Resumo: O presente estudo visa analisar a legalidade dos fundamentos que foram determinantes para que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), admitisse a possibilidade de restituição dos valores percebidos a título de benefício previdenciário, por força de tutela de urgência revogada posteriormente. Partiu-se da análise histórica das tutelas de urgência, bem como do instituto da boa-fé dos segurados, a fim de compreender os principais fatores responsáveis pela atual e importante mudança de entendimento do judiciário. Em seguida, analisou-se a evolução da jurisprudência no STJ. Concluiu-se mencionando os efeitos positivos que o atual entendimento jurisprudencial trouxe para o mundo jurídico e para sociedade. Fez-se uso de uma metodologia baseada em pesquisas bibliográficas brasileiras.
Palavras Chave: Benefícios. Previdência Social. Restituição. Segurados.
Abstract: This study aims to examine the legality of the grounds that were instrumental in the Superior Court of Justice (SCJ), admitted the possibility of repayment of the amounts received by way of social security benefits, for urgent protection force revoked later. It started from the historical analysis of emergency guardianships and the good faith of the Institute of insured in order to understand the main factors responsible for the current and important change of legal understanding. Then analyzed the evolution of case law in the Supreme Court. It was concluded by mentioning the positive effects that the current jurisprudential understanding brought to the legal world and society. There was use of a methodology based on Brazilian literature searches.
Keywords: Benefit. Social Security. Restitution. Policyholders.
Sumário: 1. Introdução. 2. Tutela de urgência. 3. Boa fé dos segurados. 4. Posicionamento do STJ em relação ao tema. Conclusão.
1 Introdução
O presente estudo busca analisar a legalidade dos fundamentos que induziram o Superior Tribunal de Justiça (STJ), a realinhar o seu entendimento a respeito do tema, qual seja, a possibilidade de restituição dos benefícios previdenciários concedidos por meio de tutela de urgência revogada posteriormente. O objetivo do trabalho é esclarecer e contribuir para melhor compreensão deste importante assunto de interesse público, que abrange temas complexos das áreas do direito Processual Civil e Previdenciário.
Percebe-se, através de uma pesquisa simples na jurisprudência dos tribunais nacionais, que mesmo após o realinhamento do entendimento no STJ, tanto a doutrina jurídica, quanto parte dos operadores do direito, mantém certa resistência em aceitar os argumentos utilizados pelo tribunal da cidadania para sedimentar o tema. Assim sendo, o presente estudo adquire maior relevância, pois, afinal, é possível deduzir que o atual posicionamento do STJ é compatível com o ordenamento jurídico vigente?
Com a finalidade de sanar o questionamento supra, torna-se necessário analisar os principais fundamentos utilizados pelo tribunal da cidadania para alterar o seu entendimento. No primeiro tópico do presente estudo verificar-se-á, com maior proximidade, o caráter histórico e a natureza das tutelas de urgência. No segundo tópico, analisar-se-á evolução histórica da boa-fé e a sua relação com os segurados. Em seguida, evidenciar-se-á significativa e importante evolução jurisprudencial que o tema obteve no STJ. Finalmente, apontar-se-á se o atual posicionamento adotado pelo STJ está de acordo com o ordenamento jurídico vigente, bem como os benefícios do atual entendimento para o mundo jurídico e para a sociedade.
É dessa forma, pois, que o presente estudo, utilizando-se do método indutivo, busca contribuir para os debates sobre o tema.
2 Tutelas de Urgência
Há muitos anos, tanto a doutrina jurídica, quanto o legislador, procuram aprimorar e atualizar o Código Processual Civil (CPC), em virtude da constante necessidade de solucionar a pretensão do jurisdicionado e acompanhar a evolução da sociedade. Assim sendo, o instituto das tutelas de urgência, que abrange o gênero das tutelas provisórias[1], ganha relevância no presente estudo, pois, além de ser reiteradamente alvo de reformulações, foi um dos temas responsáveis pela atual modificação de entendimento do STJ. Modificação essa, que admitiu a possibilidade de restituição dos benefícios previdenciários concedidos por meio de tutela de urgência revogada posteriormente.
Constatou-se que diante do formalismo processual acentuado da década de 40, a morosidade se tornou mais presente no processo, passando a afetar a efetividade jurisdicional e aumentar a insegurança jurídica na época. Destarte, a doutrina jurídica e os operadores do direito começaram a ponderar sobre a necessidade de atualização do CPC de 1939. Assim, após legislador constatar a necessidade de mudança, criou a Lei nº 5.869/73 (CPC de 1973).
