Crimes contra a previdência social

Resumo: O principal objetivo do presente artigo é fazer uma análise dos ilícitos previdenciários, fazendo comentários acerca das modificações trazidas com o tempo à legislação previdenciária. Com isto, em que surge não só a proteção e inclusão dos cidadãos na esfera da proteção da seguridade social mas também no que tange ao patrimônio como meio eficaz para assegurar os recursos materiais que se destinam a justa distribuição dos benefícios e serviços aos usuários do sistema previdenciário.Pois para que haja o ao funcionamento da estrutura de seguridade social, a solidariedade social e a boa-fé dos contribuintes são pressupostos indispensáveis, uma vez que o legislador impôs a proibição de condutas que se reputam lesivas ao funcionamento da Previdência Social.E o desvio das principais finalidades de funções acerca do âmbito previdenciário caracterizam condutas meramente classificadas pelo legislador como ilícitos penais, os quais serão abordados ao longo deste.[1]

Palavras-chave: Decreto nº 4.682/23 – Lei nº 6.439/77- Previdência Social – Crimes contra a Previdência Social

Antes de tudo, é de relevante importância uma breve abordagem sobre a  história da previdência social no Brasil começou , a qual teve início em 1923, quando foi criada uma caixa de aposentarias e pensões para os empregados de empresas ferroviárias, mediante contribuição dos trabalhadores, sendo considerada o marco inicial da previdência. Alguns doutrinadores abordam os seguintes aspectos, que o Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923 (Lei Eloy Chaves) é a primeira lei sobre a aposentadoria no Brasil. Seu objetivo, em princípio não era conceder aposentadoria, mas apaziguar um se teor econômico estratégico na época.

 Ou seja, o início deste sistema foi limitado, pois a maioria dos trabalhadores não fazia parte, a princípio somente ferroviários e eletricistas, então se criaram outras caixas em empresas de diversos ramos de atividade econômica.  Por meados de 1930, foi criado o ministério do trabalho, indústria e comércio, que tinha a tarefa de supervisionar a previdência social. E a partir  de 1930 foram surgindo vários institutos que abrangiam determinados setores (marítimos, comerciários, bancários, industriários e empregados no transporte e cargas).

Surgiu assim o Instituto de Aposentadoria dos marítimos (IAPM) em 1933, o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Comerciários (IAPC) em 1934, o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários, (IAPB) em 1934, o IAP dos Industriários (IAPI) em 1936 e o IAP dos empregados de Transportes e Cargas (IAPTEC) em 1938. Esse processo de unificação e criação dos Institutos avançou até o inicio dos anos 50, quando praticamente toda a população urbana assalariada já se encontrava coberta pela previdência, exceto os trabalhadores domésticos e autônomos.

A previdência social é custeada pelas contribuições dos trabalhadores, das empresas e do estado e mantém serviços de assistência médica e hospitalar. Em geral, beneficia as pessoas que exercem atividade remunerada em empresa s privadas e servidores públicos, o que difere da assistência social que atende qualquer pessoa que dela precise.Seu financiamento no setor privado ocorre de forma Tripartite, com contribuição dos trabalhadores no salário, recolhimento pelo empregador e o governo que cobre insuficiências que possam ocorrer.

Visto que, houve uma regulação da tríplice forma de custeio (ente publico, trabalhador e empregador), devido a  Constituição de 1934 no art. 121. A Carta Magna de 1937, outorgada em pleno Estado Novo, empregou a expressão “seguro social”. Somente na Carta de 1946, surgiu pela primeira vez à expressão  “previdência social”, elencando como riscos sociais , a doença, a velhice, a invalidez e a morte.

Já em 1960, por mera coincidência com as construções e fundação de Brasília, foi criada a Lei Orgânica da Previdência Social (Lei nº 3.807, de 26/08/1960) e em 1966 ocorreu à união dos institutos, surgindo o Instituto Nacional da Previdência Social (INPS).  Em 1977 foi criada a Lei nº 6.439 de 01/07/1977 que tinha por objetivo reorganizar a previdência social, e estava dividida em INPS, INAMPS, LBA, FUNABEM, DATAPREV, IAPAS, CEME. Somente os contribuintes do INPS tinham direito aos serviços do INAMPS.

O INPS e o IAPAS tornaram-se um só instituto o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), surgiram em 1990 que tinha como atribuições básicas à arrecadação, administração e pagamento dos benefícios aos segurados, confirmando a ideia de que a previdência social é uma forma de seguro, e é diferente da assistência social e saúde. Neste mesmo período foi criado o Sistema Único de Saúde, para cuidar apenas da saúde.

