Horas in Itinere na Reforma Trabalhista

Kleverson Glauber Figueiredo de Paula Júnior

 

RESUMO

O presente trabalho tem como objeto de estudo as horas in itinere no direito do trabalho. O objetivo do trabalho consiste em realizar um estudo sobre as mudanças desse instituto advindas com a reforma trabalhista. A justificativa para a escolha do tema é que as horas in itinere consistia em um direito essencial ao trabalhador, e a sua retirada, por meio da reforma trabalhista, afeta diretamente a classe trabalhadora. O trabalho utilizará o método lógico-dedutivo, baseando-se na construção doutrinária, jurisprudencial e normativa, sendo analisada as referência do instituto. A pesquisa bibliográfica sobre o tema, por meio de artigos jurídicos, doutrina, revistas jurídicas, normas constitucionais e infraconstitucionais será o método de procedimento específico do trabalho em questão. O texto final foi fundamentado nas ideias e concepções dos principais autores do direito do trabalho.

Palavras chave: Horas in itinere. Trabalhador. Reforma trabalhista.

 

ABSTRACT

The present work has as object of study of hours in itinere in labor law. The objective of this paper is to conduct a study on the changes of this institute resulting from the labor reform. The justification for the choice of the subject is that hours in itinere consisted of an essential right to the worker, and their withdrawal through labor reform directly affects the working class. The work will use the logical-deductive method, based on the doctrinal, jurisprudential and normative construction, being analyzed the references of the institute. The bibliographic research on the subject through legal articles, doctrine, legal journals, constitutional and infraconstitutional norms will be the specific procedure method of the work in question. The final text was based on the ideas and conceptions of the main authors of labor law.

Keywords: Hours in itinere. Worker. Labor reform.

 

Sumário: Introdução. 1. Jornada de Trabalho. 2. Horas In Itinere. 3. Horas In Itinere e a Reforma Trabalhista. Conclusão. Referências.

 

INTRODUÇÃO

Quando se fala em jornada de trabalho, entende-se o número de horas diárias de trabalho, ou seja, o montante de horas de trabalho em um dia. Assim, as horas in itinere correspondem ao tempo despendido pelo trabalhador entre a sua residência e o local de trabalho.

São dois os requisitos, portanto, das chamadas horas itinerantes: em primeiro lugar, que o trabalhador seja transportado por condução fornecida pelo empregador, o segundo requisito exige que o local de trabalho seja de difícil acesso, ou se exige que, pelo menos, o local de trabalho não esteja servido por transporte público regular.

No entanto, com a reforma trabalhista, que foi uma mudança significativa na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) instrumentalizada pela lei № 13.467 de 2017, houve a mudança no instituto das horas in itinere, as quais serão tratadas no presente estudo.

Desta forma, inicialmente fez-se necessário o estudo a respeito da jornada de trabalho, de forma a compreender o seu conceito, estabelecendo um entendimento didático para embasar a compreensão a respeito das horas in itinere.

Posteriormente, adentrou-se ao estudo das horas in itinere, passando pela sua conceituação, e citando os dispositivos legais e as sumulas que tratam sobre o assunto. Utilizou-se de autores renomados para fundamentar o assunto.

Por fim, foi realizado um estudo sistêmico a respeito das mudanças da reforma trabalhista para o instituto da horas in itinere, que é o ponto principal do presente estudo.

A justificativa para a escolha do tema em questão reside na importância de aprimorar os conhecimentos sobre o assunto, que encontra-se em voga, por meio de pesquisa e exposição de ideias.

Para tanto, adentrando aos procedimentos metodológicos, o trabalho utilizará o método lógico-dedutivo, baseando-se na construção doutrinária, jurisprudencial e normativa, sendo analisada as referência do instituto. A pesquisa bibliográfica sobre o tema, por meio de artigos jurídicos, doutrina, revistas jurídicas, normas constitucionais e infraconstitucionais será o método de procedimento específico do trabalho em questão. O texto final foi fundamentado nas ideias e concepções dos principais autores do direito do trabalho.

 

1 JORNADA DE TRABALHO

A rigor, quando se fala em jornada de trabalho, entende-se o número de horas diárias de trabalho, ou seja, o montante de horas de trabalho em um dia. Exemplo, jornada de trabalho de oito horas.

Importante mencionar o entendimento do seguinte autor, no que se refere ao conceito de jornada de trabalho:

Jornada é uma medida de tempo no qual se inclui o labor diário do empregado; é a quantidade de trabalho que diariamente o empregado cumpre em favor de seu empregador como obrigação decorrente do contrato de trabalho. O conceito de jornada de trabalho pode ser formulado a partir de duas concepções básicas distintas, ou seja, a doutrina identifica duas teorias a partir das quais pode -se conceituar jornada de trabalho: a) teoria do tempo efetivamente trabalhado; e b) teoria do tempo à disposição do empregador. (ROMAR, 2018, p. 354)

Ao se buscar a natureza jurídica da jornada de trabalho, procura-se a sua subsunção em certas categorias jurídicas conhecidas e mais genéricas. Pode-se dizer que a jornada de trabalho, a qual é regulada pelo Direito, tem natureza de norma de ordem pública, pois há interesse social na sua limitação, em proteção da saúde, da segurança e da vida do trabalhador, preservando e concretizando a sua dignidade como pessoa. (GARCIA, 2017)

No que se refere a jornada de trabalho, a hora de entrada e de saída do trabalhador no emprego determina seu horário de trabalho. Já a duração de trabalho é o gênero do qual são espécies a jornada, o horário de trabalho e os repousos.

