Resumo O presente trabalho demonstra, a partir da evolução do modelo de Estado e da Administração Pública, o processo de criação e desenvolvimento das Parcerias Público-Privadas (PPP). Aliada aos preceitos traçados pelo princípio da subsidiariedade e apresentando-se como uma alternativa eficiente no que se refere à prestação de serviços públicos, a Parceria Público-Privada é um instituto inovador oriundo do novo modelo de gestão pública. Essa parceria surge em resposta à crise fiscal e ao estrangulamento das contas públicas decorrente do acréscimo de atribuições do Estado de Bem Estar Social, possibilitando o financiamento privado de grandes empreendimentos sem a necessidade de aportes iniciais pelo poder público. Nesse sentido, o presente artigo apresenta os benefícios alcançados através dessa parceria, analisando a experiência mineira no que tange à concessão administrativa do Complexo Mineirão. Para realização desse estudo foi utilizada a metodologia de pesquisa bibliográfica e documental da doutrina, análise da legislação sobre o tema e contrato de concessão firmado.
Palavras chave: Princípio da Subsidiaredade; Fomento; Inovação; Parceria Público Privada; Complexo Mineirão;
Sumário: Introdução; 2. Evolução do Estado; 3.PrincÃpio da Subsidiariedade 4. Reforma Administrativa; 5. Concessão e as Parcerias público-privadas; 6. Estudo de caso de Minas Gerais O contrato de concessão administrativa do Mineirão; 7. Conclusão
O Estado, do latim status, pode ser definido como ente soberano que através de suas instituições (forças armadas, funcionalismo público e etc.) controla e administra uma comunidade humana politicamente organizada em determinado território. Segundo Kant, o Estado pode ser designado por coisa pública (res publica) que tem por liame o interesse de todos os indivíduos de viver em sociedade. Nessa medida, o Estado deve propiciar aos seus cidadãos a melhor forma possível de convivência, procurando sempre atingir a paz social e assegurar o bem comum almejado por seus membros. Nesse sentido, nas palavras do Papa João XXIII a busca pelo bem comum seria “o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana”.
Desse modo, a formação do Estado se justifica na sua própria finalidade de concretização plena dos objetivos da comunidade. Portanto, as instituições estatais são dirigidas, indireta e diretamente, pela vontade dos homens que compõem a sociedade, ou seja, o indivíduo, elemento constitutivo essencial da sociedade, enseja a própria atuação Estatal na medida em que orienta o ente público a agir em prol dos interesses da coletividade.
Partindo dessa concepção, o presente artigo demonstra a evolução do modelo de Estado e os avanços atuais alcançados no que tange aos mecanismos utilizados para atendimento dos interesses da sociedade, com enfoque nas Parcerias Público Privadas. Criada a partir do cenário de escassez de recursos decorrente do acúmulo de atribuições do Estado de Bem Estar Social, a Parceria Público Privada (PPP’s ) surge como uma alternativa de contratação do Poder Público que visa o aproveitamento da eficiência de gestão do setor privado. Ademais, as PPP’s representam um movimento de transferência para a iniciativa privada da execução de atividades que a mesma possui capacidade para desempenhar, ficando o ente Estatal responsável pelas atividades de fomento e prestação de auxílio no momento em que a auto-ajuda não bastar – princípio da subsidiariedade. Nessa medida, o presente artigo apresenta os benefícios e os avanços alcançados através dessas parcerias, demonstrando a experiência mineira no que se refere à Parceria Público Privada do Complexo Mineirão.
O Estado, como sociedade politicamente organizada, almeja criar condições para possibilitar a consecução dos objetivos particulares dos seus membros, buscando oferecer os meios para que os fins privados dos indivíduos possam ser alcançados – bem comum da comunidade. Entretanto, o referido bem comum refere-se a um conceito em constante transformação devido à existência de múltiplos interesses e necessidades dos diversos grupos sociais inseridos em cada contexto vigente. Cabe ao Estado, portanto, implementar políticas e adotar modelos de gestão visando atender a esses anseios em conformidade com a conjuntura social do período. Nesse sentido, com o intuito de apresentar um breve panorama dos movimentos que influíram na estruturação da Administração Pública, estudaremos essa evolução do modelo estatal partindo do Estado Liberal.