Dentre as alterações realizadas, a que mais se destacou foi a ampliação das medidas cautelares. Com o decorrer do tempo, constatou-se que através da ampliação das medidas cautelares de urgência, o legislador havia encontrado o mecanismo necessário para afastar a situação de ameaça ao resultado do processo e atenuar o conflito existente entre as garantias constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LV, CF/88) x Acesso Efetivo à Justiça (art. 5º, XXXV, CF/88).
Por conseguinte, a doutrina jurídica passou a sustentar, de forma majoritária, que as medidas cautelares pertenciam ao instituto da tutela de urgência.
Em relação há tutela de urgência, vale destacar o entendimento de Araken de Assis:
“É nesse quadro principiológico conflituoso que se impõe a tutela jurisdicional de urgência, como remédio provisório e necessário. Assim, no hiato inevitável interposto entre o ajuizamento da causa e o provimento final de mérito, os problemas que põem em risco a efetividade do processo devem ser equacionados pelo juiz, afastando-se de imediato tudo aquilo que possa tornar inútil ou insatisfatória a prestação definitiva que se espera alcançar ao fim do processo. A essa atividade judicial complementar dá-se o nome de “regulação provisória” ou “litisregulação”, ou, ainda, “tutela de urgência.”[2]
No mesmo sentido é o entendimento do Ministro Luiz Fux:
“À luz do princípio do acesso à justiça, consagrado no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que tem como corolário o direito impostergável à adequada tutela jurisdicional, não podia o legislador escusar-se de prever a “tutela urgente”, sob pena de consagrar a tutela “tardia e ineficiente”, infirmando a garantia constitucional por via oblíqua, na medida em que a “justiça retardada é justiça denegada.”[3]
A tutela de urgência justifica-se constitucionalmente como mecanismo de concretização e de harmonização de direitos fundamentais em conflito. Sua origem, sua importância e sua legitimidade decorrem não de um ou outros dispositivos específicos, e sim do próprio sistema constitucional organicamente considerado (ZAVASCKI, 1997, p. 106).
Ocorre que, com o decorrer do tempo, houve um aumento significativo das demandas cautelares, haja vista que essas eram o principal mecanismo para que os juristas pleiteassem a tutela de urgência.
Nesse sentido, Humberto Theodoro Junior mencionava:
“Para tentar contornar a inadequação do processo tradicional e superar a irritante e intolerável lentidão da Justiça, muitos operadores do direito encontraram na ação cautelar uma válvula par ase alcançar algum tipo de aceleração na tutela jurisdicional e alguma forma de antecipar efeitos da solução de mérito esperada para a causa. Havia, porém, dificuldades de ordem técnica, visto que a concepção da tutela cautelar não havia sido elaborada para tal fim. Múltiplas foram a controvérsias e quase sempre se considerava abusiva a prática de generalizar as cautelares para obter, de plano, satisfação do direito subjetivo da parte, mormente porque não havia, nem na lei, nem na doutrina, uma disciplina que desse apoio e segurança ao desvio do poder geral de cautela para cumprir a missão nova que se atribuía.”[4]
Não obstante, a doutrina jurídica passou a ponderar sobre o desvio de finalidade das medidas cautelares de urgência. Isto é, constatou-se que juristas e magistrados passaram a utilizar/conceder as medidas como se essas tivessem natureza satisfativas.
Oportuno referir que o mesmo fenômeno (desvio de finalidade das medidas cautelares), também ocorreu no Direito Italiano e foi denominado por Federico Carpi de força expansiva da tutela cautelar.[5]
Para o Ministro Teori Zavascki:
“Essa dessintonia doutrinária refletiu-se, como era de se esperar, na jurisprudência. Todavia, o que ocorreu nos tribunais, de modo geral, foi a gradual passagem de uma linha de orientação nitidamente radical, de rejeitar medidas cautelares satisfativas, para outra exatamente oposta. A ação cautelar passou a ser aceita, não apenas como instrumento para a obtenção de medidas para garantia do resultado útil do processo, mas também para alcançar tutela de mérito relativa a pretensões que reclamassem fruição urgente.”[6]
Em síntese, diante do acelerado processo de modernização da sociedade brasileira[7], bem como da solidificação das garantias constitucionais, novamente, a prestação adequada, efetiva e tempestiva da relação processual estava sendo mitigada.
