Resumo: O trabalho ora abordado refere-se ao Benefício de Prestação Continuada, conhecido popularmente como LOAS, justamente por ter sido instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social – Lei nº 8.742/1993 e o critério de miserabilidade. Sendo de suma importância destacar que, como critério de miserabilidade a Lei nº 8.742/1993 prevê que o grupo familiar pode ter renda per capita de até ¼ do salário mínimo nacional. Contudo, o Colendo Supremo Tribunal Federal – STF declarou inconstitucional o parágrafo 3º, do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social que impõe essa limitação em relação à renda per capita de ¼ do salário mínimo por grupo familiar, passando a considerar outros meios de prova válidos a fim de aferir a condição de carência da família. Assim, se pretende analisar desde o benefício como garantia constitucional, a como forma de garantir a dignidade da pessoa humana, nos termos da Constitucional Federal brasileira. Destacando-se ainda os requisitos necessários para sua concessão, sua função social, a possibilidade de cumulação com outros benefícios previdenciários, bem como a possibilidade de mais de um membro da mesma família em recebê-lo. Por fim, abordará as causas de cessação do benefício.
Palavras-chave: LOAS. Critério de miserabilidade. Renda per capita. Função social.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como especial objetivo abordar o critério de miserabilidade para a concessão do Benefício de Prestação Continuada, adotado pela Lei Orgânica da Assistência Social nº 8.742/1993 e a tese já pacificada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal que declarou inconstitucional o parágrafo 3º, do artigo 20, da LOAS.
Dentre os programas de Governo criados para garantir a dignidade da pessoa humana, uma vez que milhões de pessoas vivem a margem da sociedade, sem o mínimo de garantia para uma sobrevivência digna está o Benefício de Prestação Continuada, que consiste na renda de 1 (um) salário mínimo nacional, pago mensalmente aos que dele necessitam.
O direito ao benefício em baila é restrito à pessoa portadora de deficiência e aos idosos que contem com mais de 65 (sessenta e cinco) anos, sendo garantido até mesmo ao estrangeiro, desde que estes comprovem não possuir meios de prover o próprio sustento, e que, igualmente sua família não possa prover-lhes.
Desta forma, tem-se que a função social do Benefício de Prestação Continuada é de prover às pessoas carentes, ou seja, aqueles que se encontram a margem da sociedade uma forma de integração nesta, pois, mesmo que seja uma renda de somente 1 (um) salário mínimo mensal, já é um valor significativo para quem realmente se encontra em estado de “miserabilidade”.
Assim, em que pese demasiadas vezes o critério para concessão do Benefício de Prestação Continuada seja rigoroso, é necessário ter uma justa análise na concessão do benefício para que se evitem fraudes, bem como para que aquele que realmente necessita do benefício possa ter seu direito acatado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
2.SEGURIDADE SOCIAL
2.1. Conceito
A seguridade social surgiu através da implantação de políticas públicas como forma de proteção aos cidadãos mais carentes, bem como a fim de prover uma substancial melhora na qualidade de vida destes.
Se analisarmos a questão da seguridade social desde os tempos mais remotos, sempre coube ao Estado à obrigação de intervir no auxílio aos necessitados, e assim sempre o fez na medida do possível.
Contudo, a Constituição Federal de 1988, conhecida como Constituição Cidadã trouxe um capítulo denominado – Da Seguridade Social, sendo que a partir do artigo 194 contemplou os chamados direitos sociais concernentes à saúde, à assistência e a previdência social.
Desta forma, ao resguardar direitos relacionados à saúde, à previdência e à assistência social, o legislador objetivou proteger especialmente a maior parte dos indivíduos residente no país, que no caso são os mais desprovidos de acesso a diversos tipos de benefícios sociais e assistenciais, mesmo sendo os que mais necessitam.
Ao abordar a Seguridade Social, Wladimir Novaes Martinez, destacou:
“O legislador fica devendo as normas sobre a efetivação da seguridade social, por falta de definição política e reconhecida incapacidade de efetivamente atender às diretrizes constitucionais da ambiciosa matéria. Seguridade social é uma técnica de proteção social avançada em relação à Previdência Social, capaz de integrá-la com a assistência social e incorporar as ações de saúde. Mas, mais ainda, é um esforço nacional extraordinário no sentido de um amplo atendimento à população, obreira ou não, empenho cujos objetivos estão a distância”[1].