A partir do século XVIII, durante o processo revolucionário desencadeado pelas Revoluções Francesa e Americana, evidenciou-se a transformação radical no que se refere à regulação do poder absolutista do monarca, uma vez que nessa fase o poder passou a ser limitado por normas jurídicas. Nesse período, verifica-se a inserção de um controle do poder estatal desempenhado pelos administrados, processo este que culminou no desenvolvimento gradativo do Estado de Direito, anunciado pela primazia da lei e por meio da positivação das liberdades individuais. Nessa fase, tendo em vista o dever de garantia dessas liberdades, a atuação da administração pública se restringia ao exercício do poder de polícia, manutenção da ordem pública, da propriedade privada, da liberdade individual e segurança, afastando toda a intervenção Estatal na economia.
Contudo, a estrutura de mercado adotada pelo modelo do Estado Liberal gerou diversos impactos ligados à desigualdade social, na medida em que provocou a concentração de riqueza nas mãos dos comerciantes e agravou o quadro de pobreza do proletariado. Alem disso, o desastre econômico do liberalismo levou à descrença da auto-regulação do mercado, o que fez com que o Estado deixasse de ter uma atuação mínima e negativa. A referida desigualdade desencadeou reações contra o Estado Liberal e, em resposta, emerge o Estado do Bem-Estar Social como a alternativa para romper com a ordem econômica vigente e reestruturar as economias fracassadas regidas pelos princípios liberais (BRESSER PEREIRA, 1997).
O Estado de Bem Estar visa garantir a igualdade entre os homens mediante a intervenção estatal na ordem econômica e social para prover a classe menos favorecida, assumindo o protagonismo na concretização de finalidades sociais e na promoção do bem-comum. Nessa fase, a atuação estatal se pauta na busca pela materialização dos direitos, não apenas no âmbito individual e político, mas também no social, como, por exemplo, ao buscar fundamentos pautados na proteção da dignidade da pessoa humana, na garantia contra o desemprego, nos seguros contra doenças e etc. A nova orientação proposta pelo Estado Social promove o crescimento dos direitos sociais e, conseqüentemente, gera o aumento do rol de atribuições estatais, tornando a sociedade cada vez mais dependente do Estado. A respeito desse processo dispõe Maria Silvia Zanella di Pietro:
“Com o crescimento dos chamados direitos sociais e econômicos, este ampliou desmesuradamente o rol de suas atribuições, adotando diferentes atitudes: (…) serviços públicos, entrando na categoria de serviços públicos comerciais, industriais e sociais (…) intervenção no domínio econômico (…) o fomento como uma atividade administrativa de incentivo à iniciativa privada de interesse público” (PIETRO, 2009, P.56),
Nesse sentido, a despeito dos inegáveis avanços do Estado Social, nem todos seus efeitos foram favoráveis, devido ao aumento da carga tributária em decorrência da necessidade de financiamento das políticas públicas ligadas às novas atribuições assumidas, agigantamento da máquina pública, ineficiência da intervenção estatal e da constatação da corrupção e do nepotismo dos administradores públicos. Além disso, aos poucos tornava-se claro as perdas significativas no que se refere à qualidade da provisão de serviços e insatisfação da sociedade frente à intervenção da Administração Pública no domínio econômico. Desse modo, o Estado passa a apresentar cada vez menos condição de sustentar o modelo de welfare state, provisor de serviços, garantidor da prosperidade econômica e do bem-estar da sociedade.
