Sumário: 1- Introdução; 2 – A arbitragem no Brasil – Evolução; 3 –
A Lei nº 9.307/96: Aspectos legais; 4 – A arbitragem e a evolução do Direito
Fundamental; 5 – Conclusões
1. Introdução:
A análise da evolução
histórica e conceitual da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro há de
ser antecedida com a visão da sua prática pelos povos antigos.
Alguns doutrinadores
afirmam ser inútil procurar compreender-se a arbitragem nas civilizações do
passado, em face das diferentes configurações que ela assumia, como via de
solução de conflitos.
Sálvio de Figueiredo
Teixeira[1],
em perfeita síntese, relata o resultado de aprofundado estudo que realizou
sobre a presença da arbitragem em várias ordens jurídicas dos povos antigos.
Eis a sua manifestação:
“Historicamente, a arbitragem se evidenciava nas duas
formas do processo romano agrupadas na ordo judiciorum privatorum: o processo
das legis actiones e o processo per formulas. Em ambas as espécies, que vão
desde as origens históricas de Roma, sob a Realeza (754 a.C.) ao surgimento da
cognitio extraordinária sob Diocleciano (século III d.C.), o mesmo esquema
procedimental arrimava o processo romano: a figura do pretor, preparando a
ação, primeiro mediante o enquadramento na ação da lei e, depois, acrescentando
a elaboração da fórmula, como se vê na exemplificação de Gaio, e, em seguida, o
julgamento por um iudex ou arbiter, que não integrava o corpo funcional romano,
mas era simples particular idôneo, incumbido de julgar, como ocorreu com
Quintiliano, gramático de profissão e inúmeras vezes nomeado arbiter, tanto que
veio a contar, em obra clássica, as experiências do ofício.
Esse arbitramento clássico veio a perder força na medida
em que o Estado romano se publicizava, instaurando a ditadura e depois
assumindo, por longos anos, poder absoluto, em nova relação de forças na
concentração do poder, que os romanos não mais abandonaram até o fim do
Império.
Nesse novo Estado romano, passa a atividade de composição
da lide a ser completamente estatal. Suprime-se o iudex ou arbiter, e as fases
in jure e apud judicem se enfeixam nas mãos do pretor, como detentor da
auctoritas concedida do Imperador – donde a caracterização da cognitio como
extraordinária, isto é, julgamento, pelo Imperador, por intermédio do pretor,
em caráter extraordinário.
Foi nesse contexto, como visto, que surgiu a figura do
juiz como órgão estatal. E com ela a jurisdição em sua feição clássica,
poder-dever de dizer o Direito na solução dos litígios.
A arbitragem, que em Roma se apresentava em sua modalidade
obrigatória, antecedeu, assim, à própria solução estatal jurisdicionalizada.
Com as naturais vicissitudes e variações históricas, veio
ela também a decair importância no Direito europeu-continental, ou civil-law,
persistindo forte a técnica de composição puramente estatal dos conflitos. Mas
subsistiu como técnica, em razoável uso, paralelamente à negociação e à
mediação, no âmbito do common law, o direito anglo-americano – marcado por
profunda influência liberal, fincada no empirismo de Francis Bacon e de juristas
do porte de Blackstone, Madison, Marshall, Holmes e Cardozo, aos quais jamais
seria infensa a utilização de válida forma de solução de litígios, como o
arbitramento -, até chegar aos tempos contemporâneos, em que retoma força e
passa a ser verdadeiro respiradouro da jurisdição estatal, como observou com a
acuidade de sempre Sidnei Agostinho Beneti, para quem “a arbitragem vem
sendo largamente utilizada no âmbito do comércio internacional, que dela
atualmente não poderia prescindir ’em sua modalidade contratual, à vista da
inexistência de jurisdição estatal que sobrepaire sobre as relações
internacionais’, experimentando-se desenvolvimento extraordinário do instituto
no âmbito interno de cada país.[2]
Nesse sentido as experiências de utilização da arbitragem
nos Estados Unidos, bem relatadas em coletânea de estudos especialmente a ela
destinados pelo The Justice System Journal (1991, vol. 14, pág. 2,), a exibir
as várias formas de arbitramento, inclusive as denominadas Court-Annexed
Arbitration e Court Ordered Arbitration, vale dizer, com determinação judicial
de uso do arbitramento, realizada pela própria Corte, em substituição ao
próprio julgamento.[3]
Daí, o rental judge (‘juiz de aluguel’), a mostrar, segundo o relato
norte-americano, o acerto das partes em torno da submissão do conflito ao
julgamento de cidadão contratualmente investido na função de dirimir-lhes o
conflito – atuando, ao que se noticia, nesses casos, profissionais respeitáveis
do Direito, entre os quais advogados, promotores e juízes aposentados.
Está-se, no âmbito do Direito anglo-americano, no campo da
ADR (Alternative Dispute Resolution), isto é, mecanismos paraestatais de
solução de controvérsias jurídicas ou, se se quiser o encaixe na pura doutrina
processual de filiação peninsular, mecanismos paraestatais de composição da
lide, já se falando até mesmo na substituição da expressão ‘meios alternativos
de soluções de conflitos’ por ‘meios propícios a soluções de conflitos’.[4]
Pedro A. Batista Martins[5],
em exame também valioso sobre a prática da arbitragem no passado pelos povos
antigos, afirma que ela foi “utilizada pelos povos desde a mais remota
antigüidade, quando a desconfiança recíproca e as diferenças de raça e religião
tornavam precárias as relações entre os povos.”
Do estudo que efetuou
sobre a evolução histórica da arbitragem, firmou a convicção de que a
arbitragem é um instituto que existiu e produziu efeitos mesmo antes que
surgisse o legislador e o juiz estatal.
O referido autor
identifica a presença da arbitragem, nos séculos pretéritos:
a) na Grécia antiga, em face de ter constatado que o “tratado
firmado entre Espanha e Atenas, em 455 a. C., já continha cláusula compromissória,
o que evidencia a utilização desse instituto por aquele povo e, também, a sua
eficácia como meio de solução pacífica dos conflitos de interesse”;[6]
b) na Roma antiga, em razão do sistema adotado de se
estimular o “iudicium privatum-judez” (lista de nomes de cidadãos idôneos),
cujo objetivo era de solucionar, em campo não judicial, os litígios entre os
cidadãos;
c) nas relações comerciais assumidas durante o Séc. XI, pela
posição dos comerciantes em resolver os seus conflitos fora dos tribunais, com
base nos usos e nos costumes.
O autor observa, ainda,
que a arbitragem não foi muito considerada durante o transcorrer dos séculos
XVI e XVII, tendo, porém, retomado o seu prestígio no século XVIII, para ,
finalmente, ter sofrido restrições no curso do Século XIX, por haver assumido,
em decorrência das reformas legais instituídas por Napoleão, forma
burocratizada exagerada.
Pedro A. Batista Martins,
concluindo essa parte dos seus estudos sobre o tema, afirma:
“Contudo, já no final do século XIX o interesse pela
arbitragem é renovado, e sua utilização plenamente revigorada no século XX, com
a ratificação de tratados sobre a matéria e a inserção do instituto na grande
maioria dos sistemas jurídicos nacionais.”[7]
Na era contemporânea, a
arbitragem é instituto utilizado, com êxito, em vários países.
Na Argentina, em
decorrência da vigência da Lei nº 24.573, há o estabelecimento da exigência da
mediação, em caráter obrigatório, antes do ingresso de qualquer ação em sede
civil ou comercial.
Saliente-se que o Código
Processual Civil e Comercial da Argentina, em seus arts. 736 a 773, e os Códigos de
Procedimentos Civil e Comercial de cada uma das Províncias Argentinas prevêem a
arbitragem.
No Paraguai, a arbitragem
está inserida no seu Código de Processo Civil, por via dos arts. 774 a 835.
O Código Geral de
Processo da República Oriental do Uruguai regula a arbitragem nos arts. 472 a 507.
A arbitragem, nos EE.
UU., tem expansão de longo alcance.
