Direito Penal

A Finalidade de Pena e os Efeitos da Prisionização

THE PURPOSE OF THE PENALTY AND THE EFFECTS OF PRISON

 

Maria Fernanda Paci Hirata Shimada – Mestranda em Direito Pelo Centro Universitário Eurípides de Marília (UNIVEM). Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho -Anhanguera. Grandes Transformações Processuais-UNISUL. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Coordenadora na Etec Sebastiana Augusta de Moraes Andradina/SP. Docente do Curso de Direito em Direito Penal da Universidade Brasil – Andradina/SP. Advogada Criminal e Civilista. Residente na Rua Antônio Rodrigues de Carvalho, 888, Jardim Sampaio, Mirandópolis/SP. E-mail: mferpaci@yahoo.com.br.

 

Resumo: O objetivo do ora trabalho, é tecer reflexões acerca do estudo da finalidade da pena e os efeitos reais e significativos na efetiva ressocialização do detento. É sabido, que uma das maiores inquietações e duvidas na atual conjuntura carcerária é possibilitar a efetiva reintegração do detento no ambiente social. Para tanto, utilizou-se a pesquisa bibliográfica, por meio do procedimento dedutivo. O trabalho é justificável visto que apresenta as conseqüências do cumprimento da pena a partir dos estudos da prisão como uma instituição total. Por assim ser, foi possível concluir que a pena no modelo em que se encontra possui total incapacidade no concernente à reeducação dos infratores e os efeitos de prisionização, decorrentes da própria imposição da pena, agravam o aspecto sociológico.

Palavras-chave: Direito. Pena. Ressocialização. Prisionização.

 

Abstract: The objective of this work is to provide reflections on the study of the purpose of the sentence and the real and significant effects on the actual resocialization of the prisoner. It is well known that one of the greatest concerns and doubts in the current prison situation is to enable the detainee to be effectively reintegrated into the social environment. For this, the bibliographic research was used, through the deductive procedure. The work is justifiable since it presents the consequences of the fulfillment of the sentence from prison studies as a total institution. Thus, it was possible to conclude that the sentence in the model in which it is found has complete incapacity regarding the re-education of offenders and the effects of imprisonment, due to the imposition of the sentence itself, aggravate the sociological aspect.

Keywords: Right. Feather. Ressocialização. Prisonering.

 

Sumário: Introdução. 1. Definição da Pena. 1.1. Características da Pena. 2. Fins Contraditórios atribuídos a Pena de Prisão. 2.1. Atrito entre adaptação à prisão e readaptação a vida livre.  3. O efeito da prisionização. 3.1. 3.1.           As condicionantes de prisionização de Clemmer. 3.2. Efeitos da prisionização. Conclusão.

 

INTRODUÇÃO

Atualmente, um dos grandes questionamentos sobre a finalidade da pena e os aspectos positivos e negativos de sua imposição é determinar a sua efetiva eficácia para o individuo sujeito a ela, bem como para a sociedade. É certo, que poucos são os autores que se ocupam com a conceituação do vocábulo pena e, não é para menos, sua existência, e sobre isso não há dúvidas nem desavenças doutrinais, se deve a necessidade abstrata e absoluta, que existiu em todas as épocas e culturas, de se aplicar algum tipo de sanção.

Por assim ser, o objetivo deste trabalho é tecer reflexões acerca do estudo da finalidade da pena e os efeitos reais e significativos na efetiva regeneração do detento, de modo a transformá-lo efetivamente, e promover a reinserção social, bem como demonstrar os efeitos da prisionização e os efetivos impactos na esfera individual e social.

Utilizou-se a pesquisa bibliográfica, porém, com uma abordagem multidisciplinar, a partir de referenciais voltados à filosofia, à sociologia e ao direito. A escrita deu-se por meio do procedimento dedutivo.

Nesse diapasão, a pesquisa é justificável, visto que apresenta as conseqüências do cumprimento da pena a partir dos estudos da prisão como uma instituição total, abordando as características e processos de desculturação e de prisionalização.

O trabalho está dividido em três pontos cruciais. O primeiro discorre acerca da definição da pena e suas características. Enquanto, que um segundo ponto, repercute a questão da finalidade da pena e seus fins contraditórios. E, por fim, em um terceiro momento, faz um comparativo dos efeitos da pena na prisionização dos detentos.

