Resumo: Este artigo analisa o instituto do controle social na área do saneamento básico, sob a ótica da política pública. Iniciando com uma abordagem histórica do saneamento no Brasil, desenvolve uma análise do controle social estudando sua inserção na legislação dos Conselhos de Saneamento no âmbito federal e estadual e, por fim oferece subsídios para a criação de interfaces com o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) e o Conselho Nacional de Saúde (CNS). A pesquisa caracterizada como documental valeu-se de documentos, leis, decretos e relatórios. Além disso, foi realizada uma observação simples a reunião para fechamento do relatório final do Grupo Executivo de Saneamento do Fórum Democrático da Assembléia Legislativa do RS. O estudo permitiu concluir pela integração de política e ações com outros setores afins e pela necessidade de uma efetiva participação da sociedade nas decisões do Conselho de Saneamento no Estado do Rio Grande do Sul.
Palavras- Chave: Controle social, políticas públicas, conselho, saneamento básico.
Abstract: This article analyses the institution of social control in the area of sanitation, from the perspective of public policy. Starting with a history of sanitation in Brazil, develops in an analysis of social control studying its inclusion in legislation of the Councils of Reorganization under federal and state, and finally offers subsidies for the creation of interfaces with the National Water Resources Council (CNRH) and the National Health Council (CNS). The survey characterized as a documentary it is worth of documents, laws, decrees and reports. Also, a simple observation was made to close the reunion of the final report of the Group Executive of Sanitation of the Democratic Forum of the Legislative Assembly of the RS. The study has concluded by the integration of policy and actions with other related sectors and the need for an effective participation of society in the decisions of the Council of Sanitation in the State of Rio Grande do Sul.
Keywords Social control, public policy, council, sanitation.
Introdução
A Organização Mundial de Saúde conceitua saneamento como o controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem ou podem exercer efeitos nocivos sobre o bem estar físico, mental e social (OMS, 2002). A falta de saneamento básico além de prejudicar a saúde da população, eleva os gastos da saúde com o tratamento às vítimas de doenças causadas pela falta de abastecimento de água adequado, sistema de tratamento de esgoto e coleta de lixo. A adoção de ações integradas no setor de saneamento, ambiental e de saúde proporciona melhores condições de saúde para as pessoas, evitando a contaminação e a proliferação de doenças. Ao mesmo tempo, garante-se a preservação do meio ambiente. Modelos que associam o abastecimento de água e o esgotamento sanitário com a saúde, (Oliveira, 2005; Moreira, 2002) procuram dar conta da complexidade dessa relação, explicando a influência sobre indicadores específicos, como a diarréia, ou sobre medidas mais abrangentes de saúde, como a mortalidade infantil ou a expectativa de vida.
No Brasil a questão do saneamento passa a se inserir como estratégia de saúde pública, no início do século XX, em vista da incapacidade das campanhas de vacinação em resolver os problemas causados pelas doenças de massa. No ano de 1969 foi criado o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) que começou a funcionar somente dois anos depois, quando passou a destinar recursos para os estados criarem suas próprias companhias de saneamento. Para isso, instituiu-se o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS), gerido pelo Banco Nacional da Habitação (BNH). Para obter o financiamento, cada estado da federação deveria criar, com base em seus recursos orçamentários, um Fundo de Financiamento para Águas e Esgotos (FAE) e uma companhia estadual de saneamento. Sua implementação viabilizou-se com os recursos do FGTS. Nos dias de hoje, a gestão da política federal de saneamento básico está sob responsabilidade da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano. A gestão financeira dos recursos do FGTS é de responsabilidade da Caixa Econômica Federal (CEF), sob fiscalização e controle do Conselho Curador do FGTS (CCFGTS).
Para a construção de uma Política Pública na área de saneamento que seja efetiva é necessário envolver todos os indivíduos que participam do processo, desde o gestor ao usuário do serviço. O canal de convergência entre esses agentes em nossa sociedade pode ser efetivado pelos conselhos gestores, que, em tese, são responsáveis por criar e deliberar políticas de sua área de atuação, dessa forma concretizando o controle social. Tendo em vista este contexto, o presente estudo possui como objetivo analisar a efetividade do Controle Social na Área de Saneamento no Estado do RS e visa responder ao seguinte problema de pesquisa: O controle Social na área de Saneamento no RS efetiva-se de acordo com a política nacional desse setor e com a doutrina?
