Resumo:O instituto do Tribunal do Júri foi reconhecido na Constituição Federal em seu artigo 5 XXXVIII sendo considerado como direito e garantia fundamental. Atualmente o Tribunal do Júri passa por questionamentos jurisprudenciais e doutrinários sendo que estes ocorrem devido os vários vícios que a referida instituição possui. Assim toda essa problemática trás como consequência o descrédito e a desconfiança da população nas instituições da Justiça.
Sumário:1 Introdução.2 Tribunal do Júri.2.1 Princípios aplicáveis ao Tribunal do Júri. 3 Críticas ao Tribunal do Júri. 3.1.Ausência de motivação das decisões. 3.2. O Teatro Em Plenário. 3.3. Influencia Da Mídia. 4.Tribunal do júri- cláusula pétrea garantia individual. 5.Extinção do tribunal do júri do ordenamento jurídico brasileiro. 6. Conclusão.
1 Introdução
O instituto do Tribunal do Júri foi reconhecido na Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXVIII, sendo considerado como direito e garantia fundamental. Além disso, o referido Tribunal detêm a função de julgar, originariamente, os crimes dolosos tentados ou consumados contra a vida.
O referido Tribunal nasceu no Brasil em 1822 com a competência para julgar os crimes de imprensa e até a Constituição de 1988 sofreu várias mudanças.
Tal instituto está ligado à ideia de democracia, isso porque o réu será julgado por seus iguais, pessoas do povo leigas, não ficando a mercê de uma decisão monocrática. Tal procedimento tem como objetivo garantir que os julgamentos sejam mais justos.
Além disso, o rito do Tribunal do Júri é realizado obedecendo aos princípios constitucionais previstos na Constituição Federal de 1988 no seu artigo 5º, XXXVIII, quais sejam: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Logo, ressalta-se a grande relevância jurídica para um ordenamento onde se observam os princípios constitucionais para, assim, buscar uma melhor interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais.
Além disso, o rito do Tribunal do Júri é realizado obedecendo aos princípios constitucionais previstos na Constituição Federal de 1988 no seu artigo 5º, XXXVIII, quais sejam: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Logo, ressalta-se a grande relevância jurídica para um ordenamento onde se observam os princípios constitucionais para, assim, buscar uma melhor interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais.
Atualmente o Tribunal do Júri passa por questionamentos jurisprudenciais e doutrinários. Esses questionamentos ocorrem devido os vários vícios que a referida instituição possui, como por exemplo, a ausência de fundamentações de suas decisões, o que leva julgamento do Júri a ser algo autoritário, tendo em vista que o poder da decisão está concentrado nas mãos de jurados leigos, sem conhecimento algum sobre o direito, que decidem com base na intima convicção, o que não nos permite conhecer o real motivo que os levou a decidir daquela maneira.
Outro ponto que traz muita discussão é a influência da mídia nas decisões. Isto, porque, nessa era de comunicação de massa, a mídia tem um papel fundamental de disseminação dos acontecimentos do mundo, assumindo a responsabilidade da divulgação clara e transparente perante a sociedade. Entretanto, o grande problema se encontra não no acesso a informação, mas sim na qualidade dessas informações, isso porque a notícia se tornou uma poderosa arma na mão da mídia sensacionalista, que vende a violência gerando um sentimento de terror na população e, esse é o grande perigo, pois acaba determinando e formando, indiretamente, as decisões proferidas no Conselho de Sentença, violando, assim, princípios e direitos fundamentais do cidadão.
Nesse trabalho ainda se faz uma análise entre o desequilíbrio que existe entre a defesa e acusação, isso tendo em vista que os promotores específicos atuam com mais frequência se encontrando mais preparados. A defesa, por sua vez, geralmente é feita por defensores públicos que não atuam com tanta frequência nesses casos, o que deixa o réu em grande desvantagem, já que ele ainda está com o fardo de ser o criminoso do julgamento. Além disso, a teatralização que ocorre no plenário do Júri gera grande influência nas decisões dos jurados leigos, assim, quem tiver a melhor oratória e capacidade de cênica, irá conseguir o convencimento destes, ainda que não tenha o melhor direito.
E toda essa problemática trás como consequência o descrédito e a desconfiança da população nas instituições da Justiça.
Nesse contexto, realizou-se uma pesquisa sobre o Tribunal do Júri no Brasil, analisando as suas principais características. Relatou-se acerca da sua estrutura e o objetivo do referido Tribunal, bem como aborda os jurados que compõe o Conselho de Sentença, a função exercida por eles.
Por fim, defendemos nesse trabalho a desnecessidade da manutenção do referido instituto no nosso ordenamento jurídico, isso tendo em vista que o Júri está permeada de vícios em seu procedimento, violando princípios e garantias invioláveis previstas na nossa Carta Magna e também do nosso Código de Processo Penal.
2 O tribunal do júri
O instituto do Tribunal do Júri foi reconhecido na Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXVIII, sendo considerado como direito e garantia fundamental. Além disso, o referido Tribunal detêm a função de julgar, originariamente, os crimes dolosos tentados ou consumados contra a vida.
Nesse sentido, a instituição do Júri passou por diversas modificações até chegarmos à estrutura que encontramos hoje. Assim, percebe que o Júri é uma forma de exercício da democracia, isso tendo em vista que o réu será julgado por pessoas do povo, não ficando a mercê de uma decisão monocrática. Desse modo, a finalidade do tribunal do Júri é garantir que os julgamentos sejam mais justos, como afirma Capez (2009, p. 630)
“A finalidade do Tribunal do Júri é a de ampliar o direito de defesa dos réus, funcionando-se como uma garantia individual dos acusados pela prática de crimes dolosos contra a vida”.
