Resumo: O trabalho apresentado trata da inserção da pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho. Primeiramente, será feito um breve estudo sobre as pessoas portadoras de deficiência em que demonstrará um panorama histórico, também será relatado como se deu a evolução no Brasil, e ainda qual é a terminologia adotada, o conceito de pessoa portadora de deficiência e as diferenças entre a incapacidade e a deficiência. Em segundo plano o trabalho fará referência à pessoa portadora de deficiência no ordenamento constitucional brasileiro. Este capítulo faz menção as pessoas portadoras de deficiência no ordenamento constitucional brasileiro e a aplicação do princípio da igualdade em relação a estas pessoas. E por fim, o assunto demonstrado é a inserção do deficiente no mercado de trabalho e o sistema de cotas. Aqui, será demonstrado o sistema de cotas para pessoas portadoras de deficiência na relação de emprego no âmbito privado e trará algumas questões polêmicas acerca do sistema de cotas.[1]
Palavras-chave: Pessoas portadoras de deficiência, sistema de cotas, mercado de trabalho.
Abstract: The presented work is about the person's deficiency carrier insert in the labor market. Firstly, it will be made a brief study on the people deficiency carriers in that it will demonstrate a historical panorama, it will also be told as he/she gave him the evolution in Brazil, and still which is the adopted terminology, person's deficiency carrier concept and the differences between the inability and the deficiency. In second plan the work will make reference to the person deficiency carrier in the Brazilian constitutional. This chapter makes mention the people deficiency carriers in the Brazilian constitution and the application of the beginning of the equality in relation to these people. It is finally, the demonstrated subject is the insert of the faulty in the labor market and the system of quotas. Here, the system of quotas will be demonstrated for people deficiency carriers in the employment relationship in the private ambit and he/she will bring some polemic subjects concerning the system of quotas.
Keywords: People deficiency carriers, system of quotas, labor market.
Sumário: Introdução. 1. Breve estudo das pessoas portadoras de deficiência. 1.1. Panorama histórico. 1.1.1. Evolução no Brasil. 1.2. A terminologia adotada. 1.3. Conceito de pessoa portadora de deficiência. 1.4. Diferença entre deficiência e incapacidade. 2. A pessoa portadora de deficiência no ordenamento constitucional brasileiro. 2.1. O ordenamento constitucional brasileiro e as pessoas portadoras de deficiência. 2.1.1. A Constituição Federal de 1988. 2.2. As pessoas portadoras de deficiência na Constituição Federal de 1988. 2.2.1. Normatização constitucional. 2.3. O princípio da igualdade e a proteção da pessoa portadora de deficiência. 3. Inserção do deficiente no mercado de trabalho e o sistema de cotas. 3.1. O sistema de cotas para pessoas portadoras de deficiência na relação de emprego: setor privado. 3.1.1. Análise do art. 93 da Lei 8.213/91. 3.2. Questões polêmicas acerca do sistema de cotas. 3.2.1. O percentual indicado na legislação faz referência à empresa ou ao estabelecimento? 3.2.2. Sistema de cotas nas empresas com atividades sazonais, perigosas e/ou insalubres e rurais. 3.2.3. O preenchimento das cotas e a terceirização. 3.2.4. O preenchimento das cotas de pessoas portadoras de deficiência e menores aprendizes. 3.3. Análise das peculiaridades do contrato de trabalho. 3.3.1. Critérios de admissão de pessoas portadoras de deficiência. 3.3.2. Salário e equiparação salarial. 3.3.3. Local de trabalho. 3.3.4. Jornada de trabalho. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O trabalho tratará de um assunto em que a legislação brasileira é considerada das mais avançadas no mundo: proteção e apoio à pessoa com deficiência. Porém, ainda existem grandes lacunas, barreiras e preconceitos a serem superados em sua aplicação, para que se estabeleça plenamente a proteção e a integração da pessoa com deficiência ao mercado de trabalho. Deste modo, a pessoa deficiente não enfrenta carência de instrumentos legais, mas de sua eficácia, pois já existe legislação perfeitamente aplicável aos casos concretos.
O tema tem sua relevância em razão do grande desafio que é fazer com que as pessoas portadoras de deficiência tenham vida com qualidade. Assim, as adaptações nas rotinas, operações e instalações dos ambientes de trabalho são necessárias e essenciais.
Como poderá ser observado o estudo está dividido em três capítulos. Para iniciar esse trabalho, no primeiro capítulo, é realizado um breve estudo das pessoas portadoras de deficiência, tratando do panorama histórico, da terminologia adotada, do conceito de pessoa portadora de deficiência, e da diferença entre incapacidade e deficiência.
Já o segundo capítulo, mostra a pessoa portadora de deficiência dentro do ordenamento constitucional brasileiro, bem como o princípio da igualdade e a proteção da pessoa portadora de deficiência.
Para finalizar, o terceiro capítulo, tem como conteúdo textual a inserção do deficiente no mercado de trabalho em que irá tratar do sistema de cotas no setor privado, bem como fazer uma análise acerca de questões polêmicas. E, por fim, faz um exame sobre as peculiaridades do contrato de trabalho da pessoa portadora de deficiência, que é o instrumento que efetiva a possibilidade de cumprimento do sistema de cotas.
Portanto, como é de se observar o tema “a inserção da pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho” é um assunto muito importante na relação de emprego. Pois precisa ser abordado principalmente no que diz respeito ao sistema de cotas que a nossa legislação institui e das dificuldades das empresas por em prática.
1. BREVE ESTUDO DAS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA
1.1. Panorama histórico
Um resumido relato histórico mostra a divisão do tratamento atribuído aos deficientes em várias fases da humanidade, o qual compreende desde as atrocidades por eles sofridas, passando pelo menosprezo, pela concessão de certas vantagens e até mesmo pelo reconhecimento de serem enviados pelos deuses.
Na mitologia grega, por sua vez, mais precisamente na sociedade espartana, a vida das crianças era decidida pelos velhos e a presença de um defeito físico poderia implicar a condenação à morte (seriam atiradas do alto do Taigeto), para que não fosse transmitida a falta de fortaleza a gerações futuras. Já aqueles que eram escolhidos para a vida eram, a partir dos doze anos, mandados para o campo, onde deviam aprender sozinhos a se sustentar. Se não morressem de fome ou frio, estariam aptos a viver como soldados espartanos.
Na sociedade romana, ou o pai matava o filho que era defeituoso (como determinava a Lei das XII Tábuas) ou o abandonava. Nesse caso, estes eram acolhidos para serem usados na prática de mendicância ou eram vendidos como escravos.