Por assim ser, concluiu-se que a pena no modelo em que se encontra possui total incapacidade no concernente à regeneração e reeducação dos infratores e os efeitos de prisionização, decorrentes da própria imposição da pena, agravam o aspecto sociológico, espraiam-se também pelo aspecto biológico e psicológico dos sujeitos do cárcere.

 

  1. DEFINIÇÃO DA PENA

Poucos são os autores que se ocupam com a conceituação do vocábulo pena e, não é para menos, sua existência, e sobre isso não há dúvidas nem desavenças doutrinais, se deve a necessidade abstrata e absoluta, que existiu em todas as épocas e culturas, de se aplicar algum tipo de sanção.

Com efeito, faz-se necessário ressaltar que não há um conceito preciso da definição de pena, uma vez que é a evolução da sociedade que impulsiona a definição e os limites do que vem a ser a pena, restando, no entanto, precisa a lição de Codesido (2005):

“No haydudas de que la pena es considerada algo malo para quienla padece. Cualquieraseala forma y magnitud que adopte, ya se trate de uma multa o de um azote, de laprisión o de lamuerte, ya se trate de um sufrimiento temporal o perpetuo, en todos los casos nos encontramos frente a laprivación de unbien, frente a algo que contraria a lavoluntad de quienlosufre.”

Nesse sentido destacamos a contribuição do penalista paranaense (Dotti apud Júnior, 2002) pena é uma instituição social que reflete a medida do estágio cultural de um povo e, ainda, o regime político a que se está submetido.

Não obstante, deve-se admitir que, ao longo dos séculos, modificaram-se não apenas as sanções aplicadas, mas também a forma de imposição, a autoridade legitimada a aplicá-la, bem como seu fundamento.

A pena, como hodiernamente entendida, é a conseqüência jurídica de um fato delitivo.

A pena, entretanto, não é uma conseqüência jurídica qualquer. Assim como não é qualquer comportamento que é elevado à categoria de delito, senão a conduta que a sociedade rechaça com maior firmeza justamente por ir de encontro aos seus interesses sociais, a pena não se traduz em uma conseqüência jurídica comum e sim na sanção mais grave que pode ser imposta a quem realiza uma conduta considerada intolerável pelo resto da comunidade.

E justamente em razão de sua gravidade e para que não ocorram arbitrariedades, é que pena somente pode ser criada, aplicada e executada pelo Estado, que conta com o monopólio do ius puniendi. Logo, a pena é a conseqüência natural imposta pelo Estado quando alguém pratica uma infração penal. Quando o agente comete um fato típico, ilícito e culpável, abre-se a possibilidade para o Estado de fazer valer o seu jus puniendi.

O fundamento dessa potestade exclusiva encontra-se no contrato social, onde cada um dos indivíduos renuncia, em favor do Estado, de parte de sua liberdade, em troca de que este lhe garanta outro espaço de independência.

Neste ponto, vale mencionar Beccaria (2005):

Foi, portanto, a necessidade que constrangeu os homens a cederem parte da própria liberdade, é certo, pois, que cada um só quer colocar no depósito público a mínima porção possível, apenas a que baste a induzir os outros a defendê-lo. A agregação dessas mínimas porções possíveis forma o direito de punir, tudo o mais é abuso e não justiça é fato, mas não direito.

Mas essa pena não pode ser imposta ao livre arbítrio das autoridades estatais, deve estar previamente definida em lei.

Com efeito, ocorre a impossibilidade de se sancionar com pena uma conduta que não esteja previamente proibida ou ordenada pela lei penal. E, se por um lado, a lei deve estabelecer, de forma clara e prévia, quais condutas estão penalmente proibidas, por outro, deve-se consignar que também cabe à lei, em sentido estrito, estabelecer as conseqüências jurídicas do delito, determinando os tipos de sanções – no caso brasileiro, pena ou medida de segurança, sendo a primeira o objeto de estudo desse ensaio – e quando devem ser impostas.

Ademais, a pena não pode ser aplicada a qualquer pessoa, senão àquela que cometeu o delito, com dolo ou com culpa (a máxima nullapoenasine culpa caracteriza o princípio da culpabilidade). O princípio da pessoalidade, como é conhecido, está previsto expressamente no artigo 5º, inciso XLV da Constituição Federal.