Além disso, cabe mencionar que o rito do Tribunal do Júri é realizado obedecendo aos princípios constitucionais, sendo encontrados no artigo 5º, XXXVIII da Constituição Federal, quais sejam: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Ressalta-se, portanto, a relevância jurídica para um ordenamento onde se observam os princípios constitucionais para assim buscar a interpretação e também a aplicação das normas infraconstitucionais.
Nesse sentido, vale mencionar que o Júri é composto por um Juiz de Carreira (Juiz presidente) e mais vinte e cinco jurados sorteados dentre os alistados, em que sete desses constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão do julgamento, é o que prevê o artigo 447 do Código de Processo Penal.
Insta salientar que, a escolha dos jurados está regulada pelo Código de Processo Penal que em seu artigo 436 prevê que o serviço do Júri é obrigatório, sendo que a recusa injustificada acarretará em multa de valor de um a dez salários mínimos, a ser decidido pelo Juiz ao analisar a condição econômica do jurado. Além disso, na lista para o sorteio estará presente cidadãos maiores de 18 anos com notória idoneidade, bem como não poderá ser analisado para seleção ou não dos trabalhos do Júri, critérios étnicos, raciais ou econômicos, conforme previsto no referido artigo e seus respectivos parágrafos.
Existem críticas quanto a essa idade mínima para ser jurado, isso porque de acordo com Paulo Rangel (2012, p.196):
“Deve-se ter uma simetria da idade mínima exigida para ser jurado do Tribunal do Júri com a idade mínima para ser Presidente da República, isso tendo em vista que um cidadão pode votar para Presidente da República, mas não pode ser candidato a Presidente da República porque não possui a cidadania plena. Assim, entende-se que tal indivíduo não tem maturidade para ser candidato a Presidente, mas pode votar para que alguém o seja e também pode votar para decidir a vida de outro no Tribunal do Júri”.
Percebe-se, portanto, que se faz necessário ter um julgador com mais experiência de vida, uma que não é alcançada aos 18 anos, isso porque o que está em jogo em plenário é um direito fundamental do indivíduo, a sua liberdade.
Desse modo, para selecionar os indivíduos para compor a lista anual o Juiz presidente deve requisitar às autoridades locais, associações de bairro e de classe, entidades culturais e associativas, instituições de ensino em geral, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnem as condições necessárias para exercer a função de jurado.
Assim sendo, tendo o cidadão o nome incluso nessa lista geral, deve estar à disposição do Poder Judiciário, isso porque prestar tal serviço ao Tribunal do Júri é obrigatório, constituindo um serviço público relevante. Entretanto, existem exceções, o artigo 437 do Código de Processo Penal traz um rol de isentos de tal obrigação.
Destarte, os artigos 448 a 452 do Código de Processo Penal trazem situações de impedimento, suspeição e incompatibilidade dos jurados. A partir da leitura dos referidos artigos, observa-se que o Código impôs aos jurados as mesmas determinações que são impostas aos Juízes de Direito e entre outros casos, tais como: reconhecimento de união estável, se tiver participado em julgamento anterior do mesmo processo ou se tiver participado do julgamento do outro acusado em casos de concurso de agentes e em casos que o réu se mostrar pré-disposto a condenar ou absolver o réu.
Percebe-se, portanto, existe uma lista anual constando nomes para serem sorteados e que os jurados são pessoas leigas, do povo, não precisando, assim, conhecer o ordenamento jurídico para julgar os seus semelhantes, o que gera uma insegurança tanto para a sociedade quanto para o acusado, isso porque não temos como prever qual será o resultado de tal julgamento, tendo em vista que os jurados decidem com base na sua intima convicção.
Cabe mencionar ainda, sobre a elaboração dos quesitos, os quais o Juiz presidente do Tribunal fará de acordo com a pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes, devendo ser redigidos em proposições simples e distintas para que os jurados possam responder com clareza e precisão, tal como prevê o artigo 482 do Código de Processo Penal.
Vale dizer que alguns autores entendem que é impossível separar a matéria de fato e de direito durante a elaboração dos quesitos. Nesse sentido, Paulo Rangel afirma:
“Quando se diz matéria de fato, não se quer dizer que os jurados não julgam o direito. Julgam, claro que julgam. Quando são indagados sobre se o réu deve ser absolvido, isso é matéria de direito, pois envolve a punibilidade, ou seja, o direito de punir do estado. Quando são indagados sobre uma qualificadora do crime de homicídio, isso também é matéria de direito. Jurados julgam, portanto, tanto o fato como o direito” (RANGEL, 2012, p. 229).
Com advento da Lei nº 11.689/2008, diferentemente do que estava previsto no Código de Processo Penal, a redação dos quesitos deve ser simples e objetiva, sendo incluído um quesito considerado obrigatório, qual seja, se o réu deve ser absolvido da imputação delituosa em razão de qualquer excludente de ilicitude, mesmo que tal alegação não seja mencionada pela defesa.
Cabe dizer ainda, que a Lei nº 11.689/2008 com intuito de manter o sigilo das votações, bem como preservar a integridade física dos jurados, trouxe que ao atingir quatro votos idênticos a votação dos quesitos será encerrada.
Nesse contexto, é válido trazer a questão da incomunicabilidade entre os jurados. O artigo 466, § 1º do Código de Processo Penal prevê que:
“Art. 466. § 1o O juiz presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do § 2o do art. 436 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).”