Considerando os mencionados fatos, emerge a noção de Estado Democrático, que reúne a concepção do Estado de Direito – que prima pelas liberdades individuais – Estado Social – bem comum – e democrático – assegura a participação popular no processo político. Desse modo, tem-se hoje o denominado Estado Democrático de Direito que compreende a participação política do cidadão e o dever de promover a justiça material entre os membros da sociedade. Nesse sentido dispõe Netto:
Nesse cenário de crise, o Estado Social, intensamente intervencionista e prestador direto de diversas atividades e serviços, vai cedendo lugar a um estado que se caracteriza por ser Estado Social e Democrático de Direito, isto é, estrutura-se sobre os princípios do Estado de Direito ou juridicidade, da democracia e da sociabilidade, não deixa de perseguir o bem-estar, mas o faz não preferencialmente valendo-se de atividades diretamente desenvolvidas por entidades integrantes do aparato Estatal, privilegia a regulação e a atuação conjunta com a sociedade sobre vários títulos. (NETTO, , p. )
Nesse novo paradigma, a sociedade, além de participar, seja de forma direita ou indireta das resoluções do Estado, exerce certo controle sobre as atividades estatais, já que estas devem ser orientadas, sobretudo, para o alcance do bem comum. Nessa medida, cogita-se a estruturação da Administração Pública cooperativa, voltada ao consenso em lugar da oposição, exigindo-se a participação social no exercício das funções Estatais. Nesse contexto, tendo em vista o discurso de redução da máquina estatal, combinado à políticas de combate ao déficit público e restrições na participação do Estado – no sentido do poder público se abster das atividades que o particular tem condições para exercer por meio de sua própria iniciativa – são instituídas as Parcerias Público Privada (latu sensu).
3. Princípio da Subsidiariedade
As parcerias público-privadas estão intimamente relacionadas às diretrizes traçadas pelo princípio da subsidiariedade, que trata da noção de “prestar ajuda”, subsidium affere, em que sociedades maiores oferecem auxílio às sociedades menores nos casos em que a auto-ajuda não bastar. O princípio trata, portanto, de uma ajuda secundária – reserva de emergência – para ajudar e suprir eventuais deficiências, com o intuito de integrar, estimular o crescimento e buscar a capacidade de recuperação e emancipação das unidades menores.
O conceito foi explicitado da forma como é utilizado hoje, em 1931, na Encíclica Quadragésimo ano, escrita pelo Papa Pio XI:
“Como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com a própria iniciativa e capacidade, para confiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que as sociedades menores e inferiores podiam conseguir, é uma injustiça, um grave dano e perturbação social. O fim natural da sociedade e da sua ação é coadjuvar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los. Deixe, pois, a autoridade pública ao cuidado das associações inferiores aqueles negócios de menor importância, que a absorveriam demasiadamente; poderá então desempenhar mais livre, enérgica e eficazmente o que só a ela compete, porque só ela o pode fazer: dirigir, vigiar, urgir e reprimir, conforme os casos e a necessidade requeiram.”
O lema da subsidiariedade é: “in dúbio pro individuo vel minore”, na dúvida, pelo individuo ou pela unidade inferior. Portanto, esse princípio deve ser visto como inerente à preservação das individualidades, ou seja, o desenvolvimento nasce na pessoa, chega à sociedade e às instituições e retorna a pessoa, tornando-as co-responsáveis pelo bem comum. Nesse sentido, cabe às unidades superiores concentrar em suas tarefas originárias e deixar a cargo das unidades inferiores aquilo que elas próprias são capazes de produzir e, no momento em que a capacidade de auto-ajuda das instâncias inferiores se encontrar atrofiada, a instância superior – Estado – assumirá o dever de regenerar as instâncias inferiores. Apesar de sugerir uma função de suplência, que justifica a ajuda estatal, esse princípio também limita a intervenção de órgão ou coletividade superior, que fica limitado a essas situações especificas. Portanto, o Estado não deverá assumir aquilo que os particulares já são capazes de fazer.