Desse modo, novamente o Poder Legislativo precisou intervir, com o objetivo de atenuar os problemas jurídicos/sociais. Assim, através elaboração da Lei nº 8.952/94, verificou-se que houve a instituição da tutela antecipada ao ordenamento jurídico brasileiro. Isto é, nascia o instrumento adequado para pleitear a tutela de urgência de natureza satisfativa.
Para Luiz Guilherme Marinoni:
“A tutela antecipatória deve ser interpretada de acordo com o espírito que presidiu a reforma do Código. Como sustentaram os professores Athos Gusmão Carneiro e Sálvio de Figueiredo, a principal preocupação foi a de “tornar nosso processo apto a realizar os objetivos e melhor servir à sociedade, recordada a advertência de Fritz Baur, o admirável reformulador do processo civil alemão, segundo a qual só os procedimentos céleres preenchem a finalidade do processo, dando-lhe efetividade. O ideal de efetividade, entendido como o ideal de uma tutela que dê, o mais rápido possível, àquele que tem um direito exatamente aquilo que ele tem o direito de obter, é que deve iluminar as novas definições dos doutrinadores do processo.”[8]
A partir do surgimento da tutela antecipada, a doutrina jurídica passou a examinar com maior profundidade as diferenças e similaridade existentes entre as tutelas de urgência (tutela cautelar e antecipada), haja vista que muitos juristas e operadores do direito careciam de melhor entendimento das matérias.
Para o doutrinador Antônio Cabral:
“[…]A procura por soluções mais expeditas começou no início do século XX com o desenvolvimento de um amplo rol de espécies de tutela de urgência, assecuratórias ou satisfativas (cautelar, antecipada, inibitória). Todavia, provimentos de urgência, ainda que, em muitas hipóteses, dotados de executividade, são decisões baseadas em cognição sumária, sem tenderem à definitividade (são precárias, revogáveis), e tomadas em juízo de probabilidade (fumus boni juris, verossimilhança) […].”[9]
Ademais, convém destacar, novamente, o entendimento de Marinoni, o qual representou o posicionamento majoritário da doutrina no período inicial da vigência da reformulação processual.
“A tutela antecipatória satisfaz o autor, dando-lhe o que almejou ao propor a ação. O autor não quer outra tutela além daquela obtida antecipadamente, diversamente do que sucede quando pede tutela cautelar, sempre predestinada a dar efetividade a uma tutela jurisdicional do direito. A tutela antecipatória também não aponta para uma situação substancial diversa daquela tutelada, ao contrário da tutela cautelar, que necessariamente faz referência a uma situação tutelável ou a uma outra tutela do direito material”.[10]
Logo, a doutrina estabeleceu que a tutela antecipada adiantava os efeitos do que fora pleiteado pelo autor na inicial, enquanto que a tutela cautelar tinha por finalidade garantir a utilidade do processo principal. Isto é, apenas a tutela antecipada possuía natureza satisfatória. Ocorre que, mesmo com os estudos realizados pela doutrina, o tema ainda causava confusão no mundo jurídico.
Assim sendo, o legislador optou por inserir, através da Lei 10.444/2002, o §7 no artigo 273 do CPC, o qual permitiu a aplicação da fungibilidade entre as tutelas de urgência. Diante da mudança, foi possível identificar que o legislador passou a ampliar o sincretismo processual[11].
Portanto, com a possibilidade da fungibilidade entre as tutelas de urgência, surgiu a possibilidade de o julgador outorgar uma medida de urgência no lugar de outra postulada, desde que presentes os requisitos para sua concessão.
Ocorre que, as mudanças realizadas pelo legislador não foram suficientes para atenuar a morosidade processual e preservar a efetividade jurisdicional. Assim sendo, com a elaboração da Lei nº 13.105/2015, a qual dispõe sobre o novo CPC/2015, as tutelas de urgência, novamente, sofreram alterações. Constatou-se que o legislador optou por priorizar o sincretismo processual. Isto é, o novo CPC, ao contrário do CPC/73, não previu regimes separados para as medidas conservativas e satisfativas.
Ademais, o legislador estabeleceu que as tutelas provisórias poderão ser fundadas em tutelas de urgência (cautelar ou antecipada, ambas com possibilidade de serem concedidas em caráter antecedente ou incidental) ou tutela de evidência (Art. 294, §único. CPC/2015).
Em relação a tutela de evidência, adequado mencionar o entendimento de Daniel Mitidiero:
“O objetivo da tutela da evidência está em adequar o processo à maior ou menor evidência da posição jurídica defendida pela parte no processo, tomando a maior ou menor consistência das alegações das partes como elemento para distribuição isonômica do ônus do tempo ao longo do processo.”[12]
Ainda, vale referir que o legislador unificou os requisitos necessários para concessão das tutelas de urgência. Desse modo, desde a vigência do novo CPC, basta a comprovação da probabilidade do direito e perigo de dano ou o risco ao resultado (art. 300, CPC/2015).
Em outras palavras, o novo CPC unificou o regime normativo instituído para as medidas conservativas e satisfativas, estabelecendo um gênero comum de tutela de urgência, que se submete a idênticos requisitos fumus boni iuris e periculum in mora. [13]
Em relação aos requisitos necessários para concessão da tutela de evidência, Leonardo Greco menciona que:
“Não é necessária qualquer aferição de perigo de dano para que a tutela de evidência seja concedida, basta acentuada probabilidade de existência do direito ou significativo valor desse direito. A tutela da evidência é sempre incidente”.[14]
No que tange há reversibilidade das tutelas provisórias, constatou-se que o legislador optou por manter o entendimento anteriormente predominante, qual seja, de que a tutela provisória, por ser de natureza precária, poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo. (arts. 296 e 298, CPC/2015).
Posta assim a questão, conclui-se que mesmo com todas as alterações realizadas pelo legislador, a natureza precária das tutelas de urgência jamais foi alterada. Isto é, resta límpido que havendo qualquer alteração posterior há situação fato-jurídico justificadora da concessão da medida, faz-se necessário o retorno ao status quo da decisão inicial. Portanto, os efeitos da revogação da decisão que inicialmente concede tutela de urgência têm eficácia ex-tunc.
3 A Boa-fé dos segurados
Faz-se necessário analisar o instituto da boa-fé e relaciona-la com os segurados, pois, apenas a análise das tutelas provisórias, não é suficiente para compreender os motivos responsáveis pela modificação do entendimento do STJ.
Constatou-se que o instituto da boa-fé surgiu no direito romano, através da introdução dos contratos consensuais e a mitigação do formalismo contratual clássico que predominava de forma absoluta na época.
Nesse sentido, é o entendimento do doutrinador Português Antônio Menezes Cordeiro:
“[…] a origem da boa-fé na fides romana. A fides romana se concretizava nas relações entre a clientela e os patrícios. A clientela era um tipo de estratificação social, um grupo de pessoas que se situavam entre o cidadão livre e o escravo, que em troca da promessa de proteção e favores (fides promessa), se submetiam a certos deveres de lealdade e obediência (fides poder). Progressivamente desaparecem os elementos de sujeição e da ideia de fides promessa evolui o elemento que vai importar para o Direito Civil, a ideia de garantia, ligada à palavra dada [...].”[15]
Com o decorrer do tempo, através da influência do Direito Canônico, conferiu-se à boa-fé uma tonalidade ética que se equiparava à ausência de pecado, traduzindo-se em um desvio de aplicação. Isto é, faltar com a palavra empenhada ou não agir de boa-fé era pecado.[16]
Contudo, constatou-se que foi a partir dos estudos realizados pelos doutrinadores alemães que a boa-fé ganhou maior notoriedade no mundo jurídico, embora tenha adquirido concepção diferente da determinada no direito romana. Foi o Código Alemão (BGB-Bürgerliches Gesetzbuch), que realizou a distinção entre a boa-fé, reconhecendo a concomitância do instituto em seus conceitos objetivo e subjetivo (PRETEL, 2009, p.30).
Para o direito alemão, a boa-fé traduzia-se na fórmula Treu und Glauber (lealdade e confiança), regra objetiva, que precisaria ser observada nas relações jurídicas em geral e não apenas nas relações contratuais.
Ocorre que, a boa-fé somente ingressou no ordenamento jurídico brasileiro no século XIX, através da redação do art. 131, I do Código Comercial.[17] Todavia, o instituto não recebeu atenção dos doutrinadores e jurista da época. Posteriormente, com o advento da Constituição Federal de 1988 (CF/88), foi possível delinear uma relação entre os direitos fundamentais, as garantias jurisdicionais e o instituto da boa-fé.