Tal entendimento é justificado como meio de cautela para garantir que o jurado manifeste sua opinião, sem qualquer influência no seu pensamento por outro jurado.
No entanto, alguns consideram tal atitude drástica, pois enxergam a incomunicabilidade prejudicial à democracia do Júri, isso porque se os jurados tivessem a oportunidade de compartilhar seus pensamentos, poderiam proferir apenas um veredicto, minimizando assim as chances de decisões pautadas em preconceitos e preferencias pessoais, evitando também, abuso de poder do jurado.
Outra inovação trazida pela referida lei é a possibilidade de o réu não comparecer em plenário, o que antes de 2008 só era permitido para crimes afiançáveis. Sendo assim, a Lei nº 11.689 permitiu a ausência do acusado em plenário, desde que seja requerida por ele e pelo seu defensor, independentemente do crime cometido.
Nesse contexto, Paulo Rangel afirma que:
“O direito ao silêncio deve ser entendido como um pressuposto do direito de não comparecer a audiência, pois, se o acusado é representado, em juízo, pelo seu advogado e, em comum acordo com ele, resolve não comparecer em juízo, o Estado não pode compeli-lo a fazê-lo, sob pena de obrigar o acusado a depor contra si mesmo.” (RANGEL, 2012, p. 202)
Sendo assim, o não comparecimento do réu em plenário não se trata de revelia, mas sim de exercer um direito que lhe é garantido constitucionalmente, o de silêncio. Até porque, como afirma Paulo Rangel (2012, p. 203) “O Direito Penal moderno é o direito penal do fato do agente e não do agente do fato, ou seja, o que se pune na lei penal é a conduta humana violadora de uma norma de proibição […]”.
2.1 Princípios aplicáveis ao tribunal do júri
O rito do Tribunal do Júri realiza-se atendendo os princípios constitucionais explícitos e referentes ao Júri, tais princípios estão previstos como direitos e garantias fundamentais e, encontram-se enumerados no artigo 5º, XXXVIII, da Constituição Federal, quais sejam: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Desse modo, o artigo 5º, inciso LIV da Constituição Federal prevê que “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Logo, o devido processo legal trazido pelo referido artigo, deve ser entendido como um meio de assegurar ao acusado alguns direitos, tais como: contraditório e ampla defesa. Desse modo, o processo penal por envolver um bem jurídico importantíssimo, que é a liberdade individual, há de ser exigir o cumprimento de tais garantias.
Entretanto, no contexto do Tribunal do Júri, Tiago Figueiredo de Souza (2012 apud Nucci (2008, p. 24), afirma que “existe uma diferença substancial entre ampla defesa, garantia aos acusados de um modo geral, e plenitude de defesa, elemento essencial no cenário do júri”.
Nas palavras do doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira (2011, p. 44):
“A ampla defesa é a outra face do princípio do contraditório, enquanto este último se liga ao direito de participação, e ao princípio da ampla defesa impõe a realização efetiva desta participação”.
O referido doutrinador ainda entende que defesa plena é:
“[…]defesa plena é uma defesa absoluta, perfeita, completa, exercício efetivo de uma defesa irretocável, sem qualquer arranhão, perfeição, logicamente dentro da natural limitação humana”. (PACELLI, 2014, P. 44)
Assim, entende-se como a essência abstrata do referido princípio a possibilidade de conceder ao réu igualdade de condições para contrarrazoar tudo aquilo que for dito contra ele, assim deve a balança permanecer equilibrada, sob pena de não realização de um julgamento justo.
No Júri a plenitude da defesa é garantida quando possibilita ao réu se valer de todos os meios de defesa possíveis para convencer os jurados, se utilizando até mesmo de argumentos não jurídicos, quais sejam: morais, religiosos e sociológicos.
Quanto à ampla defesa, é entendida como a defesa técnica, isto é, aquela ligada aos aspectos jurídicos, a qual deve ser efetivamente prestada, para garantir ao réu a possibilidade de provar sua inocência, bem como ter seus direitos respeitados. Assim, tal defesa é exercida em processos judiciais quando são trazidos elementos essenciais para esclarecer a verdade real, bem como o direito de silêncio, de produzir provas, de se omitir, de recorrer de decisões, conhecer todos os documentos do processo, contraditar testemunhas.
Por fim, observa-se que tal princípio vem como forma de tentar trazer um equilíbrio do julgamento do Júri, possibilitando as partes o respeito de seus direitos e garantias para se ter um julgamento justo.
Outro princípio que está assegurado pela constituição no artigo 5º inciso XXXVIII, alínea “b”, é o sigilo das votações, o qual consiste em uma condição para proteger a livre manifestação dos pensamentos dos jurados. Assim, a expressão “livre”, é no sentido de que os jurados deverão decidir com independência e imparcialidade, bem como estar inaccessíveis a intervenções externas ao pronunciar seu veredicto, tendo em vista que possuem uma ampla responsabilidade social.
Percebe-se então, que tal princípio tem a função de preservar os jurados de qualquer influência ou retaliações ao votarem os quesitos formulados no Júri.
Sobre tal assunto, Eugênio Pacelli (2013, p. 718) alude:
“O sigilo das votações impõe o dever de silencio (a regra de incomunicabilidade) entre os jurados, de modo a impedir que qualquer um deles possa influir no animo e no espírito dos demais, para fins de formação do convencimento acerca das questões de fato e de direito em julgamento”.
Percebe-se, portanto, que tal princípio é de grande importância, tendo como principio objetivo preservar a imparcialidade dos jurados, bem como garantir um julgamento justo, sem interferências externas.