Assim, resta evidente que a seguridade social tem como principal objetivo a proteção social do indivíduo que dela necessite, pois é fato que mais dia, menos dia, o cidadão vai precisar fazer uso de algum desses benefícios, para tanto precisa ter garantido seu acesso à saúde pública, à assistência social e aos benefícios da previdência social.
De acordo com a Ilustre doutrinadora Marisa Ferreira dos Santos:
“Para ter o direito subjetivo às prestações da Seguridade Social é necessário o preenchimento de requisitos específicos. Na previdência o segurado contribui para o custeio do sistema, já a saúde independe de contribuição, uma vez que é direito de todos. No caso da assistência social, só há direito subjetivo para aqueles que necessitarem, na forma da lei, independentemente de contribuição”[2].
O artigo 203 da Constituição Federal é claro no sentido de que a assistência social deve ser prestada a quem necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social.
Desta forma, significa dizer que o cidadão não precisa ser segurado da previdência social para se beneficiar dos programas assistenciais promovidos pelo Estado/Governo.
No entendimento dos Ilustres Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, a Seguridade Social consiste:
“A Seguridade Social, segundo o conceito ditado pela ordem jurídica vigente, compreende o conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade nas áreas da saúde, previdência e assistência social, conforme previsto no Capitulo II do Título VIII da Constituição Federal, sendo organizada em Sistema Nacional, que é composto por conselhos setoriais, com representantes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e da sociedade civil”[3].
Conforme pode se notar com o presente estudo, os programas sociais que compõem a seguridade social visam à aniquilação da pobreza, uma vez que vislumbra a curto e longo prazo a melhora na qualidade de vida da população.
3. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA
3.1 Aspectos Gerais
O Benefício de Prestação Continuada foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social nº 8.742/93, sendo que, devido à própria nomenclatura da lei o benefício é conhecido por LOAS.
Segundo conceito estabelecido pelo Ilustre Sérgio Pinto Martins, o benefício de prestação continuada é: "(…) um benefício de trato continuado, que é devido mensal e sucessivamente[4]".
Contudo, importa salientar que a Lei Orgânica da Assistência Social foi promulgada para disciplinar o artigo 203, inciso V da Constituição Federal que já trazia essa garantia, conforme aduz: “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Sendo assim, o benefício de prestação continuada consiste em uma renda mensal no importe de 1 (um) salário mínimo nacional, paga ao portador de necessidades especiais e ao idoso maior de 65 (sessenta e cinco) anos que não possuem condições de prover a própria subsistência, e, que igualmente sua família não possa fazer.
Importante esclarecer que para ter direito ao benefício aludido não é necessário ter contribuído com a previdência social, tampouco, ter qualidade de segurado no momento do pedido do benefício, basta que se enquadre nas condições de miserabilidade trazida pela lei.
Desta feita, o artigo 20 e 21 da Lei nº 8.742/93 traz um rol taxativo no qual a pessoa que queira receber o benefício deverá se enquadrar.
3.2 Requisitos para concessão do benefício
Os requisitos para concessão do benefício de prestação continuada estão previstos no artigo 20, parágrafo 3º da Lei nº 8.742/93.
Em suma, o idoso deve ter mais de 65 (sessenta e cinco) anos, de outro lado, para a pessoa com deficiência ter esse direito deverá ser constatada, através de perícia médica realizada por médico do Instituto Nacional do Seguro Social que a pessoa possui limitações de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que o impeça de participar ativamente na sociedade em igualdade de condições, conforme conceito trazido pelo parágrafo 2º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93[5].
Para os dois grupos servem os demais requisitos que são: não possuir renda per capita superior a ¼ do salário mínimo no grupo familiar onde está inserido, não poderá ainda receber qualquer outro benefício da Previdência Social ou de regime próprio, nem mesmo seguro desemprego.
Conforme previsto no parágrafo 1º, do artigo 20, da Lei supracitada, bem como de acordo com o artigo 16, da Lei nº 8.213/91, o grupo familiar a ser considerado para cálculo da renda é aqueles que convivem sob o mesmo teto, podendo ser: os pais, o cônjuge ou companheiro (a), filhos menores de 21 anos e não emancipados ou maiores e inválidos, irmãos menores de 21 anos e não emancipados ou maiores e inválidos, e enteado e menor tutelado, uma vez que se equiparam a filho, conforme preleciona o parágrafo 2º do artigo 16 da Lei nº 8.213/91.