 

2 HORAS IN ITINERE

As horas in itinere correspondem ao tempo despendido pelo trabalhador entre a sua residência e o local de trabalho. Tal lapso de tempo só é computado como de efetivo serviço quando o estabelecimento da empresa situa-se em local de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. (CAIRO JUNIOR, 2017)

Para Cairo Junior, devem ser considerados os horários de início e término da jornada, como se vê:

Inclusive, devem ser considerados os horários de início e de término da jornada de trabalho para aferição do direito à jornada de trajeto, requisito denominado pela jurisprudência de compatibilidade de horário. Por exemplo, se o empregado inicia sua jornada as 04:00 e o transporte público só começa a funcionar as 5:00, considera-se corio inexistente. Portanto, é necessária a ocorrência de um desses requisitos: local de difícil acesso ou ausência de transporte público regular: Entende-se que, em regra, os locais de difícil acesso não possuem transporte público regular. Então, um requisito seria consequência do outro. (CAIRO JUNIOR, 2017, p. 622)

Ainda, segundo o autor, caso o local seja de difícil acesso, mas seja servido de transporte público, esse direito seria afastado:

Entretanto, se o local é de difícil acesso, mas é servido por transporte público regular e em horários compatíveis (algo muito difícil de acontecer), essa circunstância afasta o direito ao cômputo das horas de trajeto. De igual forma, se o local é de fácil acesso, mas não é servido por transporte público regular, não há como levar em consideração as horas in itinere. (CAIRO JUNIOR, 2017, p. 622)

O art. 4º da CLT considera como tempo de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.

Dando interpretação extensiva a tal dispositivo consolidado, o TST editou as Súmulas 90, 320 e 324, que disciplinam as hipóteses em que são devidas horas in itinere, que correspondem ao tempo que o empregado gasta para sair de sua residência e chegar ao local de trabalho de difícil acesso e vice-versa. (LEITE, 2017)

Vê-se, pois, que a contagem do tempo de serviço não fica adstrita à efetiva prestação do trabalho. Basta que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens ou, ainda, por construção jurisprudencial, durante o tempo de deslocamento de sua residência para o local de trabalho e vice-versa, quando o percurso é considerado de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. (LEITE, 2017)

A Lei 10.243/2001 acrescentou o § 2.º ao art. 58 da CLT, com a seguinte redação:

O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução.

Com isso, a própria norma legal tornou explícito o reconhecimento das horas in itinere, desde que presentes os requisitos específicos, tal como já estabelecia a Súmula 90 do Tribunal Superior do Trabalho.

Nesse sentido, Delgado leciona a respeito dos requisitos caracterizadores das horas in itinere:

São dois os requisitos, portanto, das chamadas horas itinerantes: em primeiro lugar, que o trabalhador seja transportado por condução fornecida pelo empregador. É óbvio que não elide o requisito em exame a circunstância de o transporte ser efetivado por empresa privada especializada contratada pelo empregador, já que este, indiretamente, é que o está provendo e fornecendo. Aqui também não importa que o transporte seja ofertado pela empresa tomadora de serviços, em casos de terceirização, já que há, evidentemente, ajuste expresso ou tácito nesta direção entre as duas entidades empresariais. O segundo requisito pode consumar-se de modo alternativo (ou — e não e — enfatizam tanto a Súmula 90, I, TST, como o novo art. 58, § 2º, CLT). Ou se exige que o local de trabalho seja de difícil acesso, ou se exige que, pelo menos, o local de trabalho não esteja servido por transporte público regular. (DELGADO, 2017, p. 983)

Ficou confirmada, também aqui, a relevância da jurisprudência perante o Direito como um todo, porquanto muitas vezes acaba precedendo o próprio legislador. Ainda assim, reconhece-se a importância da lei em comento, pois eliminou quaisquer discussões sobre o acerto do entendimento dos tribunais a respeito dessa questão, conferindo-se maior segurança jurídica. Permanecem válidas, ainda, as demais orientações contidas nas sumulas anteriormente citadas.

 

3 HORAS IN ITINERE E A REFORMA TRABALHISTA

O art. 58 da CLT sofreu duas mudanças: foi conferida nova redação ao seu § 2º, por intermédio do art. 1º da Lei n. 13.467/2017; e foi revogado o seu anterior § 3º por meio do art. 5º da mesma Lei n. 13.467/17.