Cabe mencionar ainda o princípio da soberania dos veredictos consiste em garantir que o veredicto popular seja a última palavra do Conselho de Sentença, em razão disso não pode ser contrariada, quanto ao mérito por nenhum tribunal togado. Em consonância com tal entendimento está o doutrinador Guilherme Nucci aludindo que
“A soberania dos veredictos é a alma do Tribunal Popular, assegurando-lhe o efetivo poder jurisdicional e não somente a prolação de um parecer, passível de rejeição por qualquer magistrado togado. Ser soberano significa atingir a supremacia, o mais alto grau de uma escala, o poder absoluto, acima do qual inexiste outro. Traduzindo-se esse valor para o contexto do veredicto popular, quer-se assegurar seja esta a última voz a decidir o caso, quando apresentado a julgamento no Tribunal do Júri”. (NUCCI, 2012, p.387)
Entretanto, a referida soberania mencionada não é intangível, tendo em vista que pode ser relativizada caso seja observado que a decisão dos jurados foi totalmente contrária a provas dos autos. Nesses casos, traz a tona o princípio do duplo grau de jurisdição que possibilita ao Tribunal 2º Grau ao entender que o apelo é procedente, realizar um novo Júri, não podendo admitir novamente recurso pelo mesmo motivo, conforme previsto no artigo 593, III, alínea do Código de Processo Penal:
“Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: […] III – das decisões do Tribunal do Júri, quando: […] d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos”.
Nesse contexto, André Dillman (2012 apud José Frederico Marques, 1997, p. 23) afirma que:
“É impossível os juízes togados substituírem os jurados em sua decisão sobre a causa. Porém, se a decisão dos jurados for contrária à prova dos autos, poderá o juízo de origem (ad quo), desde que provocado, produzir novo julgamento. Dessa forma, a soberania dos veredictos é condição necessária para que o júri exista em sua integralidade.”
Assim, percebe-se que a decisão proferida pelos jurados em regra é soberana, sendo assegurado tal garantia na Constituição Federal, em seu artigo 5, XXVVIII. Logo, a decisão de mérito que é proferida pelos jurados através da sua íntima convicção, é a própria essência do Júri, não podendo tal decisão ser modificada por nenhum Tribunal, a não ser que seja manifestamente contraria as provas dos autos.
Por fim, temos o princípio da competência do júri para julgamento dos crimes dolosos contra a vida, previsto no artigo 5º, XXXVIII, alínea “d” da Carta Magna.
Dessa forma, tal competência não deve ser entendida de maneira restritiva, tendo em vista que o texto constitucional prevê a competência para os crimes dolosos contra a vida, mas não somente para eles. Assim, caso a competência do Júri seja ampliada, essa clausula pétrea não será violada.
Além disso, existe uma relativização de tal competência, pois existem alguns crimes dolosos contra a vida, que em razão de algumas prerrogativas do sujeito que praticou o ato ilícito, não serão julgados pelo tribunal do júri, conforme previsto pela Constituição Federal nos artigos 29, VIII; 96, III; 102, I, “b” e “c”; 105, I, “a”; 108, I, “a”.
3 Críticas ao tribunal do júri
3.1 Ausência de motivação das decisões
A participação popular no Tribunal do Júri decorre do princípio democrático, o qual é exercido através da atuação do conselho de sentença, conforme determina a Constituição Federal.
No Tribunal do Júri os veredictos são baseados apenas na íntima convicção dos jurados, isso porque quando iniciada a Sessão Plenária, os jurados leigos serão submetidos à votação, na qual devem se restringir a responder sim ou não aos quesitos, não sendo necessária motivação de sua resposta, eles decidem com base na convicção íntima, sendo a sentença será proferida com base na maioria dos votos.
Preceitua o artigo 93, IX, da Constituição Federal, que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e todas as decisões serão fundamentadas, sob pena de nulidade”. Além disso, prevê o artigo 31, III do Código de Processo Penal que a sentença deve conter a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundarem a decisão.
Depreende-se, portanto, dos artigos mencionados acima, que é dever do Juiz demonstrar as razões que levaram seu convencimento sobre a questão, sob pena de nulidade desta. Isso porque, é somente através motivação que a sociedade e as partes conseguem fiscalizar a atividade intelectual do julgador que decidiu a causa, sendo uma garantia do cidadão contra o abuso do poder do Estado.
Corroba com tal entendimento, o doutrinador Aury Lopes Júnior, que entende pela necessidade de motivação das decisões com intuito de limitação das decisões em face do devido processo legal, pois a verdade processual é confirmada ou refutada a partir da motivação. Segundo ele,
“Só a fundamentação nos permite avaliar se a racionalidade na decisão predominou sobre o poder, e principalmente se foram observadas as regras do devido processo penal. Trata-se de uma garantia fundamental cuja eficácia e observância legitima o poder contido no ato decisório” (LOPES JUNIOR, 2013, p.195).
Denota-se que a ausência de motivação impede que seja feito um controle racional e subjetivo das decisões, trazendo como consequência, um caráter inquisitivo ao processo, isso porque não permite que sejam conhecidos os reais motivos que levaram os jurados a absolver ou condenar o réu.
Observa-se, assim, que o instituto do Júri não se concilia com o texto constitucional e nem com o nosso Código de Processo Penal, isso tendo em vista que ambos exigem uma decisão fundamentada.