Não bastasse a pena imposta ao delinqüente deve levar em conta a sua condição humana e a sua dignidade. Não se admite mais as penas desumanas, cruéis e degradantes, sendo que a Carta Magna expressamente veda a pena de morte – salvo em caso de guerra declarada –, as penas de caráter perpétuo e de trabalhos forçados, bem como as penas cruéis (art. 5º, XLVII da CF), garantindo aos presos o respeito à integridade física e moral (art. 5º, XLIX da CF).

 

  • Características da Pena

As penas apresentam basicamente 6 características que as definem:

  1. Intimidadora: Procura incutir o medo na sociedade através do temor de sua aplicação;
  2. Aflitiva: Busca atingir basicamente a liberdade da pessoa humana;
  3. Exemplar: Servir de paradigma para que o Estado aplique com severidade a pena àqueles que rompem a ordem vigente;
  4. Legal: As penas derivam da Lei e devem ser aplicadas conforme os preceitos ali esculpidos. Não são, portanto, fruto das idéias e caprichos dos governantes ou magistrados;
  5. Corretiva: Busca impedir a reincidência, através de medidas sócio-educacionais, de forma a readaptar o indivíduo que esteja sofrendo os rigores da punição estatal;
  6. Justa: As penas devem guardar a maior proporcionalidade possível entre a reprimenda estatal e o delito perpetrado.

 

  1. FINS CONTRADITÓRIOS ATRIBUÍDOS A PENA DE PRISÃO

Conforme Thompson (2002) propõe-se, oficialmente, como finalidade da pena da prisão, a obtenção não de um, mas de vários objetivos concomitantes: — punição retributiva do mal causado pelo delinqüente; — prevenção da prática de novas infrações, através da intimidação do condenado e de pessoas potencialmente criminosas; — regeneração do preso, no sentido de transformá-lo de criminoso em não-criminoso.

A partir do século passado, pelo menos, passou a merecer ênfase especial a meta reabilitação. Designada, indiferentemente, por terapêutica, cura, recuperação, regeneração, readaptação, ressocialização, reeducação e outras correlatas.

Por assim ser, o conceito da tríplice finalidade é bastante familiar no plano racional, pois o preso é colocado na penitenciária com vistas a ser punido intimidado e principalmente reformado. Entretanto, essa doutrina ainda num enfoque puramente lógico é de enganosa pureza e simplicidade.

Punir é castigar fazer sofrer. A intimidação a ser obtida pelo castigo demanda que este seja apto a causar terror. Ora, tais condições são reconhecidamente impeditivas de levar ao sucesso uma ação pedagógica.

Para Guilherme de Souza Nucci, no atual sistema normativo brasileiro a pena não deixa de possuir as seguintes características: é castigo + intimidação ou reafirmação do Direito Penal + recolhimento do agente infrator e ressocialização (2007, p. 371).

Segundo Thompson (2002), Johan Galtung anotou incompatibilidades principais entre função punitiva e atividade terapêutica, vejamos:

FUNÇÃO PUNITIVA ATIVIDADE TERAPÊUTICA
Observa urna orientação punitiva. Observa uma orientação de tratamento.
Tem uma ideologia concernente a prisões e prisioneiros no sentido de que circunstâncias externas, são somente circunstancias necessárias, não causas suficientes de atos criminosos, em razão do fato de serem tomados como certo princípios de livre arbítrio e de auto-acusação. Tem uma ideologia concernente a prisões e presos no sentido de que as circunstâncias externas (determinantes sociais, mentais, físicas) são vistas como causas tanto necessários como suficientes do crime.
Pinta a prisão, para a sociedade, em termos negativos; assim, ela funciona como uma intimidação coletiva e como uma referência geral de sanções negativas. Apresenta a prisão, para s sociedade, como um símbolo neutro ou positivo
Força o recolhimento do interno à prisão, contra a vontade. Espera que o interno adote uma atitude de boa vontade para submeter-se à terapia
Intencionalmente (e com o conhecimento do interno de que a ação é intencional) infligi-lhe sofrimentos ou priva-o de valores positivos, durante sua estada na prisão. Espera que o interno acredite que o que se faz o é para seu bem e como cooperação ao seu tratamento.
Institucionaliza relações secundárias entre os internos e os funcionários, num esforço para assegurar igualdade no tratamento e para prevenir a formação de personalidades que podem pôr em perigo a eficiência operativa, em dadas emergências. Institucionaliza relações primárias entre os internos e os funcionários, num esforço para assegurar ou facilitar uma transferência com valores destes para aqueles.
Solta o interno depois de um período de tempo que está fixado em função, principalmente, de seu comportamento anterior estar institucionalizado. Solta o interno depois de um período de tempo que está fixado em função, principalmente, de seu comportamento depois de estar institucionalizado.

