Resumo: Este meta- artigo abordará alguns aspectos da Lei 11.340, de 7 de Agosto de 2006 que ficou conhecida como Lei Maria da Penha, analisando a problemática da violência doméstica e familiar contra a mulher e suas contribuições. Será analisada a Lei no que tange aos princípios fundamentais, verificando que as estatísticas foram os motivos pelos quais o legislador conscientizou-se acerca da necessidade de uma legislação específica na tratativa do assunto em questão, destacando que a criação da lei 11.340/2006 é um marco legislativo, como consequência de uma legislação comum ineficiente e inadequada a fim de combater e minimizar a violência doméstica e familiar contra a mulher, desestimulando as queixas-crime nesses delitos e não mensurando assim as reais dimensões dessa problemática (cifra-negra). É certo que o tempo será o grande validador de sua eficácia ou ineficácia, havendo ou não a necessidade de posteriores modificações e aprimoramentos.
Palavras-chave: Legislação. Violência. Mulher. Gênero. Família.
Abstract: This meta-article is about some aspects of 11.340 law of august 7th in 2006 became known as Maria da Penha law. It analyzes the problem of home and family violence against women and their contributions. The article analyses and explains its fundamental principles by verifying its statistics. Because of it legislators saw the necessity of a specific legislation for this matter and pointed the creation of 11.340/2006 law. It is a legislative mark as consequence of inefficient and inadequate law system in Brazil. This new law tries to minimize and tries to combat home and family violence against women by not encouraging new crimes against women. Only time will say whether or not this act will be efficient.
Keywords: Legislation, Violence, Women, Genre, Family.
Sumário: Introdução. 1. Da violência contra a mulher e legislação. 1.1. Evoluções legislativas brasileira no reconhecimento da violência contra a mulher. 1.2. Finalidades da lei Maria da Penha. 2. Violência doméstica. 2.1. Definição de violência contra a mulher. 2.2. Conceito de violência doméstica e familiar. 2.3. Formas de violência doméstica. 3. Da assistência à mulher. 3.1. Das medidas integradas de prevenção. 3.2. Da assistência à mulher em situação de violência. 3.3. Das medidas protetivas de urgência. Conclusão. Referência Bibliográfica.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho, elaborado em três seções, aborda resumidamente, o estudo da Lei 11.340, de 7 de Agosto de 2006, que, uma vez publicada, ficou conhecida como Lei Maria da Penha.
O nosso estudo tem por objetivo analisar a problemática da violência doméstica e familiar contra a mulher além de demonstrar os aspectos que tem despertado discussões a respeito dessa legislação.
Abordaremos uma breve evolução histórica da violência e discriminação contra a mulher bem como a luta para o reconhecimento dos seus direitos.
Verificaremos os aspectos criminais da lei Maria da Penha, definindo o que é e quais as formas de violência contra a mulher.
Abordaremos também as questões referentes às medidas de prevenção à violência doméstica e assistência à mulher nesses casos, salientando que o grande referencial da Lei 11.340/2006 são as medidas protetivas de urgência que são aplicadas de acordo com a gravidade de cada caso concreto.
Destacamos que a da lei 11.340/2006 trata-se de um marco legislativo, conquistado após muitas lutas e à custa de muito sangue de mulheres guerreiras, uma vez que legislações comuns mostraram-se ineficientes e inadequadas para combater a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Por fim, queremos chamar a atenção para o fato de que, as estatísticas mostram que algo realmente deveria ser feito com relação a triste realidade de nosso país para com a problemática da violência sofrida por muitas mulheres no âmbito familiar, e que somente o tempo dirá se a lei Maria da Penha realmente atingiu seu objetivo, ou se apenas será mais um degrau dessa longa luta por um tratamento digno, justo e igualitário entre homens e mulheres.
1 DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E LEGISLAÇÃO
1.1 Evoluções legislativas brasileira no reconhecimento da violência contra a mulher.
Infelizmente, a violência contra a mulher é uma realidade antiga que, através de muitas lutas, vem sendo mudada, como forma de garantir os direitos de igualdade nas relações de gênero.
O primeiro passo do Brasil contra a violência de gênero foi a ratificação da Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1° de fevereiro de 1984. Em 1988, a Constituição Federal reconheceu a igualdade entre homens e mulheres, em particular no casamento. Em 1995, o Brasil ratificou a Convenção Interamericana para prevenir e erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará.
No ano de 2002, o Brasil assinou o Protocolo Facultativo à Convenção Sobre Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, que abriu a possibilidade de denúncias individuais, a serem submetidas à OEA. Então, finalmente, em 2006, foi publicada a lei 11.340/2006, levando o nome de Lei Maria da Penha.