Com base doutrinária, tem se como  previdência social  como um seguro público, coletivo, compulsório, mediante contribuição e que visa cobrir os seguintes riscos: incapacidade, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de família, morte e reclusão.Por ser um seguro público, coletivo, e compulsório, ele é administrado pelo governo e todos os trabalhadores economicamente ativos devem aderir a ele de maneira forçada, sob pena de crime, tipificado no Código Penal no art. 337-A, com pena de dois a cinco anos, além de multa e do pagamento da quantia principal devida.

Pode-se dizer que é um eufemismo quando a Constituição diz que o seguro é pago mediante contribuição, pois contribuição é um termo que pressupõe voluntariedade, ou seja, a pessoa contribui para alguma coisa, em tese, apenas se ela quiser o que não é o caso.  Portanto, a melhor denominação para esse pagamento seria imposto, pois é uma imposição estatal a sua pagamento, mas vamos manter a palavra original para não confundir o leitor.

 Atualmente vigoram dois  tipos de regime, o regime geral de previdência social (para os trabalhadores do setor privado) e  regime próprio de previdência social ( para os trabalhadores do setor público).São alguns os benefícios concedidos pela previdência social brasileira, como: auxílio-doença; auxílio-acidente; aposentadoria por invalidez; aposentadoria por idade; aposentadoria por tempo de contribuição; aposentadoria especial; salário-maternidade; salário-família; pensão por morte e auxílio-reclusão.

Entretanto, o custo do sistema previdenciário brasileiro é pago por quatro entes:  pelos trabalhadores (através de contribuição sobre o quanto ganha, que vai de 7,65% a 20% do salário de contribuição, dependendo do tipo de segurado);  pelas empresas empregadoras (através de uma série de tributos, como COFINS, CSLL, SAT, entre outros), por parte da receita proveniente de loterias e  pelo Governo.Através de algumas pesquisas, constatei que muitos inda criticam que a previdência social não passa de ser um esquema fraudulento de pirâmide,tanto na esfera público quando na privada, ou seja, inerentemente imoral e ineficaz, a previdência social possui outras distorções flagrantes que são ignoradas pelo grande público.

Por fim, além de ineficiente, a previdência social é um verdadeiro antro de pessoas inescrupulosas ávidas por desviar recursos para fins próprios. Provavelmente é a instituição mais fraudulenta do Brasil. Recorrentemente funcionários do INSS descobrem que beneficiários já faleceram e recebem por eles. Pessoas fantasmas  também são inventadas, junto ao sistema, para fins de desvio, entre outras fraudes Muito embora o código Penal trate de crimes contra a previdência, o mais correto seria falar-se em delitos praticados contra a seguridade social, posto que parte das contribuições sociais é destinada à saúde e à assistência social. Os crimes a seguir estudados exigem sempre a conduta dolosa, não admitindo a culpa. Abaixo serão relatados alguns crimes em face do sistema previdenciário, como:

1. Apropriação indébita previdenciária

Este ilícito está descrito no Código Penal, da seguinte forma:

Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa

§1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;

II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III – pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.

§2º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.

§3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que:

I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou

II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais”.

A doutrina caracteriza este crime como um tipo formal, omissivo próprio,isto quer dizer que, não preciso haver um resultado para a sua caracterização e porque  prevê uma omissão por parte do agente (“deixar de…”). É diferente da apropriação indébita clássica, prevista no art. 168, CP (que é crime comissivo e material). Aqui, o agente (quem comete o crime) deve agir com consciência e vontade, e isso deve ser caracterizado para que tenha o crime.

Mas, do contrário será inocentado, quando no caso por exemplo da empresa deixou de recolher os valores descontados dos segurados por negligência, imprudência ou imperícia, não há crime, pois este tipo penal não admite modalidade culposa. Por isso que, por exemplo, sócios cotistas da uma sociedade limitada, muito embora possam ser responsabilizados pelos débitos previdenciários, nunca serão responsabilizados penalmente, pois como não administram a sociedade, certamente não tiveram a intenção de deixar de repassar os valores descontados dos segurados. A responsabilização penal é muito mais difícil de ser enquadrada, em razão deste elemento subjetivo (tem que comprovar a intenção). Este tipo de responsabilidade é diferente das que são trazidas por  infrações do direito tributário ou previdenciário, que é, em regra, objetiva.