Sobre o tema completa Hoffe:
“Via de regra competências podem ser interpretadas de forma bem variada, tanto de maneira generosa quanto restrita. Dentro da respectiva margem de decisões, o princípio da subsidiariedade adota, em segundo lugar, a tarefa de uma regra executora de competências. Mais uma vez, ele surge como uma regra de ônus da prova, e esta pode ser especificada em três critérios: a clausula da exigência requer que a instância superior tem de ser necessária na respectiva coisa; conforme a cláusula do melhor, ela tem que fazê-lo melhor do que qualquer instância inferior; e de acordo com o imperativo da proporcionalidade, uma intervenção legítima da instância superior deve-se restringir (a) à dimensão necessária, (b) à profundidade necessária de regulamentação ou de desempenho e (c) à intensidade necessária de regulação.” (HOFFE, 2005, p. 157)
Considerando o trecho transcrito acima, cabe ao Estado, enquanto ente superior, concentrar-se em atividades a qual compete somente ao poder público desempenhar, deixando para a coletividade a realização de ações que possam executar de maneira eficiente. Nessa medida, o ente estatal atuaria em situações excepcionais nas quais a auto-ajuda não bastasse, desempenhando atividades de fomento, coordenação, fiscalização da iniciativa privada visando o sucesso dos empreendimentos. Portanto, o Estado deve respeitar a autonomia da iniciativa privada, somente agindo segundo o princípio da subsidiariedade quando necessário para criar condições favoráveis ao exercício da atividade.
São várias tendências podem ser apontadas como decorrência da aplicação desse princípio, quais sejam: a idéia de diminuir o Estado, a privatização com o intuito de diminuir os gastos públicos com empresas deficitárias e a criação das Parcerias Público Privadas. Ademais, conforme tratado, a necessidade de adoção das formas de gestão privada eficiente, sem controles excessivos e os formalismos burocráticos da Administração Pública, aliada as políticas que aconselham a substituição da execução de serviços públicos do ente público para a Empresa privada, reserva ao Estado as tarefas de incentivar, subsidiar e fiscalizar a prestação do serviço. Ou seja, deve ficar a cargo do Estado as atividades que lhe são próprias como ente soberano, indelegáveis ao particular (segurança, defesa, justiça, relações exteriores, legislação e etc) e devem ser regidas pelo principio da subsidiariedade as demais atividades, nas quais o Estado deve exercer em caráter supletivo da iniciativa privada, quando ela for deficiente.
Com o advento da Segunda Guerra Mundial e o fracasso do modelo liberal em reprimir a desigualdade econômica, surge o modelo do Estado de Bem Estar Social que prevê uma ampliação dos direitos sociais e econômicos dos cidadãos. Contudo, a partir da década de 1970 a crise do Estado Social se instaura em decorrência de conseqüências negativas desse modelo, tais como: aumento da carga tributária, crescimento da máquina Estatal e da ineficiência da intervenção estatal. Esse período foi marcado pela crise fiscal, no qual a Administração, diante da gama de interesses sociais a serem assegurados, encontrava dificuldades para o financiamento dessas políticas e, ao mesmo tempo, lidava com a resistência da população no que tange ao aumento de impostos. Ademais, nessa fase surgem questionamentos acerca do modelo de gestão burocrático adotado pela Administração sob o ponto de vista econômico, social e administrativo.
Nesse cenário de crise surge o Estado Democrático de Direito, estruturado na idéia de democracia e sociabilidade, que favorece a atuação conjunta do Estado com a sociedade em diversos aspectos. Nesse novo paradigma, cogita-se a estruturação da Administração Pública cooperativa, buscando a participação social no exercício das funções Estatais. Esse processo estava associado às significativas mudanças econômicas, tais como o ajuste fiscal e os procedimentos voltados para o mercado – a privatização e a desregulamentação, sob o paradigma gerencial.
Contudo, cumpre ressaltar que a Constituição 1988 representou um retrocesso em termos de avanços na gestão pública, uma vez que o texto da Carta Magna perpetuou o modelo burocrático, ignorando os pressupostos da administração gerencial. Entretanto, a partir de 1995 entra em pauta no cenário nacional a reforma do aparelho administrativo, em resposta ao grande aumento do Estado e transformações políticas do Estado Democrático Social (BRESSER-PEREIRA, 2008).