Importante mencionar que a Turma Nacional de Uniformização – TNU[6] editou duas súmulas interessantes sobre a questão da incapacidade para fins de recebimento do benefício de prestação continuada. Vejamos:
“Súmula nº 29: Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento”. (DJ DATA: 13/02/2006).
E ainda a Súmula nº 48: “A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada”. (DOU DATA 18/04/2012).
Assim, é perfeitamente possível afirmar que a incapacidade da pessoa que pleiteia o benefício de prestação continuada é aquela que o incapacita para o trabalho, ou seja, de prover o próprio sustento, podendo ser até mesmo uma capacidade temporária.
3.3 Função social do benefício e a dignidade da pessoa humana
Como já destacado, o benefício de prestação continuada é um benefício conhecido pelo caráter assistencial e como tal visa prover o mínimo necessário para a sobrevivência do indivíduo desprovido de qualquer condição, ou seja, resguardar um princípio constitucional de suma importância, o da dignidade da pessoa humana, previsto no inciso III, do artigo 1º, da Constituição Federal.
Assim, o benefício de prestação continuada se mostra de extrema valia no que concerne à garantia de subsistência dos idosos e pessoas deficientes, uma vez que, devido ao preconceito ainda demasiadamente perceptível em nossa sociedade, tais pessoas costumam ser, não raras vezes, esquecidas e postas a margem da sociedade.
Destarte, o recebimento dessa renda faz com que muitas pessoas que seriam marginalizadas devido às condições de idade avançada, deficiência, poucas condições financeiras e por não estarem inseridas no mercado de trabalho sejam inseridas na sociedade, tendo acesso ao mínimo necessário para sua sobrevivência, como alimentação, remédio e moradia.
O fato é que o legislador constitucional salvaguardou tanto o princípio da dignidade da pessoa humana, quanto à garantia de um salário mínimo mensal aos idosos e portadores de deficiência que não possam prover o próprio sustento e que, igualmente não possa ter este provido pela sua família, restando evidente que a função social do benefício é dar dignidade aos menos favorecidos.
Portanto, é justamente no sentido de tentar dar efetividade ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana é que se visualiza a função social do benefício de prestação continuada, vez que este garante ou pelo menos tem o condão de garantir a todos os seres humanos o mínimo existencial.
3.4 Cumulação com outros benefícios
O benefício de prestação continuada não pode ser cumulado com qualquer outro benefício, seja proveniente da Previdência Social ou de qualquer outro regime, essa impossibilidade está prevista no artigo 20, § 4º, da Lei nº 8.742/93.
Cumpre mencionar que o benefício estudado não é cumulável nem mesmo com o seguro desemprego, com exceção de benefícios de natureza indenizatória.
O benefício de prestação continuada não é um benefício previdenciário, mas sim da Assistência Social, porém, em casos onde a pessoa já receba o benefício de prestação continuada e passar a ser detentor do direito a pensão por morte poderá fazer a opção pelo mais vantajoso que no caso será a pensão por morte, pois mesmo que também seja de 1 (um) salário mínimo, por ter décimo terceiro já é mais vantajoso.
3.5 Possibilidade de mais de um membro da mesma família receber o benefício
De acordo com o parágrafo único do artigo 34, da Lei nº 10.741/2003 – Estatuto do Idoso, o benefício de prestação continuada já concedido a um membro da família não será computado para fins do cálculo da renda per capita do grupo familiar.
Destarte, significa dizer que é possível a concessão do mencionado benefício a mais de um membro da mesma família.
Obviamente que se assim não fosse, ou seja, se o valor do benefício recebido por um membro da família fosse incluído no cálculo de outra pessoa do grupo familiar, os danos causados para essas famílias seriam demasiadamente grave, uma vez que já se encontram desassistidas, vulneráveis, e negar-lhes o benefício porque um membro da família já recebe seria colocá-los em condição de miserabilidade, a margem da sociedade.
Cumpre destacar ainda que, se um membro da família receber algum benefício que seja no valor de um salário mínimo, este também não será computado para cálculo da renda per capita para fins de concessão do benefício de prestação continuada.
