança

Como explanado no item anterior, com o advento da E.C. 62/09, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo se posicionou no sentido da extinção dos pedidos de sequestro constitucional de rendas públicas, sob o fundamento de que citada emenda atingiu todos os precatórios vencidos e não pagos e, considerou, ainda, que a não efetivação do sequestro de rendas municipais sob a égide da Emenda 30, não mais poderia sê-lo na vigência da EC. 62.

Inconformados, os requerentes dos pedidos de sequestro passaram a impetrar Mandados de Segurança contra as decisões de extinção.

No mandamus, os impetrantes utilizaram como argumentação a inaplicabilidade da E.C. nº 62/09, sob o fundamento de possuírem direito adquirido e ato jurídico perfeito;

O requerimento, em síntese, consubstanciava-se na:

a) concessão de liminar para determinar a suspensão do ato coator;

b) concessão da segurança para declarar a nulidade do ato coator que extinguiu o pedido de sequestro;

c) prosseguimento e o deferimento do pedido de sequestro para satisfação do crédito exequendo.

Os pedidos de liminar em mandado de segurança muitas vezes acabaram sendo deferidos, sob o fundamento de estarem presentes os requisitos autorizadores da referida medida.

Porém, cumpre-nos observar que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao determinar o prosseguimento dos pedidos de sequestro, acabou por ignorar a na nova disposição constitucional (E.C. nº 62), restando aos entes públicos intentarem a medida de Suspensão de Segurança perante o Egrégio Supremo Tribunal Federal, a fim de obter suspensão da decisão proferida no mandamus.

É fato que referida emenda abrangeu todos os precatórios não quitados na data da sua promulgação. Vejamos o preceito do artigo 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

Artigo 97 – Até que seja editada a lei complementar de que trata o § 15 do art. 100 da Constituição Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que, na data da publicação desta Emenda Constitucional, estejam em mora na quitação de precatórios vencidos, relativos à suas administrações direta e indireta, inclusive os emitidos durante o período de vigência do regime especial instituído por este artigo, farão esses pagamentos de acordo com as normas a seguir estabelecidas, sendo inaplicável o disposto no art. 100 da Constituição Federal, exceto em seus §§ 2º, 3º, 9º, 10, 11, 12, 13 e 14, e sem prejuízo dos acordos de juízos conciliatórios já formalizados na data de promulgação desta Emenda Constitucional.

Assim, após leitura do artigo supra, não há dúvida de que os sequestros que foram deferidos contrariaram a norma constante do artigo 97, § 13, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, pois nela está previsto, em suma, que, enquanto vigorar tal regime de pagamentos, o Município não pode sofrer sequestro de rendas oriundo de precatório, considerando que a Emenda Constitucional nº 62 acabou por revogar a previsão do sequestro contida no artigo 78, § 4º, do ADCT e suspendeu a eficácia do § 6º do art. 100 da Carta Magna, que previa a possibilidade de sequestro em caso de precedência ou de não alocação orçamentária de recursos para o pagamento de precatório.

Consequentemente, desapareceu o fundamento para os sequestros de receita que vinham sendo requeridos com base no artigo 78, § 4º, do mesmo ADCT (inserido pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/2000).

A determinação do prosseguimento de sequestro, em confronto com o preceito do citado artigo, sem dúvida, enseja a proliferação de situações assemelhadas a esta, cuja consequência principal não deixa de ser o considerável desequilíbrio das contas públicas, evidente prejuízo às políticas públicas em curso, atingindo a população carente, aquela que mais necessita e efetivamente utiliza os serviços essenciais prestados pelo Poder Público.

Aliás, o “efeito multiplicador” de situações assemelhadas à que fora exposta já é notória, tendo em vista os Mandados de Segurança nºs 990.10.394262-0, 990.10.237993-0, 990.10.519272-6, 0588043.07.2010, 0588992.31.2010, 0588995-83.2010, 0010966-42.2011, 0010961-20.2011.8.26.0000, 0010963-87.2011.8.26.0000 e 990.10.455.290-7, impetrados perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Ademais, verifica-se que as medidas intentadas pelas Procuradorias dos Municípios, como Diadema e São Paulo, perante o Supremo Tribunal Federal, para extensão da suspensão de segurança, foram deferidas, pois foi reconhecido pelo Supremo Tribunal estar configurado o efeito multiplicador e a lesão à economia pública.

Portanto, as disposições contidas na Emenda Constitucional nº 62/09 terão sua aplicação imediata, de forma a abranger todos os precatórios em mora.

