Resumo: Este artigo tem por objetivo analisar os conceitos de "acidente em trânsito" e "acidente em serviço", bem como a eventual equiparação de tais institutos, por força do disposto no art. 212, § único, II da Lei n° 8.112/90. Outrossim, aborda-se a repercussão jurídica do afastamento em razão de acidente de trabalho, bem como a consideração de tal tempo de serviço como efetivo exercício do cargo e função.
Palavras chaves: Acidente em serviço. Serviço público. Tempo de serviço. Lei n° 8.112/1990.
Resumen: Este artículo tiene como objetivo examinar los conceptos de "accidente de tránsito" y "accidente de trabajo", así como las eventuales coincidencia de tales institutos, en virtud de lo dispuesto en el art. 212, § único de la Ley nº 8.112/90. Por otra parte, se ocupa de los efectos jurídicos de la suspensión debido a un accidente en el trabajo, así como la consideración de dicho servicio como tiempo de ejercicio.
Palabras clave: Accidente en el servicio. El servicio público. El tiempo de servicio. Ley n° ° 8.112 /1990.
Sumário: Introdução. 1. Da delimitação do conceito de acidente de trabalho. 2. Do afastamento em razão de acidente de trabalho como efetivo exercício do cargo e função 3. Conclusões.
INTRODUÇÃO:
Primeiramente cabe ressaltar que o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais é regido pela Lei n° 8.112/1990.
Não obstante a referida lei detalhe, com a maior minudência possível, a temática que envolve o exercício das funções e cargos pelos referidos servidores, existem determinada temáticas, oriundas da práxis, que, por vezes, não encontram respostas no referido diploma legal.
Assim sendo, cabe ao gestor, diante do caso concreto e em estrita observância ao princípio da legalidade, solucionar a questão.
Pretende-se, no presente artigo, analisar o conceito de acidente em serviço, bem como os acidentes sofridos por servidores fora das dependências da Administração Pública, quando estes estiverem, para todos os fins de direito, em efetivo exercício de suas funções, mesmo que por força do art. 102, VII, “d”, da Lei n° 8.112/90.
Outrossim, busca-se ofertar soluções aos gestores públicos para que, diante do caso concreto, saibam como dirigir tais questões, principalmente, de acordo com as orientações emanadas pelo Ministério do Planejamento e Gestão.
1 – DA DELIMITAÇÃO DO CONCEITO DE ACIDENTE DE TRABALHO.
A Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, ao dispor sobre a Licença por Acidente em Serviço, fixa, nos termos do art. 212 e seu parágrafo único, as hipóteses em que um evento possuirá tal qualidade, senão vejamos:
“Da Licença por Acidente em Serviço (…)
Art. 212. Configura acidente em serviço o dano físico ou mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições do cargo exercido.
Parágrafo único. Equipara-se ao acidente em serviço o dano:
I – decorrente de agressão sofrida e não provocada pelo servidor no exercício do cargo;
II – sofrido no percurso da residência para o trabalho e vice-versa.”(grifos nossos)”
Destarte, a citada Lei considera acidente em serviço aquele cujo dano físico ou mental tenha decorrido do exercício das atribuições do cargo. Todavia, a fim de conferir proteção jurídica extra aos servidores, o referido artigo equipara a acidente de trabalho às agressões sofridas no exercício do cargo, bem como, aos traumas ocorridos no percurso da residência ao trabalho e vice-versa.
Com relação ao inciso II, do parágrafo único do art. 212, convém esclarecer que a doutrina pátria o denominou como acidente “de trajeto”, imputando a responsabilidade dos danos sofridos pelos empregados e servidores públicos aos empregadores e à Administração. Tal responsabilidade deriva da premissa de que quando o empregado realiza o percurso de sua casa ao local da atividade laboral, ou vice-versa, já se encontra à disposição de seu empregador.