Desse modo, segundo Tourinho Filho
“A sentença sem motivação é um corpo sem alma. É nula. Se se trata derequisito estrutural da sentença, formalidade e, portanto, essencial, fácil concluir-se que sentença sem motivação é uma não sentença”. (TOURINHO FILHO, 2009, p. 28)
Nesse sentido, Fabrício Pozzebon (2009, p.9) entende que a motivação é a “garantia mãe”, isto é, uma garantia de defesa contra possíveis abusos do poder estatal, isso porque ela é considerada como um ponto de início para garantia de todos os demais direitos constitucionais do acusado, além disso, ela possibilita uma avaliação da atividade jurisdicional, verificando as escolhas e os motivos que levaram o julgador a decidir daquela maneira.
Desse modo, de acordo com Luciano Góes (2011, p.14), sem essa exposição pública dos fatos objetivos que influenciaram os jurados a decidirem de tal forma, os julgamentos do instituto do Júri seriam julgamento subjetivos, onde se julga o autor do fato e não o fato do autor, o que é contrário ao princípio da legalidade.
Alude o ilustríssimo doutrinador Paulo Rangel que :
“A necessidade de fundamentação e de comunicação entre os jurados é típica de um sistema judicial amparado no regime democrático, no qual maioria, por si só, não significa democracia, mas sim consenso que, se for com a liberdade do outro, não tem validade”. (RANGEL, 2005, p. 62)
Cabe mencionar ainda que uma forma de “contornar” tal problemática é a possibilidade dos jurados serem responsabilizados civil e criminalmente por corrupção ativa ou passiva. No entanto, não é comum isso acontecer, porque como já mencionado, os votos são secretos e os jurados não precisam fundamentar suas decisões, decidindo apenas com base na sua intima convicção e, em razão disso, como bem diz Mariana Guimarães (2012 apud Antônio Pádua Torres 2012. p.13), “deixa o sistema jurídico a mercê de fatores extra autos que podem influenciar no julgamento”.
Dessa maneira, em um Estado Democrático de Direito as decisões devem obedecer aos preceitos constitucionais, ou seja, devem ser motivadas, porque apenas assim, poderíamos ter uma atuação ética do Tribunal, sendo compromissado com a vida e a liberdade do outro.
3.2 O teatro em plenário
Outra problemática do instituto do Júri é quanto à forma de exposição dos fatos em plenário. No julgamento do Tribunal do Júri, o jurado leigo tem contato com uma atividade estranha ao seu cotidiano e, diante dessa situação, Leonardo Garcia (2006 p.69) afirma que,
“O que influenciará o Conselho de Sentença a decidir em favor da defesa ou da acusação será aquele que melhor souber se expressar em plenário, isto é, aquele que melhor argumentar, interpretar, tiver a melhor oratória, e não em razão daquele indivíduo que tiver o melhor direito esculpido nos autos.”
Nesse sentido, alude Eliene de Oliveira (2006, p. 4) que:
“No momento do espetáculo, os holofotes transfiguram os operadores jurídicos em personagens que contracenam não só com os personagens simbólicos do texto (acusado, vítima e testemunhas), mas com a plateia e os jurados. Até então, havia o texto, o trabalho intelectual do operador jurídico – o mundo das letras e da imaginação. Agora, há o ator em cena, presente no palco, transfigurado no seu personagem. Está ele, antes de ser ouvido, sendo assistido.”
Assim, percebe-se que o julgamento no plenário ocorre de forma teatral, e como bem aborda IorioForti (2009) “a capacidade cênica dos atores possibilita maior probabilidade de êxito do que a certeza dos seus argumentos”.
Cabe mencionar ainda, que a acusação geralmente encontra-se mais preparada, tendo em vista que os promotores atuam constantemente em julgamentos do Júri. Além disso, os promotores têm a função de representar a sociedade e trazer a Justiça, o que acaba moldando uma simpatia por parte dos jurados, porque ele é o representante do estado que vai defender não só a sociedade, mas a família da vítima, com o objetivo de retirar o criminoso das ruas, restabelecendo a segurança e a paz, tudo isso traz uma maior credibilidade ao promotor.
Assim, muitas vezes os promotores por deter a função de ser a acusação tem a sina de pedir sempre pela condenação do réu, mesmo que as provas nos autos demonstre sua inocência ou ainda que observem circunstâncias que podem atenuar sua pena não a mencionam.
Dessa maneira, a função do promotor é de fazer Justiça, assim, caso perceba nos autos circunstâncias que demonstrem a inocência do réu, bem como se perceber que há falta de indícios de autoria deve pedir sua absolvição, até porque existe o princípio do indubioproreu, isto é, na dúvida o réu deve ser absolvido.
Diante dessa situação, o advogado da defesa já entra em cena com a desvantagem de estar defendendo um criminoso, pois os jurados leigos não separam bem a ideia de defesa de direitos de um suposto autor do crime para a defesa do crime propriamente dito, o que acaba mais uma vez por prejudicar a ampla defesa do acusado. Além disso, é bem verdade que a maioria dos réus são pobres não tendo como arcar com um bom advogado especialista em Júris, sendo então defendido por um defensor dativo, que geralmente tem pouca experiência e preparo para atuar no caso, o que pode trazer falácias na tentativas de persuadiros jurados.
Observa-se assim, que esse desequilíbrio entre a acusação e a defesa fere o princípio constitucional da plena defesa, tendo em vista que a os promotores específicos encontram-se geralmente mais preparados e entram em cena com a imagem de defensor da sociedade, enquanto a defesa encontra-se em desvantagem por não estar tão preparada como os promotores que atuam em juris constantemente, bem como por estar defendendo um criminoso.