José Maria Rossine Garcez[8],
ao analisar as regras de arbitragem do “American Arbitration Association –
AAA”, escreveu (pá. 170, ob. citada, no rodapé):
“A prática da arbitragem se expandiu invulgarmente nos
Estados Unidos graças ao trabalho que desenvolve naquele país a American
Arbitration Association – AAA, que conta com um grupo de mais de 57.000
árbitros e 35 sedes físicas que oferecem a logística adequada para o
desenvolvimento dos procedimentos arbitrais em todos os estados
norte-americanos. A AAA é uma instituição privada, sem fins lucrativos, que
oferece serviços ao público na administração de arbitragens, em que têm sido
predominantes os casos laborais e de responsabilidade civil, além das disputas
em questões internacionais de natureza comercial.
As regras de arbitragem internacional da AAA foram
revisadas e se encontram em vigor desde 1º de março de 1992, dispondo, em 37
artigos, sobre os procedimentos a serem adotados nessas arbitragens.
No preâmbulo, o Regulamento recomenda que as partes que
queiram submeter suas controvérsias às regras administradas pela AAA introduzam
em seus contratos uma cláusula cuja redação indique, simplesmente, que se
aplicam à solução controvérsias deles originadas as International Arbitration
Rules of the America Arbitration Association. As partes, segundo sugere a AAA,
podem ainda acrescentar: a) o número de árbitros que atuarão (um a três); b) o
local onde a arbitragem se realizará (cidade e/ou país); c) a língua em que a
arbitragem será expressada.
Sob as regras da AAA as partes acham-se livres para adotar
qualquer acordo mutuamente aceitável para a indicação futura dos árbitros ou
podem, desde logo, nomear tais árbitros. Podem as partes indicar também que a
controvérsia será resolvida por um árbitro único ou por um tribunal de três ou
mais árbitros, sempre em número ímpar. Elas também podem preferir que a AAA
designe os árbitros, ou que cada parte escolha um árbitro e que estes, entre
si, nomeiem um terceiro, verificando a AAA se o tribunal arbitral assim formado
está conforme as regras aplicáveis. Podem também as partes ajustar que a AAA
submeta a elas uma lista de árbitros, da qual elas retirarão os nomes que lhes
pareçam inaceitáveis, ou, ainda, podem delegar à AAA a escolha dos árbitros,
sem exigir lhes que seja submetida qualquer lista.
De acordo com o art. 2º das Regras da AAA, os
procedimentos da arbitragem começam na data em que o requerimento da parte que
deseja iniciá-lo é recebido pelo administrador da AAA, o qual enviará
comunicado às partes a respeito, dando-lhes ciência deste início. A defesa
deverá então ser apresentada nos 45 dias seguintes. Conforme o art. 15, o
tribunal arbitral tem o poder de decidir sobre a existência ou validade da
Convenção de Arbitragem, ou de determinar sobre a validade do contrato no qual
a cláusula arbitral tenha sido inserida, dispondo ainda tal artigo que as
objeções à arbitrabilidade de uma reclamação devem ser apresentadas num prazo
não superior a 45 dias do início do procedimento arbitral.
No art. 28 encontra-se prevista a regra de que o tribunal
(2) exporá as razões em que se baseia a decisão, exceto se as partes houverem
convencionado que tais razões não devam ser reveladas e (3) somente tornará
pública a decisão arbitral se as partes convencionarem neste sentido ou caso
tal providência resultar da lei.
Conforme o art. 29 (1) o tribunal arbitral aplicará a lei
substantiva que as partes tenham designado para a solução da controvérsia e na
hipótese de não ter sido indicada qualquer lei ou caso o tenha sido feita
imperfeitamente, o tribunal poderá aplicar a lei que julgar conveniente. De
acordo com o mesmo artigo, no numeral 2, nas arbitragens envolvendo contratos o
tribunal decidirá de acordo com os termos do contrato, levando em consideração
a feição dos negócios ao mesmo aplicáveis. O tribunal não decidirá como
compositor amigável (amiable compositeur) ou ex aequo et bono (3) exceto se as
partes assim o autorizem.
Na conformidade do art. 31, dentro de 30 dias da ciência
da decisão, a parte poderá requerer ao tribunal que a interprete ou que corrija
algum defeito decorrente da atividade da secretaria, erro tipográfico ou de
computação, ou que apresente uma decisão aditiva à mesma sobre pontos
requeridos mas não abrangidos pela decisão.”
Demonstrando o alto conceito atual da
arbitragem nos países de maior expressão no planeta, o mesmo autor explicita
(fls. 171 e 172 da obra citada):
“Além da CCI e da AAA diversas outras entidades dedicadas
à organização e administração de arbitragens podem ser citadas, como a London
Court of Arbitration; a Câmara de Comércio de Estocolmo; a Câmara de Comércio
de Tóquio; o Tribunal Arbitral da Bolsa de Comércio de Buenos Aires; a Câmara
de Comércio, Indústria e Produção da República Argentina; o Tribunal Arbitral
do Colégio Público de Advogados de Buenos Aires.
No Brasil se podem contar, dentre outras, a Comissão de
Arbitragem da Associação Comercial do Rio de Janeiro; a Comissão de Arbitragem
da Câmara de Comércio do Paraná; a Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo
(FIESP); a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional de Minas
Gerais e a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá).”[9]4-5
Ao comentar, a seguir, a
decisão da UNCITRAL[10]
que, em 11/12/1985, pela Resolução nº 40/72, em sua Assembléia Geral
na 112ª Reunião, aprovou uma Lei Modelo de Arbitragem[11],
afirmou, ainda, José Maria Rossani Garcez, pág. 172, ob. citada, que:
“Além das Regras sobre Arbitragem antes referidas, a
Uncitral aprovou, pela Resolução nº 40/72, em sua Assembléia Geral
na 112ª Reunião Plenária, de 11 de dezembro de 1985, uma Lei-Modelo de
Arbitragem, preparada em regime de consultas com entidades arbitrais e experts
internacionais da área, com o objetivo de poder ser aceita e adaptada pelos
Estados e assim contribuir para o desenvolvimento harmônico das relações
comerciais e a criação de um framework internacional. A Lei-Modelo, em 36
artigos, se aplica à arbitragem comercial internacional, ficando esclarecido,
em nota de rodapé ao numeral (1) do artigo primeiro, que ao termo ‘comercial’ é
dada uma ampla interpretação, para cobrir todas as relações de natureza
comercial, sejam elas contratuais ou não.
Um estudo levado a efeito pelo Professor Pieter Sanders
(Professor emeritus na Universidade de Rotterdam, artigo constante do vol. II
nº 1 do Arbitration International, LCIA, 1995), registra que o impacto da
Lei-Modelo é tão elevado que praticamente nenhum Estado que tenha modernizado
seu sistema legislativo sobre arbitragem, após a sua edição, teria, inter alia,
deixado de levá-la em consideração. Alguns Estados adotaram a
Lei-Modelo por inteiro, outros se adaptaram a maior parte de suas provisões, de
forma que existem países que podem ser caracterizados como países da Lei-Modelo
(Model Law countries). Uma lista de 14 desses países que adotaram os standards
da Lei-Modelo no período compreendido entre 1986 e 1994 é apresentada nesse
estudo como adiante se reproduz, com registro do ano da adoção: Canadá (1986);
Chipre (1987); Bulgária e Nigéria (1988); Austrália e Hong Kong (1989); Escócia
(1990); Peru (1993); Bermuda, Federação da Rússia, México e Tunísia (1993);
Egito e Ucrânia (1994). Além desses países, oito Estados norte-americanos
adotaram também os padrões da Lei-Modelo: Califórnia, Connecticut, Florida,
Georgia, North Carolina, Ohio, Oregon e Texas.[12]
Até 1995, quando o estudo do Professor Pieter Sanders foi
realizado, 22 países haviam promulgado leis internas sobre arbitragem
adaptando-as, substancialmente, aos padrões da Lei-Modelo.
Uma interessante nota sobre o tema é a de que, embora a
Lei-Modelo haja sido concebida para arbitragens comerciais internacionais, isto
não representa qualquer obstáculo a que os países utilizem seus standards para
arbitragens domésticas. A adoção da Lei-Modelo num padrão idealizado para as
arbitragens internacionais e em outro para as domésticas foi feita pela
Bulgária, México, e Egito. Para o Canadá, este critério também se aplica, mas
somente a nível federal e para a Província de Quebec.
Outra possibilidade é a de que, quando tenham adaptado a
Lei-Modelo, os Estado criem a possibilidade de que as partes optem por seu
regime, mediante ajuste entre elas, em relação às arbitragens domésticas. Isto
atua de forma que se deva reordenar as dispositivos do art. 1º (3) (c) da
Lei-Modelo, que se aplicam à arbitragem internacional. A lei de arbitragem da
Escócia, por exemplo, permite que as partes acordem que a Lei-Modelo possa
aplicar-se, não obstante não se trate de uma arbitragem internacional
comercial. A Nigéria, através do Decreto de 1988 sobre Conciliação e
Arbitragem, mudou a definição “internacional” contida na Lei-Modelo
e, segundo tal mudança, as partes podem expressamente ajustar que, a despeito
da natureza do contrato, a arbitragem seja tratada à feição da arbitragem
internacional.
Ainda uma outra alternativa aplicada em vários países que
adotaram a Lei-Modelo é que as partes possam, contrariamente, optar por
solucionar suas pendências de natureza internacional comercial de acordo com
regras expressamente excludentes da Lei-Modelo, utilizando-se das regras
editadas para as arbitragens domésticas. Na Austrália, que adotou a Lei-Modelo,
podem as partes excluir sua aplicação a tais casos, por escrito. Nas Bermudas,
o Arbitration Act de 1993 contém disposição neste sentido, ainda com maior
detalhamento.”
Essa notícia bem
representa a importância da arbitragem para a solução dos conflitos, o que
justifica o culto que a ela está sendo devotado por quase todas as Nações.
2 – A arbitragem no Brasil – evolução:
A doutrina brasileira
identifica a presença da arbitragem em nosso sistema jurídico desde a época em
que o País estava submetido à colonização portuguesa.
Em ambiente puramente
brasileiro, a arbitragem surgiu, pela primeira vez, na Constituição do Império,
de 22/03/1924, em seu art. 160, ao estabelecer que as partes podiam nomear
juizes–árbitros para solucionar litígios cíveis e que suas decisões seriam
executadas sem recurso, se as partes, no particular, assim, convencionassem.
A CF de 24 de fevereiro
de 1895, a
primeira Carta Republicana, não cuidou de homenagear a arbitragem entre pessoas
privadas. É certo que não deixou de incentivar a sua prática como forma útil
para pacificar conflito com outros Estados soberanos.
A Carta de 16 de julho de
1934 voltou a aceitar a arbitragem, assegurando à União competência para
legislar sobre as regras disciplinadoras do referido instituto.
A Constituição de 1937
não valorizou essa entidade jurídica. A Carta Magna de 1946, de 18 de julho,
também não fez qualquer referência à arbitragem privada, tendo o mesmo
comportamento a Lei Maior de 1967.
A atual CF, de 05/10/88,
referiu-se sobre a arbitragem no art. 4º, § 9º, VII, bem como no art. 114, §
1º.
Saliente-se, contudo, que
a Carta de 1988, no seu preâmbulo,[13]
faz, a nível de princípio fundamental, homenagem à solução dos conflitos por
meio de arbitragem, no pregar a forma pacífica de serem resolvidos, quer na
ordem interna, quer na ordem internacional.
Pedro A. Batista Martins
revela, no artigo já mencionado, que, em âmbito infraconstitucional, a
arbitragem foi, pela primeira vez, introduzida no Brasil, no ano de 1831 e, em
seguida, em 1837, para solucionar litígios relativos à locação de serviços, em
caráter impositivo ou obrigatório; informa, a seguir, que ela foi regulada, em
1850, pelo Decreto nº 737, de 25 de novembro, para ser aplicada em dissídios
existentes entre comerciantes, para ser consagrada no Código Comercial:
“Ainda nesse mesmo ano, o Código Comercial traz em seu
bojo a figura do juízo arbitral e, seguindo a tendência já delineada no
passado, prescreve-o de modo obrigatório às questões (i) resultantes de
contratos de locação mercantil, (ii) suscitadas pelos sócios, entre si, ou com
relação à sociedade, inclusive quanto à liquidação ou partilha, (iii) de
direito marítimo, no que toca a pagamento de salvados e sobre avarias,
repartição ou rateio das avarias grossas e (iv) relacionadas à quebra” (fl.
43).
A arbitragem foi regulada
no Código de Processo Civil de 1939, com reprodução no atual Código de 1973.
Tomou uma nova feição com a Lei nº 9.307/96, a denominada Lei Marco Maciel, por
ter permitido que desenvolvesse a solução dos litígios fora do âmbito do Poder
Judiciário. A atuação deste Poder ficou limitada, apenas, a situações
determinadas para garantir o êxito da arbitragem como solução pacífica dos
conflitos, por meio da mediação, da conciliação e do pronunciamento dos
árbitros, tudo na área privada.
3 – A Lei nº 9.307/96. Aspectos gerais:
No momento contemporâneo,
a arbitragem no Brasil está regulada pela Lei nº 9307, de 23 de setembro do ano
1996, publicada no DOU de 29/09/96. Entrou em vigor 60 (sessenta ) dias depois.
[14]
Há um esforço doutrinário
de larga escala para que esse diploma legal produza efeitos concretos e de alta
intensidade na busca do seu objetivo principal, que é a solução dos conflitos
patrimoniais por vias não judiciais.
A utilização da
arbitragem, no Brasil, está recebendo, em progressão geométrica, preferência de
vários estamentos sociais.
As denominadas Cortes de
Conciliação e Arbitragem, pela eficácia e efetividade demonstrada em suas
atividades, considerando-se seus resultados, têm determinado a criação de um
novo panorama para a solução dos litígios.
Exemplo de grande
significação é o que está ocorrendo no Estado de Goiás.
A 1ª CCA de Goiânia, instalada
em 1996, funcionando na Associação Comercial e Industrial, recebeu até junho de
1998, 3.718 reclamações; a 2ª Câmara de Goiânia, que funciona no Secovi-Goiás,
no mesmo período, 8.036 reclamações; a 3ª, sediada na Sociedade Goiana de
Pecuária e Agricultura, atendeu 344 reclamações.
No Estado de Goiás há,
ainda, Câmaras de Conciliação e Arbitragem instaladas nos Municípios de
Anápolis, Caldas Novas, Catalão.
Segundo dados
estatísticos fornecidos pela Revista Indústria Imobiliária, em dois anos e meio
de atividades, até julho de 1998, nas Cortes instaladas no Estado de Goiás,
foram atendidas mais de 15.000 reclamações.
Convém registrar que as
Cortes de Conciliação e Arbitragem, no Estado de Goiás, foram instaladas com
apoio integral do Poder Judiciário, especialmente, do Des. Lafaiete Silveira,
Presidente do TJ na época, e do Juiz José Arlindo Lacerda.
Considere-se, também, a
defesa que parte da doutrina faz, hoje, da aplicação da arbitragem para
solucionar conflitos trabalhistas.
O Jornal dos Advogados, março
de 99, revelou (pág. 28) os pronunciamentos que a favor da arbitragem, na
Justiça do Trabalho, fizeram ilustres e conceituados doutrinadores.
Os trechos da notícia em
destaque merecem ser transcritos:
“O professor Cássio disse ser muito simpático ‘à idéia da
arbitragem privada, porque: “uma breve análise dos sistemas jurídicos vai
mostrando que, no mundo de nossos dias, nas sociedades mais desenvolvidas, a
legislação é mínima e cabe às próprias partes estabelecerem os métodos de
solução dos conflitos. Na área trabalhista, a negociação, atualmente, está
desempenhando um papel preponderante, e a competência da Justiça do Trabalho
nesses países, quando ela existe, se limita aos conflitos de Direito, porque se
acredita que os juízes estão mais preparados para resolver conflitos
decorrentes de interpretação e aplicação da Lei aos casos concretos do que
questões que são, na verdade, estranhas ao Direito, como salário,
produtividade, conjuntura econômica etc.’.