Na idade Média, os indivíduos portadores de deficiência física eram vítimas de extermínio, porque os concebiam como portadores de poderes especiais, oriundos dos demônios. Apesar disso, começaram a surgir hospitais e abrigos destinados aos doentes e também as pessoas portadoras de deficiência.
Por outro lado, no Renascimento, com o surgimento do espírito científico, os deficientes físicos começam a desfrutar de um tratamento mais humanitário.
E, na idade Moderna, alguns deficientes físicos tornaram-se notáveis no campo das artes e da literatura.
O tema da integração dos deficientes na sociedade e no mercado de trabalho nunca esteve tão presente, seja na legislação vigente, seja em estudos científicos e acadêmicos. Porém, os avanços concretos ainda são discretos, ainda tem-se um longo caminho até que as pessoas portadoras de deficiência tenham seus direitos básicos assegurados e efetivados.
1.1.1. Evolução no Brasil
No Brasil até os anos de 1940 a deficiência era conseqüência da má-formação congênita ou de doenças decorrentes da idade avançada. Existiam, ainda, os acidentes que ocorriam com pessoas adultas, sendo que nestes poucos sobreviviam. Além disso, crianças com o conhecido “retardo mental” e os adultos cegos eram afastados do meio social. Nessa época quem tinha uma deficiência era julgado incapaz para praticar um trabalho. Nesse período, as instituições filantrópicas entediam que o melhor era dar proteção e asilo a essas pessoas.
No final da década de 40 aconteceram dois fatos mundiais (Segunda Guerra Mundial e a Revolução Industrial-ocorrida nos anos 50) que fizeram com que as pessoas portadores de deficiência fossem um tema que merecesse atenção. Nesse momento as opiniões tomaram duas correntes principais: uns entendiam que os empregadores deveriam ser contra a reserva de vagas para portadores de deficiência nas grandes indústrias, enquanto outros acreditavam na reabilitação para o trabalho com fundamento na exploração das capacidades de cada trabalhador. Até o momento não existia nenhum projeto no país de ação concreta que tivesse sido pensado pelo poder público ou por particulares.
Já as décadas de 1960 e 1970 apresentaram os movimentos de protesto da população e a retomada pelos grupos minoritários da Carta das Nações Unidas de 1945. Nessas décadas é que passam a existir documentos internacionais que produziram novo conceito econômico, social e político às discussões atuais sobre emprego e trabalho, como por exemplo: a Declaração dos Direitos do Deficiente Mental (ONU, 1971), a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (ONU, 1975) e a Convenção 159 Sobre Reabilitação Profissional e Emprego de Pessoas Deficientes (OIT, 1983).
Apenas com a Constituição Federal de 1988 é que a proteção das pessoas com deficiência passou a integrar as normas constitucionais. A Constituição em vários capítulos veio concretizar os direitos sociais e individuais, incluindo os de acesso ao trabalho, dos portadores de deficiência.
A década de 1990 tem que os princípios da Convenção 159 são os estimulantes sociais das discussões dessa época. O Brasil tem estado distante de cumprir inteiramente o que estabelece a Convenção 159 em seu art.3º:
“Essa política deverá ter por finalidade assegurar que existam medidas adequadas de reabilitação profissional ao alcance de todas as categorias de pessoas deficientes e promover oportunidades de emprego para as pessoas deficientes no mercado regular de trabalho”.
Ao que tudo indica a distância entre a necessidade de independência econômica e social dos portadores de deficiência e a dificuldade brasileira de cumprir o que determina a Convenção foi a pedra de toque, no ano de 2000, do ressurgimento revigorado de antigos textos legais e da edição de novos. Atualmente, o Brasil tem tentado dar efetividade as suas leis de proteção a pessoas portadora de deficiência.
1.2 A terminologia adotada
Através da análise da doutrina e legislação, conclui-se que a pessoa portadora de deficiência já foi denominada das mais diversas formas, havendo, ainda hoje divergências doutrinárias acerca da melhor terminologia.
Várias eram as expressões usadas (como por exemplo: retardado, aleijado, mancos) e muitas destas assumiram com o passar do tempo, feição pejorativa e, por vezes, discriminatória. Por esse motivo, muitas dessas expressões foram sendo afastadas e rejeitadas.
Hoje, a discussão orienta-se pela escolha da melhor terminologia, sendo empregadas as seguintes expressões: pessoas portadoras de deficiência; pessoas portadoras de necessidades especiais; e, pessoas com deficiência. Ainda não se chegou a uma conclusão de qual expressão deve ser usada.
Estas três expressões demonstram uma transformação de tratamento que vai da invalidez e incapacidade à tentativa de nominar a característica peculiar da pessoa, sem estigmatizá-la.
Existem doutrinadores que entendem que a expressão "pessoa com necessidades especiais" é um gênero que contém as pessoas com deficiência, mas também acolhe os idosos, as gestantes, enfim, qualquer situação que implique tratamento diferenciado.
Há quem diga que deve ser usado o termo “pessoas portadoras de deficiência, pois é a adotada pela Constituição Federal de 1988 e pela legislação em vigor. Outros entendem ser a expressão “pessoas com deficiência” eis que é encontrada em algumas declarações internacionais e algumas vezes em doutrinas.
Como pode ser observado encontram-se atualmente as três expressões, podendo concluir que qualquer dessas expressões poderá ser usada.
1.3 Conceito de pessoa portadora de deficiência
O conceito para se definir pessoa portadora de deficiência foi apresentado em vários instrumentos internacionais e também na legislação nacional.
Observa-se, portanto, diferentes abordagens, assim, o conceito será definido conforme o bem que se pretende proteger. Nesse sentido, a Organização Internacional do Trabalho elaborou um conceito vinculado à possibilidade de obtenção e manutenção de emprego. Já a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes traz um conceito mais amplo, voltado essencialmente para as dificuldades da vida individual e social. Por fim, o conceito da Lei 10.098/00, por tratar de questões relacionadas à acessibilidade propriamente dita, é mais elástico, considerando que os problemas atinentes à acessibilidade podem afetar permanente e/ou temporariamente, boa parte das pessoas, quer elas portem uma deficiência, quer elas estejam, momentaneamente, incapazes de usufruir sua plena capacidade motora.
Para Luis Alberto David de Araújo[2] que define a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade.