Desse modo, percebe-se que o profissional que tiver os melhores artifícios técnicos e a melhor capacidade de persuasão irá influenciar e manipular o convencimento do conselho de sentença, tendo em vista que tal conselho é composto por jurados leigos, que se deixam levar pela emoção, ainda que não se tenha o melhor direito, trazendo assim, uma maior possibilidade de erros, o que gera um maior descrédito da população brasileiro na Justiça.
3.3 Influência da mídia
Entende-se que a liberdade de imprensa surgiu na França com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789. O Brasil, por sua vez, por ser regido por um Estado Democrático de Direito, garantiu aos seus cidadãos, através da Constituição de 1988, direito a liberdade de pensamento, de expressão e a liberdade de imprensa.
Nesse sentido, a Carta Magna ao garantir uma imprensa livre, previu também que essa liberdade não é irrestrita ou absoluta, uma vez que as informações divulgadas pela mídia devem sempre observar os direitos fundamentais elencados no artigo 5º da mesma.
Entretanto, não é isso que ocorre, tendo em vista que atualmente ocorre a difusão de uma mídia sensacionalista que usa da informação para outras finalidades. Nesse sentido, é perceptível essa manipulação da informação nos assuntos relacionados ao direito penal, no qual é transmitido noticias de forma exagerada e com apelo emotivo, trazendo imagens e comentários chocantes, impressionando o público.
Nesse sentido, Fernanda Mendonça (2013 apud Juliana Câmara. 2012 p. 265), alude que:
“Quando a cobertura jornalística recai sobre acontecimentos afetos ao sistema penal, o funcionamento desse mecanismo difusor de notícias esbarra em direitos individuais expressamente agasalhados pela Carta Magna.”
Contudo, percebe-se a imprensa, transforma e deforma noticia que é divulgada para todos, o que acaba trazendo como consequências gravíssimas injustiças que pesame influenciam a opinião pública.
Dessa forma, fica nítido como essa cobertura jornalista traz uma influência negativa nos crimes julgados pelo júri, tendo em vista que influência indiretamente as decisões proferidas pelos jurados, o que vai contra um princípio fundamental importantíssimo, o da presunção de inocência.
4 Tribunal do júri- cláusula pétrea? Garantia individual?
As cláusulas pétreas são entendidas como:
“As clausulas que tem seu conteúdo especialmente protegido. Constituem um núcleo inatingível que se presta a garantir a estabilidade da Constituição e conservá-la contra alterações que aniquilem o seu conteúdo essencial, ou causem ruptura ou eliminação do próprio ordenamento constitucional, sendo a garantia da permanência da identidade da constituição e dos princípios fundamentais. Com isto, assegura-se que as conquistas jurídicos-politicas essenciais não serão sacrificadas em época vindoura.” (PEDRA, 2012, p.50)
Assim, a Constituição Federal prevê no seu artigo 60, §4 o rol de cláusulas pétreas existentes no nosso ordenamento jurídico, não podendo estas, serem objeto de deliberação de emendas com intuito de aboli-las, in verbis:
“Artigo 60, §4- Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais.”
Nesse sentido, a advogada Daniela Olímpio afirma que as “cláusulas pétreas representam a petrificação de determinados assuntos na Constituição Federal e estes assuntos, uma vez petrificados tornam-se insuscetíveis de serem excluídos da órbita constitucional”. (OLIMPIO, 2007, p.1).
Percebe-se, portanto, que tais cláusulas têm como objetivo principal evitar que ocorram alterações em dispositivos essenciais para os cidadãos e para o Estado, isto é, as referidas cláusulas agem como um empecilho para tentativa de reformar a Constituição Federal.
Segundo Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco, existem três correntes doutrinárias acerca da discussão sobre a limitação ao poder de reforma.
A primeira corrente trazida pelo referidos autores, entende que :
“O argumento dos que sustentam ser juridicamente inaceitáveis as cláusulas pétreas (Loewenstein e Joseph Barthélemy) apega-se à ideia de que não haveria uma diferença de substância entre o poder constituinte de revisão e o originário, sendo ambos formas de expressão de soberania do Estado. Ambos são exercidos, num regime democrático, por representantes do povo, por ele eleitos. Não havia porque considerar o poder constituinte como exercido num certo momento como superior à vontade do poder de revisão expressa posteriormente. Diz –se dessarrozado supor a existência de uma autolimitação da vontade nacional operada pelo constituinte originário. A declaração de intangibilidade, por isso, teria uma função política, mas não força jurídica. “(BRANCO e MENDES, 2012, p. 138)
Observa-se que a primeira corrente entende ser inconcebível a ideia de cláusulas pétreas, pois acreditam não haver diferença entre o poder constituinte de revisão e o originário, já que ambos são feitos dentro de um regime democrático, por representantes do povo e por eleitos.
Já a segunda corrente, defende que :
“As normas que impedem a revisão de certos preceitos básicos são juridicamente vinculantes, mas não seriam por elas próprias imunes a alterações e à revogação. Se forem suprimidas, num primeiro momento, abre-se o caminho para em seguida, serem removidos os princípios petrificados. Esse procedimento ganha o nome de dupla revisão. Assim, aceita-se que o poder constituinte originário estabeleça que certas cláusulas estejam ao abrigo de mudanças, mas se propõe que essa determinação somente deverá ser observada enquanto ela própria estiver em vigor, podendo ser revogada pelo poder de revisão”.(BRANCO e GILMAR, 2012, P. 139).
Percebe-se que a segunda corrente se filia ao entendimento de que algumas cláusulas pétreas são inatingíveis, para evitar que princípios importantes sejam atingidos pelo poder de reforma.