A jurisprudência dos tribunais superiores federais e da justiça do trabalho têm esposado a tese acima, de forma a considerar que tanto a Administração Pública Federal quanto o empregador comum são responsáveis pelos danos sofridos pelo servidor/empregado no seu trajeto diário, in verbis:
“ADMINISTRAÇÃO. SERVIDOR MILITAR. TRAJETO ENTRE O QUARTEL E RESIDÊNCIA. ACIDENTE EM SERVIÇO. VENCIMENTO DO PRAZO DE ENGAJAMENTO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Em primeiro lugar a Jurisprudência é pacífica no sentido de que o acidente sofrido pelo militar, que se desloca do quartel para a residência e desta para o quartel, caracteriza-se como "acidente em serviço", como se vê de precedente dessa Corte, em que se entendeu que "é considerado acidente em serviço o atropelamento ocorrido durante o percurso em que o militar da ativa retorna ao quartel para sua residência", de sorte que ]"a Lei n. 6.880/80, em seu art. 3o., parágrafo 1.o, "a", II, reconhece como militar da ativa aquele que se encontra incorporado para a prestação de serviço militar inicial" (REO – 89.03.0175654 – ARICÊ AMARAL). 2. Partindo-se do fato de que o autor, quando do acidente sofrido encontrava-se engajado no serviço militar e o acidente deve ser considerado como "em serviço", as seqüelas desse acidente, se o incapacitam para o exercício de atividade militar, justificam sua reforma. 3. A conclusão que se extrai da realidade posta nos autos é a de que o autor, em tendo sofrido acidente em serviço (in itinere), ficou incapacitado para o desenvolvimento de atividades militares, devendo ser reformado, não licenciado. 4. Apelação a que se dá provimento. Inversão dos encargos de sucumbência. TRF3 – AC 00182794019944036106 AC – APELAÇÃO CÍVEL – 455428” (grifos nossos).
“ADMINISTRATIVO. MILITAR. ACIDENTE EM SERVIÇO. COMPROVAÇÃO DO NEXO ENTRE O DANO E O ACIDENTE. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA O SERVIÇO MILITAR COMPROVADA. Lide na qual o autor pleiteou reforma com fulcro na Lei nº 6.880/80, em decorrência de acidente automobilístico ocorrido durante o trajeto para a Base Naval. Sentença que julgou procedente o pedido. Restou caracterizado que o caso é de acidente em serviço e a documentação juntada aos autos confirma que, em função das lesões sofridas, o autor sofre de epilepsia pós-traumática, e está incapaz para o serviço ativo militar, mas não para atividades civis. Em tais condições, existe direito à reforma com proventos correspondentes ao soldo do mesmo posto que ocupava na ativa. Agravo retido desprovido. Remessa necessária e apelo parcialmente providos. TRF2 APELRE 200251080011348 APELRE – APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO – 471080” (grifos nossos).
Nessa toada, frise-se que até mesmo um breve desvio do trajeto não descaracteriza a responsabilidade da Administração pelo dano sofrido pelo servidor:
“APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR MILITAR FALECIDO. PROMOÇÃO POST MORTEM. ACIDENTE EM SERVIÇO "IN ITINERE". BREVE DESVIO DE TRAJETO. NÃO DESCONFIGURAÇÃO DO ACIDENTE. ADMISSÃO DA PROMOÇÃO. CONFIGURAÇÃO COM FULCRO NA LEI Nº. 5.195/66 ART. 1º. CONDENAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL A PROMOVER AS RETIFICAÇÕES NA PENSÃO CONCEDIDA AOS SEUS GENITORES, PASSANDO A CORRESPONDER À GRADUAÇÃO IMEDIATA, NA DATA DO FALECIMENTO. JUROS DE MORA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. I – Caracteriza-se acidente em serviço quando ocorrido no trajeto do militar entre a sua residência e a organização em que serve ou o local de trabalho, ou naquele em que sua missão deva ter início ou prosseguimento, e vice-versa, a teor do art. 1º, "f", do Decreto nº. 57.272/65. II – Sindicância administrativa instaurada para apurar a causa do referido acidente, ocasião na qual se concluiu que o itinerário utilizado pela vítima, quando da ocorrência do acidente, não se enquadrou nos possíveis trajetos de deslocamento entre o Batalhão e