Os Tribunais já manifestaram diversos entendimentos recentes neste sentido:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AMPARO ASSISTENCIAL DA LOAS. HIPOSSUFICIÊNCIA. CRITÉRIO DA RENDA PER CAPITA NÃO É ABSOLUTO. CÁLCULO DA RENDA PER CAPITA ADMITE EXCLUSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE UM SALÁRIO MÍNIMO, INDEPENDENTE DO TIPO E DO BENEFICIÁRIO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. O requisito da hipossuficiência pode ser demonstrado utilizando-se métricas distintas da renda per capita de ¼ do salário mínimo. Precedente do STF. 2. Para o cálculo da renda per capita, admite-se a exclusão de um benefício previdenciário de um salário mínimo do grupo familiar, independente do tipo e do beneficiário. 3. Apelação do INSS não provida”[7].
“PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AMPARO ASSISTENCIAL. LEI 8.742/93 (LOAS). RENDA PER CAPITA FAMILIAR, ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 10.471/2003 (ESTATUTO DO IDOSO). 1. Sopesando as reduzidas cargas de densidade da controvérsia e mínima complexidade jurídica (matéria com jurisprudência já pacífica neste TRF 1), além da demora na satisfação imediata da pretensão do direito, adiante judicialmente revelado na decisão recorrida, não há qualquer óbice à regular confirmação da sentença de primeiro grau. Nesse sentido: "o valor do benefício pago ao esposo da impetrante não pode entrar no cálculo da renda per capita, tendo em vista a aplicação, por analogia, do disposto no parágrafo único do art. 34 da Lei n. 10741/03 – Estatuto do Idoso". 2. Remessa Oficial e apelação não providas. Sentença confirmada”[8].
Portanto, é possível mais de um membro da mesma família receber o benefício de prestação continuada, igualmente, é admissível que a renda de um salário mínimo percebida a titulo de benefício previdenciário não entre no cálculo da renda per capita para fins de concessão do benefício de prestação continuada.
4. CRITÉRIO DE MISERABILIDADE
4.1 Aspectos gerais
De acordo com a Lei nº 8.742/93 para se ter direito ao benefício de prestação continuada a pessoa deverá comprovar que a renda per capita do grupo familiar é inferior a ¼ do salário mínimo, é o que se chama de critério de miserabilidade.
Todavia, o fato é que essa limitação de renda per capita à ¼ do salário mínimo por família acaba por impedir um grande número de pessoas, tanto deficientes quanto idosos que realmente necessitam desse auxílio assistencial de acessá-lo.
Até mesmo porque é sabido que o critério de avaliação para concessão do benefício é tão rigoroso que basta passar poucos reais do limite estabelecido em lei para o benefício ser negado.
Contudo, não se leva em conta que mesmo a renda per capita ultrapassando o limite imposto por lei, muitas vezes a família não possui condições de vida digna, tampouco consegue prover o sustento do deficiente ou idoso, pois é sabido que esses demandam cuidados especiais e gastos suplementares, especialmente com remédios e alimentação.
Neste sentido é o entendimento da Ilustre Maíra de Carvalho Pereira:
“Não se deve esquecer de que o critério objetivo da renda foi estabelecido para facilitar a aferição da miserabilidade, não podendo servir de empecilho à análise desta condição por outros meios. Com efeito, a depender das peculiaridades de cada caso, pode restar constatado que, apesar de a renda familiar per capita ser igual ou superior a ¼ do salário mínimo, a família do requerente não possui condições de prover o seu sustento, estando evidenciada a condição de hipossuficiência econômica do clã”[9].
Assim, pessoas que pela condição de vida imposta, se encontram frágeis e demandam cuidados e gastos maiores, por não estarem dentro da condição de miserabilidade requerida, acabam tendo o benefício do qual muito precisam, indeferido.