Nesse período surge o modelo gerencial de administração pública, em flagrante superação ao modelo burocrático de gestão, através da adoção de mecanismos que visam à excelência administrativa nos resultados e o foco no cidadão. A reforma administrativa foi colocada na agenda nacional através do Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), apresentando o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – proposta de adoção do modelo gerencial de administração pública no Brasil. A idéia era transformar a Administração pública burocrática, rígida e ineficiente, voltada para si própria e para o controle interno, para uma administração gerencial, flexível e eficiente, voltada para o atendimento do cidadão. Esse processo culminou com a aprovação da Emenda Constitucional no. 19, de 04 de junho de 1998, que estabeleceu a adoção do Princípio da Eficiência na administração pública brasileira – Administração Gerencial pautada pela busca dos resultados. Nesse sentido dispõe Maria Sylvia di Pietro:
“ Com todas essas alterações, objetiva-se a “reforma do estado” com vistas a fazer reverter os males instaurados pelo Estado intervencionista: de um lado visto do lado do cidadão, quer-se restaurar e privilegiar a liberdade individual e a livre concorrência; isso leva às idéias de privatização, fomento, parceria com o setor privado; visto do lado do Estado, quer-se alcançar a eficiência na prestação dos serviços públicos, o que leva à idéia de desburocratização.” (DIPIETRO, 2006, p. 30)
Dentro do contexto da Nova Gestão Pública surgem as Parcerias Público-Privadas – PPP’s – reguladas em âmbito federal pela Lei 11.079/2004 e no Estado de Minas Gerais pela Lei 14.868/2003, como forma alternativa de parceria entre o setor público e o setor privado.
5. Concessão e as Parcerias público-privadas
Conforme tratado, a forma burocrática da organização administrativa contribuiu para a ineficiência na prestação dos serviços públicos e mostrou ser manifestadamente inadequada no que se refere ao desempenho de atividades que exigem agilidade e desembaraço típicos da iniciativa privada. Além disso, a crise fiscal aliada às limitações gerenciais e escassez de recursos para investimento dão ensejo ao surgimento de propostas para que o Estado se abstenha do desempenho de atividades que o particular possui condições de desempenhar, por meio da sua própria iniciativa, para fins de redução do tamanho da máquina administrativa. Nessa medida, o repasse de atribuições ao ente privado, no que se refere à execução de serviços públicos, transfere a execução de atividades que o parceiro possui plena capacidade para desempenhar, restando ao Estado o dever de fomento à iniciativa particular, quando deficiente, para fins de alcançar o interesse público – princípio da subsidiariedade.
Desse modo, as concessões e parcerias junto às empresas privadas surgem em pleno cenário de baixa capacidade de financiamento do setor público e patente necessidade de modernização da Administração. Desse modo, as parcerias mostram-se uma alternativa para redução do tamanho do aparelhamento administrativo do Estado, na medida em que delega ao setor privado a realização de atividades antes desempenhadas exclusivamente pela Administração e promove ganhos de eficiência na prestação dos serviços – técnicas modernas de gestão. Nesse sentido o art. 175 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece:
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. (BRASIL, 1988)
As concessões mencionadas no artigo transcrito referem-se a um gênero que contempla as seguintes espécies: comum, patrocinada ou administrativa. A concessão comum refere-se à modalidade contratual na qual não há pagamento pelo ente público à concessionária. Nesse caso a remuneração da empresa será realizada mediante a cobrança de tarifas ao usuário. A referida concessão é realizada mediante procedimento licitatório na modalidade de concorrência, podendo ser: concessão de obra pública, concessão de serviço público e permissão de serviço público.
As Parcerias Público Privadas, por sua vez, referem-se às modalidades de concessão patrocinada e administrativa. Nesse sentido dispõe SUNDFELD:
“Em sentido amplo, as Parcerias Público Privadas são múltiplos vínculos negociais de trato continuado estabelecido entre a Administração Pública e particulares para viabilizar o desenvolvimento, sob a responsabilidade destes, de atividades com algum coeficiente de interesse geral” (SUNDFELD, 2005, p.18)
A concessão patrocinada trata do contrato no qual o poder concedente concede ao parceiro privado a execução de determinado serviço público para que realize a atividade mediante recebimento de contraprestação pelo poder público e, adicionalmente, pagamento de tarifa pelo usuário (DI PIETRO, 2009, p. 146). Ou seja, nesse caso a remuneração do ente privado é composta pela tarifa cobrada dos usuários e pela quantia repassada pelo poder concedente. Como nas concessões comuns, as concessões patrocinadas podem ser exclusivamente de serviço púbico, antecedidas de obra pública, de exploração de obra pública a ser edificada ou de exploração de obra já existente.