Por fim, a terceira corrente mencionada por Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco, prevê que as cláusulas pétreas
“Têm a limitação como absolutamente vinculante e imprescindível ao sistema parte do pressuposto de que o poder de revisão, criado pela Constituição, deve conter-se dentro do parâmetro das opções essenciais feitas pelo constituinte originário”.
De acordo com a terceira corrente, todas cláusulas pétreas são inatingíveis, pois guardam um conteúdo essencial, bem como protegem de valores essenciais, logo precisam ser preservadas.
Nesse contexto, o doutrinador Oscar Vilhena Viera afirma que é
Através das limitações constitucionais que as gerações futuras terão resguardados os seus direitos de se autogovernarem, frente às ameaças das gerações presentes de impor ideias absolutas que vinculem o futuro. […]. O pré comprometimento constitucional, por intermédio de clausulas superconstitucionais, será moralmente legitimo toda vez que proibir os cidadãos de se autodestruírem, enquanto seres livres e portadores de direitos que protegem sua condição de dignidade humana. (VIERA, 1999, P. 226)
No entanto, esse engessamento e imutabilidade que as cláusulas pétreas preveem, podem em um momento futuro não se adequar aos valores que serviram como base para a criação de normas antigamente, o que pode levar uma ruptura constitucional, tendo em vista que as referidas cláusulas só poderão ser modificadas ou extintas com uma nova Constituição. Observa-se, assim, que as cláusulas pétreas podem ser também um empecilho a perpetuidade constitucional por elas próprias caçadas.
Acerca do tema, Adriano Sant’ana Pedra afirma que
“[…] as cláusulas pétreas não podem ser compreendidas como limites absolutos a reforma constitucional, haja vista que é imprescindível um certo equilíbrio entre a indispensável estabilidade constitucional e a necessária adaptabilidade da Constituição a realidade social. […] É possível transcender a tais limitações materiais dentro de um paradigma de um Estado democrático participativo, levando em consideração a permanência do poder constituinte”. (PEDRA, 2012, p.69)
Desse modo, ao entender que as cláusulas pétreas são inatingíveis, estaremos desconsiderando a possibilidade de um desenvolvimento constitucional legítimo. E segundo Oscar Vilhena Viera,
“As clausulas constitucionais inatingíveis apenas serão consideradas legitimas se servirem como elementos estruturantes, que habilitam e favorecem os cidadãos a se constituírem em sociedade, como uma comunidade de indivíduos iguais e autônomos, que decidem ser governados pelo Direito. Não devem, portanto, ser compreendidas ou, mesmo de utilizadas como instrumento de bloqueio absoluto de mudanças de proteção de privilégios ou do status a quo, mas como elementos que viabilizam a evolução da sociedade democrática e a promoção das mudanças necessárias na esfera constitucional […]”. (VIERA, 1999, p.225)
Para o referido autor, as constituições podem ser reformadas, desde que não coloquem em risco os elementos essenciais à continuidade de um sistema que garanta a autonomia privada e politica, num campo de igualdade e dignidade. Logo, ele afirma que merece proteção superconstitucional os direitos que conferem autonomia privada a cada individuo, bem como as garantias necessárias para que essas liberdades sejam preservadas. Além dessa, merece proteção também às instituições do Estado de Direito, que garanta o princípio da liberdade. O doutrinador cita ainda, que há necessidade de ser mantido um rol de direitos essenciais para que a igualdade e a dignidade dos cidadãos, bem como os direitos sociais básicos não podem ficar vulneráveis. (VIERA, 1999, p. 231-232)
Insta salientar que, dentro de um parâmetro democrático, não seria prudente uma decisão política tomada num passado distante tenha o condão de paralisar novos pensamentos e com isso novas mudanças. Na realidade, o que se procura proteger com as cláusulas pétreas é a essência da Constituição, sendo então os:
“[…]direitos e princípios básicos que buscam estruturar a democracia e o Estado de Direito, na perspectiva de emancipação e da dignidade humana. Assim, a reforma que busque o aperfeiçoamento da democracia, da separação de Poderes, dos direitos fundamentais e da Federação pode ser levada a cabo pelo constituinte reformador. […] Interpretadas adequadamente, as clausulas constitucionais não constituirão obstáculos à democracia, mas servirão como mecanismos que, num momento de reformulação da ordem constitucional, permitirão a continuidade e o aperfeiçoamento do sistema constitucional democrático, habilitando cada geração a escolher seu próprio destino sem, no entanto, estar constitucionalmente autorizada a furtar esse mesmo direito às gerações futuras”. (VIERA, 1999 p.235/247)
Percebe-se que, as cláusulas superconstitucionais não devem ser obstáculos para a democracia, mas sim mecanismos que permitam o aprimoramento do sistema constitucional democrático e que acompanhem a evolução da realidade social, isso porque a sociedade e o direito evoluíram, dai não podemos afirmar que o direito é estático se a própria sociedade é mutável.
Assim, a Constituição Federal em seu artigo 5º trás um rol de direitos fundamentais, e dentre eles, no inciso XXXVIII encontra-se o Tribunal do Júri, que é considerado um direito e garantia fundamental dos cidadãos brasileiros e, por isso, trás a esse instituto a proteção de cláusula pétrea, se tornando intangível, isto é, não sendo possível, assim, de acordo com das correntes clássicas, ter emenda constitucional para abolir, apenas para ampliar.
Entretanto, como já exposto anteriormente, a primeira corrente entende não existir a ideia cláusulas pétreas, isso tendo em vista que houve uma evolução na sociedade e também no direito, logo o direito que antes era considerado como fundamental, hoje passa a não ser mais. Sendo assim, não há mais necessidade de o Júri se encontrar dentre as garantias fundamentais.