a sua residência (trajeto oposto). III – Testemunha – última pessoa que teve contato com o falecido antes do acidente – declarou ter o mesmo afirmado que após sair do quartel, abasteceria e a sua moto e, logo após, iria direto para sua residência. IV – Breve desvio de trajeto para abastecimento de motocicleta não descaracteriza o acidente "in itinere", considerando que tal desvio se mostra razoável e é admitido em função do tempo (o acidente ocorreu após poucos minutos após a saída do "de cujus" do batalhão) e do espaço (desastre ocorreu a apenas alguns metros do quartel). V – A União Federal, por outro lado, não trouxe aos autos qualquer comprovação atinente a eventual itinerário diverso por parte do falecido. VI – Configuração do acidente em serviço, o que enseja a promoção "post mortem" no moldes do artigo 1º da Lei nº 5.195/66, com a condenação da União à promover as retificações na pensão recebida pelos autores, com o pagamento das diferenças apuradas, com data retroativa ao óbito do militar, com a determinação, ainda, de que as prestações vencidas sejam pagas em uma única parcela, com correção monetária (Súmulas 43 e 148 do STJ), incluídos os expurgos inflacionários previstos na Resolução nº 561/2007 – CJF.. VII – Juros de mora da condenação devem ser fixados em 6% (seis por cento) ao ano, a partir da citação, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 24 de agosto de 2001, considerando que a ação foi proposta posteriormente ao advento da mesma. Ainda, nos termos da Lei nº 11.960/2009, a qual deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, a partir de 29 de junho de 2009, os juros deverão ser aqueles aplicados à poupança. VIII – Honorários advocatícios reduzidos para 10% sobre o valor das parcelas vencidas, com fulcro no artigo 20, §4º do Código de Processo Civil . IX – Apelação parcialmente provida”. (grifos nossos).
Assim sendo, a única exigência dos tribunais superiores para o reconhecimento da situação como acidente de serviço é que haja nexo causal entre o dano sofrido e o exercício direto ou indireto do cargo ou função:
“MILITAR. INCAPACIDADE DEFINITIVA E NEXO DE CAUSALIDADE NÃO COMPROVADOS. É vedado pretender acrescer, em apelação, causa de pedir não constante da inicial e jamais discutida em 1º grau. Aplicação da regra do artigo 264 do CPC. Pleito de reforma militar. A inicial argumenta que o interessado sofreu acidente motociclístico, no trajeto para o quartel, e isso o teria incapacitado para todo e qualquer trabalho. Falta de prova de que o acidente foi em serviço (no trajeto) e perícia conclusiva, atestando problemas no cotovelo, mas afastando a incapacidade para todo e qualquer trabalho. Apelo que pretende discutir, também, aquisição de estabilidade, matéria jamais ventilada em 1º grau. Apelação desprovida. TRF2 AC 200951010139073 AC – APELAÇÃO CIVEL – 559744”
Complementando a Lei n° 8.112/90, bem como, incorporando a jurisprudência pacífica dos tribunais superiores, o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, instituído pela Portaria nº 797, de 22 de março de 2010, da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão apresenta, de forma mais detalhada, as circunstâncias em que deve o acidente ser configurado como em serviço, a saber:
“Acidente em Serviço
É aquele que ocorre com o servidor federal, pelo exercício do cargo, função, ou emprego no ambiente de trabalho ou no exercício de suas atividades a serviço da Administração Pública Federal, provocando lesão corporal, perturbação funcional ou mental.
São também considerados acidentes em serviço os eventos que ocorrem no percurso da residência para o trabalho ou vice-versa. (…)
d) Licença por motivo de acidente em serviço ou doença profissional (Art. 212 da Lei nº 8.112/1990 e Art. 20 da Lei nº 8.213/1991 e ON SRH/MP nº 03, de 23/02/2010, republicada em 18/03/2010)
Competência: perícia oficial singular ou junta oficial em saúde, dependendo do período de afastamento.