Para ele, nessas sociedades mais desenvolvidas, há uma
consciência clara de que as regras jurídicas não são mais um solução
satisfatória para os conflitos sociais, que são resolvidos pelas próprias
partes envolvidas. Já, nas sociedades menos desenvolvidas há uma predominância
quase absoluta da lei. O campo de negociação é mínimo e a solução do conflito
cabe ao Judiciário, como acontece no Brasil. Esse esquema, segundo o referido
professor, não corresponde à atual dinâmica das relações de trabalho. Cássio
afirmou que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) vem, há tempos,
recomendando a adoção, nos casos de conflitos trabalhistas, da conciliação, da
mediação e da arbitragem em vez da justiça pública. No Brasil, os conflitos
coletivos de trabalho continuam sendo resolvidos pelo Judiciário, gerando perplexidade
nos países desenvolvidos. A busca de soluções, em nosso País,
conduziu ao estímulo para as negociações coletivas de trabalho, com a presença
do mediador. O conciliador e o mediador, na prática, continuam exercendo as
mesmas funções.
A arbitragem, que é privada e facultativa, segundo a
Constituição, afirma: frustradas as negociações coletivas, as partes poderão
eleger árbitros e, não alcançando essa conciliação, poderão instaurar o
dissídio coletivo. “A nosso ver, parte considerável do processo civil e
todo o Direito Comercial pode ser resolvida por meio da arbitragem que, por ser
privada, tem inúmeras vantagens. A questão é saber se a Lei nº 9.307/96 , como
ela está, é aplicável ao Direito do Trabalho?” Perguntou o professor. Ele
se disse favorável a essa aplicação, citando o exemplo espanhol, que já inclui
a possibilidade de existência da arbitragem, em caso de conflito, quando da
celebração dos contratos de trabalho.
O segundo expositor foi o Professor Renato Rua, que também
é advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Rua fez um histórico dos
princípios do Direito do Trabalho, iniciando pela Revolução Francesa e indo até
a Comuna de Paris, passando pelo “Manifesto Comunista”, de Marx e Engels, até o
fortalecimento dos sindicatos, principalmente após a 2a. Guerra
Mundial e, finalmente, a atual globalização da Economia. Tudo isso , para
chegar à atual primeira preocupação dos trabalhadores, que é a manutenção do
emprego e a flexibilização das normas trabalhistas. Ele disse que existem duas
vertentes, atualmente, para solucionar os conflitos trabalhistas: uma é a
jurisdicional, por meio da Justiça do Trabalho; a outra é o entendimento entre
as partes, por meio de conciliação, mediação ou arbitragem. Segundo o professor
Rua, a conciliação pode se dar por duas maneiras: negociação direta ou atuação
de um conciliador, que vai aproximar as partes. Não resolvido o conflito pela
conciliação, se estabelece o mediador, que vai apresentar uma proposta. Ainda
desta vez, não se conseguindo um acordo, vem a solução da arbitragem, por meio
de um laudo arbitral.”
Mais adiante, o
articulista registra:
“O terceiro expositor; professor Octávio Bueno Magano, que
começou sua explanação com um poema de Camões, para ilustrar o tempo excessivo
para que um trabalhador receba o veredicto de seu litígio trabalhista, disse
que, para haver solução para esse problema, existiriam dois caminhos: a adoção
da Súmula Vinculante ou a arbitragem. No caso da Súmula Vinculante, ele
considera essa saída inconstitucional, pois o Judiciário estaria usurpando
‘poderes’ do Legislativo. Restando, assim, a arbitragem. Para Magano, a
arbitragem não deve ser confundida com o arbitramento. Arbitragem é a decisão,
a respeito de um litígio, tomada por pessoa ou pessoas, que hajam sido
escolhidas pelos litigantes, enquanto arbitramento é a fixação de valores de
determinado litígio, realizado por perito. A arbitragem tem três momentos bem
distintos: a cláusula compromissória; o compromisso; e o laudo arbitral. Ela
pode ser voluntária ou compulsória. Nos Estados Unidos existem entidades
especializadas em arbitragem e os contratos de trabalho prevendo que, em caso
de litígio, haverá a atuação de uma delas.
O Professor falou dos empecilhos que existiam para a
adoção da arbitragem no Brasil, um deles era o costume brasileiro querer uma
solução governamental para todo e qualquer problema, o outro era a falta de
força coercitiva do laudo do árbitro que, para se tornar obrigatório, tinha de
ser homologado, não valendo como título executório e, de qualquer forma,
sujeito a recurso. Para ele, essas inconveniências foram sanadas pela Lei nº
9.307/96, que dispôs que cláusula compromissória vale como compromisso. Outro
tópico que precisa ser registrado é que o laudo dispensa homologação e não cabe
recurso. Magano discutiu, ainda, a constitucionalidade da aplicação da
arbitragem no campo trabalhista, dizendo que, se foi objeto de convenção ou
acordo coletivo, ela pode ser utilizada.”
Cláudio Viana de Lima, em
artigo publicado no Jornal do Comércio – RJ, de 29/05/98, noticia que a Medida
Provisória nº 1.619/42, de 13/03/98 (DOU de 14/03/98), que dispõe sobre a
participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa,
regulamentando o art. 7º, XI, da CF, assegurou, em seu art. 4º, a prática da
arbitragem. Transcrevo o comentário do autor: “ A Medida Provisória nº 1.619,
de 13.03.98 (DOU de 14/03/98, pág. 3), “dispõe sobre a participação dos
trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa e dá outras providências”,
convalidando os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.619-41, de
12/02/98 e a revogando. É regulamentação do art. 7º, XI, da Constituição
Federal. Deseja-se focalizar, neste texto, o art. 4º da Medida Provisória
referida, que vem sendo reproduzido das antecedentes. Está assim escrito: “Art.
4º: Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da
empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes
mecanismos de solução do litígio: I. mediação – II. arbitragem de ofertas
finais.” O artigo define em seu § 1º: “Considera-se arbitragem de ofertas
finais aquela em que o árbitro deve restringir-se a optar pela proposta
apresentada, em caráter definitivo, por uma das partes.” Dispõe mais, o art.
4º, em exame, sobre a liberdade de escolha (por comum acordo entre as partes)
do mediador ou do árbitro (§ 2º), a inadmissibilidade da desistência unilateral
de qualquer das partes (§ 3º) e a força normativa , independentemente de
homologação judicial, do laudo dos árbitros (§ 4º).”
Abre-se, portanto, na lei
uma oportunidade para que os litígios decorrentes da participação dos
trabalhadores nos lucros das empresas sejam resolvidos por meio da arbitragem.
4 – A arbitragem e a evolução do direito fundamental
Em artigo anterior que
escrevi sobre o tema, denominado “Arbitragem: um direito da cidadania”, afirmei
o que transcrevo:
“O Direito Processual Civil , no
decorrer dos últimos cem anos, alcançou o seu apogeu científico, especialmente,
neste final de Século. Não se pode deixar sem reconhecimento a fortaleza dos
princípios que o regem, tudo em decorrência dos resultados obtidos pelas
investigações científicas na busca de encontrar a melhor estrutura para o seu
funcionamento.
Estarrecedor , porém, é a
constatação , especialmente, no Brasil, de um fato que causa profundas preocupações
ao jurista. Tal se caracteriza pelo retrato de que quanto mais avançou a
Ciência do Direito Processual mais ela se afastou dos anseios do cidadão. O seu
envolvimento com princípios burocráticos levou-a a se afastar da adoção de uma
metodologia de caráter gerencial e com resultados compatíveis com as reais
necessidades de urgência impostas pelo mundo contemporâneo no referente a
solução dos conflitos.
O Direito Processual Civil , na
verdade, esqueceu-se de que ele é instrumento para servir ao cidadão na busca
de se identificar com a paz. É apenas caminho e que necessita ser trilhado com
segurança e rapidez.