Para responder ao problema e ao objetivo proposto optou-se por uma pesquisa qualitativa, utilizando como estratégia para desenvolver o artigo a técnica da pesquisa documental. Para Gil (1999) a pesquisa documental diferencia-se da pesquisa bibliográfica pelo fato de que os materiais coletados para a pesquisa não receberam ainda um tratamento analítico, tendo como exemplo documentos oficiais. Além das leis e decretos pesquisados, fonte de discussão deste trabalho foi realizada uma observação simples na reunião para fechamento do relatório final do Grupo Executivo Saneamento do Fórum Democrático de Desenvolvimento Regional da Sociedade Convergente (Assembléia Legislativa, RS, 2008).
Os procedimentos de coleta de dados incluíram a análise das leis que regulamentam a Política Nacional de Saneamento, Recursos Hídricos e Saúde em âmbito Federal e Estadual para verificar a interface entre essas áreas afins, e a semelhança da estrutura do conselho de saneamento do Estado do Rio Grande do Sul com as bases propostas pela legislação da esfera Federal e com a doutrina. Com a observação à reunião do Grupo Executivo do Saneamento, na Assembléia Legislativa, somaram-se subsídios que permitiram aos autores concluir que a efetivação do controle social na área do saneamento trata-se de uma demanda da sociedade gaúcha que pode ser suprida através da reestruturação do conselho estadual de saneamento.
1. Base Conceitual
a. Evolução do Saneamento Básico no Brasil
No Brasil, quando do surgimento das primeiras vilas, houve uma ausência de estruturação sanitária e de abastecimento, assim permitindo a formação de um pequeno mercado para serviços privados, principalmente na distribuição de água. Segundo Oliveira (2005), esse mercado era caracterizado por trabalhadores individuais que, em geral, prestavam basicamente serviços de entrega de água. Vale lembrar que sob o regime monárquico a questão da saúde apresentava-se como uma questão de domínio privado, familiar e local, não havendo ações empreendidas pelo governo colonial. A remoção de dejetos e de lixo era tratada de forma individualizada por cada família.
Oliveira (2005) resgata que
“a iniciativa pública passou a atuar no Brasil, em alguns municípios, na área do saneamento entre o final do século XIX e início do XX com a ampliação do acesso à água através de distribuições de chafarizes e bicas públicas, a captação e a distribuição da água era de responsabilidade de cada vilarejo e, principalmente na implantação das primeiras estruturas sanitárias destinadas à coleta de esgotos, com fins a solucionar problemas de epidemias advindas das precárias condições urbanas, toda a rede de esgoto era extremamente precária, sendo que havia falta de água em alguns bairros do município, o sistema de coleta de esgotos era arcaico e os dejetos recolhidos eram despejados diretamente nos rios”.
Até o início da década de 70, quando a população brasileira era de aproximadamente de 92 milhões de habitantes, não havia um programa de saneamento básico (IBGE, 2007). O início dessa década foi marcado por grandes pressões por parte da população e de representantes do comércio e da indústria, reivindicando maiores investimentos no setor de saneamento básico, fossem eles na extensão das redes de abastecimento, redes de coleta e tratamento de esgotos, já que isso impedia o crescimento econômico e social das cidades, levando um grande número de empresas a abandonar os grandes centros urbanos em virtude dos custos implicados em sua manutenção.
Neste período foi criado o PLANASA (1969) – Plano Nacional de Saneamento – na qual o poder federal concentrou o poder de decisão e financeiro no Banco Nacional da Habitação, onde através desse plano, direcionava grandes investimentos para o setor de saneamento. Ficava a cargo dos Estados e dos Municípios aderirem ou não a este Plano para obterem recursos, que por sua vez tinham origem no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Para obter o financiamento, cada estado da federação deveria criar, com base em seus recursos orçamentários, um Fundo de Financiamento para Águas e Esgotos (FAE) e uma companhia estadual de saneamento. Neste sentido, foram criadas Companhias de Saneamento Básico em todos os estados, sendo estas responsáveis pelo planejamento, execução e operação dos serviços de saneamento, através da concessão dos municípios.