Acidente em serviço é aquele ocorrido no exercício do cargo, que se relacione direta ou indiretamente com as atribuições a ele inerentes, provocando lesão corporal ou perturbação funcional ou que possa causar a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. Equiparam-se ao acidente de serviço aquele que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a redução ou perda da capacidade do servidor para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação.
São também acidentes em serviço:
1 • a doença proveniente de contaminação acidental no exercício das atribuições do servidor e o acidente sofrido no local e no horário do trabalho, em conseqüência de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de serviço;
2 • ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao serviço;
3 • ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de serviço;
4 • desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior.
São ainda considerados acidentes:
1 • aqueles sofridos, fora do local e horário de serviço, na execução de ordem ou na realização de serviço relacionado às atribuições do servidor, ou na prestação espontânea de qualquer serviço à União para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
2 • em viagem a serviço, inclusive para estudo, com ônus ou com ônus limitado, independentemente do meio de locomoção utilizado;
3 • no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do servidor;
4 • os acidentes ocorridos nos períodos destinados à refeição ou descanso, estando o servidor no cumprimento de sua jornada de trabalho. (…)
Orienta-se que todo e qualquer acidente de trabalho que provoque ou não lesões no servidor tenha registro obrigatório, mediante formulário de Comunicação de Acidente de Trabalho do Serviço Público – CAT/SP, para que sejam analisadas as condições em que ocorreu o acidente e se intervenha de forma a reduzir ou mesmo impedir novos casos, além de se resguardar os direitos do servidor acidentado em serviço.
A caracterização do acidente em serviço poderá, também, ser feita por perito com o apoio da equipe de vigilância e promoção à saúde, de acordo com os critérios legais estabelecidos. Os afastamentos por motivo de acidente em serviço ou por doença profissional deverão ser submetidos à perícia oficial em saúde, independentemente do quantitativo de dias de licença.
Considera-se como data do acidente em serviço a da ocorrência do fato.” (grifos nossos)
Saliente-se que as disposições do Manual servem de baliza à presente análise, especialmente porque tal orientação trouxe maiores inovações a respeito do tema, refletindo os entendimentos consagrados na jurisprudência. Trata-se, ainda, de compilação e explicitação das normas já existentes, bem como, de orientação aos órgãos da Administração federal sobre os procedimentos a serem adotados nos casos concretos.
Face ao exposto, é natural inferir que a Lei nº 8.112, de 1990, o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, assim como a jurisprudência pátria, prevêem o acidente de trajeto como uma forma de acidente de serviço, sendo necessária, todavia, a comprovação do nexo causal entre o exercício direito ou indireto do cargo/função e o trauma sofrido.
2 – DO AFASTAMENTO EM RAZÃO DE ACIDENTE DE TRABALHO COMO EFETIVO EXERCÍCIO DO CARGO E FUNÇÃO
O art. 102 da Lei n° 8.112/90, ao regrar os períodos que deverão ser considerados como de efetivo exercício para todos os fins legais, dispõe que:
“Art. 102. Além das ausências ao serviço previstas no art. 97, são considerados como de efetivo exercício os afastamentos em virtude de:
I – férias;
II – exercício de cargo em comissão ou equivalente, em órgão ou entidade dos Poderes da União, dos Estados, Municípios e Distrito Federal;
III – exercício de cargo ou função de governo ou administração, em qualquer parte do território nacional, por nomeação do Presidente da República;
IV – participação em programa de treinamento regularmente instituído ou em programa de pós-graduação stricto sensu no País, conforme dispuser o regulamento; (Redação dada pela Lei nº 11.907, de 2009)
V – desempenho de mandato eletivo federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal, exceto para promoção por merecimento;
VI – júri e outros serviços obrigatórios por lei;