Por fim, no que se refere ao instituto da concessão administrativa, segundo o art. 2º, § 2º da Lei Nº 11.079/04 a concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços no qual a Administração Pública será a usuária direta ou indireta, sendo que, neste caso, o Estado preserva seu direito de gestão. Trata-se, portanto, de modalidade contratual que prevê a execução de uma atividade prestada à Administração Pública, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. Destaca-se que é expressamente vedado a concessão que tenha por objeto o fornecimento de mão de obra.
Nas Parcerias Público Privadas o ente privado é o responsável pelo financiamento total do empreendimento e somente após a disponibilização do serviço é que este começará a receber a remuneração e o investimento será amortizado pelo ente público. Cumpre ressaltar, ainda, disposições especiais no que se refere ao contrato de PPP, são elas: existência de previsão para aplicação de penalidades pela Administração Pública ao parceiro nos casos de inadimplemento do contrato, existência de múltiplas formas de remuneração (por meio de tarifa cobrada do usuário; recursos do tesouro; cessão de créditos não tributários; outorga de bens públicos dominicais; transferências de bens móveis e imóveis e outros meios admitidos no direito) e etc.
São inúmeras as vantagens oferecidas pelo instituto das PPP’s, dentre elas destaca-se a possibilidade de compartilhamento de ganhos entre o poder público e o parceiro privado, bem como dos riscos. No que se refere aos riscos, cabe ressaltar que o contrato de PPP deverá prever a repartição objetiva dos riscos envolvidos entre as partes, inclusive os riscos referentes a caso fortuito, força maior e fato do príncipe – razões que poderão ensejar a revisão contratual. A referida alocação dos riscos deve ser realizada conforme capacidade e expertise de cada uma das partes, sendo que a parte que melhor possa mitigá-lo deverá se responsabilizar pelo determinado risco. Destaca-se que tal distribuição eficiente dos riscos é essencial para o sucesso da Parceria Público Privada.
Cumpre ressaltar que a eventual revisão contratual em razão de acontecimentos supervenientes, a despeito do modelo adotado pela concessão comum em que é de responsabilidade do ente público riscos relacionados à Alea extraordinária (caso fortuito, força maior, fato do príncipe), no caso do contrato de PPP deverá ser respeitada a distribuição posta em contrato. Portanto, a Administração não será automaticamente obrigada a recompor o equilíbrio econômico financeiro nessas situações, uma vez que a repartição dos riscos é realizada em cada contrato de maneira única e especifica, sendo acordada pelo poder concedente e concessionário. Ademais, os riscos assumidos pelo parceiro privado serão incluídos no valor da proposta comercial, implicando, necessariamente, no aumento do valor da mesma.
No que se refere à remuneração, conforme preceitua o art. 15, 1º da Lei Mineira de PPP’s, a remuneração do parceiro privado será variável, estando vinculada ao desempenho da concessionária a partir do momento que o serviço, obra ou empreendimento estiver disponível. Portanto, o desempenho impacta na remuneração da concessionária, obrigando essa a buscar a máxima produtividade. Tal prerrogativa implica na criação de mecanismos eficientes para racionalização dos ganhos econômicos entre as partes, através da avaliação e indicadores de desempenho e qualidade. Ademais, destaca-se que nos contratos de PPP não se deve falar em endividamento em função de utilidades já consumidas, haja vista que as obrigações contratuais do ente público somente se tornarão devidas à medida que os serviços forem sendo disponibilizados (NAVES, 2013). Ou seja, o investimento do parceiro privado será amortizado no longo prazo da concessão por meio da remuneração direta da Administração e pela exploração econômica do serviço, desonerando o Estado do desembolso imediato.