No âmbito do direito do trabalho, conceitua-se pessoa portadora de deficiência como aquela que enfrenta maiores dificuldades para se inserir no mercado de trabalho e nele se manter e desenvolver, especialmente quando comparado às pessoas que não portam tais limitações, necessitando, pois, de medidas compensatórias com vistas a efetivar a igualdade de oportunidade e o acesso ao emprego.
1.4 Diferença entre deficiência e incapacidade
Deficiência e incapacidade têm significados diferentes, ou seja, ter deficiência não é ter incapacidade. Segundo o dicionário Aurélio, deficiência significa falta, carência; insuficiência. Já incapacidade quer dizer falta de aptidão, de habilidade.
Observa-se, então, que a pessoa portadora de deficiência não é essencialmente incapaz para o trabalho.
Rubens Valtecides Alves[3] adverte que considerar uma pessoa portadora de deficiência física como incapaz é igual a diminuí-la a um ser inútil. Em certas situações os deficientes físicos não podem praticar determinados trabalhos, mas são na maioria das vezes trabalhadores em potencial como qualquer outra pessoa.
Como pode ser observado, o Decreto 3.298/99, em seu art.3º, conceitua de maneira diferente as expressões deficiência, deficiência permanente e incapacidade, confirmando a distinção de conteúdo entre os vários conceitos.
“Art. 3o Para os efeitos deste Decreto, considera-se:
I – deficiência – toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano;
II – deficiência permanente – aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos; e
III – incapacidade – uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida”.
Dessa forma, é verificada nas atuais contratações de pessoas portadoras de deficiência que as limitações de significativa parte das deficiências não levam, obrigatoriamente, à incapacidade para o trabalho. Constata-se que quando apresentada alguma oportunidade à pessoa portadora de deficiência, esta se mostra apta ao trabalho, devendo apenas se descobrir a compatibilidade entre o trabalho e a limitação.
2. A PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA NO ORDENAMENTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO
2.1 O ordenamento constitucional brasileiro e as pessoas portadoras de deficiência
A primeira vez em que se fez menção às pessoas portadoras de deficiência (conhecidas, nessa época, como desvalidos) no ordenamento constitucional brasileiro foi na constituição de 1934, que, também, foi a primeira a inserir direitos sociais.
A Constituição de 1937 era ainda elementar na referência que fazia. As Constituições seguintes (de 1946 e 1967) não fizeram qualquer menção em relação às pessoas portadores de deficiência, mas vale destacar que foram as primeiras a inserir os direitos trabalhistas e previdenciários.
Encontra-se na Emenda 01 de 1969 a primeira referência constitucional expressa às pessoas portadoras de deficiência. Esta emenda constitucional alterou o artigo 175, §4º da Constituição Federal de 1967 que passou a ter a seguinte redação:
“Art.175- A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos.
§4º Lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à adolescência e sobre a educação de excepcionais.”
Como pode ser observado o dispositivo faz referência à expressão “excepcionais” e em comentário a essa disposição constitucional alguns doutrinadores a conceituaram. Como exemplo, tem-se Pontes de Miranda[4] que afirma que “excepcionais está, aí, por pessoas que, por faltas, ou defeitos físicos ou psíquicos, ou por procedência anormal (nascido, por exemplo, em meio social perigoso), precisam de assistência”.
A autora Nair Lemos Gonçalves[5], no texto em que comenta o artigo 175, §4º da CF de 1967, já mencionava a necessidade de normas para a integração das pessoas portadoras de deficiência mental, inclusive, com o objetivo de capacitar e profissionalizar os portadores de deficiência de modo a possibilitar que eles encontrassem oportunidades de emprego e acesso social. Logo veio a Emenda 12 de 1978 que trouxe um único artigo prevendo:
“É assegurado aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica, especialmente mediante:
I- educação especial e gratuita;
II- assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País;
III- proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e salários;
IV- possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.”
Verifica-se que a Emenda constitucional mencionada, inseriu no ordenamento constitucional tutelas ligadas à educação; reinserção na vida econômica e social; ao trabalho; e, por fim, a questão urgente da acessibilidade aos edifícios e logradouros públicos.
Embora a Emenda 12/78 tenha trazido direitos relacionados à pessoa portadora de deficiência, somente com a Constituição Federal de 1988 é que se tem um avanço no assunto. O presente texto constitucional foi além dos princípios e decidiu prever direitos das pessoas portadoras de deficiência em diversas áreas, além disso, parte das normas relacionadas ao tema na Constituição são normas programáticas, que dependem de legislação ordinária para sua regulamentação e nota-se que significativa parte já foi promulgada.
2.1.1 A Constituição Federal de 1988
Vários dispositivos da Constituição brasileira são dedicados a amparar as pessoas com deficiência no desejo de ressaltar que são estendidos a elas todos os direitos inerentes à cidadania e à dignidade, norma fundamental da estrutura da Magna Carta.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, caput, estabelece que:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.”
Com o que dispõe esse artigo considera-se que dignidade e pessoa humana devem ser levadas em conta em toda interpretação constitucional, pois se violado haverá a ausência de justiça. Nota-se, portanto, que a aplicação da Constituição e das leis deve tomar por conta a repercussão democrática dessas leis, tanto na origem, quanto no efeito. Não se trata puramente de aplicar a lei, ou qualquer lei. Deve ser uma lei democraticamente elaborada e voltada, sua aplicação, para os interesses do povo.
O art. 3º da Constituição Federal é à base das ações afirmativas públicas e privadas. A norma não se transige com a mera afirmação dos direitos de cidadania e dignidade, mas exige uma postura pró-ativa do Estado e da sociedade para que as desigualdades econômicas, políticas e sociais sejam enfrentadas e, efetivamente, superadas por meio de ações imperativas.
Dessa forma, O art. 3° é outro dispositivo da Constituição de 1988 que deve ser observado:
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Esse dispositivo mostra que todos os cidadãos brasileiros devem ter uma vida digna.
Com base nisso, tanto o Estado como a sociedade estão obrigados a juntar esforços para promover a proteção das pessoas portadoras de deficiência e efetivar os direitos tutelados na Constituição e nas leis.
2.2 As pessoas portadoras de deficiência na Constituição Federal de 1988
Na Constituição Federal de 1988 foram introduzidos vários dispositivos acerca dos direitos das pessoas portadoras de deficiência. Vale destacar que foram inseridas, também, diversas normas relativas ao trabalho do portador de deficiência. Observa-se, portanto, que houve um grande avanço no assunto após 1988 com a promulgação da Carta Magna desse ano e, também, com as diversas leis ordinárias promulgadas após esse período.