VII – missão ou estudo no exterior, quando autorizado o afastamento, conforme dispuser o regulamento; (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
VIII – licença:
a) à gestante, à adotante e à paternidade;
b) para tratamento da própria saúde, até o limite de vinte e quatro meses, cumulativo ao longo do tempo de serviço público prestado à União, em cargo de provimento efetivo; (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
c) para o desempenho de mandato classista ou participação de gerência ou administração em sociedade cooperativa constituída por servidores para prestar serviços a seus membros, exceto para efeito de promoção por merecimento; (Redação dada pela Lei nº 11.094, de 2005)
d) por motivo de acidente em serviço ou doença profissional;
e) para capacitação, conforme dispuser o regulamento; (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
f) por convocação para o serviço militar;
IX – deslocamento para a nova sede de que trata o art. 18;
X – participação em competição desportiva nacional ou convocação para integrar representação desportiva nacional, no País ou no exterior, conforme disposto em lei específica;
XI – afastamento para servir em organismo internacional de que o Brasil participe ou com o qual coopere. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)” (grifos nossos)
Em uma linha mais restritiva, o art. 103 do mesmo diploma legal estabelece que:
“Art. 103. Contar-se-á apenas para efeito de aposentadoria e disponibilidade:
I – o tempo de serviço público prestado aos Estados, Municípios e Distrito Federal;
II – a licença para tratamento de saúde de pessoal da família do servidor, com remuneração, que exceder a 30 (trinta) dias em período de 12 (doze) meses. (Redação dada pela Lei nº 12.269, de 2010)
III – a licença para atividade política, no caso do art. 86, § 2o;
IV – o tempo correspondente ao desempenho de mandato eletivo federal, estadual, municipal ou distrital, anterior ao ingresso no serviço público federal;
V – o tempo de serviço em atividade privada, vinculada à Previdência Social;
VI – o tempo de serviço relativo a tiro de guerra;
VII – o tempo de licença para tratamento da própria saúde que exceder o prazo a que se refere a alínea "b" do inciso VIII do art. 102. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 1o O tempo em que o servidor esteve aposentado será contado apenas para nova aposentadoria.
§ 2o Será contado em dobro o tempo de serviço prestado às Forças Armadas em operações de guerra.
§ 3o É vedada a contagem cumulativa de tempo de serviço prestado concomitantemente em mais de um cargo ou função de órgão ou entidades dos Poderes da União, Estado, Distrito Federal e Município, autarquia, fundação pública, sociedade de economia mista e empresa pública.” (grifos nossos)
Da breve leitura dos dispositivos legais acima transcritos, infere-se que o legislador criou duas situações jurídicas diferentes no tocante aos afastamentos: (i) aqueles que deverão ser considerados como período de efetivo exercício para todos os fins e (ii) aqueles que somente poderão ser considerados para efeito de aposentadoria e disponibilidade.
Assim sendo, dependendo do tipo de licença ou afastamento que o servidor requeira, ela terá efeitos diversos para sua vida funcional. Nessa toada, convém atentar que a licença gestante, por exemplo, é considerada, segundo art. 102, VII, “a”, como período em que a servidora, para todos os efeitos jurídicos, está ainda “à disposição da Administração”. Diferentemente ocorre, por exemplo, com a licença para exercício de atividade política (art. 103, III, da Lei n° 8.112/90), eis que o servidor deixa de estar à disposição do Poder Público por estar imbuído em atividade que refoge aos interesses da Administração.
Nesse ínterim, cabe ressaltar que a licença por motivo de acidente em serviço enquadra-se na primeira situação, ou seja, é considerada como tempo de efetivo exercício do cargo, para todos efeitos (art. 102, VII, “d” da Lei n° 8.112/90). Logo, eventuais acidentes que ocorram com o servidor no trajeto do seu domicílio para Administração e vice-versa, poderão ser enquadrados como acidentes em serviço, visto que não há descontinuidade do vínculo estatutário com o Poder Público.