 

Com a experiência pessoal de diretor de Estabelecimento Penal, Thompson (1979, p. 40) diz que:

 Há convicção formada de que o criminoso será ressocializado na penitenciária é uma quimera, sendo que as reais funções do sistema penitenciário são: impedir que o preso fuja e manter rigorosamente a disciplina da comunidade carcerária. Observa-se que os meios se transformam em fins, ou seja, a uma criação informal na finalidade da pena. Busca-se manter o criminoso afastado do corpo social, impedindo sua fuga, já que o mesmo violou o sistema jurídico vigente, e por outro lado, tem como objetivo primordial a ordem do próprio presídio.

A própria definição de ressocialização da pena é contraditória, pois possui o intuito de regenerar o indivíduo que infringiu as determinações legais, através de sua segregação, a fim de que reflita sobre os danos que causou, no grau de reprovabilidade de sua conduta criminosa e entenda a importância do respeito às leis para um convívio saudável e serene em sociedade.

Temos, então que no momento em que o individuo é encarcerado, parte-se da idéia que ele irá se readaptar na prisão, mas o que de fato ocorre é a desadaptação maior a vida livre. A partir do instante em que o preso se adapta ao sistema penitenciário vigente está se prontificando a sair pior, dificultando assim, sua ressocialização.

Na maior parte dos estabelecimentos prisionais as condições materiais e humanas fazem com que o objetivo reabilitador seja inalcançável. Trata-se de estabelecimentos com infra-estrutura precária, deficiente em todos os seus aspectos, em que se predominam os maus tratos verbais, a insalubridade decorrente da umidade, falta de circulação de ar, higiene e superlotação.

Ressalte-se, que não há como o segregado fugir das influências da prisionização, vez que está preso aquele ambiente até o cumprimento de sua pena.

Não há como fugir do sistema. O recluso encontra-se não só fisicamente encerrado, impedido de sair, como também se encontra preso a um contexto de comportamento e usos sociais dos quais não pode fugir. (BITENCOURT, 2001).

Isto porque, é sabido que a vida no cárcere, além de deixar de cumprir a meta da reinserção do recluso à vida na sociedade livre, tem um nítido caráter de reprodução de comportamentos, e é demasiadamente estigmatizadora, na medida em que, literalmente, uniformiza os apenados, o que reflete na retirada da individualidade destes.  As características deste modelo prisional podem ser sintetizadas no fato de que a prisão causa efeitos justamente contrários à reinserção do condenado em sociedade livre, além de favoráveis à sua estável inserção na população criminosa.

O conjunto de atitudes, valores e comportamentos adquiridos com a vivência na prisão reproduz as características de uma cultura carcerária. Tal harmonia de fatores constitui a prisionalização do apenado. Este nocivo processo é considerado o principal efeito causado sobre os encarcerados.

Dessa forma, o processo de prisionalização em face de qualquer tipo de reinserção do condenado, tem sido reconduzido ao processo da educação para ser criminoso.

Trata-se de uma aprendizagem que implica em um processo de dessocialização. Esse processo é um poderoso estimulo para que o apenado negue, de forma nítida, as normas admitidas pela sociedade exterior. A prisionalização sempre produzirá graves dificuldades aos esforços que se faz em favor de um discurso ressocializador.

Funciona como se a prisão produzisse exatamente o oposto do que ela menciona ser sua função principal.

E assim, torna-se importante apontar a “função invertida” da pena existente na Lei de Execução, já que ela não combate, mas constrói o desviante, fato de maior importância à explicação da falácia da tentativa de ressocializar.

 

  • Atrito entre adaptação à prisão e readaptação a vida livre

Há, porém, um recurso capaz de aliviar o sentimento de fracasso das várias metas propostas ao regime prisional. Consiste na redefinição do objetivo readaptação, que e é transmudado de readaptação do interno a vida em sociedade para adaptação do interno à vida carcerária.

Afora a perda da liberdade física (ou do direito de ir e vir), a prisão subjuga o detento ao comando de uma estrutura autoritária e de uma rígida rotina autocrática que opera como uma grande máquina impessoal. O controle sobre os indivíduos é exercido de forma ininterrupta, regulando-se de modo minucioso todos os momentos de sua vida.