As idéias de Noberto Bobbio não
chamaram atenção desse campo do direito formal. O seu apego aos rigores da
Ciência, o que se justifica pela necessidade de sua afirmação, afastou a sua
preocupação de que, neste final de Século XX, o jurista há de se preocupar, de
modo intenso, com o respeito aos direitos do homem.
Considere-se, em razão do afirmado,
o registro de que Noberto Bobbio, na obra intitulada “A Era dos
Direitos”, Tradução de Carlos Nelson Coutinho, observa com absoluta
precisão, por dominar inteiramente o campo explorado pela sua inteligência, que
o homem do mundo atual está a exigir maior consciência da justiça, por
aumentarem as situações em que os Direitos dos Homens são desrespeitados.
As novas dimensões do direito que
são perseguidas por Noberto Bobbio, na obra referida, foram examinadas pelo
Professor Vicente Barreto, da Universidade Gama Filho e da UERJ, em campo de
filosofia política, em artigo publicado no Caderno/Idéias, pelo Jornal do
Brasil de 21/03/92, de onde destaco a afirmação de que:
“A leitura do livro do
professor Bobbio permite que se possa redimensionar o significado e a
abrangência dos direitos fundamentais da pessoa humana, passados mais de 200
anos das primeiras declarações de direitos do homem e do cidadão. Nesses dois
séculos, ocorreu um processo de explicitação de valores morais da humanidade,
que para Bobbio faz com que o atual debate sobre os direitos do homem possa ser
interpretado como um “sinal premonitório” desse progresso moral.
Bobbio sustenta que, independentemente da discussão sobre o que se entende por
moral, houve na doutrina dos direitos do homem uma grande evolução, ainda que
submetida a negações e limitações.”
A leitura vagarosa da obra de Bobbio
revela, o que é bem destacado por Vicente Barreto, no artigo já citado, que a
palavra “direitos” vem sendo usada somente com o efeito de se
atribuir dignidade a ideais que, na prática, não são respeitados. Suficiente
para se confirmar quanto irrepreensível é essa afirmação, basta ver o quadro
levantado por Vicente Barreto, no curso do artigo citado, de Países que,
atualmente, se encontram desrespeitando flagrantemente os direitos humanos.
A arbitragem, como meio processual
para a solução dos conflitos, sem a presença do Poder Judiciário, visa
consolidar os anseios daqueles que estão insatisfeitos com a demora na entrega
da prestação jurisdicional, não só porque contribui para aumentar o grau de
discórdia com o seu semelhante, mas, também, pelo fato de lhe ser negado o
direito constitucional de ver o seu direito reconhecido em tempo razoável de
ser possível o seu gozo e a sua fruição.
Tenho que a arbitragem é um direito
processual de quarta geração. Ele se contrapõe aos sistemas até então adotados
para solução de conflitos, onde a presença do Poder Judiciário era considerada
indispensável.
O Direito Processual de primeira
geração caracteriza-se pelo profundo apego ao formalismo, com regras inspiradas
em aumentar o grau da segurança jurídica, porém, possibilitadoras de manobras
processuais que favoreciam, especialmente, ao litigante de maior poder
aquisitivo e que tinha interesse em fazer demorar o resultado da demanda.
O Direito Processual de segunda
geração é representado pelo sistema que tentou, embora não tenha conseguido,
romper com a burocracia processual. O seu mérito consiste em ter abolido
determinadas formalidades processuais inúteis e ter consagrada a figura do Juiz
ativo, isto é, comprometido com o apanhado das provas e com a justiça da
decisão.
O Direito Processual de terceira
geração é o que enfatiza a necessidade de se prestigiar as ações coletivas,
especialmente, na proteção dos direitos difusos, estes voltados à proteção do
meio ambiente, paisagístico, do consumidor, etc.
Por fim, vive-se, na época
contemporânea, o Direito Processual de quarta geração, onde a arbitragem se
situa. É a utilização de um instrumento voltado para a solução dos litígios sem
a presença obrigatória do Poder Judiciário. É a própria sociedade, de modo
organizado, aplicando o direito , utilizando-se das associações que a compõem.
É uma nova era do Direito Processual que necessita evoluir até alcançar os
denominados Tribunais de Vizinhança. É a busca de intensificação de outros meios
de acesso do cidadão ao encontro da Justiça, por essa reivindicação se
constituir em um direito constitucional de natureza subjetiva.
Em “ACESSO À JUSTIÇA – DIREITO CONSTITUCIONAL DO CIDADÃO”,
de minha autoria, escrevi:
“Cristaliza-se, no âmbito do moderno Direito
Constitucional, a idéia de que o acesso à Justiça pelo cidadão se constitui um
direito fundamental a ser protegido pelo Estado.
Fiel a essa evolução garantidora da cidadania, a nossa
Carta Magna de 1988, seguindo tradição anterior, consagrou o acesso à Justiça,
com esse teor axiológico, de modo explícito, ao determinar que “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”
(art. 5º, XXXV) e que “O Estado prestará assistência jurídica integral e
gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (art. 5º, LXXIV).
O final do Século XX tem revelado uma constante
preocupação da comunidade jurídica com o direito do cidadão de buscar, no
âmbito do Poder Judiciário, a solução para a entrega rápida da prestação
jurisdicional, hoje erigida, em nosso ordenamento legal, como direito
substancial de caráter individual ou coletivo. A eficácia da prestação
jurisdicional, ao lado da rapidez, tem sido, também, uma garantia do cidadão
que se consagra como de natureza elevada no corpo de qualquer Carta Magna.
O legislador ordinário, preocupado em aprimorar o acesso à
Justiça, pela constante reivindicação que em tal sentido é feita pela
sociedade, tem criado ambiente de proteção à exeqüibilidade desse direito
fundamental. Destaque merece, no particular, a conduta legislativa posta, como
princípio, nos artigos 2º e 9º, da Lei nº 7.244/84 e nos artigos 5º, IV e 6º,
VII, da Lei nº 8.078/90, visando facilitar o ingresso das partes na via
judiciária e a rápida solução dos litígios.
O denominado direito constitucional à jurisdição tem sido
defendido, no campo doutrinário, como sendo o mais “fundamental das
obrigações estatais, cujo relevo é inconteste para que o indivíduo veja
garantidos todos os seus direitos reconhecidos normativamente”.
Essa a razão pela qual a doutrina contemporânea tem se
preocupado, com forte intensidade, em abordar o tema e a difundir as idéias
construídas a respeito, no sentido de sensibilizar o Estado para o cumprimento
dessa suprema garantia do direito do cidadão.
Releva notar que a publicação de “Acess to Justice,
Milão, Giuffré, 1978, em seis volumes, da autoria de Mauro Cappelletti e
outros, representa um marco inovador na abordagem do assunto, a se considerar a
mensagem fixada na obra de serem estabelecidas regras jurídicas, a partir da
Constituição Federal de cada Nação, que contenham real efetividade no garantir
o acesso à Justiça.
Não se pode deixar de registrar que o tema já tinha sido
tratado por outros autores. Não obstante o valor das idéias plantadas e as reivindicações
apresentadas para se buscar um aperfeiçoamento no tocante ao ingresso do
jurisdicionado à Justiça, tenho que, só a partir dos últimos três decênios
deste século, com o aumento da preocupação das Constituições Modernas com o
cidadão, é que se formou uma conscientização metodológica sobre tal direito.
Nas meditações de Carmen Lúcia Antunes, a garantia do
alcance aos órgãos jurisdicionais tem merecido uma abordagem constante, o que a
levou a afirmar, com absoluta propriedade que “O primeiro passo para que a
jurisdição seja um direito vivo é a garantia plena, facilitada e desembaraçada
do acesso de todos aos órgãos competentes para prestá-la. A jurisdição é
direito de todos e dever do Estado, à maneira de outros serviços públicos que
neste final de século se tornaram obrigação positiva de prestação afirmativa
necessária da pessoa estatal. A sua negativa ou a sua oferta insuficiente
quanto ao objeto da prestação ou ao tempo de seu desempenho é descumprimento do
dever positivo de que se não pode escusar a pessoa estatal, acarretando a sua
responsabilidade integral.”
Inspirado em tais
ensinamentos, ouso firmar o entendimento de que qualquer dificuldade imposta
pelo Estado ou surgida de sua atuação ineficiente no campo da entrega da
prestação jurisdicional, quer ocorra no momento inicial do acesso à Justiça,
quer ocorra na demora em decidir a causa, desde que ocasione dano ao
jurisdicionado, gera responsabilidade civil.
O Estado, na época
contemporânea, não pode amesquinhar a natureza da função jurisdicional.
Consciente dessa realidade, afirmei, no ano de 1983, em trabalho identificado
na nota abaixo[15],
que “Não há, portanto, que se polemizar, na atualidade, sobre a
responsabilidade potencializada do Estado em assegurar aos indivíduos as
condições necessárias para a consecução do bem comum.
Para tanto, entre outras
atividades que desenvolve, há de ser elencada a de entregar a prestação
jurisdicional dentro dos prazos e limites que o sistema jurídico positivo
instituiu. No particular, destaque-se que tal dever surge como conseqüência do
princípio da legalidade, dogma a que está vinculada toda a ação estatal, por
ser certo o axioma de direito de que a lei deve ser suportada, em primeiro
plano, por aquele que a fez. Sendo a lei uma regra de conduta genérica oriunda
do Estado, a este cabe o dever do seu integral cumprimento.”
Mais adiante, no mesmo
trabalho, acrescentei:
“A essência da atividade jurisdicional é ‘aplicar
contenciosamente a lei a casos particulares”, no dizer conhecido de Pedro
Lessa. Acrescento, apenas: visando estabilizar o conflito através de uma
solução de efeito pacificador. No contexto do que seja bem comum, não é
possível afastar a exigência de uma convivência pacífica entre os indivíduos,
situação a que o Estado está obrigado a garantir, quer aplicando fisicamente a
lei, em o contraditório jurisdicional, função do Executivo, quer
contenciosamente, modo pelo qual atua o Poder Judiciário.’
Mário Carlos Velloso, Ministro do Supremo Tribunal
Federal, no trabalho “Princípios Constitucionais do Processo”,
escrito em memória do Ministro Carlos Coqueijo Torreão Costa, enfatiza que
“Mauro Cappelletti e B. Garth acentuam que os países ocidentais têm-se não
só se esforçado no sentido de afastar os óbices ao acesso à Justiça, como,
também, procurado estimular esse acesso, proporcionando, principalmente,
serviços jurídicos para os necessitados que, ‘na maior parte das modernas
sociedades, o auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para
decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos, necessários
para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária
àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais.” (Em nota de pé de
página registra a fonte da citação: “Cappelletti, Mauro, Garth, B. Acesso
à Justiça. Trad. de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1988,
pág. 31-32).
Ao Estado não é permitido criar nenhuma barreira que
dificulte o trânsito do cidadão ao Judiciário. Deve facilitar a atividade
daqueles que procuram o órgão julgador, considerado, na atualidade, como a
última trincheira a ser ocupada para que se possa , com o uso dos instrumentos
que a compõem, solucionar os ataques aos direitos individuais e coletivos.
A garantia desse direito se constitui em forma expressiva
de se valorizar a cidadania, fato que, em todas as civilizações, está sendo
reconhecido como uma das grandes conquistas em benefício do homem a ser
cultivada, de modo profundo, no próximo Século XXI.
Os fluidos dessas idéias levaram a Convenção Européia para
Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais a reconhecer, de modo
explícito, no texto do art. 6º, § 1º, que a Justiça que não cumpre suas funções
dentro de um prazo razoável é, para muitas pessoas, uma justiça inacessível.”
A arbitragem busca valorizar o princípio constitucional
acima destacado. Ela, na atualidade brasileira, de acordo com o que dispõe a
Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, preenche vazio cultural jurídico até
então existente em nosso sistema processual. Caracteriza-se como instrumento
processual constituído de princípios que se harmonizam com as exigências de
desenvolvimento econômico, financeiro e social presentes neste final de Século
XX, onde o tempo passou a ser fator considerado na realização dos negócios por
exercer influência positiva ou negativa em seus resultados.
Dada a sua importância no cenário institucional
processual, há de ser cultuada com intensa profundidade, a fim de se firmar uma
cultura que leve os variados setores da sociedade a aceitá-la e nela confiar.
Com absoluta razão, a respeito da necessidade de ser
criada uma cultura da arbitragem no País, as observações feitas por Cláudio
Vianna de Lima,[16]
em artigo publicado no Correio Braziliense, Caderno “Direito & Justiça”, de
27 de julho de 1998, no sentido de que:
“Até o advento da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, a arbitragem foi,
notoriamente, maltratada pelo Direito Positivo no Brasil. A conseqüência é a
falta de uma prática do instituto e de uma “cultura arbitral” em nosso país.
Não se acredita na arbitragem. Só se admite a justiça feita pelo Estado, nada
obstante a crise universal, do Judiciário, a delonga das decisões judiciais, a
injustiça manifesta que representam as decisões retardadas, a conseqüente
inocuidade, na maioria das vezes, dessas sentenças e a impunidade freqüente de
infrações penais.
Os ensinamentos colhidos no exterior sinalizam na direção
de uma pesada campanha de marketing para mudanças de mentalidade geral e
garantia de que, com a nova lei, se vá, efetivamente, alcançar a série de benéficos
efeitos de arbitragem, à semelhança de outros países.
Assim, foi recomendado em recente encontro em Barcelona
(designado Euramer), promovido pela Associação Ibero-Americana de Câmaras (ou
associações) Comerciais – AICO, e se instituiu em encontros preparatórios e no
próprio Congresso da Comissão Interamericana de Arbitragem Comercial – CIAC,
organizado pela Associação Comercial do Rio de Janeiro, em maio de 1997.”
O fortalecimento da arbitragem, no Brasil, depende,
unicamente, ao meu entender, da formação de uma cultura para a sua prática.
Para tanto, há necessidade da divulgação dos propósitos da Lei nº 9.307, de 23
de setembro de 1996, enfatizando-se os seus princípios e regras nas
Universidades, nos Sindicatos, nas Associações Comerciais, nas Associações de
Bairros e demais órgãos públicos e privados da sociedade.
Há, também, de se educar a população para o atual estágio
da denominada entrega da prestação jurisdicional, quando não mais se constitui
privilégio absoluto do Estado a responsabilidade pelo seu manejo.
Há de se ter em consideração que os direitos e garantias
fundamentais vistos na era contemporânea não podem receber interpretação
idêntica a que se fazia em épocas passadas. Vivencia-se, na atualidade, uma
transformação do modelo até então adotado para o Estado, buscando-se novas
estruturas para o seu funcionamento .
O juízo arbitral, na forma concebida pela Lei nº 9.307, de
23 de setembro de 1996, não vai de encontro aos princípios da jurisdição única
ou da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), da essencialidade do
juiz natural, com banimento do Juízo ou Tribunal de Exceção (CF, art. 5º,
XXXVII ) e da ampla defesa (CF, art. 5º, LIV e LV).
Tais direitos e garantias são fundamentais para o cidadão
. Eles continuam sendo respeitados pela arbitragem em sua total integridade,
haja vista que ela é, apenas, caminho encontrado, com apoio na lei, pela
vontade das partes, expressando com liberdade o seu querer, de solucionar os
conflitos.
Não se pode deixar sem consideração que a solução dos
conflitos é o objetivo maior a ser alcançado pelo Estado Brasileiro, conforme
disposto está no Preâmbulo da Constituição Federal de 1988, ao assim dispor:
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e contemporânea, na ordem interna e internacional,
com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus,
a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”
Ora, no preâmbulo da Constituição Federal de 1988, está a
síntese dos objetivos fundamentais a serem alcançados pelo Estado Brasileiro,
entre eles o de proporcionar aos administrados uma convivência baseada na
harmonia social e na solução pacífica das controvérsias. Evidente que, em face de
tal posicionamento do constituinte brasileiro, não se confiou, de modo
exclusivo, ao Poder Judiciário, a entrega da prestação jurisdicional.