1.2 Finalidades da lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha não é uma Lei Penal, e sim uma lei multidisciplinar, tanto que apenas cinco artigos são ligados direta ou indiretamente ao Direito Penal e Processual Penal; ficando o restante ligado ao Direito Civil, Previdenciário, Trabalhista, etc.
A lei 11.340/2006 extraiu do caldo da violência comum, uma nova espécie, que é aquela praticada contra a mulher (vitima própria), em seu ambiente doméstico, familiar ou de intimidade.
As finalidades da Lei Maria da Penha são encontradas no art. 1º, Lei 11.340/06, sendo as principais:
1) Criar Mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher;
2) Criar juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher;
3) Estabelece medidas de assistência;
4) Estabelece medidas de proteção à mulher em situação de violência doméstica e familiar.
2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
2.1 Definição de violência contra a mulher
De acordo com a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, adotada pela OEA em 1994: “A violência contra a mulher é qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública quanto na esfera privada”.
2.2 Conceitos de violência doméstica e familiar
O conceito técnico de violência doméstica e familiar contra a mulher encontra-se no artigo 5º, Lei 11.340/06, conforme segue:
“Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:”
A expressão “baseada no gênero” é o termo mais importante desse artigo pois não é qualquer ação e omissão contra a mulher que configurará violência doméstica e familiar, mas somente aquela baseada no gênero, ou seja, será aquela agressão que tem como objeto a mulher, é a violência preconceito, opressão. Essa violência de gênero tem que ocorrer em um dos seguintes lugares:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas. Apenas exige-se, para configurar violência doméstica a unidade doméstica (ambiente caseiro), dispensando vínculo de parentesco, vínculo familiar entre os envolvidos, estando, portanto, abrangida nesse inciso, a empregada doméstica;
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa de união, ou seja, nesse caso a violência não é doméstica, mas sim familiar, dispensando a coabitação, entretanto exige-se vínculo familiar por afinidade ou por vontade expressa.
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação, esse inciso permite, portanto, abranger, por exemplo, namorado e ex-namorada, marido e ex-mulher, marido e amante;
Devemos observar que o Parágrafo único do artigo 5º da Lei em questão dispõe que: “As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual”, como bem explicam Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto:
“Notável a inovação trazida pela lei neste dispositivo legal, ao prever que a proteção à mulher, contra a violência, independe da orientação sexual dos envolvidos. Vale dizer, em outras palavras, que também a mulher homossexual, quando vítima de ataque perpetrado pela parceira, no âmbito da família – cujo conceito foi nitidamente ampliado pelo inc. I, deste artigo, para também incluir as relações homoafetivas – encontra-se sob a proteção do diploma legal em estudo. (CUNHA e PINTO, 2012, P.57) [1]“.
Isso significa que se aplica a lei Maria da Penha mesmo que a vítima esteja em uma relação homo afetiva, e segundo o entendimento jurisprudencial (TJMG, Cjur 1.0000.11.037325-5/000, j. 09.09.2011 rel. Cássio Salomé), somente às relações homo afetivas femininas.
2.3 Formas de violência doméstica
O artigo 7º, Lei 11.340/06, prevê as formas de Violência doméstica e familiar contra a mulher, porém de forma não taxativa visto que ao final usa a expressão “entre outras”, conforme passamos a expor:
1) A violência FÍSICA – trata- se do uso de força que visa ofender a integridade ou a saúde corporal da vítima, pode ir desde uma contravenção penal de vias de fato até o crime de homicídio, ou seja, é todo tipo de agressão física.
2) A violência PSICOLÓGICA é a chamada agressão emocional, que é tão ou mais grave que a física e se dá quando o sujeito ameaça, humilha ou discrimina a vítima. A depender do caso concreto, pode configurar o crime de ameaça.
3) A violência SEXUAL, o inciso III descreve a violência sexual de forma bem ampla, entendendo assim como qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, manter ou participar de relações sexuais não desejadas; que a induza a comercializar ou utilizar de qualquer modo, indesejado, sua sexualidade; que a impeça de utilizar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, a gravidez ou ao aborto, que limite ou anule seus direitos sexuais ou reprodutivos. No Código Penal Brasileiro, tais condutas podem configurar o crime de estupro, entre outros.
4) A violência PATRIMONIAL, conforme prescreve o inciso IV do artigo 7º da lei 11340/06, violência patrimonial é qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total dos objetos da mulher, de seus instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.
Essa forma de violência, raramente se apresenta separada das demais, servindo como meio para agredir física ou psicologicamente a vítima.