Neste sentido, dispõe Patrícia Ayub da Costa e Sérgio Alves Gomes (2012, p. 18) sobre a procedência do princípio da boa-fé no conceito do Estado Democrático de Direito e nos demais princípios expressos na Carta Magna:
“Portanto, no paradigma de um Estado Democrático de Direito (art. 1º, caput, da CF) fundamentado na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), cujos objetivos são construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CF); promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV, CF) que rege suas relações internacionais pelos princípios da igualdade entre os Estados (art. 4º, V, CF); defesa da paz (art. 4º, VI, CF); solução pacífica dos conflitos (art. 4, VII, CF); cooperação entre os povos para o progresso da humanidade (art. 4º, IX, CF) só pode ser regido pelo princípio da boa-fé objetiva, pois é esse princípio que fundamenta o comportamento desse modelo de Estado.”
Assim, com o advento dos valores constitucionais, a autonomia da vontade e o individualismo cederam lugar às regras deontológicas da boa-fé, haja vista que as relações jurídicas passaram a ser norteadas pela lealdade e confiança.
Por conseguinte, o legislador de forma inovadora inseriu a boa-fé objetiva na Lei nº 8.078/90, a qual trata do Código de Defesa do Consumidor e na da Lei nª 10.406/02, a qual trata do Código Civil.
A respeito do tema, Diego Martins Silva do Amaral (2009) refere:
“O princípio boa-fé objetivo se estabelece em uma regra ética, em um grande dever de guardar fidelidade à palavra dada ou ao comportamento praticado, na ideia de não fraudar ou abusar da confiança alheia, o respeito e a obrigação. Como já argumentado anteriormente, não surgiu com o Código Civil de 2002 ou mesmo com o Código de Defesa do Consumidor, mas, ao contrário, passou por uma lenta e gradativa evolução, desde os tempos romanos, passando pelo direito alemão, sendo que, pelo legislador constituinte de 1988 foi reconhecida e erguida à condição de princípio, adquirindo o status de fundamento ou qualificação essencial da ordem jurídica. Isto significa dizer que atua como postulado ético inspirador de toda ordem jurídica e que, por fim, sempre deverá ser aplicado no caso concreto. Nos dias atuais, não há como não se reconhecer a sua incidência em todos os temas de direito civil, direito processual civil e direito do consumidor.”
Diante disso, constata-se que a boa-fé objetiva passou a ser é um vértice de todo o ordenamento jurídico, sendo configurada como princípio (implícito), de modo que, toda a legislação infraconstitucional e a interpretação jurídica passaram a ser pautadas de acordo com os valores éticos. Destarte, faz-se necessário trazer à baila o posicionamento da doutrina jurídica em relação às diferenças encontradas entre a boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva.
Mariana Pretel (2009, p.19-20), explica a diferença existente entre a boa-fé subjetiva e a objetiva:
“Em princípio, poder-se-ia dispor que a boa-fé subjetiva se refere a dados psicológicos, elementos internos, os quais conduzem o sujeito a uma ignorância do caráter ilícito de suas condutas, relacionando-se com a ideia de crença errônea; enquanto que, a boa-fé objetiva se vincula a elementos externos, normas de conduta, que determinam a forma de agir de um indivíduo, conforme os padrões de honestidade socialmente reconhecidos.”
Para Humberto Theodoro Junior, a boa-fé objetiva:
“Consiste o princípio da boa-fé objetiva em exigir do agente que pratique o ato jurídico sempre pautado em valores acatados pelos costumes, identificados com a ideia de lealdade e lisura. Com isso, confere-se segurança às relações jurídicas, permitindo-se aos respectivos sujeitos confiar nos seus efeitos programados e esperados”.[18]
Na mesma linha é o posicionamento de Fredie Didier:
“A boa-fé objetiva compreende que a boa-fé objetiva é uma norma jurídica – especificamente, um princípio. Violara boa-fé objetiva é, portanto, violar uma norma jurídica […].”[19]
Deste modo, conclui-se que a boa-fé subjetiva está relacionada à índole do agente, ou seja, com os seus valores pessoais de agir, enquanto a boa-fé objetiva refere-se aos valores da sociedade no agir da pessoa, um padrão de comportamento ético, leal, justo.