Oportuno citar que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo também editou ato de caráter administrativo, com o objetivo de orientar e padronizar os serviços internos do Tribunal. Referido ato, isto é, a ordem de serviço 03/2010, em seu item 1, prescreve que:

1.1. O Estado, Municípios, Autarquias, Universidades e Fundações Públicas que disponham de orçamento próprio e que estejam em mora em 09/12/2009 com o pagamento de precatórios, ingressam automaticamente no regime especial de liquidação concebido pela EC 62/2009. (g.n.)

Parágrafo único – A mora é caracterizada pelo atraso de qualquer natureza no pagamento de Precatórios Judiciais consolidado até 09.12.2009 proveniente de depósitos insuficientes ou não pagamento da verba atual orçamentária até 2008 ou das parcelas vencidas ou vincendas das moratórias concebidas pelos art. 33 e 78 do ADCT. O regime especial, uma vez instaurado, abarca os novos débitos formados durante seu exercício até a quitação integral no prazo máximo de 13 anos.

Assim, verifica-se que a única interpretação razoável a ser dada aos preceitos advindos da Emenda Constitucional nº 62/09 é a de sua aplicação imediata e abrangência a todos precatórios pendentes de pagamento.

A questão aqui tratada – a observância ao regime especial do pagamento de precatórios estabelecido pela Emenda Constitucional nº 62/09 – reveste-se de excepcional importância para a preservação da ordem constitucional vigente.

Mostra-se oportuno transcrever recente decisão do Supremo Tribunal Federal, no sentido da suspensão da decisão do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que reconheceu a aplicabilidade imediata das alterações legislativas introduzidas pela citada emenda e a natureza evidentemente constitucional que a questão em debate se reveste. Vejamos:

SS 4303 / SP – SÃO PAULO

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA

Relator(a):  Min. PresidenteJulgamento: 26/11/2010

Decisão Proferida pelo(a) Min. CEZAR PELUSO

Publicação PROCESSO ELETRÔNICO DJe-233

DIVULG 01/12/2010 PUBLIC 02/12/2010

Partes

REQTE.(S)           : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

ADV.(A/S)           : MARIA APARECIDA DOS ANJOS CARVALHO

REQDO.(A/S)         : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

INTDO.(A/S)         : ANASTÁCIO ADMINISTRADORA DE BENS LTDA

ADV.(A/S)           : JOSÉ YUNES

“DECISÃO: 1. Trata-se de pedido de suspensão de segurança, formulado pelo Município de São Paulo, contra acórdão proferido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça paulista, no qual foi concedida a ordem, reconhecendo direito líquido e certo da impetrante de prosseguir no sequestro de verbas da Fazenda municipal.

Na origem, Anastácio Administradora de Bens Ltda. formulou, em fevereiro de 2007, pedido de sequestro perante a Presidência do Tribunal de Justiça paulista, visando à satisfação de parcelas vencidas de precatórios decorrentes de ação de desapropriação ajuizada em 1991. Em 24.9.2009 foi deferido o pedido, autorizando o sequestro de aproximadamente quarenta e cinco milhões de reais.

Como o mandado de sequestro não fora assinado, foi protocolado, em 26.1.2010, requerimento para expedição de nova ordem. O Presidente do TJ/SP, Desembargador Viana Santos, indeferiu o pedido e extinguiu o sequestro, sob fundamento de que a EC nº 62/09, em vigor na data do pedido de expedição do segundo mandado, mas não quando da decisão que autorizara o sequestro, colheria todos os precatórios ainda não pagos.

Contra a decisão foi interposto agravo regimental e, em paralelo, impetrado mandado de segurança. Na impetração sustentou-se ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição da República. Consta do mandamus:

 “Quanto ao ato jurídico perfeito e acabado, vale dizer que a decisão do então Presidente dessa Corte, Desembargador VALLIM BELLOCCHI, foi proferida dentro dos ditames legais vigentes à época de sua prolação, portanto, anterior à edição da EC nº 62, que veio ao mundo jurídico em dezembro de 2009.

Dessa forma, a Impetrante, que em 2007 protocolou pedido extremo, e teve a decisão deferida em seu favor em 24 de setembro de 2009, não pode ser penalizada pelo atraso da zelosa Serventia na expedição e cumprimento de mandado de sequestro.”

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu a ordem. Consta do acórdão:

“(…) em razão do princípio do tempus regit actum, não pode incidir a Emenda Constitucional nº 62/2009, pois que o pedido de sequestro está sedimentado e consumado na decisão que o determinou, prolatada em 24 de setembro de 2009, antes da vigência da referida Emenda Constitucional.”

