A respeito da ética

Sumário: Introdução. A ética, seus conceitos e fundamentos. Panorama histórico da ética. Reeferências.

Introdução.

Estudo introdutório acerca da ética e sua evolução a partir da filosofia helênica. Este conjunto de textos, como já se sabe, constitui instrumento de fundamentação teórica a respeito do pensamento humano nas principais fases da vida em sociedade.

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A ética, seus conceitos e fundamentos.

A ética é uma ciência, um ramo da Filosofia.

A reflexão sobre a postura ética dos indivíduos transcende o campo individual e alcança o plano profissional dos seres humanos.

Entretanto, na busca de não se resumir o ser humano a um autômato, mero cumpridor de normas ou etiquetas sociais, devemos buscar alcançar a razão de ser dos comportamentos.[1]

A ética está no nosso cotidiano. Em jornais, revistas, diálogos e outros aspectos de nossa realidade social, a ética é utilizada, lembrada, esquecida, mencionada ou até mesmo exigida.

Camargo define a ética, de acordo com Sertillanges: "Ciência do que o homem deve ser em função daquilo que ele é".[2]

O fundamento da ética é ser do homem. A fonte de seu comportamento seria justamente a sua natureza. 

O agir depende do ser. O giz deve escrever. É de sua natureza escrever. O sol deve brilhar. Ele deve assim fazer, pois está na sua natureza brilhar.

A única obrigação do ser humano é ser e agir como ser humano. O único mal do homem é não agir como homem. 

A ética brota de dentro do ser humano, daqueles elementos que o caracterizam como ser humano. 

Entretanto, qualquer situação específica da pessoa deve brotar da realização do fundamental. Um dentista só vai se realizar como dentista, por exemplo, se ele se realizar como ser humano. 

A construção da ética parte das exigências ou necessidades fundamentais da natureza humana.

Ética vem do grego "ethos" e significa morada. Heidegger da ao "ethos" o significado de "morada do ser". 

A ética indica direções, descortina horizontes para a própria realização do ser humano. Ela é "a construção constante de um "sim" a favor do enriquecimento do ser pessoal. 

A ética deve ser eminentemente positiva e não proibitiva. Por exemplo, é mais importante respeitar a vida do que não matar. 

A ética antecede a qualquer lei ou código de conduta. Sua busca é a melhoria do ser humano.[3]

Segundo Houaiss, a palavra ética é um substantivo feminino que foi incorporado à língua portuguesa no século XV e tem significados diferentes. 

Ética é parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano, refletindo especialmente a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social.

Por extensão, ética é o conjunto de regras e preceitos de ordem valorativa e moral de um indivíduo, de um grupo social ou de uma sociedade (ética profissional, ética psicanalítica, ética na universidade).[4]

Já o substantivo feminino eticidade significa qualidade ou caráter do que é condizente com a moral.[5]

A palavra ciência adentrou na língua portuguesa no ano de 1370. Por ciência entendemos o conjunto organizado de conhecimentos acerca de algo. Este algo será justamente o objeto da ciência. Por exemplo, dentro da ciência do direito, as leis, conjuntos escritos de normas que são capazes de produzir efeitos práticos naquela sociedade, podem ser considerados o objeto desta ciência. 

O também substantivo feminino ciência, segundo o dicionário de nossa língua, é o conhecimento atento e aprofundado de alguma coisa. 

Um outro significado de ciência é conhecimento, informação, noção precisa, consciência a respeito. 

Filosofia, finalmente, é o substantivo feminino que faz parte da nossa língua desde o século XIV e que representa o amor pela sabedoria, experimentado apenas pelo ser humano consciente de sua própria ignorância. Originalmente o termo fora utilizado por Pitágoras no século VI antes de Cristo. Dentre os diversos significados existentes, em diferentes sentidos pode ser conceituada a filosofia. 

Segundo Sá, em um sentido mais amplo: "a Ética tem sido entendida como a ciência da conduta humana perante o ser e seus semelhantes". 

Envolve, pois, os estudos de aprovação ou desaprovação da ação dos homens e a consideração de valor como equivalente de uma medição do que é real e voluntarioso no campo das ações virtuosas. 

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Encara a virtude como prática do bem e esta como promotora da felicidade dos seres, quer individualmente, quer coletivamente, mas também avalia os desempenhos humanos em relação às normas comportamentais pertinentes. 