6. Estudo de caso de Minas Gerais – O contrato de concessão administrativa do Mineirão
Em 30 de outubro de 2007, o Comitê Executivo da Fèdération International de Football Association – FIFA) nomeou o Brasil como anfitrião da Copa do Mundo de 2014 e, aos 31 de maio de 2009, a FIFA anunciou Belo Horizonte como uma das cidades-sede da Copa do Mundo de 2014, juntamente com outras 11 capitais brasileiras. A realização do evento Copa do Mundo impõe inúmeros desafios à Cidade Sede, dentre eles destaca-se as exigências ligadas à modernização de infraestrutura do Estádio Governador Magalhães Pinto, um dos principais palcos da Copa do Mundo, em conformidade com os requisitos estabelecidos pela entidade internacional.
Nessa medida, o Governo do Estado de Minas Gerais, buscando uma alternativa para o investimento condizente com escassez de recursos financeiros do Estado, lançou a Concorrência nº02/2010 para concessão administrativa da operação e manutenção, obras de reforma, renovação e adequação do Complexo Mineirão. Além das reformas e intervenções incluídas o escopo do contrato (custo estimado de R$677.353.021,85), a referida contratação previa o direito de exploração e operação do complexo, pela vencedora do certame, por 25 anos.
Conforme previsto nos documentos da contratação, o Governo do Estado de Minas Gerais não investiu recursos públicos na obra de reforma, sendo que os pagamentos mensais de amortização tiveram inicio após a disponibilização do Estádio e inicio da operação. Os mencionados pagamentos foram efetuados em duas parcelas, sendo elas: Parcela Pecuniária Mensal (PM –parcelas limitada e complementar) e parcela de ajuste Sazonal Anual (PA). A parcela limitada que compõe a PM refere-se à remuneração relativa aos investimentos realizados pela concessionária e a parcela complementar, por sua vez, esta ligada à capacidade de operação da empresa. Ou seja, a parcela complementar será calculada em conformidade com a análise de critérios previamente definidos quanto à produtividade e eficiência em relação à gestão do Complexo Mineirão, trata-se, portanto, de parcela variável. Desse modo, tal mecanismo de remuneração incentiva a empresa concessionária a buscar alcançar excelência na prestação de serviços, na medida em que o nível de serviços prestados possui impacto direto na remuneração que será recebida. Nesse sentido, foram estabelecidos no contrato indicadores de desempenho que a concessionária deverá garantir para fins de assegurar a qualidade na Gestão do Complexo sendo que, caso os referidos indicadores não sejam atendidos, o Governo do Estado poderá aplicar penalidades (multa, interrupção da concessão e etc.). O quadro abaixo demonstra esse modelo de remuneração:
No que tange à alocação dos riscos, elemento essencial para o sucesso de uma Parceria Público Privada, cumpre ressaltar o arranjo de compartilhamento de riscos presente nesse contrato como, por exemplo, os riscos relacionados à construção em que a previsão contratual estabelece prêmios para entregas concluídas na data e multa em razão de eventuais atrasos. Além disso, no que se refere aos riscos relacionados as receitas do empreendimento, foram determinadas metas mínimas de atendimento na geração de receitas pelo parceiro privado, ou seja, caso a concessionária apresente resultados abaixo da margem operacional, serão aplicadas penalidades (NAVES, 2013). No que tange aos riscos legislativos, cabe asseverar que os mesmo referem-se aos denominados “fato do príncipe” e “fato da administração”, ou seja, são aquelas situações em que são realizadas alterações no ordenamento jurídico pelo Governo que geram impactos diretos na relação contratual. Nesses casos, haja vista a impossibilidade da concessionária de evitar esses riscos, os mesmos são assumidos pelo poder concedente. Ademais, em situações em que as referidas alterações promovidas criarem, extinguirem, isentarem ou alterarem os tributos e encargos legais deverá ser realizada a recomposição do equilíbrio econômico financeiro do contrato. Por fim, no caso de eventual ocorrência de eventos de força maior ou caso fortuito, o Governo do Estado será obrigado a recompor o equilíbrio econômico financeiro. Cumpre destacar, ainda, que o poder concedente se responsabilizará por despesas, pagamentos e indenizações decorrentes de atos e fatos anteriores à data do contrato. Portanto, o contrato prevê situações especificas que ensejam o ajuste do equilíbrio econômico financeiro, tidas como situações que impõem ao parceiro privado encargo imprevisível e insuportável. Essas situações foram detalhadamente descritas no contrato, estando, portanto, restritas à situações específicas identificadas. O contrato traz, ainda, previsão expressa de que a concessionária deve segurar todos os equipamentos do complexo passíveis de cobertura.
