A Lei Geral da Copa e o direito penal

Resumo: O presente artigo traz uma breve análise sobre a Lei n. 12.663 de 5 de junho de 2012 – Lei Geral da Copa, uma lei temporária recentemente inserida no ordenamento jurídico brasileiro, que elenca condutas incriminadoras, especialmente de empresas, que visam a obter vantagem econômica da Copa do Mundo organizada pela FIFA.

Palavras-chave: Lei Geral da Copa, Copa do Mundo, Direito Penal.

Abstract:This paper presents a brief analysis of General Law of the World Cup, a temporary law recently inserted in the Brazilian legal system, which lists incriminating conduct, especially practiced by companies that aim to obtain economic advantage of the World Cup organized by FIFA.

Keywords: General Law of the World Cup, World Cup, Criminal Law.

No dia 5 de Junho de 2012 entrou em vigor no nosso ordenamento jurídico a Lei Temporária Nº 12.663, uma inovação na legislação nacional, haja vista que tipos penais por ela criados têm um prazo determinado de vigência, que se finda em 31 de Dezembro de 2014. A chamada de Lei Geral da Copa configura uma espécie de microssistema, que aborda temas de Direito Civil, Direito Administrativo, Direito Empresarial e Direito Penal, tem sido tema de discussões muito polêmicas acerca de seu objeto, que basicamente se resume em tutelar os interesses financeiros e econômicos da Federação Internacional de Futebol – FIFA, contrastando com a subsidiariedade do Direito Penal.

A referida lei traz o princípio da retroatividade benigna, uma espécie de flexibilização do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, o que significa que a Lei Geral da Copa deverá ser aplicada aos fatos praticados durante sua vigência, ainda que decorrido o período de sua duração.

Haja vista a grande notoriedade do evento e seu monstruoso potencial lucrativo, a FIFA exigiu que fosse editada uma lei que amparasse os interesses privados envolvidos na realização da Copa do Mundo, elencando crimes a fim de inibir a prática de publicidade abusiva, tais quais divulgações não autorizadas de marcas, produtos e serviços que visam sugerir um vínculo com a entidade durante o evento esportivo. As normas penais incriminadoras que temporariamente passaram a integrar o nosso ordenamento jurídico são:

Utilização indevida de Símbolos Oficiais

Art. 30. Reproduzir, imitar, falsificar ou modificar indevidamente quaisquer Símbolos Oficiais de titularidade da FIFA:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa.

Art. 31. Importar, exportar, vender, distribuir, oferecer ou expor à venda, ocultar ou manter em estoque Símbolos Oficiais ou produtos resultantes da reprodução, imitação, falsificação ou modificação não autorizadas de Símbolos Oficiais para fins comerciais ou de publicidade:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses ou multa.

Marketing de Emboscada por Associação

Art. 32. Divulgar marcas, produtos ou serviços, com o fim de alcançar vantagem econômica ou publicitária, por meio de associação direta ou indireta com os Eventos ou Símbolos Oficiais, sem autorização da FIFA ou de pessoa por ela indicada, induzindo terceiros a acreditar que tais marcas, produtos ou serviços são aprovados, autorizados ou endossados pela FIFA:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem, sem autorização da FIFA ou de pessoa por ela indicada, vincular o uso de Ingressos, convites ou qualquer espécie de autorização de acesso aos Eventos a ações de publicidade ou atividade comerciais, com o intuito de obter vantagem econômica.

Marketing de Emboscada por Intrusão

Art. 33. Expor marcas, negócios, estabelecimentos, produtos, serviços ou praticar atividade promocional não autorizados pela FIFA ou por pessoa por ela indicada, atraindo de qualquer forma a atenção pública nos locais da ocorrência dos Eventos, com o fim de obter vantagem econômica ou publicitária:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa.

O tipo penal intitulado marketing de emboscada por associação, veda qualquer tipo de divulgação de marcas, produtos e serviços sem a autorização da FIFA ou de pessoa por ela indicada, promovida por empresas que visem tirar vantagem econômica da grande exposição que o evento oferece. Estas práticas são evidenciadas pela execução de propagandas que enganosamente insinuam que determinada empresa esteja apoiando a realização do evento ou o comércio não autorizado que usa como premiação ingressos para assistir às partidas.

Já o marketing de emboscada por intrusão, proíbe a exposição de marcas, negócios, estabelecimentos, produtos, serviços bem como a prática de atividade promocional não autorizada pela FIFA ou por pessoa por ela indicada, atraindo de qualquer forma a atenção pública nos locais da ocorrência dos Eventos, com o fim de obter vantagem econômica ou publicitária, conforme prevê o artigo 33. Como exemplo já ocorrido, tem-se o caso de jogadores que, intencionalmente, exibem produtos de algum patrocinador durante a realização de evento patrocinado por empresas autorizadas.

Para que o infrator responda pela prática destas condutas é necessária representação da FIFA no prazo de seis meses, a contar da data em que se conheça a autoria do crime.

Todos os crimes elencados pela lei temporária são punidos exclusivamente a título de dolo (direto ou eventual), não existindo a possibilidade de punição das condutas culposas, praticadas por negligência, imprudência ou imperícia.

Há que se observar que as penas cominadas por esta lei não são elevadas, a cominação é sempre de três meses a um ano, ou seja, trata-se de infrações penais de menor potencial ofensivo, sendo admitida em todas as hipóteses a aplicação dos institutos despenalizadores previstos na Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, a exemplo da transação penal ou suspensão condicional do processo (artigo 61 combinado com os artigos 76 ou 89).

Destaca-se também a hipótese de aplicação de pena de multa dos crimes previstos nesta Lei, e no Estatuto de Defesa do Torcedor (artigos 41-B a 41-G, da Lei no 10.671, de 15 de maio de 2003), o artigo 35 criou hipóteses de majoração ou diminuição, excepcionais e temporárias. Se os delitos forem relacionados às Competições de que trata esta lei (Copa das Confederações FIFA 2013 e Copa do Mundo FIFA 2014), os limites do valor do dia-multa a ser fixado pelo juiz (de um trigésimo a cinco vezes o valor do salário mínimo vigente ao tempo do fato) “pode ser acrescido ou reduzido em até 10 (dez) vezes, de acordo com as condições financeiras do autor da infração e da vantagem indevidamente auferida”. Desta forma, as multas a serem aplicadas podem chegar a treze milhões de reais, dependendo do potencial econômico do infrator.

Outra saída para os incursos nos crimes desta lei é a reparação dos danos causados, que possibilitará a composição civil entre os envolvidos, e o Ministério Público, por sua vez, aplicará uma pena restritiva de direitos ou multa, isentando o infrator de qualquer efeito penal, tal como ocorre nas conciliações dos Juizados Especiais.

Um dos questionamentos centrais da Lei Geral da Copa é sem dúvida a subsidiariedade do Direito Penal. Sabe-se que de acordo com o Princípio da Intervenção Mínima o Direito Penal é subsidiário e fragmentário. O princípio da subsidiariedade indica que o Direito Penal é o ramo considerado a ultima ratio do Direito. Se o conflito pode ser resolvido por outro ramo do direito, não se deve acionar Direito Penal. Como o objeto desta lei trata da defesa dos interesses financeiros de uma entidade privada, as condutas descritas pelas normas penais temporárias envolvem conflitos que podem ser solucionados pelo Direito Civil, por exemplo, através de ações cíveis indenizatórias para punir as empresas infratoras.


Informações Sobre o Autor

Drielli Serapião Afonso

Advogada Criminalista e pesquisadora jurídica. Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense


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