Situação diversa ocorre nas hipóteses previstas no art. 103 do referido diploma legal, visto que nos casos ali previstos o servidor não age no interesse da Administração ou não se encontra, inteiramente, a sua disposição, situação essa que impõe o cômputo do tempo de serviço apenas para os fins de aposentadoria e disponibilidade. Nesse aspecto, convém esclarecer que não há, todavia, suspensão ou mesmo interrupção do vínculo com a Administração. Logo, não pode o servidor cumular cargo ou mesmo incidir nas vedações do art. 117 da Lei n° 8.112/90, sob pena de sanções legais.
Nesse sentido, colaciona-se acórdão do Egrégio Tribunal de Contas da União:
“ADMISSÃO. OCUPAÇÃO DE CARGOS INACUMULÁVEIS. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA ADMINISTRATIVA EM UM DOS CARGOS. ILEGALIDADE. NEGATIVA DE REGISTRO. RECEBIMENTO DAS REMUNERAÇÕES REFERENTES AOS DOIS CARGOS. IMPOSSIBILIDADE FÁTICA DE CONTRAPRESTAÇÃO LABORAL AOS DOIS ÓRGÃOS. RESSARCIMENTO. 1. O fato de o servidor licenciar-se, ainda que sem vencimentos, do cargo público ou emprego que exerça em órgão ou entidade da administração direta ou indireta não o habilita a tomar posse em outro cargo ou emprego público, sem incidir no exercício cumulativo vedado pelo artigo 37 da Constituição Federal (súmula/TCU 246).2. Na hipótese de acumulação indevida de cargo(s) e/ou emprego(s) público(s) que enseje o recebimento concomitante de remunerações, havendo impossibilidade fática de acumulação das jornadas de trabalho, deverão ser restituídos os valores recebidos sem a correspondente contraprestação laboral.” (Acórdão TCU 809/2008).
3- CONCLUSÃO
Face ao exposto, parece estar inserido no conceito de acidente em serviço os acidentes sofridos por servidores fora das dependências da Administração Pública, quando estes estiverem, para todos os fins de direito, em efetivo exercício de suas funções, mesmo que por força do art. 102, VII, “d”, da Lei n° 8.112/90.
Resta necessário, todavia, a comprovação documental, nos casos concretos, dos nexos causais entre as fatalidades ocorridas e a atuação do serviços no interesse da Administração, a fim de que fique cabalmente caracterizada, ou não, a ocorrência de acidente de serviço.
É imprescindível, ainda, notar que nem a Lei nº 8.112, de 1990, nem o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal dispõem expressamente que a averiguação em tela deva ser procedida por meio de sindicância. Contudo, no âmbito deste Ministério, foi editada a Norma de Execução COGRH/SPOA/SE-MF nº 2.04-001, de 1996, com o objetivo de “definir os procedimentos operacionais relativos à apuração e caracterização do Acidente em Serviço”.
De acordo com esse ato normativo, a “caracterização do acidente em serviço será efetuada sempre mediante processo de sindicância administrativa” (cf. item 5), estabelecendo, ademais, que:
“6.1. A comissão de sindicância será formalizada pela autoridade local do órgão, quando houver suspeita de que se trata de acidente do serviço.
6.2. Nos casos de deslocamento a serviço, a competência para instauração da sindicância é da autoridade do órgão onde se encontrar o servidor.
6.3. A sindicância será aberta na unidade aonde o servidor iria prestar serviço.”
Assim sendo, sempre deverá o gestor instaurar sindicância com o intuito de apurar o efetivamente ocorrido, com o objetivo de constatar a ocorrência de nexo causal, conforme sugerido nos parágrafos anteriores. É importante, ainda, salientar a necessidade de que se envidem esforços no sentido de instaurar o mais precocemente possível a respectiva sindicância, tendo em vista que a investigação depois de decorridos longos períodos pode prejudicar a exata caracterização do evento e até mesmo a realização de algumas diligências.
Informações Sobre o Autor
Priscila Prado Garcia
Procuradora da Fazenda Nacional, Especialista em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Especialista em Direito Tributário pelo IBET, mestranda em Direito Penal Econômico Internacional pela Universidade de Granada