Este crime foi inserido no mesmo título dos crimes contra o patrimônio, pois  entende-se que o bem jurídico tutelado é o patrimônio da previdência social. Sendo que  que a Lei nº 9.983/00, no que diz respeito à pena da apropriação indébita previdenciária, tem efeitos retroativos, já que seu valor máximo é inferior ao anteriormente previsto, que era de 06 (seis) anos, uma vez que não é suficiente para a caracterização do crime, a mera ausência de repasse.O respectivo crime não exige  o dolo específico, ou, no caso, o “animus rem sibi habendi” isto é, ter a coisa apropriada para si mesmo, apenas é necessário  consciente e livre vontade do agente em reter os valores devidos à previdência social, independente de fim específico (por isso é crime formal).

De acordo com o artigo expresso, entende-se que há de ter o dolo de deixar de repassar, mas não é levado em consideração se foi com a intenção de ficar com o dinheiro para si, pois a comprovação da ausência de desconto exclui o crime. Sendo que a Lei nº 8.212/91 em seu art. 33 §5º , traz a  presunção absoluta da retenção de tais valores e, por isso, serão cobrados do sujeito passivo, mas sem a caracterização do ilícito penal. O objetivo desta Lei é estimular o pagamento, traz caso de extinção da punibilidade, ao prever, no § 2º, que esta será extinta se o agente, espontaneamente, declarar confessar e efetuar o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e prestar as informações devidas à previdência social, antes do início da ação fiscal.

Como sabemos se há a extinção da punibilidade, consequentemente haverá a extinção da pretensão punitiva do Estado, isto que dizer que, caso você cometa o crime, não mais o Estado não poderá mais aplicar-lhe a pena, mas  para que haja a exclusão é necessário o recolhimento integral do devido antes da ação fiscal, que se inicia, em regra, pelo termo de início da ação fiscal – TIAF, pois o recolhimento posterior não exclui a punibilidade, podendo, conforme o caso, gerar perdão judicial, se feito antes da denúncia (§ 3º).

É de relevante importância salientar que antes da  Lei nº 9.983/00, a exclusão da punibilidade poderia ocorrer com o pagamento até a denúncia (início da ação penal), segundo o que  prevê no art. 34 da Lei no 9.249/95, a qual era aplicável às contribuições previdenciárias. Mas atualmente, o pagamento deve  ser feito antes da ação fiscal, visto que para alguns, o parcelamento também traria a extinção da punibilidade.

No que tange aos efeitos previdenciários,, tal fato não é aplicável, não só em vista da ausência de lei expressa, mas também em virtude da proibição de parcelamento de contribuições retidas (art. 38, § 1º da Lei no 8.212/91), então resta concluir que, esta vedação não se aplica a hipóteses específicas, em que leis passadas autorizavam o parcelamento mesmo de valores descontados dos segurados, como o REFIS. Nestes casos, haverá a suspensão da ação penal enquanto perdurar o parcelamento, consequentemente a prescrição penal também será suspensa.O art. 168-A, ainda traz dois casos de perdão judicial, uma vez que é  facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa, se o agente for primário e de bons antecedentes, e tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios ou ainda, se o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais, o que está limitado como R$ 10.000,00.

Sendo assim, pode-se concluir que em ambos os casos, o réu deverá ser  primário e ter bons antecedentes, caso contrário, torna-se inaplicável o perdão, pois na extinção da punibilidade, pouco importa se o agente é de bom antecedentes ou primário.

2. Sonegação de contribuição previdenciária

Este também foi inserido no Código Penal, com a seguinte redação:

“Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I – omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços;

II – deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços;

III – omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

§1º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara e confessa as contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.

§2º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que:

I – (VETADO)

II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.

§3º Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal não ultrapassa R$ 1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), o juiz poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa.

§4º O valor a que se refere o parágrafo anterior será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência social”.

Apesar deste crime não estar previsto pela Lei nº 8.212/91, mas sim na Lei nº 8.137/90, que deixa de ser aplicada, como vimos, em virtude da existência de norma específica sobre o assunto, mas fora  foi inserido no Título referente aos crimes contra a Administração Pública, no Capítulo dos crimes praticados por particulares no Código Penal.O crime é  material, pois o resultando compõe o tipo, sendo que é necessária a supressão ou redução de contribuição social para a sua materialização, pois se apenas houver conduta e não resultado, não há crime, haverá somente uma infração tributária administrativa. Neste crime,  o resultado é necessário, visto que sem ele, não há crime, já quanto o dolo deve ser caracterizado, sob pena de exclusão da antijuridicidade, existindo mero ilícito administrativo.