5) A violência MORAL é entendida como qualquer conduta que configure calúnia (imputar a vitima a prática de determinado fato criminoso, sabendo ser falso), injúria (atribuir à vítima qualidades negativas) ou difamação (imputar a vítima a pratica de fato desonroso). Normalmente a violência moral se dá concomitantemente à violência psicológica.
Quando se fala em violência doméstica e familiar, ela pode corresponder a um crime (ex.: homicídio), podendo também corresponder a uma contravenção penal (ex.: vias de fato) ou também a um fato atípico (ex.: adultério). Tanto o crime quanto a contravenção penal e/ ou o próprio fato atípico podem autorizar o deferimento de medidas protetivas em favor da mulher;
3 DA ASSISTÊNCIA À MULHER
3.1 Das medidas integradas de prevenção
O artigo 8º e seus incisos da lei Maria da Penha é dedicado a estabelecer medidas que devem ser implementadas para prevenir e coibir a violência doméstica, devendo ser formulada e colocada em prática “por meio de um conjunto articulado de ações do poder público (União, Estado, Distrito Federal e Municípios) e de Ações não governamentais” que efetivará as obrigações assumidas pelo Brasil quando da ratificação da Convenção de Belém do Pará.
3.2 Da assistência à mulher em situação de violência
O artigo 9º da Lei Maria da Penha, dispõe sobre as formas de assistência à mulher. Os mecanismos de assistência, ou seja, a tríplice assistência consiste em:
1- assistência social, incluindo a ofendida no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal;
2- assistência à saúde, que compreende o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência à profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis em casos de violência sexuais;
3- assistência à segurança pública, garantindo a vitima proteção policial bem como abrigo ou local seguro quando houver risco de vida, e se necessário, acompanhamento da ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar.
3.3 Das medidas protetivas de urgência
O maior diferencial na Lei Maria da Penha, são as medidas protetivas de urgência, previstas nos artigos 22 a 24, que podem ser aplicadas de acordo com a gravidade de cada caso. Essas medidas não se limitam apenas a esses artigos, pois em toda a lei existem diversas medidas voltadas à proteção da mulher vítima. Tais medidas podem ser concedidas de ofício pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou pela própria ofendida.
A mulher vítima de violência doméstica deve dirigir-se a uma delegacia de Polícia, preferencialmente especializada, ou seja, a uma delegacia de Defesa da Mulher, a fim de relatar o ocorrido a uma autoridade policial, que deverá tomar as providencias legais cabíveis constantes nos artigos 10 e 11 da lei Maria da Penha (dentre outras), garantindo assim uma maior proteção à vítima.
A autoridade Policial deve representar ao juiz as medidas protetivas requeridas pela vitima em até 48 horas do requerimento, conforme o artigo 12 inciso III da Lei Maria da Penha.
O Juiz competente é o juiz do Juizado Especial da Mulher, que tem competência penal e civil, ou seja, julga tanto o crime quanto a separação judicial determinando o afastamento do agressor. Na ausência do juizado especial, as varas criminais acumularão as competências civis e criminais para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência domestica e familiar contra a mulher.
CONCLUSÃO
Podemos concluir que para acabar com a violência doméstica e familiar contra a mulher, é preciso, antes de mais nada, mudar certas atitudes culturais e crenças da sociedade, as quais permitem a ocorrência e continuidade do comportamento abusivo de homens que acreditam na resolução das divergências e controvérsias utilizando a força, a brutalidade e a violência.
As estatísticas mostram a imperiosa necessidade de medidas que coíbam e punam a violência sofrida por muitas mulheres no âmbito doméstico e familiar, porém, devemos acreditar que com o advento da lei 11.340/2006 (que prevê programas de prevenção, mecanismos inovadores de proteção à vitima, e programas de recuperação e reeducação do agressor, deixando de lado a banalização de uma cultura machista), a tendência é que haja uma diminuição nesse tipo de delito.
Finalizamos afirmando que este trabalho não pretende esgotar o assunto, no entanto, contribuir modestamente para o conhecimento acerca do tema estudado. Concluímos, então, que é preciso tratar a violência doméstica e familiar contra a mulher, não apenas como uma questão de justiça penal, mas também como uma questão social, de educação e cultura, visto que uma sociedade com essas bases bem estruturadas é uma sociedade mais consciente, correta e justa. É notório que somente o tempo dirá se a lei Maria da Penha atingirá seu objetivo.
Informações Sobre os Autores
Aline Simões de Lemos da Silva
bacharel em Direito e investigadora de polícia
Amanda Pinheiro Machado Teixeira
Graduada e pós-graduada na área de biológica e investigadora de polícia