Segundo Sousa (2004), o PLANASA tinha como objetivo desenvolver uma política para o setor. Esse plano (1970-1986), embora nunca tenha atingido 1% do PIB, conseguiu ampliar entre os anos 70 e 80, de 54,4% para 76% o número de domicílios com fornecimento de água da rede pública e de 22,3% para 36% o número de domicílios com instalação sanitária de uso exclusivo. Além disso, buscava o equilíbrio entre a oferta e a demanda no campo do saneamento básico que é essencial à vida e à saúde do homem. Este plano foi uma formulação de política pública predominantemente centrada na expansão da rede urbana de abastecimento de água. No período de 1970 a 1984 foram para esta função 61,2% dos investimentos, enquanto que para o esgotamento sanitário chegaram 25,2% dos recursos, restando apenas 13,6% para a drenagem urbana.
O PLANASA findou na década de 80. Souza (2004), afirma que a partir desse período, não houve nenhuma proposta que pudesse ser contraposta aos resultados desse plano. “Diversos fatores concorrem para a estagnação em que se encontra hoje o saneamento ambiental brasileiro, já que, nos últimos tempos, não houve uma política bem definida para superação da crise em que o setor mergulhou após o fim do PLANASA. No período de investimentos mais intensos no setor, durante a década de 1970, as médias anuais alcançaram a taxa de 0,34% do PIB. Nos anos 1980 a taxa caiu para 0,28% e, na década de 1990, para 0,13% – sendo que entre 1995 e 2000 foi de 0,25%”.
A partir da década de 1980 o setor foi perdendo força, culminando com a extinção do órgão central do sistema – o Banco Nacional da Habitação e com a pulverização das funções exercidas pelo PLANASA.
A Constituição de 1988 não determina qualquer modalidade preferencial de prestação de serviços. Segundo a Carta, a implementação de programas é de competência de qualquer um dos níveis da federação, ainda que submetidos a diretrizes gerais emanadas pela União. Por outro lado, a partir dos anos 90, sob o impulso dos processos de reforma do Estado, uma grande reestruturação vem ocorrendo na engenharia administrativa dos serviços de saneamento básico no Brasil, modificando significativamente a estrutura institucional que havia sido montada sob o PLANASA.
A década de 1990, por sua vez, concretiza a possibilidade da privatização dos serviços de saneamento básico aos moldes das grandes empresas. Esse modelo de gestão induziu o governo federal a impedir a contratação de novos financiamentos por parte de empresas públicas e a disponibilizar grandes somas às empresas privadas no setor de saneamento básico.
O marco regulatório do setor de abastecimento é a Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico. O mencionado diploma legal considera como princípios fundamentais para a prestação dos serviços públicos de saneamento básico a universalização do acesso; a integralidade; articulação com outras políticas; a transparência nas ações com sistema de informações e processos decisórios institucionalizados; segurança, qualidade e regularidade e controle social.
Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB 2000), a intermitência no abastecimento de água afeta 20% dos distritos abastecidos, obrigando a população a recorrer a fontes de abastecimento nem sempre seguras que podem provocar risco à saúde, além de prejuízos e deterioração precoce das redes de distribuição – o que faz aumentar as perdas. Em 2000, havia 116 municípios brasileiros sem serviço de abastecimento de água por rede geral (2% do total de municípios), a maior parte dos quais situadas nas regiões Norte e Nordeste. Nestas regiões, embora tenha havido redução do número de municípios sem abastecimento desde 1989, houve, na década, o aumento de seu peso proporcional: passaram de 50% para 56% no Nordeste, e de 21,7% para 23,3% na região Norte. Esses dados indicam que o investimento aí realizado na expansão da rede geral de abastecimento de água não ocorreu nas mesmas proporções que nas demais regiões, as quais apresentaram melhores resultados. Os municípios que não contam com rede distribuidora de água utilizam como alternativa os chafarizes e fontes, poços particulares e abastecimento por caminhões-pipas, bem como uso direto de cursos d’água, que como já dito anteriormente, pode causar grandes problemas de saúde na população.