Essa adaptação tende à despersonalização do sujeito apenado – a mortificação de seu eu. Quanto maior a intensidade do ajustamento ao sistema social da prisão, maiores as possibilidades de se alcançar os privilégios de que ela dispõe. Ao contrário, mostrar-se resistente acarreta ao indivíduo punido um maior rigor, severidade e endurecimento de seu regime.

Tendo a pena privativa de liberdade o objetivo não apenas de afastar o criminoso da sociedade, mas, sobretudo, de excluí-lo com a finalidade de ressocializá-lo, note-se que a pena de prisão atinge o objetivo exatamente inverso: ao adentrar no presídio, o apenado assume o seu papel social de um ser marginalizado, adquirindo as atitudes de um preso habitual e desenvolvendo cada vez mais a tendência criminosa, ao invés de anulá-la.

O mundo da prisão e completamente diferente, em muitos pontos antagônicos, daquele existente extramuros:

Preconiza Champman (1968):

 Na vida civil, o cidadão e, geralmente, membro de uma família, de um grupo laborai, de um grupo de vizinhança, de uma comunidade local, que apresentam grande variação de interesses grupais, uma variação completa deidade e uma variedade infinita de ligações sociais. A maioria dos adultos tem relações sócio sexuais de um padrão permanente, continuo e, usualmente, heterossexuais. A prisão, em contraste, as relações sociais são temporárias (pela duração da sentença) e compulsórias (geralmente, baseadas na residência numa cela, bloco de celas ou pátio e no local de trabalho, embora em algumas prisões os interesses grupais possam desenvolver-se). A variação deidade e estreita e as relações sócias sexuais são, exclusivamente, homossexuais. O sistema-padrão da sociedade civil e baseado no lucro, ocupação, educação e participação nos assuntos comunitários. Muito pouco disso existe no sistema prisional.

Logo, a adaptação à prisão não significa adaptação à vida livre, há fortes indícios de que adaptação à prisão implica em desadaptação à vida livre.

 

  1. O EFEITO DA PRISIONIZAÇÃO

De acordo com Clemmer (1958):

A prisionização se relaciona ao conceito sociológico de assimilação, entendido como processo lento, gradual, mais ou menos inconsciente, pelo qual a pessoa adquire o bastante da cultura de uma unidade social na qual foi colocada, a ponto de se tornar característico dela.

É possível estabelecer diferenças importantes entre tal assimilação e a prisionização. A assimilação é um processo de menor intensidade, no qual as modificações comportamentais apresentam-se de forma lenta e gradual; a prisionização, por sua vez, traduz-se numa força de elevada potência que em razão das características peculiares do ambiente carcerário e de seus membros torna sua atuação muito mais agressiva a ponto de afirmá-la como um fenômeno inevitável, variável e cíclico.

Por assim ser, a prisionização é um processo particular de assimilação da cultura prisional, sendo tal cultura entendida tanto em seu prisma formal quanto informal. Deste modo, não apenas leis, normas administrativas e regimento interno compõem a cultura de uma penitenciária, mas sim, e principalmente, a informalidade da organização e manifestações de seus membros.

A estrutura penitenciária e os processos sociais nela inseridos atuam reciprocamente, criando uma força social determinante, capaz de alterar variados aspectos de seus sujeitos, condicionando suas atitudes aos valores da vida carcerária.

 

  • As condicionantes de prisionização de Clemmer

Clemmer identificou que a prisionização se efetiva mediante a mútua influência de uma série de condicionantes, quais sejam: a influência dos agrupamentos carcerários; o espaço e o tempo da penitenciária e dos aspectos subjetivos do interno.

 

3.1.1 O tempo e o espaço da pena

O maior ou menor tempo de estada dentro da instituição carcerária é um dos mais importantes fatores para permitira prisionização de um interno. Apesar de não traçar uma relação objetiva entre o tempo penal e os efeitos de prisionização, até pela dificuldade de mensuração. Contudo, ocorre uma rapidez para a assimilação prisional iniciar seus efeitos sobre a figura do interno, inclusive determinando alguns efeitos do fenômeno apurados logo nos primeiros momentos de inserção na prisão.

O fato é que quanto maior o tempo de pena, os efeitos da prisionização. Por outro lado, a rotina da cadeia é capaz de modular o comportamento dos internos, sendo oportuno traçar seus apontamentos sobre a estrutura penitenciária de sua época.