No pedido de suspensão de que se cuida, o Município sustenta não ter sido publicada na imprensa oficial a decisão que autorizou o sequestro. E alerta para o fato de que “Todas as decisões proferidas para acolher os pleitos de saque forçado, perante o Tribunal de Justiça de São Paulo padecem desse vício (…)”, alegando, ainda, que a Corte paulista teria transformado em prática corrente a publicação de decisões desse teor apenas depois da consumação do auto de sequestro. E, em decorrência da alegada ausência de publicação, defende a nulidade da decisão, com ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República.

“Ora, sendo nula a decisão, por ausente o respeito à publicidade dos atos processuais, inquestionável que o precatório do requerente está colocado sob a égide da Emenda Constitucional 62/09, que colheu todos os precatórios não quitados, na data da sua promulgação.”

Por fim, atém-se à norma do art. 97 do ADCT, na redação da EC nº 62/09, segundo o qual, em síntese, os entes federados “que, na data de publicação desta Emenda Constitucional, estejam em mora na quitação de precatórios vencidos” devem fazer os respectivos pagamentos de acordo com as normas introduzidas pela Emenda.

2. É caso de suspensão.

De acordo com o regime legal de contracautela (Leis nºs 12.016/09, 8.437/92 e 9.494/97 e art. 297 do RISTF), compete a esta Presidência suspender execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. (g.n.)

A cognição do pedido exige, contudo, demonstração da natureza constitucional da controvérsia (cf. Rcl nº 497-AgR, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Plenário, DJ de 06.4.2001; SS nº 2.187-AgR, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 21.10.2003; e SS nº 2.465, Rel. Min. NELSON JOBIM, DJ de 20.10.2004).

Está preenchido o requisito, pois em jogo, aqui, suposta violação ao art. 97 do ADCT, com a redação dada pela EC nº 62/2009, e que teria sido afrontado pelo Tribunal de Justiça local. Não há dúvida, portanto, de que a matéria discutida na origem se reveste de índole constitucional.

Nesses termos, a Corte tem entendido, com base nas diretrizes normativas que disciplinam as medidas de contracautela, não ser vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, quando a decisão contra a qual se pede a suspensão seja contrária às normas jurídicas. Nesse sentido: SS nº 846-AgR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, de 29.5.96; e SS nº 1.272-AgR, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, de 18.5.2001.

Não há dúvida de que as normas do art. 97 do ADCT, nos termos da EC nº 62/2009, incidem sobre todos os débitos de precatórios não pagos até a entrada em vigor desta Emenda, enquanto não sobrevier a Lei Complementar de que trata o art. 100, § 15, da Constituição da República. No caso, é incontroverso que a Fazenda municipal se encontrava, na data inicial de vigência da Emenda, em débito com parcelas de precatórios.

A questão que se coloca, no entanto, é sobre a possibilidade de ser imposto ao credor o novo regime de pagamentos, quando já lhe havia decisão favorável de sequestro de verbas públicas, não publicada no órgão oficial. A resposta é positiva. É que, não havendo publicação da gravosa decisão de sequestro de verbas municipais, com consequente intimação da devedora, a decisão pode, em regra, ser objeto impugnação administrativa ou judicial.

3. Ante o exposto, defiro o pedido, para suspender a execução do acórdão proferido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos do Mandado de Segurança nº 990.10.076122-6, até o trânsito em julgado ou ulterior deliberação desta Corte.

Exp. com urgência telex e ofício ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Publique-se. Int..” (g.n.)

Frise-se que a Emenda Constitucional nº 62/09 deve ser observada por todos entes públicos federados e repercute sobre normas de ordem pública que dizem respeito a previsão orçamentária, controles contábeis, critérios de cálculo para atualização de valores a serem pagos por força de sentença, etc.

Assim, repita-se, é clara a grave lesão à economia pública e à ordem pública, bem como quanto à natureza constitucional da discussão em debate devido à ofensa direta gerada pela decisão da concessão da liminar aos dispositivos introduzidos pela Emenda Constitucional nº 62/09, em especial o art. 97, § 13, do ADCT.

O Supremo Tribunal Federal já se posicionou no sentido da imediata aplicação do artigo 97, § 13, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, por meio de duas Suspensões de Segurança, uma intentada pelo Município de São Paulo (SS 4303) e, outra, pela Municipalidade de Diadema (SS 4421), sendo que ambas decisões foram no sentido da suspensão do prosseguimento dos sequestros, isto é, a favor da aplicação imediata dos preceitos introduzidos pela Emenda Constitucional nº 62/09.