Ambos os preceitos insertos no art. 58 da CLT tratavam das denominadas “horas in itinere“, conforme já visto anteriormente. Dessa maneira, o texto do art. 58 da CLT foi modificado, relativamente aos dispositivos modificados pela Lei da Reforma Trabalhista, como se vê:

Art. 58 § 22 O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. § 32 (Revogado).

Conforme exposto, as mudanças efetivadas no art. 58 da CLT dizem respeito às horas itinerantes (horas in itinere), reguladas tanto pelo texto antigo do § 2º do art. 58 (cuja redação foi modificada pelo art. 1 º da Lei n. 13.467 /2017), como pelo texto antigo do § 3º do mesmo art. 58 – este agora inteiramente revogado pelo art. 5º, I, “a”, da Lei n. 13.467/2017.

Esse tempo que se refere a ida e a volta ao local de trabalho, em que o empregado realmente fica à disposição do empregador em transporte fornecido pelo mesmo, conforme já destacado, fazia parte da jornada de trabalho, desde que observados os requisitos.

Nesse sentido, Romar:

Esta concepção do tempo à disposição do empregador havia sido ampliada com a adoção, primeiro pela jurisprudência e depois pelo legislador, da teoria do tempo in itinere, segundo a qual deveria ser incluída na jornada de trabalho o período em que o empregado está em percurso de casa para o trabalho e, no retorno, do trabalho para casa, quando o local de trabalho fosse de difícil acesso ou não servido por transporte público e, em qualquer caso, o empregador fornecesse a condução. No entanto, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), passou a ser previsto expressamente pelo legislador (art. 58, § 2º, CLT) que o tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. (ROMAR, 2018, p. 356)

Nota-se que essa mudança oferecida pela reforma trabalhista é capaz de modificar consubstancialmente a vida do trabalhador. Importante evidenciar o seguinte posicionamento:

Trata-se de urna óbvia perda para o trabalhador, especialmente aquele situado na área rural – em que as horas in itinere são mais comuns e relevantes -, traduzindo significativa redução de sua duração do trabalho juridicamente reconhecida, além de substancial redução de sua renda salarial. (GODINHO DELGADO; NEVES DELGADO, 2017, p. 122)

Como se vê, o autor considera uma perda evidente para o trabalhador, principalmente os que moram na zona rural, devido à dificuldade de se chegar ao local de trabalho. Ainda, nas palavras de Miessa:

Essa medida é prejudicial aos trabalhadores, pois ainda que levem horas até o local de trabalho, que se encontre em local de; difícil acesso em condução fornecida pelo empregador, o período do deslocamento e o seu retorno não serão considerados tempo à disposição do empregador. (MIESSA, 2018, p. 629)

A maior parte da doutrina trabalhista considera essa mudança prejudicial ao trabalhador, pois foi uma verdadeira retirada de direitos, e isso causa um reflexo direto na renda do mesmo, prejudicando a sua subsistência.

 

CONCLUSÃO

O presente estudo pretendeu esclarecer as modificações realizadas pela reforma trabalhista no instituto das horas in itinere. Tal instituto, previsto na Consolidação das Leis Trabalhistas, nos casos em que o transporte era fornecido pelo empregador, e nos casos em que o local de trabalho era de difícil acesso por parte do empregado, esse tempo despendido pelo mesmo até chegar ao local de trabalho era computado na jornada de trabalho.

No entanto, a reforma trabalhista veio modificar esse senário, aprovada em julho de 2017, alterou a CLT, com promessas de melhoria nos direitos dos trabalhadores. Ademais, no que se refere as horas in itinere, observa-se claramente, que houve a retirada do direito que era demasiadamente importante para alguns trabalhadores, especialmente os trabalhadores rurais.

A reforma trabalhista, conforme visto, suprimiu as horas in itinere da jornada de trabalho. Ou seja, mesmo nas hipóteses anteriormente citadas, o trabalhador não terá o tempo de deslocamento até o local de trabalho computado em sua jornada de trabalho.

Conforme visto no decorrer do estudo, trata-se de uma perda considerável para o trabalhador brasileiro, pois implica a redução de sua remuneração, causando prejuízos no sustento familiar.

Faz-se importante o estudo frequente do tema, visto que a reforma é algo novo no ordenamento jurídico, deve haver a investigação da mudança da lei trabalhista, no caso concreto. Esse estudo serve como um incentivo para a comunidade acadêmica e jurídica para a realização de novos estudos sobre o tema.

 

REFERÊNCIAS

GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Curso de direito do trabalho.11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

ROMAR, Carla Teresa Martins. Direito do Trabalho. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho de Acordo com a Reforma Trabalhista. 14. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

CAIRO JUNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 13. Ed. Salvador: Juspodvim, 2017.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 16. Ed. São Paulo: LTr, 2017.

DELGADO, Mauricio Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no Brasil. São Paulo: LTr, 2017.

CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho. 11. Ed. Salvador: Juspodivm, 2018.

 

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