 

3.1.2. Dos aspectos subjetivos dos internos e seus perfis

Temos que os indivíduos de personalidade estável, dotados de maior instrução e cujas relações sociais pré-penais sejam positivas e adequadas, acabam por minorar os efeitos insidiosos do ambiente carcerário, relutando em aceitar seus dogmas.

Clemmer (1958) preconiza a influência social para tal formação carcerária, o que ele é enquanto adulto é necessariamente o resultado do que ele aprendeu durante a infância, adolescência e juventude. Nesse sentido, sua personalidade é somente parcialmente determinada por hereditariedade e fatores biológicos. Sua personalidade é predominantemente a expressão da sua associação com outras pessoas.

 

3.1.3. Do contato do detento com agrupamentos carcerários

Há grande dinamismo na sociedade prisional, fundada num fluxo constante de entradas e saídas de internos. Em contraponto, as formas e estruturas de controle permanecem praticamente estáticas, mudando pouquíssimo ao longo da história. Ainda, Clemmer (1958), este seria um dos primeiros princípios de tais relações, pois no sistema prisional, o sistema de trabalho, o sistema de disciplina, persistiram tenazmente, a despeito das características dinâmicas da vida e das dinâmicas das pessoas que estão nela e a compõem.

Outra característica é a impessoalidade. A modificação das relações de solidariedade, prevalecendo um individualismo também observado na cadeia.

Ademais, a estrutura penitenciária possuía cultura própria, sendo um ambiente marcado tanto por relações conflitivas, como também por acordos e processos de acomodação, fatores contributos para a assimilação prisional e também importantes para os estabelecimentos dos grupos carcerários, os quais atuariam como fator estimulante ou impeditivo à prisionização.

 

  • Efeitos da prisionização

Os efeitos da prisionização podem ser entendidos de acordo com dois momentos distintos. O primeiro momento e seus efeitos se referem à brusca imersão inicial no cárcere, enquanto num segundo plano, apuram-se efeitos decorrentes de uma vivência prisional mais duradoura.

O detento ao compreender e integrar esta rede complexa de exigências, imposta nos presídios, passa por um processo de “aprimoramento”. Este raciocínio, os processos de admissão, que retiram do condenado seus apoios anteriores, podem ser vistos como a forma de a instituição prepará-lo para começar a viver de acordo com as regras da casa.

Por fim, os detentos demonstraram em consenso que níveis avançados de assimilação prisional tendem a favorecer a reincidência criminosa. Conforme Clemmer (1958), denota que foi opinião coletiva dos conselheiros que aqueles internos que se tornaram prisionizados em graus muito elevados estariam muito mais propícios a retornar para o crime quando de sua soltura do que aqueles nos quais a prisionização não avançou.

 

CONCLUSÃO

Poucos são os autores que se ocupam com a conceituação do vocábulo pena e, não é para menos, sua existência, e sobre isso não há dúvidas nem desavenças doutrinais, se deve a necessidade abstrata e absoluta, que existiu em todas as épocas e culturas, de se aplicar algum tipo de sanção.

Não obstante, deve-se admitir que, ao longo dos séculos, modificaram-se não apenas as sanções aplicadas, mas também a forma de imposição, a autoridade legitimada a aplicá-la, bem como seu fundamento. A pena, entretanto, não é uma consequência jurídica qualquer

Assim como não é qualquer comportamento que é elevado à categoria de delito, senão a conduta que a sociedade rechaça com maior firmeza justamente por ir de encontro aos seus interesses sociais, a pena não se traduz em uma conseqüência jurídica comum e sim na sanção mais grave que pode ser imposta a quem realiza uma conduta considerada intolerável pelo resto da comunidade.

E justamente em razão de sua gravidade e para que não ocorram arbitrariedades, é que pena somente pode ser criada, aplicada e executada pelo Estado, que conta com o monopólio do ius puniendi.

Logo, a pena é a conseqüência natural imposta pelo Estado quando alguém pratica uma infração penal. Quando o agente comete um fato típico, ilícito e culpável, abre-se a possibilidade para o Estado de fazer valer o seu jus puniendi. O fundamento dessa potestade exclusiva encontra-se no contrato social, onde cada um dos indivíduos renuncia, em favor do Estado, de parte de sua liberdade, em troca de que este lhe garanta outro espaço de independência.

Mas essa pena não pode ser imposta ao livre arbítrio das autoridades estatais, deve estar previamente definida em lei.

Com efeito, ocorre a impossibilidade de se sancionar com pena uma conduta que não esteja previamente proibida ou ordenada pela lei penal. E, se por um lado, a lei deve estabelecer, de forma clara e prévia, quais condutas estão penalmente proibidas, por outro, deve-se consignar que também cabe à lei, em sentido estrito, estabelecer as conseqüências jurídicas do delito, determinando os tipos de sanções – no caso brasileiro, pena ou medida de segurança, sendo a primeira o objeto de estudo desse ensaio – e quando devem ser impostas.

Ademais, a pena não pode ser aplicada a qualquer pessoa, senão àquela que cometeu o delito, com dolo ou com culpa (a máxima nullapoenasine culpa caracteriza o princípio da culpabilidade).O princípio da pessoalidade, como é conhecido, está previsto expressamente no artigo 5º, inciso XLV da Constituição Federal.

Não bastasse a pena imposta ao delinqüente deve levar em conta a sua condição humana e a sua dignidade. Não se admite mais as penas desumanas, cruéis e degradantes, sendo que a Carta Magna expressamente veda a pena de morte – salvo em caso de guerra declarada –, as penas de caráter perpétuo e de trabalhos forçados, bem como as penas cruéis (art. 5º, XLVII da CF), garantindo aos presos o respeito à integridade física e moral (art. 5º, XLIX da CF).

Nota-se que a partir do século passado, pelo menos, passou a merecer ênfase especial a meta reabilitação. Designada, indiferentemente, por terapêutica, cura, recuperação, regeneração, readaptação, ressocialização, reeducação e outras correlatas.

Por ser, o conceito da tríplice finalidade é bastante familiar no plano racional, pois o preso é colocado na penitenciária com vistas a ser punido intimidado e principalmente reformado. Entretanto, essa doutrina ainda num enfoque puramente lógico é de enganosa pureza e simplicidade.  Punir é castigar fazer sofrer. A intimidação a ser obtida pelo castigo demanda que este seja apto a causar terror. Ora, tais condições são reconhecidamente impeditivas de levar ao sucesso uma ação pedagógica.

A própria definição de ressocialização da pena é contraditória, pois possui o intuito de regenerar o indivíduo que infringiu as determinações legais, através de sua segregação, a fim de que reflita sobre os danos que causou, no grau de reprovabilidade de sua conduta criminosa e entenda a importância do respeito às leis para um convívio saudável e serene em sociedade.

Temos, então que no momento em que o individuo é encarcerado, parte-se da idéia que ele irá se readaptar na prisão, mas o que de fato ocorre é a desadaptação maior a vida livre. A partir do instante em que o preso se adapta ao sistema penitenciário vigente está se prontificando a sair pior, dificultando assim, sua ressocialização.

Na maior parte dos estabelecimentos prisionais as condições materiais e humanas fazem com que o objetivo reabilitador seja inalcançável. Trata-se de estabelecimentos com infra-estrutura precária, deficiente em todos os seus aspectos, em que se predominam os maus tratos verbais, a insalubridade decorrente da umidade, falta de circulação de ar, higiene e superlotação.

Ressalte-se, que não há como o segregado fugir das influências da prisionização, vez que está preso aquele ambiente até o cumprimento de sua pena.

Isto porque, é sabido que a vida no cárcere, além de deixar de cumprir a meta da reinserção do recluso à vida na sociedade livre, tem um nítido caráter de reprodução de comportamentos, e é demasiadamente estigmatizadora, na medida em que, literalmente, uniformiza os apenados, o que reflete na retirada da individualidade destes.  As características deste modelo prisional podem ser sintetizadas no fato de que a prisão causa efeitos justamente contrários à reinserção do condenado em sociedade livre, além de favoráveis à sua estável inserção na população criminosa.

O conjunto de atitudes, valores e comportamentos adquiridos com a vivência na prisão reproduz as características de uma cultura carcerária. Tal harmonia de fatores constitui a prisionalização do apenado. Este nocivo processo é considerado o principal efeito causado sobre os encarcerados.

Dessa forma, o processo de prisionalização em face de qualquer tipo de reinserção do condenado, tem sido reconduzido ao processo da educação para ser criminoso.

Trata-se de uma aprendizagem que implica em um processo de dessocialização. Esse processo é um poderoso estimulo para que o apenado negue, de forma nítida, as normas admitidas pela sociedade exterior. A prisionalização sempre produzirá graves dificuldades aos esforços que se faz em favor de um discurso ressocializador.

Funciona como se a prisão produzisse exatamente o oposto do que ela menciona ser sua função principal.

E assim, torna-se importante apontar a “função invertida” da pena existente na Lei de Execução, já que ela não combate, mas constrói o desviante, fato de maior importância à explicação da falácia da tentativa de ressocializar.

Há, porém, um recurso capaz de aliviar o sentimento de fracasso das várias metas propostas ao regime prisional. Consiste na redefinição do objetivo readaptação, que e é transmudado de readaptação do interno a vida em sociedade para adaptação do interno à vida carcerária.

Afora a perda da liberdade física (ou do direito de ir e vir), a prisão subjuga o detento ao comando de uma estrutura autoritária e de uma rígida rotina autocrática que opera como uma grande máquina impessoal. O controle sobre os indivíduos é exercido de forma ininterrupta, regulando-se de modo minucioso todos os momentos de sua vida.

Essa adaptação tende à despersonalização do sujeito apenado – a mortificação de seu eu. Quanto maior a intensidade do ajustamento ao sistema social da prisão, maiores as possibilidades de se alcançar os privilégios de que ela dispõe. Ao contrário, mostrar-se resistente acarreta ao indivíduo punido um maior rigor, severidade e endurecimento de seu regime.

Por assim ser, a prisionização é um processo particular de assimilação da cultura prisional, sendo tal cultura entendida tanto em seu prisma formal quanto informal. Deste modo, não apenas leis, normas administrativas e regimento interno compõem a cultura de uma penitenciária, mas sim, e principalmente, a informalidade da organização e manifestações de seus membros.

A estrutura penitenciária e os processos sociais nela inseridos atuam reciprocamente, criando uma força social determinante, capaz de alterar variados aspectos de seus sujeitos, condicionando suas atitudes aos valores da vida carcerária.

O maior ou menor tempo de estada dentro da instituição carcerária é um dos mais importantes fatores para permitira prisionização de um interno. Apesar de não traçar uma relação objetiva entre o tempo penal e os efeitos de prisionização, até pela dificuldade de mensuração. Contudo, ocorre uma rapidez para a assimilação prisional iniciar seus efeitos sobre a figura do interno, inclusive determinando alguns efeitos do fenômeno apurados logo nos primeiros momentos de inserção na prisão.

O fato é que quanto maior o tempo de pena, maiores os efeitos da prisionização. Por outro lado, a rotina da cadeia é capaz de modular o comportamento dos internos, sendo oportuno traçar seus apontamentos sobre a estrutura penitenciária de sua época.

Temos que os indivíduos de personalidade estável, dotados de maior instrução e cujas relações sociais pré-penais sejam positivas e adequadas, acabam por minorar os efeitos insidiosos do ambiente carcerário, relutando em aceitar seus dogmas.

Há grande dinamismo na sociedade prisional, fundada num fluxo constante de entradas e saídas de internos. Em contraponto, as formas e estruturas de controle permanecem praticamente estáticas, mudando pouquíssimo ao longo da história.

Outra característica é a impessoalidade. A modificação das relações de solidariedade, prevalecendo um individualismo também observado na cadeia.

Ademais, a estrutura penitenciária possuí cultura própria, sendo um ambiente marcado tanto por relações conflitivas, como também por acordos e processos de acomodação, fatores contributos para a assimilação prisional e também importantes para os estabelecimentos dos grupos carcerários, os quais atuariam como fator estimulante ou impeditivo à prisionização.

Portanto, a pena favorece o sistema de prisionização, de modo a não efetivar a reintegração do detento a sociedade e tão menos de colaborar na resolução do sistema prisional.

 

REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. “Falência da pena de prisão- causas e alternativas”. 4ª Ed. São Paulo. Editora Saraiva, 2011.

CLEMMER, Donald. Prision Community. 2ª ed. Nova Iorque: Holt, Rinehart And Winston, 1958, p. 84-88.

CODESIDO, Eduardo A. El concepto de pena y sus implicâncias jurídicas en Santo Tomás de Aquino. Buenos Aires: Universitas, 2005.

DENNIS Chapman, Sociology anã the Stereotypes of the Criminal, TavistockPubl., Londres, 1968, ps. 201 e 203.

DOTTI apud JÚNIOR, Alceu Correa; Sérgio Salomão Shecaria. Teoria da Pena: finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de direito criminal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p.128.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral, parte especial. 3. ed. rev., atual. eampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

 

 

 

Âmbito Jurídico

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