Neste sentido vejamos uma jurisprudência recente:
“PROCESSUAL CIVIL. E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADOR DE PARALISIA CEREBRAL DESDE O NASCIMENTO. ART. 203, V DA CF/88 C/C ART. 20, PARÁGRAFO 3º, DA LEI Nº 8.742/93. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDAS. 1. (…) 4. Ainda que a genitora do autor perceba a quantia de R$ 1.715,00 (hum mil setecentos e quinze reais) e o genitor receba um salário mínimo, o fato é que, conforme declaração da composição familiar constante na exordial, o apelante mora com a genitora, o genitor, uma irmã menor e uma tia, que também faz parte da divisão da renda. 5. O teto estabelecido pelo parágrafo 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 tem por estimativa os gastos comuns de uma pessoa dentro dos padrões convencionais o que não pode ser aplicado ao caso concreto, pois trata-se de portador de paralisia cerebral que necessita, devido a sua doença, de gastos mensais com itens extraordinários que atendam as suas necessidades básicas de subsistência. 6. O Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista o critério excessivamente restritivo de 1/4 do salário mínimo, de que fala a LOAS, em seu art. 20, parágrafo 3º, com o objetivo de visualizar quem estaria enquadrado na linha de pobreza, vem apostando em sua flexibilização judicial. Precedentes: Resp nº 223.603/SP -5. T. do STJ – Rel.: Min. Edson Vidigal -DJU de 21.02.2000, p. 163. 7. Assim sendo, verifico que estão presentes os requisitos autorizadores à concessão do benefício requerido pelo Apelante, com efeitos a partir da data da entrada do requerimento administrativo, qual seja 11 de novembro de 2003. 8. Não merece reforma a sentença quanto aos critérios adotados pelo magistrado a quo na fixação dos juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios. 9. Remessa oficial e apelação não providas”[10]. (grifo nosso)
No entanto, a forma como a Lei nº 8.742/93 introduziu o critério de renda para concessão do benefício faz com que a lei não cumpra o papel para o qual foi especialmente criada, haja vista que deixa de favorecer muitas pessoas que se encontram em estado de miserabilidade, e, que por conseguindo teriam direito ao benefício.
Notadamente, o critério de renda de até ¼ do salário mínimo disposto na Lei nº 8.742/93 não é absoluto, razão pela qual a Justiça flexibilizou o critério de renda, passando a admitir outros meios de provas para apuração da miserabilidade quando esta estiver acima do ¼ previsto em lei.
Neste sentido há diversos precedentes dos Colendos Tribunais que se pede vênia para enumerar:
“AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA PER CAPITA SUPERIOR A ¼ DO SALÁRIO MÍNIMO. UTILIZAÇÃO DE OUTROS MEIOS PARA COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE. 1. A Lei n. 8.742 /93 estabelece em seu artigo 20 os requisitos para a concessão do benefício assistencial, quais sejam, ser pessoa incapaz para a vida independente e para o trabalho ou pessoa idosa, bem como ter renda familiar inferior a ¼ do salário mínimo, nos termos do parágrafo 3º, do referido artigo. 2. O referido dispositivo já teve sua constitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal na ADIN nº 1.232- 1, no entanto, a aferição da miserabilidade pode ser feita por outros meios que não a renda per capita familiar. Desta forma, uma vez ultrapassado o limite estabelecido pela norma, é perfeitamente possível utilizar-se de outros meios probatórios para demonstrar a carência de recursos para a subsistência. 3. Agravo improvido”[11]. (grifo nosso)
“PREVIDENCIÁRIO. AMPARO ASSISTENCIAL DA LOAS. HIPOSSUFICIÊNCIA. CRITÉRIO DA RENDA PER CAPITA NÃO É ABSOLUTO. PRINCÍPIO DO CONVENCIMENTO MOTIVADO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA. 1. O requisito da hipossuficiência pode ser demonstrado utilizando-se métricas distintas da renda per capita de ¼ do salário mínimo. Precedente do STF. 2. Incapacidade demonstrada por perícia médica. Motivo determinante para denegação do benefício inexistente. Situação de miserabilidade verificada por meio da prova dos autos. Princípio da livre apreciação da prova pelo magistrado. Concessão do beneficio e antecipação da tutela mantidas. 3. Apelação do INSS improvida”[12]. (grifo nosso).
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS. PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. 1. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. O Tribunal a quo, apesar de reconhecer que a renda per capita não impede, por si só, a concessão do benefício, na linha do entendimento firmado nesta Corte, manteve a sentença de improcedência do pedido inicial, em razão da inexistência dos pressupostos para concessão do benefício assistencial. 3. Nesse contexto, considerando a fundamentação do acórdão recorrido, os argumentos utilizados pela recorrente para fundamentar seu inconformismo somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o reexame de matéria probatória, o que encontra óbice na Súmula 7 desta Corte. Agravo regimental improvido”[13]. (grifo nosso)
De acordo com a TNU, a renda do grupo familiar também pode ser comprovada por outros meios. Vejamos:
“A renda familiar per capita de até ¼ do salário mínimo gera presunção absoluta de miserabilidade, mas não é um critério absoluto. Trata-se de um limite mínimo, motivo pelo qual a renda superior a este patamar não afasta o direito ao benefício se a miserabilidade restar comprovada por outros meios’[14].
O Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais – FONAJEF aprovou, neste sentido o Enunciado nº 44 e nº 6, que aduzem:
“Enunciado 44. "Sem prejuízo de outros meios, a comprovação da condição socioeconômica do autor pode ser feita por laudo técnico confeccionado por assistente social, por auto de constatação lavrado por oficial de justiça ou através da oitiva de testemunhas." (Nova redação – IV FONAJEF).
Enunciado 6. “É legítima a designação do oficial de justiça, na qualidade de longa manus do juízo, para realizar diligência de constatação de situação socioeconômic”a”.
Assim, como visto, quando a família possui renda per capita superior a ¼ do salário mínimo é possível comprovar a miserabilidade por outros meios de prova, ou seja, poderá ser feita a prova da hipossuficiência através de laudo sócio econômico, ou mesmo com a demonstração das despesas mensais da família.
4.2 Inconstitucionalidade do parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93
O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 567.985/MT e na Reclamação Constitucional nº 4.374/PE, julgados em 18.04.2013 acabou por declarar a inconstitucionalidade do parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93, tendo em vista que o critério de renda limitado a ¼ do salário mínimo da renda mensal per capita não é capaz de atestar a miserabilidade de uma família.
Desta feita, acredita-se que quando houver uma definição quanto ao critério de miserabilidade, este passe a ser de pelo menos ½ salário mínimo por membro da família, ressaltando que o conceito de família são os que residam sob o mesmo teto.
É nítido que a inconstitucionalidade do parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93 foi reconhecida devido ao grande número de processos que tramitaram e tramita na Justiça.
Sendo certo que referidos processos buscaram provar o quanto a limitação da renda per capita a ¼ do salário mínimo por família estava longe que atender a assistencialidade intencionada com a criação da Lei Orgânica da Assistência Social.
Ora, é fato que muitas pessoas em estado de pobreza, pessoas realmente necessitadas de um auxílio financeiro como esse, foram e ainda são impedidas de acessar o benefício de prestação continuada, quando deveriam ter pleno acesso.
Todavia, tendo sido declarada a inconstitucionalidade do parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93 não está sendo levando em consideração a renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade da família, podendo ser avaliado pelos magistrados diversos outros critérios a fim de se apurar a necessidade da pessoa que pleiteia o benefício de prestação continuada.
5 CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO
O artigo 21 da Lei nº 8.742/93 prevê que o benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação de sua continuidade, pois é certo que se houver mudanças nas condições que deu origem a concessão do benefício, este poderá ser imediatamente cancelado.
Igualmente, o benefício em comento poderá ser cancelado em caso de morte do beneficiário, ou caso se constate irregularidades na concessão ou utilização do benefício, nos termos do quanto previsto nos artigos 47 e 48, do Decreto nº 6.214/07.
Para melhor elucidação dos motivos para cessação do benefício de prestação continuada, importa colacionar os dispositivos supracitados, in verbis:
“Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. (Vide Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou utilização.
§ 3º O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência, inclusive em razão do seu ingresso no mercado de trabalho, não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Art. 47. O Benefício de Prestação Continuada será suspenso se identificada qualquer irregularidade na sua concessão ou manutenção, ou se verificada a não continuidade das condições que deram origem ao benefício. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 1o Ocorrendo as situações previstas no caput será concedido ao interessado o prazo de dez dias, mediante notificação por via postal com aviso de recebimento, para oferecer defesa, provas ou documentos de que dispuser.