O art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, ao dispor que “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” não
invalida o disposto no art. 1º, da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, ao
determinar que “ As pessoas capazes de contratar poderão valer-se de arbitragem
para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.” No dispositivo
em apreço há uma faculdade outorgada ao cidadão capaz de contratar e de dispor
a respeito do seu patrimônio. Não consta qualquer impedimento do litígio deixar
de ser apreciado pelo Poder Judiciário.
O artigo comentado respeita, conseqüentemente, a manifestação
da vontade do cidadão, valorizando a sua dignidade humana, em face do que
dispõe o art. 1º, incisos II e III, da Constituição Federal, cuja redação
transcrevo:
“Art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela
união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se
em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:
I – …………….;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – ……………;
V – o pluralismo político.”
A solução dos conflitos por meios alternativos
processuais, como é o caso da arbitragem, que atua, apenas, no campo
patrimonial, constitui, portanto, um direito subjetivo fundamental do cidadão e
que merece o apoio de toda a comunidade jurídica. Esse entendimento decorre da interpretação
sistêmica da Constituição Federal, quando vincula-se à mensagem contida em seu
preâmbulo, na parte que prega a harmonia social e a solução pacífica dos
conflitos, com os arts. 1º, II e III, e 5º, inciso XXXV, da mesma Carta Magna.
Há plena liberdade do homem, em situação de conflito
patrimonial, optar pela solução via arbitragem. Esta, por sua vez, se ofender,
na sua prática, a quaisquer princípios garantidores dos direitos e garantias
fundamentais do indivíduo, poderá ser anulada, pela via do Poder Judiciário,
conforme dispõe o art. 33, da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.
A arbitragem, na forma instituída no Brasil, atende,
conseqüentemente, aos propósitos fundamentais veiculados na Carta Magna e se
aproxima dos anseios do povo de conviver com uma justiça rápida, segura,
desburocratizada e de fácil acesso, especialmente, por não exigir maiores
despesas financeiras.”
A minha convicção cada
vez mais está fortalecida pela necessidade de se fazer aplicar, no Brasil, a
arbitragem como meio de solução dos litígios, expandindo-a para o âmbito das
controvérsias trabalhistas. Há necessidade, porém, que o Estado estimule a
criação de órgãos arbitrais, facilitando o seu funcionamento e criando
condições materiais para que cumpram a missão a que estão destinados.
5 – Conclusões:
Formulo, finalmente,
alguns enunciados que, no trato do tema arbitragem, merecem ser sempre
considerados, para que bem possa se compreender a sua evolução histórica e
conceitual, especialmente, a sua estrutura atual no ordenamento jurídico
nacional.
Os enunciados abaixo
registrados são sínteses do que tenho como pacificadas a respeito da arbitragem
no campo doutrinário.
Enunciado 1 – Um tribunal
arbitral nunca age com plena independência perante a justiça estatal, em face
de determinadas medidas estarem reservadas ao Poder Judiciário.
Enunciado 2 – Em regra,
conforme legislação da maioria dos países, o tribunal arbitral não pode expedir
medidas coercitivas. O nosso sistema segue essa linha: ver art. 22, § 4º, da
Lei nº 9.307, de 23/09/96 “… havendo necessidade de medidas coercitivas ou
cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que
seria, originariamente, competente para julgar a causa.”
Enunciado 3 – As partes,
podem, contudo, quando acertarem o procedimento arbitral, permitir a adoção de
medidas cautelares.
Enunciado 4 – A tendência
moderna, em vários países, é seguir a Lei Modelo da United Nations Commission
on International Trade Law (UNCITRAL), de 21/06/1985: Canadá, Chipre,
Austrália, Bulgária, México, Escócia, Federação Russa, Peru, Nigéria, Tunísia,
Hong Kong, Ucrânia, Hungria, Egito, Cingapura e vários Estados dos Estados
Unidos incorporaram a Lei Modelo da UNCITRAL, na sua íntegra ou pelo menos em
grande parte, na sua legislação interna.
Enunciado 5 – A Lei
Modelo da UNCITRAL é aplicável, tão-somente, à arbitragem comercial
internacional. Foi aprovada pela Comissão das Nações Unidas para o Direito
Comercial Internacional, visando maior uniformidade para essa espécie de
arbitragem.
Enunciado 6 – Os mentores
da Lei nº 9.307, de 23/09/96, foram inspirados pelo trabalho elaborado pela
UNCITRAL, sem se deixar de anotar que, também, receberam influências da
Convenção de Nova Iorque de 10/06/1958 sobre o Reconhecimento e a Execução de
Sentenças Arbitrais Estrangeiras, como também a Convenção Interamericana sobre
Arbitragem Comercial Internacional do Panamá de 30/01/1975, conforme anota
Pedro Batista Martins, in Anotações sobre a Arbitragem no Brasil e o Projeto de
Lei do Senado nº 78/92, Revista de Processo, 77;1995, pág. 58-59.
Enunciado 7 – O
reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras, no Brasil,
obedecem às regras seguintes:
– o tema é regulado pelos arts. 34 a 40, da Lei nº 9.307, de
23/09/1996;
– princípios a serem
obedecidos: a) só será reconhecida e executada no Brasil se se apresentar
conforme com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento jurídico
interno; b) na ausência de tratados só se estiverem de acordo com os termos da
Lei nº 9.307, de 23/09/1996;
– ser homologada pelo
Supremo Tribunal Federal;
– a homologação pelo STF
obedece, no que couber, aos arts. 483 e 484, do CPC, e ao regimento Interno
daquela Corte;
– há necessidade de ser
requerida pela parte, em petição (art. 282, do CPC), acompanhada de: a) original
da sentença arbitral ou cópia devidamente certificada, autenticada pelo
consulado brasileiro e acompanhada de tradução oficial; b) – o original da
convenção de arbitragem ou cópia devidamente certificada, acompanhada de
tradução oficial.
Enunciado 8 – A
homologação de sentença estrangeira somente será negada se o réu comprovar :
– a incapacidade das
partes em face do nosso C. Civil ou conforme fixado em tratados;
– invalidade da convenção
da arbitragem segundo a lei à qual as partes a submeteram, ou, na falta de
indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi proferida;
– que não foi notificado
da designação do árbitro ou do procedimento da arbitragem, ou tenha sido
violado o princípio do contraditório, impossibilitando a ampla defesa;
– que a sentença tenha
extrapolado os limites da convenção e haja impossibilidade de se separar a
parte excedente do que foi convencionado ser submetido ao procedimento de
arbitragem;
– a não obrigatoriedade,
ainda, da sentença arbitral, ou que tenha sido anulada ou suspensa por órgão
judicial do país onde a sentença arbitral foi prolatada;
– que o objeto do litígio
não é suscetível de ser resolvido por arbitragem;
– que a decisão ofende a
ordem pública nacional.
Enunciado 9 – Se o vício
formal existente for corrigido, novo pedido de homologação pode ser formulado.
Enunciado 10 – A
Convenção Interamericana. O Dec. Legislativo nº 93/95 (DOU de 23/06/1995, pág.
9197), aprovou o texto da Convenção Interamericana sobre Eficácia
Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros, concluído em
Montevidéu, em 08/05/1970. O texto integral da convenção encontra-se publicado
no Diário do Congresso Nacional (Seção II, de 23/06/1995).
Enunciado 11 – O Decreto
nº 1476/95 (DOU de 03/05/1995, pág. 6153) promulgou o Tratado Relativo à
Cooperação Judiciária e ao Reconhecimento e Execução de Sentenças em Matéria Civil,
entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, de 17/10/1989. O
procedimento para o reconhecimento, homologação e execução da sentença italiana
no Brasil está previsto no Decreto nº 1476/95, arts. 18 a 21.
Enunciado 12 – A
homologação de sentença estrangeira é atividade privativa do STF, sendo via de
expressão da soberania( CF. art. 102, I, h. RISTF, arts. 217 a 224).
Enunciado 13 – A execução
da sentença estrangeira obedece às linhas do art. 484, CPC – A execução
far-se-á por carta de sentença, extraída dos autos da homologação e obedecerá
às regras estabelecidas para a execução da sentença nacional da mesma natureza.
Enunciado 14 – É da
justiça federal comum de primeiro grau a competência para a execução. CF, art.