No que se refere à remuneração da concessão o art. 6º, a Lei nº 11.079/04 autoriza os pagamentos vinculados à prestação do serviço, in verbis:
“Art. 6º A contraprestação da Administração Pública nos contratos de parceria público-privada poderá ser feita por: (…)
1º O contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato.”
Conforme visto anteriormente, o conceito transcrito acima foi adotado na concessão do Complexo Mineirão, estando a remuneração vinculada ao desempenho do parceiro privado. Tal prerrogativa incentiva o concessionário a fornecer um serviço de alto nível, para fins de arrecadar o máximo de remuneração, máxima produtividade e geração de lucro (MARINS,2011). Nesse sentido, o contrato de PPP do Complexo Mineirão prevê a seguinte situação: quando a margem operacional de receita supera a margem de referência os ganhos serão distribuídos entre o poder concedente e o concessionário, o que, necessariamente, aumenta o lucro do parceiro privado e diminui os pagamentos públicos a serem realizados.
Por fim, cabe ressaltar que a referida concessão administrativa do Complexo Mineirão une as atividades de construção e do operador em um mesmo parceiro, trazendo ganhos na prestação do serviço. Essa concepção possibilita agregar a busca pelo lucro com a construção do equipamento e com a prestação eficiente e otimizada do serviço (NAVES,2013).
Conforme estudado, em razão da reduzida capacidade de financiamento do setor público para investimentos de grande porte – em decorrência do aumento de atribuições do Estado de Bem Estar Social – diante do cenário de nomeação de Belo Horizonte como uma das 12 Cidades Sede do evento Copa do Mundo e considerando as exigências FIFA quanto à infraestrutura necessária para o evento, a Parceria Público Privada surge como alternativa viável para realização dos investimentos no Complexo do Mineirão.
Inúmeras são as vantagens da Parceria Público Privada contratada no que se refere à execução das obras de reforma e modernização do Estádio (em flagrante superação às restrições do orçamento público), transparência nos custos, comprometimento com a eficiência na prestação dos serviços, provisão de serviços de maior qualidade e etc. Todo esse processo esta diretamente associado e é guiado pelos preceitos traçados pelo princípio da subsidiariedade, na medida em que o repasse da execução de serviços como este ao parceiro privado demonstra o papel fundamental do Estado ligado às atividades de fomento e fiscalização traduzindo nos ganhos evidenciados nesse modelo de parceria no que se refere à prestação eficiente do serviço, satisfação da população e, conseqüentemente, atendimento ao bem comum da sociedade.
Diante do exposto, resta claro os benefícios inerentes a esse modelo e os grandes avanços alcançados, sugerindo, nessa medida, um novo modelo de Estado subsidiário mais eficiente, que mantém as atribuições que possui competência para desempenhar – segurança, manutenção da ordem social, soberania e etc. – e torna-se capaz de, mediante a criação de parcerias junto ao ente privado e fazendo uso das funções de fomento e apoio a esses, efetivamente atender a todas as demandas sociais de forma eficiente.
Informações Sobre os Autores
Gabriela Costa Xavier
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG em curso. Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais. Atualmente ocupa este cargo na Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo do Estado de Minas Gerais
Camila Costa Xavier
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Direito Administrativo e Direito de Família. Advogada civilista