§ 2o Na impossibilidade de notificação do beneficiário por via postal com aviso de recebimento, deverá ser efetuada notificação por edital e concedido o prazo de quinze dias, contado a partir do primeiro dia útil seguinte ao dia da publicação, para apresentação de defesa, provas ou documentos pelo interessado. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 3o O edital a que se refere o § 2o deverá ser publicado em jornal de grande circulação na localidade do domicílio do beneficiário. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 4o Esgotados os prazos de que tratam os §§ 1o e 2o sem manifestação do interessado ou não sendo a defesa acolhida, será suspenso o pagamento do benefício e, notificado o beneficiário, será aberto o prazo de trinta dias para interposição de recurso à Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 5o Decorrido o prazo concedido para interposição de recurso sem manifestação do beneficiário, ou caso não seja o recurso provido, o benefício será cessado, comunicando-se a decisão ao interessado. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
Art. 47-A. O Benefício de Prestação Continuada será suspenso em caráter especial quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual, mediante comprovação da relação trabalhista ou da atividade empreendedora. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 1o O pagamento do benefício suspenso na forma do caput será restabelecido mediante requerimento do interessado que comprove a extinção da relação trabalhista ou da atividade empreendedora, e, quando for o caso, o encerramento do prazo de pagamento do seguro-desemprego, sem que tenha o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício no âmbito da Previdência Social. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 2o O benefício será restabelecido: (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
I – a partir do dia imediatamente posterior, conforme o caso, da cessação do contrato de trabalho, da última competência de contribuição previdenciária recolhida como contribuinte individual ou do encerramento do prazo de pagamento do seguro-desemprego; ou (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
II – a partir da data do protocolo do requerimento, quando requerido após noventa dias, conforme o caso, da cessação do contrato de trabalho, da última competência de contribuição previdenciária recolhida como contribuinte individual ou do encerramento do prazo de pagamento do seguro-desemprego. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 3o Na hipótese prevista no caput, o prazo para a reavaliação bienal do benefício prevista no art. 42 será suspenso, voltando a correr, se for o caso, a partir do restabelecimento do pagamento do benefício. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 4o O restabelecimento do pagamento do benefício prescinde de nova avaliação da deficiência e do grau de impedimento, respeitado o prazo para a reavaliação bienal. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
§ 5o A pessoa com deficiência contratada na condição de aprendiz terá seu benefício suspenso somente após o período de dois anos de recebimento concomitante da remuneração e do benefício, nos termos do § 2º do art. 21-A da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
Art. 48. O pagamento do benefício cessa:
I – no momento em que forem superadas as condições que lhe deram origem; (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
II – em caso de morte do beneficiário; (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
III – em caso de morte presumida ou de ausência do beneficiário, declarada em juízo; ou (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
IV – em caso de constatação de irregularidade na sua concessão ou manutenção. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
Parágrafo único. O beneficiário ou seus familiares são obrigados a informar ao INSS a ocorrência das situações descritas nos incisos I a III do caput. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)”
Assim, conforme o próprio nome aduz, o benefício previsto na LOAS é de prestação continuada, porém, há previsão que este seja revisto a cada 2 (dois) anos para averiguar se a pessoa continua fazendo jus ao benefício, sendo certo que em determinados casos, nos termos do quanto previsto em lei, este poderá ser cessado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Beneficio de Prestação Continuada, conforme abordado, foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social, Lei nº 8.742/93, popularmente conhecida como LOAS.
Destarte, o benefício em comento está entre os programas de Governo criado para garantir o mínimo existencial a muitas pessoas que vivem a margem da sociedade, assim, mesmo o benefício sendo no importe de somente 1 (um) salário mínimo mensal, já é um valor considerável para quem não teria outro meio de garantir a própria subsistência.
Em que pese o critério de concessão do benefício ser demasiadamente rigoroso, é preciso que a avaliação quanto ao preenchimento dos requisitos seja rígido a fim de se evitar fraudes, tão comum na atual conjuntura do país.
Contudo, é preciso ponderar esse rigor para que pessoas que realmente necessitem do benefício não tenham negado esse direito, haja vista a enorme diferença que esse valor tão ínfimo faz na vida, ou melhor, na qualidade de vida dessas pessoas.
Assim, tendo em vista que o enfoque do presente foi em relação ao critério de miserabilidade considerado para a concessão do benefício, uma vez que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 8.742/93, o Poder Judiciário tem considerado outros critérios para apuração da real necessidade da pessoa que requer o benefício, até mesmo porque a limitação de renda trazida pela lei não é capaz de atestar a miserabilidade de uma pessoa ou família.
Informações Sobre os Autores
Vanessa Cristina Borela
advogada, pós-graduanda em Direito da Seguridade Social pela Faculdade Legale
Carlos Alberto Vieira de Gouveia
Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale