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A confusa divisão dos royalties do petróleo

Sumário: 1. Da natureza indenizatória dos royalties. 2 Da violação do princípio do direito adquirido. 3 Da possibilidade jurídica de distribuição dos royalties para órgãos da União e demais entidades políticas, ressalvado o montante destinado a indenização dos Municípios e Estados produtores. 4 O critério legal de distribuição dos royalties.

1 Da natureza indenizatória dos royalties

Quando em tramitação o projeto legislativo, que se converteu na Lei nº 12.734/12, em vários artigos que escrevemos  apontávamos para  o equivocado redirecionamento dos royalties (compensação financeira) para os Estados e Municípios não produtores em razão da desconsideração de sua natureza indenizatória,  que decorre do texto do § 1º, do art. 20 da CF, in verbis:

“É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.”

Como se sabe a Lei nº 7.990/89 optou pela instituição de compensação financeira dada a dificuldade de regular a participação no resultado da exploração de recursos naturais.

O montante dos royalties destinados à indenização dos Estados e dos Municípios pelos danos econômicos, sociais e ecológicos causados pela atividade de exploração do petróleo, inclusive, pela instalação terrestre de terminais de embarque e desembarque de óleo bruto, segundo a nova lei é repartido nos mesmo moldes das receitas tributárias da União (IPI e IR) que formam o Fundo de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM). Isso caracteriza o desvio da finalidade prevista na Constituição Federal.

2 Da violação do princípio do direito adquirido

A recente rejeição dos vetos apostos pelo Executivo agravou o problema, pois passou a implementar o novo critério de repartição das receitas de royalties com efeito retroativo, atingindo os contratos de exploração em vigor, comprometendo os planos de ação governamental de longo prazo, elaborados  nas esferas estaduais e municipais, que contaram com esses recursos. Violou-se o princípio do direito adquirido, protegido em nível de cláusula pétrea. As entidades políticas atingidas pela retroação do novo critério de repartição dos royalties deverão rever seus planos governamentais. Não bastasse a perda de arrecadação do ICMS sobre o petróleo produzido em seu território, com o advento da Constituição de 1988 (art. 155, § 2º, X, b da CF), os Estados passarão, também, a ter que repartir com os demais Estados a compensação financeira destinada a ressarcir os danos decorrentes da exploração do petróleo em seu território.

Para a União, os royalties têm natureza de receita patrimonial, porque os recursos naturais explorados são de sua propriedade. Entretanto, para os Estados e os Municípios essas receitas têm classificação na Lei nº 4.320/64, como outras receitas correntes, pois não têm uma classificação legal própria, caindo a vala comum de receitas não específicas. Efetivamente,  esses royalties correspondem à indenização, como sucedâneo de sua participação (Estados e Municípios)  no resultado da exploração do petróleo, alternativa essa prevista no texto constitucional.

3 Da possibilidade jurídica de distribuição dos royalties para órgãos da União e demais entidades políticas, ressalvado o montante destinado a indenização dos Municípios e Estados produtores

Com sucessivas descobertas de novos campos petrolíferos há um crescimento vertiginoso dos royalties que aguçam a cobiça dos entes políticos locais e regionais na repartição desse rico filão antes inexistente, pelo menos em volume tão considerável como na atualidade.

Assim, é compreensível ante o incremento efetivo do volume de produção de petróleo e perspectivas de um aumento ainda maior em face da descoberta do pré-sal que a disputa por esses recursos financeiros decorrentes da extração do petróleo se espalhe no âmbito nacional. Não temos dúvidas de que essa disputa nasceu com a descoberta do pré-sal que tem uma expectativa de produção de petróleo como nunca dantes visto. Tanto é assim que em relação aos royalties propiciados pela exploração de recursos hídricos e minerais não se cogita de alterar o critério em vigor. Entretanto, esses três recursos naturais são submetidos ao mesmíssimo regime previsto no § 1º, do art. 20 da CF no que tange à compensação financeira. A disputa só ocorre na exploração de recursos naturais que propicia receita maior de royalties.

Tendo em vista uma situação conjuntural anormal, em que a exploração do petróleo assumiu, ou está para assumir proporções gigantescas a propiciar aos Estados e Municípios afetados por essa exploração recursos que excedem ao montante das respectivas indenizações, penso que é possível, sem descumprir o preceito constitucional, aventar-se  a redistribuição desses royalties excedentes uma vez reservados os montantes a título de indenização devida aos
Estados e aos Municípios produtores.

Realmente, não é razoável supor que os danos ao meio ambiente, à economia ou a sociedade (regional ou local) são exatamente proporcionais ao volume da produção de óleo bruto. Os dutos de óleos, por exemplo, não causam danos maiores ou menores segundo o exato volume de passagem desses produtos.

Uma vez separado o montante destinado à indenização, o que se fará por meio de critérios técnicos a serem estabelecidos por órgãos competentes, penso que a União, dona da receita, por decorrer da exploração de seu patrimônio, poderá distribuir o excedente aos demais Estados e Municípios e também aos seus próprios órgãos, como prevê a legislação ordinária.

4 O critério legal de distribuição dos royalties

Para distribuição dos royalties do petróleo pode-se utilizar do critério de distribuição das receitas tributárias previsto na Constituição e na LC nº 62/89 que atende a esse propósito. É preciso apenas que em cumprimento à  decisão proferida pelo STF (ADin nº 875 e apensos ns. 2.727, 3.243 e 1.987) o Congresso Nacional aprove novos coeficientes de participação com base no censo de 1990. Os coeficientes em vigor foram declarados inconstitucionais, podendo ser utilizados apenas até o final de 2012, por força do efeito prospectivo conferido à decisão.  


Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.


Equipe Âmbito Jurídico

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