Mostra-se aqui oportuna a transcrição de excerto do artigo de lavra do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Venicio Salles, publicado na Revista do Advogado, ano XXXI, n. 111, abril/2011, cujo tema explorado foi a Emenda Constitucional nº 62/09 e o regime especial destinado à liquidação da mora do pagamento dos precatórios. Vejamos:

“[…] As sanções previstas no art. 78 do ADCT continuam operando efeito com relação aos décimos, permitindo o poder liberatório para a compensação tributária dos valores não pagos, bem como requisição de parcelas não incluídas na Lei Orçamentária. Com relação ao sequestro, foi concebida uma restrição prevista no ADCT, art. 97, § 13, que veda a sua utilização enquanto houver pagamento do Regime Especial, questão duvidosa, e que deverá atormentar a vida dos julgadores.

A princípio, o credor incluído no Regime Especial poderá apenas se valer do sequestro por preterição ou aguardar as novas formas punitivas previstas na Emenda Constitucional n. 62/2009.[…]” (g.n.)

Assim, vale relembrar o que dispõe o art. 97, § 13, do ADCT:

“Enquanto Estados, Distrito Federal e Municípios devedores estiverem realizando pagamentos de precatórios pelo regime especial, não poderão sofrer seqüestro de valores, exceto no caso de não liberação tempestiva dos recursos de que tratam o inciso II do § 1º e o § 2º deste artigo”.

4. Considerações Finais

A Emenda Constitucional nº 62/2009 acrescentou o artigo 97 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, instituindo um regime especial de pagamento de precatórios pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, que permitiu aos Entes Federados o parcelamento do estoque de precatórios em 15 anos ou depósito em conta especial do percentual de apensas 1,5% a 2% da receita corrente líquida, e ainda, a debatida possibilidade do devedor se utilizar de leilão para pagamento de seu débito àqueles credores que oferecerem maior deságio.

Da leitura da redação da Emenda Constitucional nº 62 nota-se uma tentativa do Legislador Constituinte Derivado em resolver a grave situação brasileira no que se refere ao acúmulo da dívida pública, assim como evitar a violação dos direitos fundamentais dos cidadãos e contribuintes.

A Emenda Constitucional n° 62/09 estabeleceu também que, enquanto os entes devedores estiverem realizando pagamentos de precatórios pelo regime especial, não poderão sofrer sequestro de valores, exceto no caso de não liberação tempestiva dos recursos na forma prevista no inciso II, §1º, do art. 97, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Assim, portanto, uma vez optando pelo regime especial para pagamento de precatórios, a Fazenda Pública devedora não mais sofrerá sequestro de suas contas, a não ser que deixe de efetuar o depósito mensal, em conta especial, do correspondente a 1/12 (um doze avos) do valor apurado percentualmente sobre as respectivas receitas correntes líquidas, apuradas no segundo mês anterior ao mês de pagamento, nos termos do inciso II, do §1º.

No entanto, ao ser editada a Emenda Constitucional 62/2009, atinente ao regime de precatórios, a posição inicial da Presidência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo foi no sentido da extinção dos pedidos de sequestro de rendas públicas, quando a apreensão efetiva do numerário ainda não tivesse ocorrido, por se considerar, em tal caso, inexistente seja situação jurídica consolidada, seja ofensa a ato jurídico perfeito ou a direito adquirido.

Frise-se inexistir qualquer ilegalidade na decisão de extinção do pedido de sequestro, ante o advento da Emenda Constitucional nº 62/09, uma vez que sua aplicação é imediata, abrange todos os precatórios pendentes de atendimento e, ademais, suas disposições obstam a decretação de sequestro de rendas em qualquer hipótese, desde que o ente público esteja adimplente quanto ao repasse mensal de valores ao Tribunal de Justiça, previsto na citada emenda.

No entanto, na prática, tais decisões de extinção de sequestro foram alvo de mandados de segurança com pedido liminar, sendo que muitos tiveram suas liminares deferidas.

O Supremo Tribunal Federal já se posicionou no sentido da imediata aplicação do artigo 97, § 13, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, por meio de duas Suspensões de Segurança, uma intentada pelo Município de São Paulo (SS 4303) e, outra, pela Municipalidade de Diadema (SS 4421), sendo que ambas decisões foram no sentido da suspensão do prosseguimento dos sequestros, isto é, a favor da aplicação imediata dos preceitos introduzidos pela Emenda Constitucional nº 62/09.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Mariana Katsue Sakai

Procuradora do Município de DiademaSP; Bacharel em Direito pela Universidade Paulista; Especialista em Direito Público pela Universidade Damásio de Jesus e pós-graduada em Direito Municipal pela UNIDERP


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