b. Saneamento Básico e Saúde
A falta, bem como a precariedade do saneamento básico, traz muitas doenças infecciosas associadas à água. Hespanhol (1999) classifica essas enfermidades em quatro categorias, para que se possa avaliar melhor os efeitos diretos e as ações corretivas que possam ser realizadas. A primeira categoria possui na água o suporte para a transmissão das doenças. Para evitar doenças como a cólera e a febre tifóide, devem ser feitas ações preventivas para a melhoria da qualidade da água, evitando-se que a população consuma água de fontes que não sejam tratadas. A segunda categoria envolve as doenças associadas com a higiene (doenças de pele), infecções que seriam evitadas com disponibilidade de água e melhoria de hábitos de higiene. A disponibilidade de água e educação em conceitos básicos de higiene já ajudaria a reduzir este problema. O terceiro tipo de infecções são as relacionadas com o contato com a água, estas transmitidas por um animal invertebrado aquático que vive na água ou passa parte de seu ciclo de vida em moluscos aquáticos. A mais importante das infecções associadas à água é a esquistossomose que pode ser reduzida consideravelmente com sistemas de distribuição de água potável. O quarto tipo de doença infecciosa associada pela água é a relacionada com vetores desenvolvidos na água. São infecções transmitidas por organismos patogênicos através de insetos desenvolvidos na água ou que picam nas proximidades da água, citando como exemplo a malária, a febre amarela e a dengue, as quais podem ser controladas com a provisão de água segura e de sistemas, mesmos simplificados, de saneamento básico.
A Constituição Brasileira de 1988, no seu Artigo 196° estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação. A Lei 8.080/90 no seu artigo 3º caput, traz valiosa menção à saúde, considerando-a com sendo um direito básico a todo o cidadão. Assim é dever do Estado intensificar as ações de promoção em saúde para que os problemas de saneamento básico, bem como as doenças causadas por sua falta, sejam erradicadas na vida da população brasileira. Até o presente momento o Estado brasileiro não vem cumprindo com seu dever básico de oferecer saúde a seus cidadãos nos padrões estabelecidos pela OMS, o que afeta a qualidade de vida das pessoas e o núcleo mínimo existencial relacionado à dignidade das pessoas.
No Brasil, a cobertura de saneamento pode ser considerada crítica, sendo a percentagem atendida no setor urbano de 55%, enquanto que na área rural é de apenas 3%. A esses dados preocupantes pode ser adicionado o elevado nível de deterioração dos sistemas de abastecimento de água e esgoto, omissões dos prestadores com relação aos direitos dos usuários e o uso não sustentável dos recursos hídricos, criando um círculo vicioso em que excretas humanas e esgotos são fatores de deterioração da qualidade da água, ocasionando doenças de origem hídrica (HESPANHOL, 2006, págs. 269-278).
Uma ferramenta que pode ser utilizada por qualquer cidadão no acompanhamento e verificação das ações da gestão pública é o Controle Social. Através dele o cidadão pode fiscalizar se seus direitos estão sendo respeitados e cobrar ações efetivas por parte do Estado.
c. Controle Social
Por controle social entende-se a participação da sociedade no acompanhamento e verificação das ações da gestão pública na execução das políticas públicas, avaliando os objetivos, processos e resultados. “Controle social é expressão de uso recente e corresponde a uma moderna compreensão de relação Estado-sociedade, onde a esta cabe estabelecer práticas de vigilância e controle sobre aquele” Carvalho (1995).
Trata-se de uma ação conjunta entre Estado e sociedade em que o eixo central é o compartilhamento de responsabilidades com vistas a aumentar o nível da eficácia e efetividade das políticas e programas públicos. Pesquisas e estudos realizados no Brasil vêm apontando para a crescente densidade organizacional da sociedade civil como resultado do descompasso entre Estado e sociedade, e da implementação de políticas públicas que têm como objetivo a descentralização de recursos para a prestação de serviços na área social, principalmente para os setores de educação e saúde. O controle social envolve a capacidade que os movimentos sociais organizados na sociedade civil têm de interferir na gestão pública, orientando as ações do Estado e os gastos estatais na direção dos interesses da maioria da população. Conseqüentemente, implica o controle social sobre o fundo público.
O controle social deve ser feito através de um órgão colegiado (a ser criado ou através da adaptação de um já existente) de caráter deliberativo, com representações dos titulares dos serviços, de órgãos governamentais relacionados ao saneamento, das prestadoras de serviços, dos usuários e de entidades da sociedade civil.
Infelizmente no Brasil o Controle Social não faz parte do cotidiano da maioria dos cidadãos, que não reconhecem este instrumento como parte de participação de qualquer indivíduo junto ao Estado. Assim, o que se percebe atualmente é que os espaços formais de controle social são ocupados por forças políticas, espelhando a cultura que ainda é prevalente no Brasil (clientelismo, privatização do espaço público). Sendo necessário urgentemente a expansão e o aprofundamento dos mecanismos que garantem a participação cívica e democrática, refletindo em uma cidadania plena. Isso faz com que o indivíduo passe a atuar de fato com a sua cidadania, que é definida por Coutinho, como “a capacidade conquistada por alguns indivíduos ou por todos, de se apropriarem dos bens socialmente criados, de atualizarem todas as potencialidades da realização abertas pela vida social em cada contexto historicamente determinado”.
2. Discussão
a. A Constituição dos Conselhos de Saneamento
A Constituição da República Federativa Brasileira representa um marco regulatório em que está previsto, de forma implícita, o controle social para a construção das políticas públicas em nosso país. A concretização da participação da sociedade foi formalizada a partir da criação dos conselhos gestores, espaços onde os cidadãos junto aos representantes do Estado e às categorias profissionais possuem para discutir as políticas desenvolvidas nos seus estados e municípios. A lei 11.445, de 5 de janeiro de 2007, versa sobre as Diretrizes Nacionais do Saneamento Básico. Em seu artigo 47 estabelece que o controle social dos serviços públicos de saneamento básico poderá incluir a participação de órgãos colegiados de caráter consultivo, estaduais, do Distrito Federal e municipais. A mesma lei prevê a forma como deverão ser compostos os conselhos de saneamento, nos quais devem conter representantes de órgãos governamentais que possuem ligação com o setor de saneamento, os prestadores de serviço, os titulares do serviço e obviamente os usuários. A participação do cidadão no processo de construção de políticas públicas na área de saneamento é de extrema importância, pois o usuário como agente poderá contribuir com relatos a respeito da situação vigente da região em que reside, acarretando uma melhor produção de ações na área pública.
O Estado do Rio Grande do Sul, através da lei n° 12.037 de 19 de dezembro de 2003, estabelece as bases para a Política Estadual de Saneamento e regulamenta também a criação do Conselho Estadual de Saneamento – CONESAN. Diferente da Lei Nacional de Saneamento, que é previsto o caráter restritamente consultivo dos conselhos na lei Estadual consta que o conselho atuará como um órgão permanente de debates, proposições, deliberações e normatização das políticas públicas de saneamento do Estado. A forma prevista para a composição do CONESAN, por sua vez, vai de encontro a Lei 11.445 que estabelece a participação dos usuários nos conselhos. O Artigo 15 da Lei Estadual prevê a constituição do conselho sem a participação dos usuários, monopolizando as deliberações pela própria esfera de governo. A limitação da representação por indivíduos que compõem o governo e por entidades ligadas ao mesmo acaba por excluir os cidadãos do processo de deliberação a respeito das políticas públicas de saneamento. Com esse panorama podemos perceber a inexistência do espaço legal para que a sociedade possa externar suas demandas e participar do processo decisório na administração pública.
Visando aperfeiçoar a participação social nos processos decisórios a Assembléia Estadual do Rio Grande do Sul, através do programa Sociedade Convergente promoveu fóruns de discussão nas regiões funcionais do Estado. Dentre as áreas temáticas previstas para serem desenvolvidas ações, com o intuito de fomentar a melhoria da qualidade de vida da população, fez parte o saneamento básico. Os resultados obtidos nessas Assembléias Regionais, apresentados sob a forma de contribuições e decisões regionais, após aprovados no âmbito estadual fizeram parte do relatório final da Assembléia Estadual de Convergência. Nesse relatório o Conselho é definido como “(…) um fórum ou grupo de trabalho com poder de deliberação, com o fim de tomar decisões de forma democrática, pois ali estão todos os atores envolvidos no setor de saneamento do Estado” (Caderno de Convergência, 2008). Sendo composto por todos os atores envolvidos no processo, nele estarão incluídas representações, tanto dos cidadãos quanto órgãos públicos, os quais devem primar pelos interesses coletivos da população (Bobbio,1986).
Dentre as atribuições do Conselho de Saneamento especificadas por este relatório estão: “acompanhar e aprovar o Plano Estadual de Saneamento; fazer cumprir o Plano Estadual de Saneamento; operar o Fundo Estadual de Saneamento; fazer cumprir o Código Estadual de Saneamento; dirimir conflitos no setor” (RIO GRANDE DO SUL, 2008). A pesquisa realizada entre os participantes das assembléias regionais demonstrou que a efetividade do controle social em todas as áreas da esfera pública devem ser aperfeiçoadas, uma vez que há falta de informação quanto à possibilidade da população participar desses espaços de integração entre a sociedade civil e o Estado.
b. Interface com outros Conselhos
O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos representa o conjunto de órgãos e entidades que atuam na gestão dos recursos hídricos no País. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é o órgão de cúpula desse Sistema e possui dentre as competências previstas nos incisos do Artigo 35 da Lei 9.433, de 08 de janeiro de 1997, as de promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com o planejamento de outras áreas, arbitrar, em última instância, os conflitos existentes entre os Conselhos Estaduais, aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e determinar as providências necessárias ao cumprimento de suas metas. O Conselho é o principal fórum nacional de discussão sobre gestão de recursos hídricos, que delibera durante suas reuniões, de caráter ordinário ou extraordinário, mediante a aprovação de Resoluções e Moções.
Com a maioria dos membros do Conselho pertencendo à União (Artigo 34, § único da Lei 9.433) fica consignada uma postura centralizadora. Esta medida mostra-se em desacordo com a tendência verificada na gestão dos recursos hídricos em países que buscam democratizar o processo, através da descentralização do poder. O próprio texto de lei, no caso específico, ao não prever a participação de representantes de organismos de bacia na composição do Conselho perdeu a oportunidade de registrar no ordenamento jurídico um dispositivo que valorizasse a novel e democrática experiência brasileira na gestão das águas, com base nas bacias hidrográficas (OLIVEIRA, 2006).
O gerenciamento dos recursos hídricos dispõe de instrumentos como planos de recursos hídricos, a cobrança pelo uso de recursos hídricos, e a compensação aos municípios, entre outros. Esses instrumentos devem ser utilizados com o objetivo de assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água em padrões de qualidade adequados e promover a utilização racional dos recursos hídricos. Porém, atualmente percebem-se falhas na estrutura, nos sistemas de informações e na participação pública nos Comitês das bacias. Ao contrário do que prega o princípio da Participação Pública, estes comitês abrangem uma pequena quantidade de pessoas envolvidas na luta pela melhor gestão dos recursos, afetando o aspecto democrático e conseqüentemente, a proteção do meio ambiente como um todo (Kettelhut, 2008).
Na área da saúde, temos os Conselhos de Saúde, que tem como missão o princípio da participação comunitária e assegurar o controle social sobre as ações e serviços de saúde. O Conselho Nacional de Saúde (CNS) é um órgão colegiado, de caráter permanente e deliberativo, com representação do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários. Atua na formulação de estratégias e no controle da execução das políticas de saúde.
A promulgação da Lei nº 8.142/90 instaurou a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo a participação popular na definição, acompanhamento da execução e fiscalização das políticas de saúde. Além disto, ela criou duas instâncias colegiadas, a Conferência de Saúde e o Conselho de Saúde.
Apesar dos conselhos criarem políticas de saúde e contribuírem na fiscalização e controle, das ações estatais, produzindo a democratização do Estado, não há uma integração entre eles, que possa contribuir para a melhoria das decisões dos setores em estudo.
Essa articulação entre os conselhos mostra-se necessária de forma a aprofundar o diálogo, a abordagem inter-setorial e a integração de políticas e ações voltadas à demanda da sociedade.
Considerações Finais
O presente artigo teve como objetivo principal analisar a efetividade do Controle Social na área do saneamento no Estado do RS. Para tal procurou-se responder algumas questões relacionadas à pesquisa. Dentre elas destacamos: há efetividade do controle social na área do saneamento no RS em relação ao marco regulatório nacional e à doutrina? Existe participação dos usuários nos conselhos? Os usuários podem deliberar (discutir e votar) sobre os temas do setor?
A trajetória percorrida na elaboração do trabalho, que ao valer-se de uma metodologia qualitativa, com pesquisa à legislação, à doutrina e a subsídios colhidos do Grupo de Saneamento da Sociedade Convergente da Assembléia Legislativa, permitiu aos autores concluir que o controle Social na área de Saneamento no RS efetiva-se em desacordo com a política nacional desse setor. Não há na constituição do Conselho Estadual de Saneamento no Estado do Rio Grande do Sul participação dos usuários. Porem é relevante referir que o novo marco regulatório do setor de saneamento, a Lei Federal nº11445/2007, no art. 47 estabelece que os órgãos colegiados participantes do controle social possuem o caráter consultivo, portanto não tomam decisões sobre as políticas e programas a serem efetivados, mas tão somente emitem parecer que pode ou não ser acatado pela autoridade administrativa do setor. A Lei Estadual nº 12.037/2003 por sua vez, estabelece caráter deliberativo ao conselho, tendo como principais atribuições: a aprovação do Plano estadual de Saneamento, operar o Fundo Estadual de Saneamento, fazer cumprir o Código Estadual de Saneamento e dirimir conflitos no setor. No entanto, como já referido, a composição do Código Estadual de Saneamento não conta com representação de usuários de serviços de saneamento, organizações da sociedade civil e de defesa dos consumidores relacionadas com o setor de saneamento, o que compromete a prática do controle social.
Além da questão de composição do conselho e da forma de poder que este Conselho exerce, para que se consiga atingir o plano da efetividade do controle social, é necessário informar a população da existência desse espaço e também conscientizar as comunidades quanto a importância da participação nesse tipo de ambiente. Assim, os cidadãos conseguirão expor suas demandas e desenvolver um efetivo controle social na área do saneamento, o que ficou demonstrado, no estudo, tratar-se de uma demanda da sociedade gaúcha.
Em vista de que o controle social nas áreas afins ao saneamento pode ser aperfeiçoado, como contribuição adicional, os autores do presente estudo propõem a interligação entre os Conselhos e o aperfeiçoamento de interfaces legislativas e de gestão nos sistemas ambiental, de recursos hídricos e de saúde visando direcionar as ações de saneamento para a preservação ambiental e para a salubridade pública. O “diálogo” entre os sistemas dessas diferentes áreas temáticas implicaria em um planejamento voltado ao atendimento eficiente das demandas sociais, objetivo maior das políticas públicas num Estado voltado ao bem estar da população.
Informações Sobre os Autores
Débora Trois Arruda
Acadêmica do Curso de Administração: Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Porto Alegre/RS-Brasil
Ítalo Zebroski Lima
Acadêmico do Curso de Administração: Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Porto Alegre/RS-Brasil
Vanessa Marques Daniel
Acadêmica do Curso de Administração: Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Porto Alegre/RS-Brasil
Celmar Corrêa de Oliveira
Doutorando em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental no Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS. Possui mestrado em Direito, linha de pesquisa: Direito Ambiental e Biodireito pela Universidade de Caxias do Sul (2002), especialista em Direito e em Educação, graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1992), graduação em Educação Física pela Escola de Educação Física do Exército (1977); professor concursado da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, na área de Gestão Pública. Tem experiência na área de Direito Público Gestão Pública, Gestão de Recursos Hídricos e Saúde Coletiva, atuando principalmente nos seguintes temas: direito constitucional, direito ambiental, gestão ambiental, gestão pública, gestão de recursos hídricos direitos sociais, sociedade de risco, democracia.