Através do enraizamento do princípio da boa-fé objetiva ao ordenamento jurídico brasileiro, a jurisprudência do STJ, como era de se esperar, passou a incorporá-lo. De tal modo, os operadores do direito ao analisarem a possibilidade de restituição dos benefícios previdenciários concedidos por meio de tutela de urgência revogada posteriormente, concluíram que o comportamento do segurado deveria ser avaliado de acordo com a boa-fé objetiva.
Desse modo, constatou-se, através do atual entendimento jurisprudencial do STJ, que a boa-fé objetiva não está presente na conduta dos segurados, quando se trata da possibilidade de restituição de benefícios previdenciários concedidos por meio de tutela de urgência revogada posteriormente. Tal entendimento levou em consideração a natureza provisória e não definitiva das tutelas de urgência.
Portanto, não há que falar em violação da expectativa do segurado, haja vista que não há dispositivo legal que justifique a mesma.
4 Evolução da Jurisprudência no STJ
Constatou-se que além dos fundamentos jurídicos, o advento da Emenda Regimental nº 14 do STJ[20], também contribuiu para a modificação de entendimento do Superior Tribunal de justiça, haja vista que com a alteração no Regimento Interno, a competência para julgar a matéria previdenciária deixou de ser da 3ª seção e passou a ser da 1ª seção.
Adequado mencionar a redação do art. 9, §1, XIII, do regimento interno do STJ[21], que trata do tema:
“Art. 9º A competência das Seções e das respectivas Turmas é fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa.
§ 1º À Primeira Seção cabe processar e julgar os feitos relativos a:
XIII – benefícios previdenciários, inclusive os decorrentes de acidentes do trabalho.”
Posta assim a questão, convém aludir que a partir da mudança de competência para o julgamento da matéria previdenciária, a jurisprudência que passou a tratar dos benefícios previdenciários evoluiu significativamente, de modo que o posicionamento anteriormente predominante na 3ª seção do STJ, qual seja, de não admitir a possibilidade de restituição dos benefícios previdenciários, foi modificado pela 1ª seção.
Constatou-se, que para os julgadores da 3ª seção do STJ, predominava o entendimento de que a natureza alimentar dos benefícios previdenciários era suficiente para mitigar as demais matérias envolvidas. Com base nesse entendimento, a Turma Nacional de Uniformização (TNU), elabora a súmula nº 51, com o mesmo entendimento.
“Sum. 51 – Os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos de tutela, posteriormente revogada em demanda previdenciária, são irrepetíveis em razão da natureza alimentar e da boa-fé no seu recebimento.”
Todavia, após a mudança de competência para o julgamento da matéria previdenciária, a 1ª seção passou a reavaliar o instituto da tutela de urgência, boa-fé objetiva dos segurados, bem como a possibilidade de mitigação da natureza alimentar dos benefícios previdenciários. Diante disso, modificou o entendimento anteriormente estabelecido pela 3ª seção. Isto é, a 1ª seção do STJ passou a admitir a possibilidade de restituição dos benefícios previdenciários recebidos por meio de tutela de urgência revogada posteriormente, conforme se constata através dos seguintes julgados:
“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDORES PÚBLICOS. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS EM VIRTUDE DE LIMINAR POSTERIORMENTE CASSADA. PROVIMENTO PRECÁRIO POSSIBILIDADE. 1. Tratando o caso dos autos de verba recebida indevidamente por força de antecipação de tutela, posteriormente revogada por decisão do Tribunal local (fl. 355), os valores devem ser restituídos, sob pena de enriquecimento ilícito por parte dos servidores beneficiados. Nesse sentido: REsp n. 1.384.418-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 12/6/13, acórdão não publicado. 2. Agravo regimental não provido”.[22]
Por conseguinte, verifica-se que houve a ratificação da modificação do entendimento e a divulgação através do informativo de jurisprudência de 2015, sob o nº 570.