Deve haver ser livre a vontade e  a consciência do agente em reduzir ou suprimir a contribuição, atingindo seu resultado. Poderá haver também a extinção da punibilidade, somente se o agente, espontaneamente, declara e confessa as contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, antes do início da ação fiscal.Não há a necessidade de haver pagamento, e sim a confissão antes do início da ação fiscal. Sendo que as contribuições continuarão  devidas e serão cobradas, mediante execução fiscal, se necessário.Desta forma,  o agente não poderá mais ser punido pelo ilícito penal, pois hoje em dia, o documento mais utilizado para tal fim (confissão) é a GFIP, a qual é elaborada pelas empresas mensalmente e tem a função de evidenciar o devido pelas mesmas à previdência social.

A princípio,  seria possível a exclusão da punibilidade pelo pagamento, ainda que posterior ao início da ação fiscal,  desde que se entenda aplicável ao caso o art. 34 da Lei no 9.249/95, o qual dispõe: Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei no 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.

Mesmo que a analogia seja vedada no direito penal, poderá ser aplicada quando for para  beneficiar o réu, como é o caso com a aplicação analógica da citada lei, que visa somente os crimes contra a ordem tributária, o réu pode se beneficiar, e é isso que tem feito os Tribunais não exista menção expressa aos tipos da Lei nº 9.983/00, até porque posteriores, é correta a aplicação da analogia que beneficie o caso, isto é, o pagamento, antes da denúncia, também excluiria a punibilidade.Já quanto ao parcelamento, quando este for feito antes de qualquer ação fiscal, a punibilidade é necessariamente excluída, pois o parcelamento implica a confissão da dívida. Mas se o parcelamento for posterior à ação fiscal, não há, a priori, exclusão da punibilidade. Isto pode ser comprovado diante  do veto do inciso I do § 2º, o qual trazia justamente hipótese de perdão judicial para débitos parcelados, após o início da ação fiscal, mas antes da denúncia. Há que se ressaltar também a divergência jurisprudencial existente, com diversos entendimentos, em especial do STJ, no sentido da exclusão da punibilidade, ainda que decorrente de parcelamento tardio, porém anterior à denúncia. Mas deve ser claro que implica em dizer que o parcelamento, neste crime, irá excluir a punibilidade se cumprido até o fim, uma vez que até lá, ficará suspenso a pretensão punitiva do Estado, bem como a prescrição penal.

 Sendo que  o perdão judicial, após o veto do inciso I, ficou assim restrito, no caso de agente primário e de bons antecedentes, às situações em que o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.É possível que  o juiz poderá reduza a pena de um terço até a metade ou aplique apenas a de multa, pois não há qualquer necessidade de primariedade e bons antecedentes do agente.Mas para isto ocorrer, a  folha de pagamento mensal não pode  ultrapassar R$ 1.510,00 (R$ 2.355,54, em valores atualizados).

3. Falsificação de documento público

O Código Penal, já trazia a tipificação deste crime, sendo que apenas recebeu o acréscimo dos §§ 3º e 4º, que expõe:

“Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

§1º Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

§2º Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular.

§3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir:

I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório;

II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deve ria ter sido escrita;

III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado.

§4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3o, nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços”.

O respectivo crime em seu título, refere-se aos crimes contra a paz pública, no capítulo referente à falsidade documental. O escopo é a preservação a veracidade das informações constantes em tais documentos, hoje em dia principalmente em especial por causa da GFIP, a previdência social tem dado muita importância à documentação elaborada pela empresa, de modo a desobrigar o segurado do ônus da prova de sua condição de segurado, assumindo o INSS como verdadeiros os dados apresentados pelos empregadores.

Deste modo, haverá certamente uma rapidez à concessão de benefícios, abrindo-se a porta para a elaboração de fraudes, como declaração de falso vínculo, que consequentemente  irá gerar direitos inexistentes. Isto pode ser entendido por exemplo quando da existência de  um vínculo falso declarado em GFIP de modo que alguém possa se aposentar mesmo sem ter direito, ou seja, desta forma a omissão indevida destes documentos pode dificultar ou até mesmo inviabilizar a concessão de benefícios devidos; por isso, a exclusão indevida de segurados dos documentos da empresa é também objeto de sanção penal. O crime do § 3º é comissivo, pois explana a ação de inserir dados falsos, já o  crime do § 4º é omissivo, já traz uma omissão da empresa em relação a seus segurados.Mas ambos os crimes são formais, isto quer dizer que independem do efetivo resultado desejado pelo agente.

4. Inserção de dados falsos em sistema de informações

Os delitos praticados por meio da informatização têm recebido cada vez mais importância do legislador, pois devido à dependência cada vez maior do Estado de mecanismos informatizados para controle de suas tarefas, fraudes dolosamente provocadas devem receber sanção de natureza penal, devido ao alto potencial danoso.

O Código Penal assim dispõe:

“Art. 313-A. Inserir ou facilitar (ação), o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano (dolo específico):

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa”.

Este crime é caracterizado por ser  próprio, formal e comissivo. É próprio, pois somente o funcionário autorizado poderá praticá-lo, isto quer dizer que deve ser um funcionário dotado de senha para inclusão de dados no sistema, uma vez que  o conceito de funcionário público aqui tratado é o constante do art. 327 do Código Penal, que diz:

“Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

§ 2º A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público”.

O crime é  formal e comissivo, pois decorre de uma ação do agente e não carece de resultado para sua consumação, embora o dolo seja específico,já que o fim visado pelo agente deve ser vantagem indevida para si ou para outrem ou ainda para causar dano.Vale ressaltar que também que  em regra ,a facilitação, pode abranger outras pessoas com participação indireta, como servidor que empresta senha ou terminal para a realização da fraude. Mas que para efeitos penais, há definição precisa de funcionário público prevista  no art. 327exposto acima.

5. Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações

    Este é mais um caso em que  a lei  traz previsão de novo ilícito informático, mas  desta vez há uma  previsão  mais abrangente. Assim dispõe o Código Penal:

“Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado”.

Aqui, também há a figura do funcionário público como agente do crime, contra a administração em geral. A conduta descrita é atualmente conhecida por “data dilling”, é um crime do tipo próprio, formal e comissivo. Próprio porque deve ser  praticado por funcionário público (art. 327 do CP), é formal,uma vez que dispensa qualquer resultado para sua consumação e comissivo pela realização de uma ação do agente.

Há uma diferença básica entre este tipo penal anteriormente mencionado, que é a ausência de dolo específico, já que a mera modificação ou alteração dolosa, com qualquer fim, caracteriza o ilícito penal. Para melhor entendimento, por exemplo, mesmo que um servidor com as melhores das intenções venha a fazer uma alteração do sistema, sem autorização do chefe, independente de uma melhora no sistema, haverá o crime previsto, pois foi uma modificação no sistema não autorizada.    O resultado da conduta do agente somente mostra-se relevante para a aplicação da qualificadora do parágrafo único, caso haja efetivo prejuízo para a previdência ou o beneficiário.

6. Estelionato

O respectivo crime contra a previdência social não foi alterado pela Lei nº 9.983/00 e continua previsto no art. 171, § 3º do CP:

“Art. 171.Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

§3º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência”.

O que traz o parágrafo terceiro inclui o INSS, sendo que é um crime contra o patrimônio da seguridade social, sendo delito material, pois sua concretização toma lugar com a obtenção da vantagem indevida, como o recebimento de benefício, oriundo de ardil praticado perante o INSS. Trata-se de um estelionato qualificado, mesmo que  a qualificadora do § 3º não mencionar expressamente a previdência social, conforme Súmula 24 do STJ “Aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do § 3º do art. 171 do Código Penal”.

Diante do que fora exposto neste trabalho, não restam dúvidas de que é imprescindível a atuação do Direito Penal como um instrumento  de controle social para que seja assegurado o resultado da tributação e a regularidade das relações jurídicas.É por este motivo que a legislação criminal vem avançando com os tempos de modo a distinguir o sonegador do mero inadimplente e municiar com relevante instrumental aqueles que combatem os ilícitos previdenciários, desestimulando – em larga medida – os sonegadores e os partícipes envolvidos na manutenção de contabilidade fictícia para fins de prática de atividade criminosa. Mas com do que foi exposto, pode-se concluir que com este estudo das figuras típicas penais contra a Previdência Social que,  para que haja uma paralisação ou ao menos uma diminuição na “sangria” dos cofres da Seguridade Social e o déficit previdenciário precisa-se muito mais do que leis. É de extrema necessidade que haja na esfera administrativa, a reestruturação de uma fiscalização mais atuante e, no âmbito judicial, a adoção de posturas que permitam uma célere tramitação das causas penais previdenciárias, de modo a impedir a impunidade e a restabelecer o equilíbrio financeiro da Previdência Social.

 

Referência
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/rev_20/artigos/FranciscoDias_rev20.htm.Acesso em: 20 de out 2013.
 
Nota:
[1] Trabalho orientado pela Profa. Thays Machado, Possui graduação em Direito pela Universidade de Cuiabá/MT (2001), especialização em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes/RJ (2004), especialização em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Católica Dom Bosco/MS (2006), mestre em Direitos Humanos e Educação Ambiental pela Universidade Federal de Mato Grosso/UFMT (2010).


Informações Sobre o Autor

Nathaly Veloso Lehnen

Acadêmica de Direito na Universidade de Cuiabá – UNIC


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