Nesse contexto, IORIO FORTI citando GUILHERME NUCCI, afirma que
“A inserção do Júri no artigo 5º da Constituição constitui mera garantia humana fundamental de caráter formal, e não essencial, pois nos países em que não há júri – e são muitos – também é viável subsistir um Estado Democrático de Direito e […] se fosse ele um tribunal indispensável à democracia, deveria julgar muito mais que os crimes dolosos contra a vida .[…] O Júri consta da Constituição brasileira não como garantia do acusado – pois Jamais o constituinte iria criar um tribunal que garantisse a liberdade do autor de um crime contra vida humana, mas como garantia do direito humano fundamental consistente na participação do povo nos julgamentos proferidos pelo Poder Judiciário, já que o Júri é praticamente, a única instituição a funcionar com regularidade, permitindo que qualquer cidadão tome parte nos assuntos de um dos Poderes da República.”
Observa-se, portanto, que a proteção do referido instituto como cláusula pétrea está equivocada, tendo em vista que a inserção do Júri no artigo 5º da Constituição é considerada garantia fundamental formal, não podendo ser considerada essencial, isso tendo em vista que o julgamento por juízes togados não afasta o princípio democrático.
Nesse sentido, o que a Constituição Federal proíbe em seu artigo 60, §4 é a possibilidade de emendas que tenham como objetivo abolir os direitos e garantias individuais. Desse modo, caso uma emenda altere o instituto do Júri e não interfira nas garantias previstas no artigo 5º, inciso XXVIII, seria ainda, inteiramente constitucional.
Ante exposto, percebe-se que a sociedade evoluiu muito, bem como o direito e, por isso, não é viável permitir que a Constituição continue estática, pois poderia impedir a ocorrência de um desenvolvimento constitucional. Desse modo, faz-se necessário retirar tal instituto do nosso ordenamento jurídico para garantir um Poder Judiciário mais sério e coerente.
5 Extinção do tribunal do júri do ordenamento juridico brasileiro
Ante todo exposto, as regras que instituem o atual Tribunal do Júri no ordenamento brasileiro não podem continuar, isso porque está permeado de vícios, contrariando dispositivos de hierarquia superior. E, diante dessa situação, deve o Código de Processo Penal adequar-se as normas constitucionais.
Um dos fatores de crítica do Tribunal do Júri é a falta de preparo dos jurados que o compõe, isso porque eles não detêm conhecimento jurídico necessário para responderem sobre as questões de fato e também de direito e, nem sempre estão aptos para julgar, o que acaba dificultando ainda mais os julgamentos e trazendo assim um descrédito da população em tal instituto.
Além disso, temos a questão da complexidade do procedimento que permeia o instituto do Júri, o que traz um desajuste a todo o julgamento, tendo em vista que os jurados leigos não se enquadram num sistema com excesso de formalismo, tal como o Júri.
A ausência de motivação é sem dúvida uma dos principais argumentos para extinção do referido Tribunal, isso porque contraria todo o sistema penal, já que não se harmoniza com os princípios e garantias que o ordenamento jurídico brasileiro prevê. Logo, ao possibilitar que os jurados votem com a íntima convicção, sem necessidade de justificação e não só com base nas questões jurídicas trazidas pelas partes no plenário, eles estão expostos a influências e pressões externas, como da mídia, a comoção social do crime e até mesmo de outros jurados, eles se encontram em uma posição vulnerável e muitas vezes pode levar uma decisão precipitada.
Vale mencionar ainda que a morosidade do julgamento do Júri é alvo de muitas críticas, isso porque o código de Processo Penal em seu artigo 424, parágrafo único prevê que o processo deve ser julgado em um ano e muitos processos se prolongam por muito mais tempo que o previsto.
Insta salientar ainda que o Júri é um instituto já ultrapassado que vem servindo como instrumento para o fortalecimento da impunidade, tendo em vista que ele não está em consonância com seus fundamentos democráticos, o que o leva a ter uma estrutura judiciária frágil. Assim, em muitos países tal instituto não que são considerados democráticos, tal instituto não existe mais e neles competência do Júri vem sendo reduzida e o julgamento pelo Tribunal é uma escolha das partes, levando assim uma maior confiança ao povo nas decisões de profissionais competentes.
Por fim, cabe trazer ainda a questão da segurança oferecida pelo Estado aos jurados que participam do julgamento, por exemplo, para condenar os réus de crime organizado, que são réus perigosos. O Estado não lhes fornece segurança, o que deixam os jurados com medo, o que os tornam vulneráveis e suscetíveis a influências externas. Sendo assim, como são obrigados a estar a disposição do Poder Judiciário eles irão julgar os réus com base na sua intima convicção e, assim, fica quase impossível saber o real motivo que os levou decidir daquela forma.
6 Conclusão
Ante todo o exposto, foi defendida a retirada do Tribunal do Júri do nosso ordenamento jurídico, isso porque o referido Tribunal está permeado de vícios em seu procedimento, violando princípios e garantias invioláveis previstas na nossa Carta Magna e também em outros Códigos.
Desse modo, como já mencionado, houve uma evolução na sociedade e no direito e, assim, o que antes era considerado como fundamental hoje passa a não mais ser e, por isso, o Tribunal do Júri não deve mais ser considerado como cláusula pétrea, isso tendo em vista que ele não se adequada mais ao ordenamento jurídico brasileiro.
Por fim, concluímos pela necessidade de extinção do instituto popular com garantindo assim um Poder Judiciário mais sério e coerente.
Informações Sobre o Autor
Sara Fonseca
Advogada