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXIGIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL POSTERIORMENTE MODIFICADA. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA 1.401.560/MT. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES, PARA DETERMINAR A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS, EM RAZÃO DA REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. 1. A teor do disposto no art. 535, incisos I e II do CPC, os Embargos de Declaração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado. 2. É possível a concessão de efeitos infringentes aos Aclaratórios no caso em que, conforme seja a deficiência a ser corrigida, seu suprimento acarrete, inevitavelmente, a modificação do julgado recorrido, conforme reverberam abalizada doutrina e jurisprudência atuais (EDcl na AR 2.510/SP, Rel. Min. ADILSON VIEIRA MACABU, DJe 16.06.2011; EDcl no AgRg no Ag 1.214.723/MG, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 10.06.2011; EDcl nos EDcl nos EDcl no AgRg nos EDcl no Ag 1.316.589/RS, Rel. Min. SIDNEI BENETI, DJe 17.06.2011, dentre outros). 3. Esta Corte Superior de Justiça tem admitido, excepcionalmente, que o Recurso Aclaratório possa servir também para amoldar o julgado à superveniente orientação jurisprudencial desta Corte, quando adotada em regime de recursos repetitivos, em atenção à instrumentalidade das formas, de modo a garantir a celeridade e a eficácia da prestação jurisdicional e a reverência ao pronunciamento majoritário. 4. A Primeira Seção desta Corte no julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia 1.401.560/MT, julgado em 12.2.2014, consolidou o entendimento de que é necessária a devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada posteriormente revogada. 5. No mais, faço a ressalva do meu entendimento pessoal, para afirmar que a realidade fática demonstra que, nessas situações, a parte autora, ao obter a concessão de um benefício por força de decisão judicial, acredita que o seu recebimento é legítimo, não tendo conhecimento da provisoriedade da decisão e da possibilidade de ter que restituir esse valor, máxime se essa advertência não constou do título que o favoreceu. Dessa forma, tendo a importância sido recebida de boa-fé, uma vez que amparada por decisão judicial, mostra-se incabível seja a parte posteriormente surpreendida com o desconto das diferenças, tidas por indevidamente recebidas, após a cessação dos efeitos da tutela provisória. 6. Embargos de Declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para determinar a devolução dos valores percebidos, em razão da revogação da tutela antecipada, com ressalva do ponto de vista pessoal do relator.”[23]
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA.COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVOGAÇÃO POSTERIOR. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. NECESSIDADE. 1. A jurisprudência mais recente deste Tribunal Superior é no sentido de que os valores de benefícios previdenciários complementares recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada devem ser devolvidos, haja vista a reversibilidade da medida antecipatória, a ausência de boa-fé objetiva do beneficiário e a vedação do enriquecimento sem causa. 2. As verbas previdenciárias complementares são de natureza alimentar e periódica. Assim, para não haver o comprometimento da subsistência do devedor, tornando efetivo o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), deve ser observado, na execução, o limite mensal de desconto em folha de pagamento de 10% (dez por cento) da renda mensal do benefício previdenciário suplementar até a satisfação integral do crédito.3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1568908/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/02/2016, DJe 01/03/2016)”
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REJULGAMENTO DETERMINADO PELO STF. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE CASSADA. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DECIDIDA EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AGRAVO PROVIDO. 1. Rejulgamento do feito determinado pelo Supremo Tribunal Federal, por entender que o acórdão desta Corte violou o art. 97 da CF/88 e o enunciado da Súmula Vinculante n. 10 do STF. 2. De acordo com o entendimento firmado no julgamento do REsp n. 1.401.560/MT, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, é possível a restituição de valores percebidos a título de benefício previdenciário, em virtude de decisão judicial precária posteriormente revogada.3. Agravo regimental provido.” (AgRg no REsp 1033478/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/02/2015, DJe 25/02/2015).[24]
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REPETIÇÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS INDEVIDAMENTE RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 692. A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a prever a antecipação da tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. Nesse contexto, o pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (art. 273, § 2º, do CPC). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu Decisum não é irreversível. Sendo assim, se acabou por ser malsucedida a demanda na qual houvera antecipação da tutela judicial, o autor da ação responde pelo que recebeu indevidamente. Além do mais, não prospera o argumento de que o autor não seria obrigado a devolver benefícios advindos da antecipação por ter confiado no juiz, porquanto esta fundamentação ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. Há, ainda, o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. Ademais, o art. 115, II, da Lei 8.213/1991 é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do STJ que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrário sensu, o STF declarou constitucional, uma vez que o art. 115, II, da Lei 8.213/1991 exige o que dispensava o art. 130, parágrafo único na redação originária, declarado inconstitucional na ADI “[25]
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REJULGAMENTO DETERMINADO PELO STF. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE CASSADA. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DECIDIDA EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AGRAVO PROVIDO. 1. Rejulgamento do feito determinado pelo Supremo Tribunal Federal, por entender que o acórdão desta Corte violou o art. 97 da CF/88 e o enunciado da Súmula Vinculante n. 10 do STF.2. De acordo com o entendimento firmado no julgamento do REsp n. 1.401.560/MT, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, é possível a restituição de valores percebidos a título de benefício previdenciário, em virtude de decisão judicial precária posteriormente revogada. 3. Agravo regimental provido”.[26]
Embora o assunto esteja pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a sumula nº 51 da TNU permanece vigente e parte dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) ainda não absorveram totalmente o que foi estabelecido pelo tribunal da cidadania. Em relação a isso, a tendência é de que em breve tanto os TRFs, quando a TNU, julguem os incidentes de uniformização de jurisprudência e absorvam o entendimento predominante na Corte Superior.