Analisa a vontade e o desempenho virtuoso do ser em face de suas intenções e atuações, quer relativos à própria pessoa, quer em face da comunidade em que se insere.[6]

A ética é ciência que estuda o agir dos seres humanos, a sua conduta, analisando as formas de conduta de forma que a mesma se reverta em benefício dos primeiros.

Sendo a conduta do ser a sua resposta a estímulos mentais, ou seja, ação resultante de um comando do cérebro, ela também pode ser observada e avaliada. O estudo da ética representa justamente a observação da conduta humana.[7]

Ela cuida das formas ideais da ação humana na procura da essência do Ser, visando ao estabelecimento de conexões entre o material e o espiritual. 

É uma ciência que busca as formas ideais de conduta e os modelos de conduta conveniente, objetiva, dos seres humanos. 

A ética analisa o bem como prática de amor em diferentes formas. Além disto, outro aspecto da ética é o da conduta que respeita e não prejudica a terceiros ou a si mesmo.[8]

Um dos significados do termo grego "ethos" é "costumes". A palavra "moral" também vem do latim e significa "costumes". 

Para o autor mexicano Sanchez a ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. Em outros termos, ética é a ciência de uma forma específica de comportamento humano. 

Panorama histórico da ética.

Sanchez ressalta que os problemas éticos são objeto de uma atenção especial na filosofia grega quando se democratizou a vida política da Região, especialmente de Atenas. 

Pitágoras, no século VI a.C., já estudava a ética. 

Os sofistas fizeram parte de um movimento intelectual na Grécia do século V antes de Cristo. 

Protágoras de Abdera, nascido em 480 a.C., já pregava o que se devia fazer perante terceiros para ser virtuoso. Além de protagonizar o célebre pensamento de que o ser humano é a medida de todas as coisas, reconhecera no respeito e na justiça as condições de sobrevivência, ou seja, o caminho pelo qual se chega ao bem, por meio da conduta.[9]

Górgias sustenta ser impossível saber o que existe realmente e o que não existe.[10]

Sócrates nasce em Atenas, no ano de 470 a.C. Adversário da democracia ateniense, o mestre de Platão foi acusado de corromper a juventude e morreu envenenado no ano de 399 a.C. A ética socrática é racionalista. Nela podemos encontrar: "a) uma concepção do bem (como felicidade da alma) e do bom (como o útil para a felicidade; b) a tese da virtude (arete) – capacidade radical e última do homem – como conhecimento, e do vício como ignorância (quem age mal é porque ignora o bem; por conseguinte, ninguém faz o mal voluntariamente), e c) a tese de origem sofista, segundo a qual a virtude pode ser transmitida ou ensinada".[11]

Platão desenvolve o estudo das funções da alma, pela virtude, nas obras Filebo e A República. Platão estuda de seu exame a disposição da alma, estudando as suas funções de forma a desenvolver.

O discípulo de Sócrates considerava que a ética se relacionava intimamente com a filosofia política. Ela dependia da sua concepção metafísica, da sua doutrina da alma:

“princípio que anima ou move o homem e consta de razão, vontade ou ânimo, e apetite; a razão que contempla e quer racionalmente é a parte superior, e o apetite, relacionado com as necessidades corporais, é a inferior".[12]

Ante as dificuldades do indivíduo de aproximar-se da perfeição, torna-se necessária ao ser humano a participação em um Estado ou Comunidade política. O homem é bom enquanto cidadão. A idéia do homem somente se realizaria na comunidade. A ética levaria necessariamente à política.[13]

Aristóteles em "Ética a Nicômaco", trata a política e em outros trabalhos exerce grande influência sobre os pensadores de então e de toda a história da humanidade. 

Discípulo de Platão, também chamado de estagirita, viveu de 384 a 322 a.C., Aristóteles se opões ao dualismo ontológico de Platão. Para ele a idéia não é uma realidade distinta dos indivíduos. A idéia existe somente nos seres individuais. Entretanto, o homem deve tornar concreta uma realidade que é só potencia em seu pensamento. A grande resposta, o grande objetivo para ele está na felicidade. Para se alcançar a felicidade, entretanto, o homem deve ter uma vida elevada, uma vida contemplativa guiada pela razão.

A ética de Aristóteles está unida à sua filosofia política, em razão de ser a comunidade social e política o meio necessário da moral. Somente nela poderia alguém realizar o ideal da vida teórica na qual se baseia a felicidade. O homem é um animal político que só se realiza vivendo em sociedade, a vida moral é necessária para esta vida social e, finalmente, somente assim o ser humano poderia se realizar em sua vida teórica na qual consistiria a felicidade. 

Dos filósofos estóicos, há menor rigor no tratamento da Ética. Estobeu considera a ética como uma conduta volvida à realidade de cada época, portanto, mutável.

Lopes de Sá conclui que em todos (…) estudos filosóficos da questão, mesmo diante das mudanças do ambiente por alterações conceituais, observa-se que a preocupação é o homem, em suas formações espiritual e mental, com vistas aos seus procedimentos perante terceiros, mas sempre buscando praticar o que não venha a ferir ou prejudicar a quem quer que seja, inclusive o responsável pelo ato.[14]

Hobbes achava que o básico na conduta humana era a conservação de si mesmo como o bem maior.[15]

O filósofo holandês, de origem portuguesa, desenvolveu em sua Ética o que Descartes preconizara.

Fichte encara a ética como auto-afirmação do ser.[16]

Hegel confundia a lei e o Estado como as materializações do bem.[17] O mesmo autor, além de Green e de Corce, entre outros, chegaram a entender a ética como o buscar assumir a Deus, como algo infinito em virtudes. 

Bérgson estabelece a ética caracterizada por "análises restritas ou fechadas e amplas ou abertas, mas, denuncia um forte sentimento de respeito à consciência ética como regente da atividade ética e uma forte ligação entre os fenômenos da matéria e do espírito".[18]

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Reeferências.
CAMARGO, Marculino, Fundamentos de ética geral e profissional, 2ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
DÓRIA, Og, Roberto, Ética e profissionalização, Revista do Serviço Público. Brasília, Escola Nacional de Administração Pública, v. 1, n. 1, nov. 1937. Brasília, v. 118, n. 1, jan/jul., 1994.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
LEPARGNEUR, Hupert. Bioética: novo conceito a caminho do consenso, São Paulo: Loyola, 1996.
MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida, A Ética Profissional no Serviço Público Brasileiro, Revista Jurídica da Presidência da República, v. 6, nº 64. Disponível em: http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/ revista/Rev_64/Artigos
/Art_Francisco.htm. Acesso em 04/05/06.
     __________. Moral e Direito, Jornal Jurid Digital, Disponível em: http://jornal.jurid.com.br/materias/doutrina-filosofia-direito/moral-direito. Acesso em 11/04/2014.
MUÑOZ, Jaime Rodriguez Arama, Ética, Poder y Estado, 1ª edição, Buenos Aires: RAP, 2004.
NADER, Paulo, Introdução ao Estudo do Direito, 23ª edição, 2035, Rio de Janeiro: Forense, 2003.
SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. 
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução de João Dell'Anna, 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. Endereços na rede mundial de computadores: http://www.sad.mt.gov.br; http://www.planalto.gov.br 
 
Notas:
[1] CAMARGO, Marculino. Fundamentos de ética geral e profissional, 2. ed. SP: Vozes, 1996. Pp. 15-16.

[2] CAMARGO, Marculino. Fundamentos de ética geral e profissional, 2. ed. SP: Vozes, 1996. Pp. 17-39.

[3] CAMARGO, Marculino. Fundamentos de ética geral e profissional, 2. ed. SP: Vozes, 1996. Pp. 21.

[4] HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa,  RJ: Objetiva,  2001. Verbete: ética.

[5] HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa,  RJ: Objetiva,  2001. Verbete: eticidade.

[6] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.15. 

[7] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.25.

[8] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. Pp. 16-19.

[9] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.26. 

[10] VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução de João Dell'Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. Pp. 267 e segs.

[11] VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução de João Dell'Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. Pp. 269-270.

[12] VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução de João Dell'Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 270.

[13] VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução de João Dell'Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. Pp. 271-272.

[14] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.18.

[15] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.27.

[16] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.18, apud SITENLEHRE, introdução, §9.

[17] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.18 apud HEGEL, G.W.F.,  Princípios da Filosofia do Direito, SP: Martins Fontes, 1997, §258.

[18] SÁ, Antônio Lopes de. Ética Profissional. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. p.21.


Informações Sobre o Autor

Francisco Mafra.

Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.


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