2.2.1 Normatização constitucional
A Constituição Federal de 1988 prevê normas ligadas ao direito do trabalho das pessoas portadoras de deficiência, tanto no âmbito privado, tanto no âmbito público.
Afirma, Jaime Jose Bilek Iantas[6], de forma contundente que sensível aos anseios da população na batalha por uma sociedade justa, democrática e contra qualquer forma de discriminação, na Constituição de 1988, na esteira da Declaração dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Assembléia Geral da ONU, foi inserido diversos dispositivos de proteção a pessoa portadora de deficiência.
Ao tratar da pessoa com deficiência, a Constituição determinou a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas com deficiência (artigo 23, II); a competência concorrente para legislar visando à proteção e integração do deficiente (artigo 24, XIV).
O artigo 7º, XXXI, da CF, dentre o rol de direitos trabalhistas aplicáveis aos trabalhadores urbanos e rurais, proíbe qualquer discriminação salarial e critérios de admissão de trabalhadores com deficiência, dessa forma, assegura o princípio da igualdade.
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;”
A respeito desse dispositivo Maria Aparecida Gugel[7] entende que esse artigo é de vital importância, eis que a nação brasileira assume o compromisso de admitir a pessoas com deficiência como trabalhador, desde que as limitações físicas não sejam incompatíveis com a atividade disponível.
Em relação ao setor público, o artigo 37, VIII, da CF estabelece que seja reservado, por lei, um percentual de cargos e empregos públicos as pessoas com deficiência e também sejam definidos os critérios de admissão. Esse dispositivo estipula a discriminação positiva na esfera da administração direta e indireta. É o texto, in verbis:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
VIII – a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;”
Esse dispositivo salienta que o candidato portador de deficiência não poderá habilitar-se para qualquer vaga, mas apenas para aquela que esteja apto.
O artigo 203, IV e V, da CF prevê, in verbis:
“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (…)
IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”
Nota-se que o artigo mencionado estabelece que a assistência social será prestada a quem dela precisar, independentemente de contribuição à seguridade social. E tem como objetivos a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração a vida comunitária; a garantia de um salário mínimo mensal a essas pessoas e ao idoso que comprovem não ter meios de se manter, ou que sejam mantidos por sua família, conforme dispuser a lei. A referida lei á que trata do benefício assistencial (Lei 8.742/93) Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS[8].
Por sua vez, a educação das pessoas portadoras de deficiência é especificamente tutelada no ordenamento constitucional vigente em dois dispositivos distintos, quais sejam artigos 208, III e 227, §§ 1º e 2º:
“Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) (…)
II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
§ 2º – A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.”
Primeiramente prevê o artigo 208, III, da CF que a educação é dever do Estado e será efetivado pela garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
Já o artigo 227, § 1º II, prevê é necessária a criação de programas de prevenção e atendimento especializados para os portadores de deficiência (física, sensorial ou mental), bem como a integração social do adolescente com deficiência, por meio de treinamento para o trabalho, convivência e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos físicos.
Além disso, o § 2º do artigo 227, dispõe sobre a acessibilidade dos deficientes às escolas, aos hospitais, aos parques e aos locais de trabalho.
A Carta Magna ainda traz instrumentos para defesa e garantia dos direitos fundamentais assegurados às pessoas portadoras de deficiência, como o mandado de segurança coletivo e a ação civil pública (arts. 5º, LXX e 129, III).
E, ainda, a Constituição ao proibir em seu art. 60, § 4º, IV, qualquer proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais, traz mais uma vez em seu texto um grande avanço na proteção dos direitos das pessoas portadoras de deficiência. Ocorre que os direitos e garantias individuais tratados no inciso IV dizem respeito aos direitos elencados no art. 5º e nos do art. 6º, ambos da Constituição.
Entende-se, então, que nenhuma reforma poderá reduzir os níveis de proteção social dispostos originariamente no texto constitucional, cabendo sempre a manutenção de certos conteúdos determinados na Constituição, especialmente os que integram o núcleo material da ordem constitucional.
2.3 O princípio da igualdade e a proteção da pessoa portadora de deficiência
O princípio da igualdade está previsto no art.5º, caput, da Constituição Federal, este princípio vem à frente de todos os direitos e garantias fundamentais, orientando a interpretação a ser dada aos direitos e deveres individuais e coletivos.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”
A Carta Magna de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo que todos têm o direito de tratamento idêntico. Embora seja essa a determinação da lei, hoje não é mais suficiente considerar todos iguais perante a lei, é preciso tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na exata medida das desigualdades. Desse modo, surge para o Direito o que se conhece como isonomia material.
É no contexto de tratamento diferenciado das pessoas que se encontram em circunstâncias de desigualdade que o legislador constituinte com base no princípio da igualdade reservou a devida atenção à questão relacionada aos direitos pertinentes às pessoas portadoras de deficiência.
No mesmo sentido Alexandre de Moraes[9] entende que:
“A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento idêntico pela lei em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, e exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente se tendo por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito(… )”.
Ademais, uma forma de efetivar o princípio da igualdade seria a proibição de toda e qualquer forma de discriminação.
A Constituição Federal de 1988, em art.7º, XXXI, traz expressamente a proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critério de admissão do trabalhador portador de deficiência.
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;”
Contudo, ao fazer uma análise superficial pode-se chegar a uma conclusão equivocada de que a proteção dada aos portadores de deficiência gera uma quebra do princípio constitucional da igualdade. Verifica-se que no caso dos direitos protetivos da pessoa portadora de deficiência não existe conteúdo discriminatório, uma vez que há total compatibilidade entre estas e os interesses constitucionalmente tutelados. Cabe destacar que o próprio Direito do Trabalho já tem esta característica marcante de proteger o hipossuficiente na relação contratual de modo a tentar reduzir as desigualdades existentes entre os detentores do capital e da força de trabalho, mediante normas elaboradas e interpretadas de acordo com o principio protetivo. Como este, pode-se dizer que existem muitos exemplos de discriminação legítima (é aquela que não ofende ao princípio constitucional da igualdade).
Esse modo atual de considerar o princípio da igualdade como igualdade material, ressalta a vedação geral do arbítrio, ou seja, a proibição de medidas legislativas arbitrárias. Considera-se lei arbitrária aquela que trata desigualmente as pessoas em situações iguais, e, igualmente situações desiguais sem que haja um motivo para a diferença ou identidade no tratamento. Conclui-se, que deve haver uma igualdade proporcional.
3. INSERÇÃO DO DEFICIENTE NO MERCADO DE TRABALHO
3.1. O sistema de cotas para pessoas portadoras de deficiência na relação de emprego: setor privado
A Constituição brasileira, em correlação com a idéia de ação afirmativa, optou pela adoção de um sistema de cotas ou de reserva legal para incentivar a inclusão das pessoas portadoras de deficiência no mercado formal de trabalho.
Nota-se que a Constituição, em seu art. 37, VIII, já previa expressamente a reserva de vagas para pessoas portadoras de deficiência na Administração Pública. Assim, o legislador ordinário tratou de agir de forma ativa na reserva de vagas nas empresas da iniciativa privada.
De tal modo, encontra-se disposto no art. 93 da Lei 8.213/91 o sistema de cotas para empregados portadores de deficiência no âmbito do setor privado. Determina o referido artigo, in verbis:
“Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:
I – até 200 empregados……………….2%;
II – de 201 a 500……………………….3%;
III – de 501 a 1.000……………………4%;
IV – de 1.001 em diante. ……………5%.
§ 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante.
§ 2º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados.”
Observa-se que a Lei 8.213/91 materializa a vontade estatal de tratar de modo diferenciado estes trabalhadores, obrigando aos empregadores com mais de 100 empregados a contratarem um percentual mínimo de portadores de deficiência.
Ressalta-se que a reserva de um percentual de vagas no serviço público aos portadores de deficiência e a obrigação de contratá-los pelos empregadores da iniciativa privada não violam o princípio da igualdade.
Todavia, as disposições do art. 93 da Lei 8.213/91 foram repetidas no Decreto 3.298/99, sendo que este introduziu algumas disposições adicionais referente ao conceito de pessoa portadora de deficiência habilitada e também quanto à competência do Ministério do Trabalho e Emprego para estabelecer uma sistemática de fiscalização, avaliação e controle das empresas, com vistas a propiciar estatísticas sobre o número de empregados portadores de deficiência.
3.1.1. Análise do art. 93 da Lei 8.213/91
A lei 8.213/91 dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, sendo que o art.93 especificamente trata do sistema de cotas para empregados portadores de deficiência, no âmbito das empresas privadas.
Em relação aos beneficiários da política instalada, nota-se que a lei incluiu no âmbito de proteção todas as pessoas portadoras de deficiência habilitadas e os trabalhadores reabilitados.
Ao utilizar a expressão genérica “pessoas portadoras de deficiência” a lei incluiu as pessoas portadoras de deficiência mental, sendo evidente que, para o preenchimento dos percentuais impostos na lei, as empresas podem contratar pessoas que portem qualquer deficiência desde que habilitados para o trabalho e, opcionalmente, as empresas podem contratar beneficiários reabilitados.
A delimitação do público que se quer incluir no mercado formal de trabalho, com a instalação do sistema de cotas, encontra-se prevista no Decreto 3.298/99, o qual apresenta em seu art.4º, um rol restritivo de hipóteses, in verbis:
“Art. 4o É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:
I – deficiência física – alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
II – deficiência auditiva – perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
III – deficiência visual – cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
IV – deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:
a) comunicação;
b) cuidado pessoal;
c) habilidades sociais;
d) utilização dos recursos da comunidade; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
e) saúde e segurança;
f) habilidades acadêmicas;
g) lazer; e
h) trabalho;
V – deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências.”
Igualmente, são consideradas pessoas portadoras de deficiência habilitadas, de acordo com o Decreto 3.298/99, aquelas que concluíram curso de educação profissional de nível básico, técnico ou tecnológico, ou curso superior, com certificação ou diplomação expedida por instituição pública ou privada, legalmente credenciada pelo Ministério da Educação ou órgão equivalente, ou aquela com certificado de conclusão de processo de habilitação ou reabilitação profissional fornecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), e também aquelas que, não tendo se submetido a processo de habilitação ou reabilitação, estejam capacitadas para o exercício da função.
Observa-se que pessoas portadoras de deficiência habilitadas e trabalhadores habilitados diferem dos segurados da Previdência Social, afastados por doença ou invalidez.
Percebe-se que a legislação vigente determina que toda e qualquer empresa com mais de cem empregados registrados deve contratar empregados portadores de deficiência.
Compreende-se que qualquer pessoa portadora de deficiência poderá ser contratada pelas empresas privadas quando demonstrar capacidade para assumir as atividades atinentes à vaga de trabalho ofertada. A aptidão para o trabalho pode ser atestada pelo empregador que, independente de processo de habilitação ou reabilitação, poderá ser feita a admissão.
Apesar de a lei mencionar pessoa portadora de deficiência habilitada, basta à verificação, pelo empregador, das potencialidades e habilidades do candidato, sem ser condição para a contratação a submissão prévia a qualquer programa de qualificação profissional disponibilizado pelo INSS.
Da leitura do §1º do artigo em análise extrai-se que o empregado portador de deficiência não possui estabilidade no emprego, eis que o empregador pode rescindir, a qualquer tempo, o contrato de trabalho. No entanto, o empregador tem como única limitação a contratação de outro profissional portador de deficiência, com o fim de preencher a cota prevista na lei.
Nesse sentido, Sergio Pinto Martins[10] entende que:
“Trata-se de hipótese de garantia de emprego em que não há prazo certo. A dispensa do trabalhador reabilitado ou dos deficientes só poderá ser feita se a empresa tiver o número mínimo estabelecido pelo art. 93 da Lei nº 8.213. Enquanto a empresa não atinge o número mínimo previsto em lei, haverá garantia de emprego para as referidas pessoas. Admitindo a empresa deficientes ou reabilitados em percentual superior ao previsto no art. 93 da Lei nº 8.213, poderá a empresa demitir outras pessoas em iguais condições até atingir o referido limite. Poderá, porém, a empresa dispensar os reabilitados ou deficientes por justa causa.”
Com efeito, de acordo com o art. 482 da Consolidação das Leis Trabalhistas, não há impedimento para o empregador dispensar o empregado portador de deficiência e/ou reabilitado por justa causa independentemente de a cota estar preenchida.
Determina o Decreto 3.298/99 que a pessoa portadora de deficiência habilitada pode recorrer à intermediação de órgão integrante do sistema público de emprego para fins de inclusão laboral. Desse modo, a lei indiretamente impôs ao Estado a adotar medidas com vistas à consecução da obrigação imposta às entidades privadas.
A citada intermediação tem sido realizada por meio das Secretarias estaduais de Emprego e Agencias de Trabalhador do Sistema Público, as quais mantêm cadastro das pessoas portadoras de deficiência aptas para o trabalho.
Ademais, o § 2º do art. 93 da lei 8.213 estabelece que o Ministério do Trabalho e da Previdência Social deve gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por segurados reabilitados e pessoas portadoras de deficiência habilitadas.
Cabe, ainda, ao Ministério do Trabalho e Emprego o estabelecimento de sistemática de fiscalização, avaliação e controle das empresas, bem como a instituição de procedimentos e formulários que propiciem estatísticas sobre o número de empregados portadores de deficiência.
Nesse sentido, a Portaria 772, de 26 de agosto de 1999, do Ministério do Trabalho e Emprego, orienta os agentes da inspeção do trabalho quanto às situações em que se deparar com o trabalho das pessoas com deficiência, em entidades sem fins lucrativos, de natureza filantrópica de comprovada idoneidade, ou em empresas tomadoras de seus serviços, a saber:
“Artigo 1º – O trabalho da pessoa portadora de deficiência não caracterizara relação de emprego com o tomador de serviços, se atendidos os seguintes requisitos:
I – realizar-se com a intermediação de entidade sem fins lucrativos, de natureza filantrópica e de comprovada idoneidade, que tenha por objetivo assistir ao portador de deficiência;
II – a entidade assistencial intermediadora comprovar a regular contratação dos portadores de deficiência nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho;
III – o trabalho destinar-se a fins terapêuticos, desenvolvimento da capacidade laborativa reduzida devido a deficiência, ou inserção da pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho.
IV – igualdade de condições com os demais trabalhadores, quando os portadores de deficiência estiverem inseridos no processo produtivo da empresa.
§ 1º O trabalho referido neste artigo poderá ser realizado na própria entidade que prestar assistência ao deficiente ou no âmbito da empresa que para o mesmo fim celebrar convênio ou contrato com a entidade assistencial.
§ 2º O período de treinamento visando a capacitação e inserção do portador de deficiência no mercado de trabalho não caracterizara vínculo empregatício com o tomador ou com a entidade sem fins lucrativos, de natureza filantrópica, se inferior a seis meses.”
E, especialmente a Instrução Normativa 20, de 26 de janeiro de 2001, dispõe sobre procedimentos a serem adotados na fiscalização do trabalho em relação às pessoas com deficiência, dispondo em seu artigo 1º que: “O Auditor-Fiscal do Trabalho – AFT observara a relação de trabalho da pessoa portadora de deficiência, de modo a identificar a existência de vinculo empregatício.”
Na hipótese de o Auditor Fiscal do Trabalho constatar o não cumprimento do art.93 da Lei 8.213/91, a Instrução Normativa 20 ordena que seja facultado o encaminhamento da matéria ao Núcleo de Promoção da Igualdade de Oportunidades e de Combate à Discriminação ou a instauração de um procedimento especial (de acordo com art.627-A da CLT), segundo o qual a empresa pode firmar um Termo de Compromisso, que conterá um cronograma para preenchimento das vagas por pessoas portadoras de deficiência ou beneficiários reabilitados e também para a adequação das condições do ambiente de trabalho.
O cumprimento do referido Termo será acompanhado pelo auditor fiscal do trabalho. E, em caso de descumprimento, o auditor fiscal deverá convocar a empresa para uma mesa de entendimentos e, posteriormente, deverá encaminhar um relatório ao Delegado Regional do Trabalho para remessa ao Ministério Público do Trabalho.
No caso de recebimento pelo Ministério Público do Trabalho de relatório elaborado pelo auditor fiscal, tem início um procedimento investigatório, no qual a empresa é convidada a firmar um termo de ajustamento de conduta em que é marcado um prazo razoável para o cumprimento da legislação, sob pena de imposição de multa, a qual será revertida ao FAT (Fundo de Amparo do Trabalhador, nos termos da Lei 7.853/89[11].
Na hipótese de a empresa não firmar o termo de ajuste de conduta ou descumpri-lo, o Ministério Público do Trabalho poderá propor uma ação civil pública, segundo art. 2º da Lei 7.853/89. Nesta ação o Ministério Público do Trabalho buscará o cumprimento de uma obrigação de fazer (ou seja, a contratação de pessoas portadoras de deficiência, nos termos da lei), mediante imposição de multas diárias, as quais são estabelecidas em valores elevados com o objetivo de desestimular o descumprimento da ordem provinda do Poder Público.
Nota-se que a fiscalização por parte das autoridades trabalhistas e a atuação do Ministério Público do Trabalho são fundamentais para o sistema de cotas instituído, simbolizando meios eficazes de fiscalizar o cumprimento da lei.
De acordo com art. 133 da Lei 8.213/91, o empregador ficará sujeito à imposição de multa em caso de descumprimento do art. 93 da lei citada.
A Portaria MTE 1.199/03 aprova normas para a imposição da multa administrativa variável prevista no art. 133 da Lei n. 8.213/91, pela infração ao art. 93 da mesma lei, que determina que as empresas devam preencher cargos com pessoas portadoras de deficiência ou beneficiários reabilitados. A Portaria menciona que o valor mínimo legal é o valor previsto no art. 133 da Lei 8.213/91, sendo certo que a Portaria destaca que o valor resultante da aplicação dos parâmetros estabelecidos não pode ultrapassar o máximo estabelecido no citado artigo.
3.1 Questões polêmicas acerca do sistema de cotas
Há algumas discussões, referentes ao cumprimento da legislação que cria o sistema de cotas de emprego para pessoas portadoras de deficiência, que devem ser tratadas, como por exemplo: a) o percentual indicado na legislação faz referência à empresa ou ao estabelecimento?; b) como deve ser feito o preenchimento das vagas no caso de empresas com atividades sazonais ou no caso de atividades predominantemente perigosas e/ou insalubres ou até mesmo nas empresas rurais?; c) será que é possível a terceirização de empregados portadores de deficiência e/ou reabilitados com o fim de preencher as cotas?; d) é possível, ao mesmo tempo, cumprir a Lei 8.213/91 e as cotas de menores aprendizes?
3.1.1. O percentual indicado na legislação faz referência à empresa ou ao estabelecimento?
A pergunta inicial trata do número de empregados habilitados ou portadores de deficiência que devem ser contratados por determinação da lei. Nota-se que a Lei 8.213/91, bem como seus respectivos Decretos 3.048/99 e 3.298/99, determinam expressamente que a obrigação de preenchimento é de 2% e 5% dos cargos da empresa com 100 ou mais empregados. E, ainda, a Instrução Normativa 20 de 26/01/2001 do MTE determina que, para aferição dos percentuais, deve ser considerado o número de empregados da totalidade dos estabelecimentos da empresa. Dessa forma, a análise do cumprimento da obrigação legal deve considerar o número total de empregados em todos os estabelecimentos da empresa e não em cada estabelecimento.
Várias são as interpretações feitas sobre o assunto, mesmo sendo clara a lei. Destarte, desde que a empresa cumpra a legislação não importa que a mesma mantenha estabelecimentos sem empregados portadores de deficiência, ou seja, o auditor fiscal do trabalho não pode exigir o cumprimento da lei também no estabelecimento fiscalizado se a cota estiver preenchida com base no número total de empregados da empresa.
Outra interpretação é feita por empresas que tem como objetivo o não cumprimento da lei. Estas empresas alegam que a aferição do cumprimento das cotas deve ser feita por estabelecimento e não sobre o total de empregados da empresa, eis que possuem mais de 100 empregados, mas tem uma série de estabelecimentos diferentes, nos quais a quantidade de empregados é inferior ao número estabelecido. Tem-se que o argumento sustentado por estas empresas deve ser afastado e elas devem ser autuadas para que cumpram a lei.
3.2.2 Sistema de cotas nas empresas com atividades sazonais, perigosas e/ou insalubres e rurais
Ressalta-se que a legislação vigente não assinala quaisquer exceções para o cumprimento do sistema de cotas. Dessa forma, toda e qualquer empresa deve obedecer ao disposto no art. 93 da Lei 8.213/91, o que inclui, sem limitação, as empresas com atividades sazonais, as empresas cujas atividades são consideradas perigosas ou insalubres, nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho, e também as empresas que desenvolvem atividades rurais.
As empresas com atividades sazonais, apenas no período em que mantêm empregados, estão compelidas a contratar pessoas portadoras de deficiência ou habilitadas.
Já as empresas que exercem atividades predominantemente insalubres ou perigosas, de acordo com os arts. 189 e 193 da CLT, em princípio, não existe qualquer impedimento para a contratação de empregados portadores de deficiência, não podendo ser presumida pelo empregador qualquer incompatibilidade entre a deficiência e o trabalho em local insalubre ou perigoso. Porém, a contratação não pode acarretar um agravamento na deficiência e nas eventuais dificuldades do empregado a ser contratado.
Quanto às empresas rurais, o sistema de cotas deve ser aplicado sem exceções.
3.2.3 O preenchimento das cotas e a terceirização
Observa-se que a contratação de empresas de prestação de serviços ou de entidades assistenciais, que contam com a mão-de-obra de pessoas portadoras de deficiência, não desonera a empresa do cumprimento da cota imposta na lei.
Isto porque a empresa contratante e a empresa de prestação de serviços estão obrigadas pela lei a contratar pessoas portadoras de deficiência caso possuam mais de 100 empregados. Dessa forma, não é possível preencher as cotas mediante contratação indireta de empregados.
3.2.4 O preenchimento das cotas de pessoas portadoras de deficiência e menores aprendizes
Além de as empresas estarem obrigadas a preencher determinado número de vagas com pessoas portadoras de deficiência, ainda estão obrigadas a contratar menores aprendizes. Por isso, parece admissível concluir que é possível a contratação de adolescentes portadores de deficiência, assim cumprindo o imposto na legislação.
Nesse sentido, Maria Aparecida Gugel[12] entende que há possibilidade de contratação de menores aprendizes portadores de deficiência:
“Contratando portadores de deficiência aprendizes, matriculados nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem, estes poderão ser considerados, ao mesmo tempo, para o preenchimento da reserva de aprendizes (art. 429, da CLT – mínimo de 5% e máximo de 15 %, em relação ao número de trabalhadores existentes em cada estabelecimento) e a reserva legal de vagas, prevista no art. 93, da Lei 8.213/91, pois se está diante de um contrato de trabalho, embora de natureza especial. Além dessa forma de contratação especial direta, poderá a aprendizagem ser realizada pelas entidades sem fins lucrativos, que tenham por objetivo a assistência ao adolescente e a educação profissional, devidamente registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (arts. 430, II, CLT; 91, ECA; Resolução 74/01, CONANDA), caso em que não gera vínculo de emprego com as empresas tomadoras de serviços (art. 431, CLT). Significa dizer que o contrato de trabalho será mantido pela entidade assistencial.”
Em se tratando de contratação de menores por entidades sem fins lucrativos, sem vínculo com o tomador de serviços, a contratação não poderá cumprir as exigências da lei, eis que para isso deve haver efetiva identidade de empregador.
3.2. Análise das peculiaridades do contrato de trabalho
Verifica-se que quando se quer cumprir as determinações do art. 93 da Lei 8.213/91 nas contratações de empregados portadores de deficiência, todos os direitos trabalhistas tutelados aos empregados urbanos e rurais, na Constituição Federal, na Consolidação das Leis do Trabalho, na legislação esparsa e também nas normas coletivas, são plenamente aplicáveis a esse contrato de trabalho.
Ocorre que algumas questões referentes ao contrato de trabalho devem ser esclarecidas, como, por exemplo: os critérios de admissão e salário; local de trabalho; possibilidade de estabelecer horário diferenciado.
3.2.1. Critérios de admissão de pessoas portadoras de deficiência
Sabe-se que a Constituição Federal, em seu art.7º inciso XXXI, proíbe qualquer discriminação nos critérios de admissão dos empregados portadores de deficiência. Dessa forma, as entrevistas e as avaliações devem ser iguais tanto para os candidatos deficientes quanto para os não deficientes. Portanto, não cabem distinções injustificadas em todas as fases do contrato de trabalho.
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…)
XXXI- proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;”
3.2.2. Salário e equiparação salarial
De acordo com a Constituição Federal (art.7º, XXXI) não pode existir qualquer discriminação no que se refere ao salário pago aos empregados portadores de deficiência. Ademais, os empregados que desempenham as mesmas atividades, com igual produtividade e perfeição técnica, para o mesmo empregador, na mesma localidade devem perceber o mesmo salário, isso é o que está disposto no art. 461 da CLT e deve ser aplicado nos contratos de trabalho das pessoas portadoras de deficiência.
“Art. 461 – Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade
§ 1º – Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço não for superior a 2 (dois) anos.
§ 2º – Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos critérios de antigüidade e merecimento.
§ 3º – No caso do parágrafo anterior, as promoções deverão ser feitas alternadamente por merecimento e por antiguidade, dentro de cada categoria profissional.
§ 4º – O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental atestada pelo órgão competente da Previdência Social não servirá de paradigma para fins de equiparação salarial.”
3.2.3. Local de trabalho
O local de trabalho é um dos pontos do contrato de trabalho de pessoas portadoras de deficiência que deve ser objeto de análise e preocupação, eis que muitos dos projetos arquitetônicos não atentam para a questão relativa à acessibilidade, o que traz problemas para a empregabilidade de pessoas portadoras de deficiência física e visual.
Assim, com a finalidade de cumprimento do sistema de cotas previsto na legislação um dos primeiros obstáculos a ser eliminado diz respeito à eliminação de todas as barreiras arquitetônicas que impedem o acesso dos profissionais portadores de deficiência ao emprego.
Considerando que a eliminação de barreiras arquitetônicas demanda ações tanto do ente privado, contratante da pessoa portadora de deficiência, como das autoridades governamentais, fato é que a situação ideal ainda está longe de ser alcançada. Por esse motivo deve ser levada em consideração a possibilidade de a pessoa portadora de deficiência prestar serviços, como empregado celetista, no âmbito de sua residência, evitando-se o deslocamento trabalho-residência e vice-versa.
Tal fato está previsto na CLT nos arts. 6º e 83, os quais apontam a possibilidade de existir uma relação de emprego na qual as atividades ajustadas são executadas no domicílio do empregado e não no estabelecimento do empregador.
Nessa modalidade de contrato de trabalho em que o trabalhador portador de deficiência executa suas atividades no seu domicílio ocorre vantagens e desvantagens. A vantagem é que existe a concessão de oportunidade de emprego, independente de o local de trabalho ser acessível e de a pessoa ter condições para deslocar-se até ele. Por outro lado, a desvantagem do trabalho fora das instalações da empresa é a não integração da pessoa portadora de deficiência no ambiente do trabalho.
3.2.4. Jornada de trabalho
A jornada de trabalho será analisada conforme o que dispõe o art. 2º, p. único, III, “b”, da Lei 7.853/89; e o art. 35, § 2º, do Decreto 3.298/99, in verbis:
“Art. 2º Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.
Parágrafo único. Para o fim estabelecido no caput deste artigo, os órgãos e entidades da administração direta e indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objetos esta Lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas: (…)
III – na área da formação profissional e do trabalho: (…)
b) o empenho do Poder Público quanto ao surgimento e à manutenção de empregos, inclusive de tempo parcial, destinados às pessoas portadoras de deficiência que não tenham acesso aos empregos comuns; (…)
Art. 35. São modalidades de inserção laboral da pessoa portadora de deficiência: (…)
§ 2o Consideram-se procedimentos especiais os meios utilizados para a contratação de pessoa que, devido ao seu grau de deficiência, transitória ou permanente, exija condições especiais, tais como jornada variável, horário flexível, proporcionalidade de salário, ambiente de trabalho adequado às suas especificidades, entre outros.”
Referente à contratação de pessoa portadora de deficiência, pode ser admitida a sua contratação para o exercício de trabalho em tempo integral, bem como para o exercício de atividades em jornada reduzida, como, por exemplo, a tempo parcial, com jornada de 25 horas semanais.
Observa-se que existe a Medida Provisória 2.164/01, mas que se encontra em pausa, tratando da redução das férias. Portanto, recomenda-se a concessão de férias integrais nos termos da Constituição, inclusive quando o empregado é contratado para uma jornada inferior a 44 horas semanais, sendo admissível o recebimento de salário proporcional ao número de horas trabalhadas.
Verifica-se que ao suscitar a possibilidade de contratos com jornada reduzida ou trabalho a tempo parcial não se pretende discriminar a pessoa portadora de deficiência e tampouco precarizar suas condições de trabalho. Na verdade, a jornada reduzida é algo absolutamente compatível com os interesses de vários grupos sociais (por exemplo: mulheres, idosos, pessoas portadoras de deficiência, estudantes).
Não obstante o Decreto 3.298 tratar da possibilidade de jornada variável e horário flexível, o fato é que nem o decreto e nem a legislação trabalhista definem essas modalidades de trabalho. Acredita-se, contudo, que o referido decreto pretendeu somente deixar claro que a contratação de pessoas portadoras de deficiência pode diferir, quando necessário, das contratações normalmente levadas a efeito no que concerne à fixação de horário de trabalho, considerando a eventual necessidade ou conveniência de se estabelecer jornadas reduzidas de trabalho; trabalho em dias alternados; horário móvel a ser definido diretamente entre o empregado e o empregador; trabalho sob o regime de banco de horas, dentre outras hipóteses.
CONCLUSÃO
Apesar das conquistas advindas da Revolução Francesa de 1789, somente após a Segunda Guerra Mundial é que se percebeu a necessidade de valorizar a vontade da maioria, respeitando-se, sobretudo, as minorias, suas necessidades e peculiaridades.
Nesse sentido, verifica-se que em nosso ordenamento jurídico existem dispositivos legais aptos a eliminar, ou pelo menos diminuir, as barreiras impostas aos portadores de deficiências com relação ao ingresso ao mercado de trabalho.
Porém, o grande problema de acesso ao mercado de trabalho da pessoa portadora de deficiência ainda é o preconceito e a visão distorcida sobre estas pessoas.
Ainda assim, pode-se dizer que já é um grande avanço ter no Brasil diversos instrumentos de proteção para a pessoa portadora de deficiência, como por exemplo, o sistema de cotas.
E já pode ser observado que aos poucos a pessoa portadora de deficiência vem conquistando seu espaço no mercado de trabalho, provando para os mais desinformados que deficiência não quer dizer incapacidade de produzir ou desenvolver uma atividade profissional.
Conclui-se que não obstante a sociedade está superando o preconceito de forma a possibilitar-lhes a inclusão efetiva, a entrada da pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho ainda necessita de leis de proteção para que estas tenham mais êxito em suas conquistas diárias. E, também, para que as empresas tenham mais sensibilidade a perceber que o portador de deficiência é capaz, responsável, dedicado e também produtivo.
Informações Sobre o Autor
Fernanda Pereira Costa
Advogada, Pós Graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera-Uniderp