Conclusão
A questão-problema buscou orientar o desenvolvimento do trabalho sobre a possibilidade jurídica da restituição dos benefícios previdenciários, percebidos por meio de tutela de urgência posteriormente revogada.
Esta hipótese foi confirmada no presente artigo, pois o atual entendimento do STJ está absolutamente de acordo com o ordenamento jurídico vigente. Chegou-se a esta conclusão a partir da análise da evolução do direito fundamental, processual civil, previdenciário e do exame das mais novas jurisprudências pátrias.
Inicialmente, realizou-se a análise histórica das tutelas provisórias. Em seguida, verificou-se a origem do instituto da boa-fé e a sua relação com os segurados. Ao final, procurou-se tratar da evolução da jurisprudência do tema no STJ.
No que tange as tutelas de provisórias (de urgência), fez-se necessário realizar a análise história para compreender as suas principais características, quais sejam, a cognição sumária (decisão superficial, baseada no juízo de probabilidade), natureza provisória (admite a revogação ou modificação a qualquer tempo, desde de que de forma justificada). Assim sendo, ao analisar o atual posicionamento do STJ, resta límpido que não houve qualquer ilegalidade em relação ao ordenamento jurídico vigente, haja vista que a natureza das tutelas de urgência foi respeitada.
Em relação a boa-fé, se tornou necessário verificar as diferenças entre a boa-fé objetiva (refere-se aos valores da sociedade no agir da pessoa, um padrão de comportamento ético, leal, justo) e a boa-fé subjetiva (se refere a dados psicológicos, elementos internos, os quais conduzem o sujeito a uma ignorância do caráter ilícito de suas condutas, relacionando-se com a ideia de crença errônea). Através do estudo histórico do tema, constatou-se que a boa-fé objetiva pauta todas as relações jurídicas previstas no ordenamento brasileiro. Diante disso, percebe-se que a decisão do STJ de avaliar a conduta do segurado, também sob a ótica da boa-fé objetiva é absolutamente adequada e compatível com as normas e princípios do ordenamento jurídico brasileiro.
Ademais, evidenciou-se que a compreensão dos institutos das tutelas de urgência e boa-fé, é fundamental para entender a modificação realizada pelo STJ e avaliar a sua legalidade.
No que diz respeito a evolução jurisprudencial, verificou-se que a alteração da competência para julgar a matéria previdenciária, também contribuiu muito para a mudança de entendimento do STJ. Notou-se que a 3ª Seção não admitia a restituição dos benefícios previdenciários, diante da natureza alimentar. Todavia, a partir dos julgamentos da 1ª Seção, constatou-se que os benefícios previdenciários que forem concedidos e revogados posteriormente por meio de tutela de urgência, deverão ser restituídos. Isto é, a natureza alimentar dos benefícios previdenciários, para a 1ª Seção, nesses casos, sofre mitigação. Ademais, vale salientar, que tanto os benefícios previdenciários, quanto a boa-fé objetiva e as tutelas de urgência, possuem amparo constitucional.
Em síntese, conclui-se que o atual entendimento do STJ não viola o ordenamento jurídico, pois, além de respeitar as características das tutelar provisórias de urgência, também restabelece os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado, vedação do enriquecimento ilícito, eficiência, moralidade, legalidade administrativa e solidariedade. Ademais, oportuno se torna destacar que o atual posicionamento reflete de forma importante e positiva no orçamento da união, haja vista que os valores percebidos inadequadamente pelos segurados, a partir do novo posicionamento, deverão ser restituídos ao Erário.
Informações Sobre o Autor
Nathã Mabilia
Advogado. Especialista em Direito Público, pela Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul (ESMAFE-RS).