109, X. Procedimento de homologação no STF. Ver arts. 215 a 224, do RISTF.
Por fim, enumero os
Tratados multilaterais mais importantes sobre a arbitragem privada . São:
1. – Protocolo de Genebra
sobre Cláusulas Arbitrais de 24/09/1923 (Protocolo de Genebra). Ele reconhece a
validade da cláusula compromissória como juridicamente válida quando a
arbitragem for internacional. O Brasil ratificou-o em 22/03/1932, pelo Dec. nº
21.187, de 22/03/1932.
2. – Convenção de Genebra
concernente à Execução de Laudos Arbitrais Estrangeiros de 26/09/1927. Cuidou
da execução de laudos arbitrais estrangeiros e que foram elaborados conforme o
Protocolo de Genebra sobre Cláusulas Arbitrais de 24/09/1923. O Brasil não o
ratificou.
3. – Convenção de Nova
Iorque de 10/06/1958 sobre o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais
Estrangeiras. Elaborada sob o patrocínio das Nações Unidas. Substituiu a
Convenção de Genebra acima noticiada. Mais de cem países de todos os
continentes. É o tratado multilateral mais significativo (Ratificado em
01/01/1995).
4. – A Convenção Européia
sobre Arbitragem Comercial Internacional de 10/04/1961 (Convenção de Genebra de
1961) destinava-se a facilitar o comércio entre os países da Europa Ocidental e
do Leste Europeu.
5. – A Convenção de
Washington de 18/03/1965 para a Solução das Lides concernentes a Investimentos
entre Estados e Nacionais de outros Estados levou à constituição do Centro
Internacional para a Solução das Lides em Relação a Investimentos.
6. – Convenção
Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional do Panamá de 30/01/1975
– ratificada pelo Brasil pelo Dec. nº 1.902, de 09/05/1996.
7. – No Brasil, cumpre
realçar a Convenção de Cooperação Judiciária, em Matéria Civil,
Comercial, Trabalhista e Administrativa, celebrada com a França em 30/01/1981 e
promulgada no país pelo Dec. nº 91.207, de 29/04/1985, aplicável,
expressamente, à sentença arbitral, sendo esse aspecto de suma importância
prática com relação aos laudos proferidos no âmbito da Câmara Internacional do
Comércio de Paris (CCI), quando a sede do tribunal arbitral tem localização
dentro do território da França.
O culto que a doutrina
brasileira promove, na época contemporânea à arbitragem, decorre das transformações
vividas pela cidadania brasileira. A sua consagração como meio alternativo de
solução de conflitos deve ser considerada como passo importante para o
aperfeiçoamento dos direitos do homem na busca de encontrar a paz com a solução
dos seus conflitos.
[1] Sálvio
de Figueiredo Teixeira, in “A arbitragem no Sistema Jurídico Brasileiro”,
trabalho apresentado na obra coletiva “A Arbitragem na Era da Globalização”,
coordenação de José Maria Rossini Garcez, Forense, pág. 25.
[2] O autor
cita, na nota de rodapé de nº 2, o trabalho de Sidnei Agostinho Beneti, de onde
extraiu a referência: “A arbitragem: Panorama e Evolução”, JTACSP, Lex, vol.
138, pág. 6.
[3] Em nota
de rodapé, nº 3, esclarece o autor: “Sobre suas principais características e
sucesso, por todos”, Beneti, ob. cit., págs. 10-11.
[4] Em nota
de rodapé, a de nº 4, o autor esclarece: “Judicial Reform Roundtable II”,
Williamsburg, Va., Estados Unidos, maio, 1996.
[5] Pedro A.
Batista Martins, Prof. de Direito Comercial na Faculdade Cândido Mendes, in
“Arbitragem Através dos Tempos. Obstáculos e Preconceitos à sua Implementação
no Brasil”, artigo publicado na obra coletiva “A arbitragem na Era da
Globalização”, já citada, págs. 35 e segs.
[6] Idem,
pág. 36.
[7] Ibidem,
pág. 37.
[8] José
Maria Rossini Garcez, em trabalho intitulado “Arbitragem Internacional”,
publicado na obra por ele coordenada “A Arbitragem na Era da Globalização”,
Forense, págs. 162 e segs.
[9] José
Maria Rossani Garcez, nas notas de rodapé de nºs 4 e 5, pág. 172, ob. cit.,
explicita: “O Prof. Guido F. S. Silva, na obra acima referida, comenta que a
Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá foi a primeira
entidade tipicamente do gênero criada no Brasil, em 1978, na cidade de São
Paulo, ficando aberta a qualquer pessoa interessada pela solução arbitral de
seus litígios, de ordem interna ou internacional (inclusive, nas relações
comerciais além Canadá).” A seguir, na nota 5: “Ob. cit. pág. 68. O Prof. Guido
Soares acrescenta que os procedimentos arbitrais dessa Câmara fazem lembrar os
mecanismos da CCI, adaptados às exigências à época de nosso Código de Processo
Civil.”
[10]
UNCITRAL – United Nations Comission for International Trade Law (Comissão das
Nações Unidas para a Legislação Comercial Internacional)
[11] Essa
lei modelo é conhecida como LEI-MODELO UNCITRAL.
[12] Em nota
de rodapé, a de nº 7, pág. 173, José Maria Rossani Garcez, in art. já citado,
registra: “O Prof. Pieter Sanders acrescenta em seu estudo que alguns Estados
têm promulgado uma nova lei sobre arbitragem comercial internacional simplesmente
copiando a Lei-Modelo ou seguindo-a em todos os seus termos, enquanto outros a
tem adaptado com maior ou menor modificação. A lei de Chipre de 1987 reproduz
praticamente os 36 artigos da Lei-Modelo, somente rearranjando os seis
primeiros numa maneira diferente. O Estado norte-americano de Connecticut
incorporou integralmente o texto da Lei-Modelo adicionando ao mesmo
simplesmente um artigo, de nº 37, que dispõe: “Esta lei pode ser citada como o
Modelo de Lei da Uncitral sobre arbitragem comercial internacional”.
[13]O
inteiro teor do Preâmbulo da CF: “Nós, representantes do povo brasileiro,
reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir
um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade , a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL.” Significativo o propósito do Constituinte, no preâmbulo,
haver registrado que … “para instituir um Estado democrático … fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias …”
[14] A
história recente registra que a Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, teve
origem no Projeto de Lei do Senado de nº 78, de 1992. Antes, três projetos
tinham sido apresentados e foram arquivados. A aprovação da lei resultou de um
movimento iniciado pela denominada operação Arbiter, comandada pelo Instituto
Liberal de Pernambuco, tudo coordenado pelo Dr. Petrônio Muniz, advogado. O
Projeto em referência foi apresentado pelo então Senador Marco Maciel.
Contribuíram para o aperfeiçoamento do texto da Lei, valiosas sugestões, de
juristas estudiosos do tema, incluindo-se os Drs. Carlos Alberto Camona e Pedro
Batista Martins, bem como, a Dra. Selma M. Ferreira Lemes. O autor do projeto,
na exposição de motivos, esclareceu que a proposta legislativa apresentada
levava em conta diretrizes da comunidade internacional, especialmente as
fixadas pela ONU na Lei-Modelo sobre Arbitragem Comercial Internacional formulada
pela UNCITRAL.
[15]
Responsabilidade do Estado pela Demora na Entrega da Prestação Jurisdicional.
Este trabalho está publicado em várias revistas jurídicas.
[16] Cláudio
Vianna de Lima, Desembargador aposentado do TJ/RN e membro da Comissão de
Arbitragem da Associação Comercial do Rio de Janeiro.
Informações Sobre o Autor
José Augusto Delgado
Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Professor de Direito Público (Administrativo, Tributário e Processual Civil). Professor UFRN (aposentado). Ex-professor da Universidade Católica de Pernambuco. Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário. Sócio Benemérito do Instituto Nacional de Direito Público. Conselheiro Consultivo do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Integrante do Grupo Brasileiro da Sociedade Internacional do Direito Penal Militar e Direito Humanitário. Sócio Honorário do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos.