“O objetivo do Estado de Direito é limitar o poder do Estado pelo Direito”.[1] Jean Jacques Chevallier.
Sumário: I. Intróito; II. Um necessário e singelo resgate histórico; II.I. De tudo ao princípio: A antiguidade; II.II. A ireluzente idade média; II.III. A moderna promessa; II.IV. A nova e velha teorização: a contemporaneidade; III. O Produto desta histórica dialética; III.I.O Poder Judiciário assumindo o papel da constitucional justiça; III.II O controle de conformidade constitucional dos atos administrativos do executivo como mecanismo prático do tanger; III.II.I. O efeito jurídico da decisão do controle de conformidade constitucional do ato administrativo; IV. Apontamentos conclusivos.
Resumo: Um texto sobre o histórico problema da tangibilidade dos atos administrativos do poder executivo brasileiro. Apresentando as diferentes concepções da Lei ao longo dos momentos históricos da civilização ocidental. Retratando a necessidade moderna de surgimento da Constituição como norma maior, e conseqüentemente a transferência da referência do controle do Poder Executivo da Lei para a Constituição. Uma rápida passagem pelas Constituições brasileiras, afirmando que contemporaneamente existe a possibilidade de controle direto do Executivo pela Constituição. E tal papel cabe ao Poder Judiciário como instituição principal do século XXI para garantir o desenvolvimento de um Estado Democrático de Direito Social no Brasil.
Palavras chave: Conflito de Poderes. Ato administrativo. Tangibilidade. Controle constitucional
Resumen: Un texto sobre la cuestión histórica del controle de poder. Al presentar los diferentes tipos de conceptos de la ley en la civilización occidental. Describiendo el surgir de la Constitución como norma más poderosos como una moderna necesidad, en consecuencia, convertirse en la Constitución más que la Ley de referencia para controlar el Poder Ejecutivo. Un paso rápidamente a través de las constituciones de Brasil, que afirman la posibilidad de controlar contemporáneo Ejecutivo directiva de la Constitución. Y esta es una tarea para poder Judicial como una de las principales instituciones del siglo XXI para el desarrollo de un verdadero Estado social en el Brasil.
Palabras Claves: Conflicto de Poderes. Acto Administrativo. Tangibilidad. De Control constitucional.
Abstract: A text about the historic matter of power tangibility. Introducing the different types of law’s concepts over western civilization. Describing the arise of Constitution as most powerful norm as a modern need, consequently become the Constitution more reference than the Law to control the Executive Power. A quickly passage thru the constitutions of Brazil, affirming the contemporary possibility to control Executive directive from the Constitution. And this is a task to Judiciary Power as a principal institution of XXI century for development of a true Social State in Brazil.
Key words: Power’s conflict. Administrative act. Tangibility. Constitutional control.
I.Intróito
O Poder é uno e indivisível, e o exercício de todas as suas funções, inclusive as precípuas, devidamente distribuídas, obedecem ao interesse público, pois é esta a norma fundamental da Administração Pública como reflexo da norma constitucional fundamental da sistematicidade jurídica: todo poder emana do povo.
A clareza da linguagem do Poder dar-se-á somente com a existência de meios de tanger os atos constitucionalmente desconformes, só este recurso é capaz da reversão da obscuridade, como já apontado por Luhmann[2].
II.Um necessário e singelo resgate histórico
II.I. De tudo ao princípio: a antiguidade
Na Mesopotâmia originaram-se os primeiros textos referentes as normas escritas de conduta da sociedade humana, alguns dirão que eram Leis, outros tantos dirão que não passaram de propagandas e de registros para a prosperidade.
Objetivamente, os textos em linguagem criptográfica esculpida em estelas, estabelecem uma suposta legitimação formal do poder até então totalmente ilimitado das divindades reais.
A descrição das normas em estelas, algo constante e material, acarretaria uma modificação tremenda no modo de pensar das Leis e sua relação com os afetados. As normas não mais estariam no abstrato, já não seriam mais ditadas pelos Deuses aos sacerdotes ou diretamente ao Rei na eminência do acontecido. Resulta assim um grande avanço na segurança jurídica pela possibilidade, inexistente até então, de previsibilidade aplicativa das normas.
Esta segurança jurídica deve-se ao fato de a população, devo advertir em pequena margem, conhecer os ditames divinos pelos textos e não mais pelas falas do Rei. Um outro efeito é a despersonalização das normas tanto a quem ordena como à quem seriam ordenadas.
A cultura suméria, assíria e helênica, ou seja, o povo da antiga Mesopotâmia, conforme E.A.Speiser, deixou um legado imemoriável para a vida moderna. È bom lembrar a seguinte advertência: se temos, ainda, esperança em normas criadas de forma despersonalizadas devemos à este povo, pois influenciaram o Mundo Clássico, e assim a própria civilização ocidental[3], e por que não pensar também no oriente, até pela posição geocêntrica.
Assim em 2350 a.c., reconhecidos por muitos, como o primeiro registro histórico de codificação de normas, e também a primeira reforma social temos o Código de Urukagina ou Uruinimgina. Auto-denominado de Rei de Lagash ou Sumer, cidade da antiga Mesopotâmia.
Historiadores renomados, como o mais experiente em história e linguagem sumérica, Samuel Noah Kramer, apontam o texto de Urukagina como um dos mais precisos documentos de combate à tirania e a opressão do poder da história humana, em todos os possíveis sentidos, e também, como o primeiro registro da concepção da idéia de liberdade, pela palavra amargi, epistemologicamente definida como o “retorno para a mãe”[4].
Este Código tem assim uma importância histórica relevante, sobretudo por tido sido um mecanismo legal de limitação dos poderes dos sacerdotes, dos altos funcionários públicos, estabelecendo mecanismos concretos de justiça social, pela garantia de direitos aos cegos, pobres, viúvas e outros. Na epígrafe de seu Código está escrito: “El poderoso no oprimirá al huérfano y a la viuda: pues tal pacto ha establecido Urukagina con Ningirsu.”[5]
Assim se tornou um importante legado para o mundo ocidental, pois iniciou a tradição de conceber uma base legal ao poder e a justiça com a justificativa de possibilitar uma vida com mais dignidade aos cidadãos, conforme aponta Enrique Nardoni[6].
Trezentos anos depois, em 2050 a.c., Ur-Nammu, proclamou a independência de Ur do reino de Uruk, com a morte de seu irmão o rei UtuKhegal, auto-declarando-se rei da cidade de Ur, fundando assim a terceira dinastia de Ur, que perdurou de 2112 à 2004 a.c.. Ur-Nammu reinou por 18 (dezoito) anos, e seus descendentes governantes por mais de 90 (noventa) anos consecutivos.
O Código de Ur-Nammu, uma compilação dos costumes antigos acumulados culturalmente, foi escrito, na verdade, como dito por alguns especialistas, por seu filho Shulgi. No prólogo aclamou o Rei como o estabilizador da equidade, e aquele que baniu a maledicência e a violência[7]. O Código teve como principal tema a reversão das penas ditas talianas em sanções pecuniárias, dando assim a origem do instituto da indenização[8].
O Código de Eshnunna, de 1930 a.c., traz uma referência ao nome da cidade, que com a queda da terceira dinastia de UR, passa a ter significância econômica, sobretudo pela posição geopolítica na antiga Mesopotâmia, com os reinados bem sucedidos e sucessivos de Naram-Sin, Dadusha e Ibelpiel II.
As compilações estão em duas estelas, encontradas na cidade que atualmente se chama Tell Armar. Os cripotologos ainda não chegaram a um consenso, mas a maioria define que uma das estelas fora esculpida no reinado de Dadusha, conforme informações de Reuven Yaron[9].
O Código traz cerca de 60 artigos sobre variadas temáticas, incluindo um sistema de cortes de julgamento, funcionamento do reino e do palácio, escravidão, casamento e divórcio, interferência do poder real no domínio econômico para coibir altas dos preços de alimentos[10], e serviu de base para a elaboração do Código de Hamurabi.
Aproximadamente em 1.870 a.c. temos o Código de Lipit-Ishtar de Isin[11], que não fora escrito em Estela mas sim em sun-baked clay tablet, o seu prólogo é um exemplo de como as normas eram manifestações de auto-promoção real[12].
Hammurabi sucedeu no trono da Babilônia com a morte de seu pai, reinou absoluto por 43 (quarenta e três) anos, foi elo forte de uma dinastia que perdurou por mais de 300 (trezentos) anos. Teve inegavelmente como principal legado o Código que perdurou por anos como sendo o primeiro, mas jamais perecerá quanto ao ser o mais estudado e assim o mais importante de todos os antigos.
O ano de 1760 a.c. é dito pela maioria como o de elaboração do Código. O primeiro aspecto é sobre a importância, ressaltar ingenuamente que a lei do talião (olho por olho e dente por dente) é a instituição da barbárie é desconsiderar que em tempos remotos somente a descrição de penas já retiraria das mãos do Rei a possibilidade de exercer o poder de forma totalmente arbitrária.
A leitura do Código traz algumas possibilidades de entendimento das características organizativas da civilização, como indicio da preocupação forte em relação as fraudes de processos judiciais, a responsabilidade ao extremo pela instituição da pena capital; a descentralização da administração pela organização em circunscrição; a legitimação da escravidão; possibilidade de venda de mulher e filhos; um sistema de contratos parecido com o atual, sobretudo o de depósito inclusive com responsabilidade patrimonial; o rio presente como demonstrador da verdade. Enfim, as normas tinham efeito concreto (razão da quantidade), parecendo mais sentenças do que Leis.
Em 1250 a.c. temos os dez mandamentos. Em 1280 a 880 a.c. Código de Manú (Manava-Dharma-Sastra, no original sanscrito) escrito em 12 livros contendo ao total 2.685 dísticos (grupo de dois versos), metrificação esta dita como elaboração do santo eremita Valmiki. Manú ora retratado como Adão, ou seja, o primeiro homem na concepção religiosa indiana, filho de Sarasvati e do próprio Brahma, ora como um antigo sábio, rei, legislador, e também como único a sobreviver de um dilúvio.
Ao comparar o direito cuneiforme com outros de diferentes épocas, John Sassoon, já concluíra que as normas das sociedades do ocidente não evoluíram numa linha paralela ao desenvolvimento da complexidade social. Assim o Código de Eshununna seria comparável em termos de reconhecimento dos direito humanos à situação legal da Inglaterra de 1.150 d.c., assim como Código de Hammurabi representaria a Inglaterra de 1.250 d.c.[13].
A criticidade a respeito da natureza das inscrições presentes nas estelas, é feita pelo professor Emanuel Bouzon que esclarece que tais normas representariam a ideologia do rei, num caráter auto-promocional, e significariam a intervenção do rei na sociedade e na economia, com fim propagandístico da imagem real como um garantidor da justiça, como se denota nos prólogos[14].
A existência destes códigos seria a ocasionada pela necessidade de transmissão com maior facilidade ás futuras gerações dos costumes de conduta, e algumas estelas denotam ser na verdade não lei propriamente dita, mas registro histórico realizado por escribas num exercício meramente acadêmico.
Bouzon ainda ressalta que a assirióloga S.Lanfont no Colóquio de Strasbourg introduziu a idéia de que os Códigos seriam utilizados de forma subsidiária, com um caráter complementar as prescrições locais
Ainda teríamos a comentar: 621 a.c. Código de Dracón; 630 a.c. Nascimento de Zaratustra; 600 a.c. Leis de Licurgo; 550 a.c. Nascimento de Confúcio; 560 a.c. Nascimento de Buda; 590 a.c. Código de Sólon; 450 a.c. Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecimarum Tabularum); 350 a.c. Código de Li Kui; 30 a 33. Prelações de Jesus de Nazaré; 313. Edito de Milão; 529. Código de Justiniano; 604: Artigo 17 da Constituição do Japão; 653. Código Tang.
A pretensão desta descrição é elucidar o cerne da intenção humana de criar normas de conduta social, cada uma das fontes foi importante influência na história de seu povo, mas vale lembrar Norberto Bobbio, que esclareceu que a história do pensamento político ocidental avançou no preconizado pensamento de Aristóteles[15]. Este elucidou que desde a sua origem o poder encontrou no Governo das Leis a limitação às paixões do Governo dos homens[16].
A tragédia grega de Sófocles, Antígona, traduz bem o nascedouro do interesse público como vertente da governabilidade ante a necessidade de aglutinação de todos em prol do bem comum da coletividade. A idéia central da peça é se uma só mulher poderia questionar o Estado ou o Estado é inquestionável contra esta individualidade (privado versus público), ou seja, se Creonte deve escutar Antígona. Em outro plano mais aprofundado se a coletividade pode controlar o poder (público versus público[17]), ou seja, se Creonte deve escutar o Coro[18].
A peça ao mesmo tempo em que inova no pensamento antigo, individualizando o direito, ratifica a imutabilidade do direito, existente até então. O direito sagrado não cedia, não era revogado, era supremo ao tempo[19], este foi o respeito enaltecido por Sófocles, homem extramente religioso, que concedida aos Deuses, e somente a estes, o poder de ditar Leis. O pensamento sófocleano fazia questão de enaltecer o respeito a esta imutabilidade, como o fez, por exemplo, em versos da peça Édipo Rei, quando conceitua as Leis: “há um poderoso deus latentes nelas, eterno, imune ao perpassar do tempo.”[20]
Assim Sófocles fez a história do mundo ocidental não sendo mais um poeta trágico sentimentalista, e sim um grande ativista político poético, como bem ressaltou Friedrich Nietzche[21], revolucionou o pensar dos antigos, erigindo a individualização do homem à norma superior, construindo a subjetividade de direito, através do único meio possível existente: a religião. Inverteu o papel de cidadão até então existente de fazer o que o Estado-individuo manda para o bem da coletividade, para mandar o Estado-coletivo fazer o bem da individualidade.[22]
Tal discussão veredou também pelas retóricas do filosofo Platão, possivelmente nos grandes debates realizadas na Agorá Ateniense, e, provavelmente objeto dos ensinamentos na dita Academia, nos quais ficou marcado que o governante é escravo da Lei[23]. Assim a tangibilidade do poder antigo é inserida num primeiro momento no campo da legalidade, esclarecendo que a Lei era entendida como a vontade dos Deuses, e não como dos próprios homens.
Já no Império Romano temos: o veto do Tribuno da Plebe (contra ações injustas dos patrícios); a Lei de Valério Publícola (proibindo penas corporais em certas situações) ou o Interdicto de Homine Libero Exhibendo (uma espécie de habeas corpus), que foram constituídos como instrumentos normativos não de controle do poder, mas de uma pequena limitação.
II.II.A ireluzente idade Média
Na idade das trevas, as luzes se apagam ao indivíduo, o Poder ganha a máxime da intangibilidade, o mundo torna-se propriedade do Imperador e da Igreja Católica, aos homens cabem a obediência inconteste. O Poder do Rei ganha o patamar de supremo. O Rei converge todas as decisões políticas da sociedade em um só apontar do cetro.
A representação divina da Lei de outrora passa a ser a legitimação divina do Poder, Luiz Wechmann já enalteceu o superposicionamento real na pirámide da hierarquia medieval, referindo que ao Rei cabia declarar o directo de plano (jus dicere)[24].
A Magna Charta Libertatum, do Rei João Sem Terra , datada do ano de 1.215, iniciando o romper da obscuridade da linguagem do poder medieval faz a menção da possibilidade da tangibilidade do poder da nobreza em face da Lei[25].
II.III.A moderna promessa
A modernidade tem como marco a queda da bastilha, nascendo assim com os ideais da Revolução Francesa, que como Eric J. Hobsbawm discera, foi o fundamento para toda a política e ideologia do século XIX no mundo, fornecendo o vocabulário, temas da política liberal e da radical-democracia, o conceito de nacionalismo, bem como os códigos legais, o modelo de organização técnica e científica e o sistema métrico de medida para a maioria dos países[26].
A Revolução Francesa como marco histórico resgata a idéia antiga da legitimidade da ordem política no direito, pretendendo libertar a humanidade do despotismo, consagrando a filosofia do direito natural moderno da liberdade, conforme Florence Gauthier[27].
Adveio de um postulado libertário da revolução francesa, que no artigo 6º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (França, 26 de agosto de 1789) prescreve:
“A Lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de participar, pessoalmente ou através de seus representantes, da sua elaboração. Ela deve ser igual para todos, seja protegendo, seja punindo. Todos os cidadãos, sendo iguais a seus olhos, estão igualmente habilitados a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, conforme suas capacidades e sem outra distinção além daquela virtude e dos seus talentos.” (Grifo nosso)
A partir do século XIX, com surgimento do constitucionalismo, a idéia de sobreposição de uma norma sobre outra ganha outro aspecto, além da temporalidade, a vinculariedade com a Constituição. A doutrinadora francesa Simone Goyard-Fabre leciona que a idéia-força era o direito elaborado sob a édige de uma ordem constitucional ganharia eficiência prática sob o manto de uma diretividade normativa imperativa aos próprios textos legais[28], impondo assim ao direito consuetudinário a sobrevalência dos ditames estatais.
Assim a liberdade do homem ganhou o mundo pelos ideais revolucionários franceses. O mundo moderno teorizou a promessa do termino do domínio do poder do eclesiástico conjugado com a nobreza, Assim a esfera de controle do poder deixou de ser Deus para ser o capital. Para este fim a organização estatal necessitada de uma nova organização estatal, foi o reconhecimento da primeira geração de direitos fundamentais: liberdade contra o Estado opressor.
O próprio fundador da teoria da tripartição das funções do Poder, Barão de Montesquieu, já sustentava, outrora, a tangibilidade de uma pela outra, para coibir o abuso inerente do homem sem limites[29].
No Brasil perdurava a Constituição Federal Imperial de 25 de março de 1.824, que já no Preâmbulo exemplificava a intangibilidade do Executivo pela aclamação de Dom Pedro I como Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil. O artigo 3º estabeleceu o sistema de governo como sendo uma monarquia hereditária constitucional e representativa.
No título III, o artigo 10 assim dispõe: “Os poderes políticos reconhecidos pela Constituição do Império do Brazil são quatro: o Poder Legislador, o Poder Moderador, o Poder Executivo e o Poder Judicial.”
O Poder Moderador seria a base de toda a organização política, exercido pelo Imperador como Chefe Supremo da Nação, tendo como fim precípuo a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos, como detona do artigo 98 e 99[30].
Entre as competências estabelecidas ao Poder Moderador que retratam bem a intangibilidade, temos os seguintes incisos do artigo 101: I. Nomear os Senadores; V. Prorrogando, ou adiando a Assembléia Geral, e dissolvendo a Câmara dos Deputados, nos casos, em que o exigir a salvação do Estado; convocando imediatamente outra, que a substitua; VII. Suspendendo os Magistrados nos casos do Art. 154; VIII. Perdoando, e moderando as penas impostas e os Réus condenados por Sentença.
As Constituições brasileiras, a partir de 1.891 trazem a necessidade de limitação da atividade do Poder, sobretudo do Executivo, como se denotada do ensinamentos de Ruy Barbosa, citado por Celso Bastos e Ives Gandra Martins[31], e do texto juramento presidencial descrito no artigo 44[32]. Nitidamente a teoria americana dos freios e contrapesos foi a base deste pêndulo do equilíbrio do poder.
O redator principal da primeira Constituição Republicana, a de 1.891, já alertava que com a absorção de conceitos constitucionais norte-americanos federalistas era necessário para contornar vícios inerentes ao sistema alienígena precisaria o sistema presidencialista brasileiro dotar o Poder Jurisdicional de posição oracular, com o uso da teoria dos freios e contrapesos[33].
Bem ressaltou também o “formalista” Rui Barbosa, agora citado por Bolívar Lamounier, já nos idos da Primeira República, que estes vícios do Presidencialismo seriam contornos pelo Poder Jurisdicional, principalmente nas questões de constitucionalidade.
Carlos Maximiliano ratifica que a doutrina dos freios e contrapesos no presidencialismo é configurada por uma Justiça garantidora da ordem constitucional, legitimada pelo sacrário da lei, e, refugiada na supremacia de sua consciência jurídica[34].
Mas afinal, quais foram os conceitos norte-americanos que geraram a teoria dos freios e contra-pesos? O jus-filosofo americano Robert A. Dahl nos elucida com a transcrição dos diálogos dos constituintes de 1.787, que fora o sempre receio do poder ilimitado[35].
Aprofundando esta adaptação dos freios e contrapesos do sistema parlamentarista ao sistema federalista presidencialista, Ruy Barbosa dispõe com genialidade especificadamente sobre o tangibilidade do ato administrativo inconstitucional:
“Não é somente contra as deliberações políticas, da administração ou de Congresso, que os tribunais não dispõem de auctoridade revogatória. Os Tribunais só revogam sentença. O que elles fazem aos actos inconstitucionaes de outros poderes é coisa techincamente diversa. Não os revogam: desconhecem-nos.[36] ”
A possibilidade da limitação do Executivo, pelo princípio da legalidade, surge com o Estado Liberal, foi este o ideal central de toda a teoria administrativista do século XIX. O reconhecimento dos direitos individuais de primeira geração é a própria subsunção do Poder aos limites legais, conforme bem historicizado por Caio Tácito[37].
A modernidade reconstruiu a tangibilidade do poder Executivo pela trilhar do caminho da especialização da legalidade, na assertiva de sendo cada vez mais específico menos seria a margem da discricionariedade, mas deixou em evidência o quanto era importante um judiciário atinente à eficácia constitucional.
A ilusão acabou quando nitidamente a boca da Lei não mais fala a linguagem clara do povo. A Lei tornar-se quase um entrave insuperável para tanger os atos do Executivo, pois é o mesmo, que subvertendo a ordem das coisas, legisla em causa própria, e exercendo também, através da formação das comissões uma preponderante influência sobre o Legislativo[38].
II.IV.A nova velha teorização: a contemporaneidade
Os pilares do Direito Público contemporâneo são sustentados numa base filosófica com a intenção de fornecer aos cidadãos mecanismos de proteção aos atos arbitrário do Estado, e, não, como ainda pensam alguns, de simplesmente regular as atividades do Poder Público. Lecionou Carlos Ari Sundfeld que o ponto de vista do atual direito público é da proteção e não do autoritarismo[39].
É justamente desta base de sustentação protética feita da miscigenação de princípios do Estado Liberal, do Estado de Direito, e, do Estado Democrático, que surge dos pilares do Direito Público, o atual e jovem, Estado Democrático e Social de Direito.
Os Códigos passam a perceber a descabida importância de seus valores, diante da magnitude de uma Constituição feita com fervor democrático da valorização da dignidade da pessoa humana. A parametrização da legalidade sucumbe ao grau normativo superior da Constituição no quesito da limitação do Poder Executivo.
A eficácia teórica da Constituição em cumprir o seu papel como elemento normativo superior da sistematicidade jurídica vem sendo reconhecidamente valorizado diante do propenso fim politiqueiro da legalidade[40].
A contemporaneidade vislumbra uma nova chance da concreção das promessas da justiça social pelo sonho constitucional, Paulo Bonavides em brilhante ensaio ressalta a tomada de virtuosidade do princípio da constitucionalidade como escudo protetor do cidadão[41].
Escudo este que deveria, conforme Juarez Freitas, ter eficácia direta e imediata, para assim podermos edificar um Estado essencialmente comprometido em fornecer ao indivíduo um desenvolvimento físico, psíquico e espiritual[42].
Assim o valor da proteção do individuo estar a ganhar ênfase, rompendo a cizânia dos cegos pela discricionariedade, soprando nos ares com a força do vento da democracia, se tornando cada vez mais o produto sobressalente desta histórica dialética.
III.O produto desta histórica dialética
O homem público ao longo dos séculos há de ter aprendido que uma sociedade justa, independentemente da legitimação do domínio do poder, necessita de auto-limitação do poder, incorporada em instituições livres e democráticas, pelo que pondera Karl Loewenstein[43].
A auto-limitação pressupõe dois pré-requisitos a própria consciência jurídica do controle do poder pelo poder, e o estabelecimento dos contornos destes limites. Um exemplo histórico, e de muita relevância sobre circunscrição do poder, referenciado por José Afonso da Silva, citando Jacques Robert, é a construção paulatina pelo Conselho Constitucional da França do “bloco de constitucionalidade”, baseado em princípios, nem sempre previstos nos textos magnos, consonantes com os valores de seu tempo. Esta seria então a responsabilidade do juiz constitucional: acompanhar o seu tempo, mesmo que ele seja inelutavelmente conduzido a criar ele próprio novos princípios para responder às múltiplas indagações da época[44].
O prevalecimento das teses favoráveis ao controle ponderado da Administração é o produto desta dialética história, não menos que Eduardo Garciá de Enterría conclui:
“A história da redução destas imunidades, desta constante resistência que a Administração opôs à exigência de um controle judicial pleno de seus atos mediante a constituição de redutos isentos e não fiscalizáveis de sua própria atuação, podemos dizes que, em geral, é a própria história do Direito Administrativo”.[45]
III.I.O Poder Judiciário assumindo o papel da Constitucional Justiça
O Poder Jurisdicional detêm a partir do século XX, com o transmudar do eixo central do sentido da Lei, agora não mais como vontade geral absolutamente representada, e o Poder Executivo se transformando em pedra angular de toda atividade pública administrativa, um novo papel: o de tanger os atos e fatos administrativos em conformidade com à Constituição. Flávio Dino de Castro e Costa, citando Mauro Cappelletti salienta o papel do novo Judiciário, com a metáfora que juízes neutros somente são encontráveis no cemitério[46].
Antonio Carlos Wolkmer, citando Sadok Belaid, que os fundamentos do Direito Público serão realmente concretizados quando os Juízes tomarem a consciência do espírito hermenêutico emancipador necessário para concreção da função equilibradora do controle de conformidade constitucional dos Atos Governamentais[47].
A tangibilidade dos atos do Poder Executivo não significa ingerência de poderes, pois o Poder Jurisdicional como todos outros segue parâmetros de legitimidade de sua atuação finalística, como bem assevera Sérgio D´ Andréa Ferreira[48].
O romper com os idos tempos da Ditadura Legal deve ser massificado na magistratura. A concreção das promessas sociais da modernidade é mais que necessária, é urgente. O olhar técnico da conformidade deve ser guiado primeiro pela constitucionalidade, não mais pela legalidade, esta é a tão aclamada revolução copernicana da Justiça, sobretudo diante das inércias ou ineficazes ações do Executivo na proteção ao cidadão da miserabilidade da vida capitalista, como bem ressaltado por Lênio Streck citando Jorge Miranda[49].
III.II. O Controle de Conformidade Constitucional dos Atos Administrativos do Executivo como mecanismo prático do tanger
O constitucionalista Alexandre de Moraes ratifica a função da justiça constitucional em controlar o bom funcionamento dos poderes públicos e de suas respectivas competências[50].
Este bom funcionamento para J.J.Gomes Canotilho é feito através da conformação do que é efetivado na prática do agir institucional com o dado como forma pela Constituição, ou seja, a Constituição é uma lei proeminente que com-forma o Estado[51].
O doutrinador Oswaldo Luiz Palu é enfático ao dispor sobre o controle jurisdicional dos atos do Poder Executivo, lembrando que tal controle recebe a denominação de controle de conformidade constitucional:
“E não há como deixar de admitir que existem limites tanto no que concerne à ação do legislador (controle de constitucionalidade) como em relação à função governamental e à atuação da burocracia (controle de conformidade), sendo, estes, verso e reverso da mesma moeda, o que diz que as técnicas de controle em face de um (lei) podem ser do outro (ato de governo, ato administrativo). (…) O controle de conformidade abrange atos outros que não a lei formal e funda-se nas lei e também na Constituição. Sua conseqüência não é a insconstitucionalidade, mas a desconformidade constitucional, muito mais que simples legalidade. Atinge inclusive os atos de governo, atos normativos que não leis, atos de efeito concreto e as omissões estatais. Assim dirige-se à: a) omissão governamental ou administrativa; b) o poder regulamentar “autônomo”; e c) a execução das leis pelo governo”.[52]
III.II.I. O Efeito Jurídico da Decisão do Controle de Conformidade Constitucional do Ato Administrativo
A subordinação dos atos governamentais perante a Constituição é freio às possíveis arbitrariedades cometidas pela Administração Pública no uso das competências atribuídas pela própria Constituição Federal.
Por fim, o efeito jurídico do controle de conformidade do ato governamental com a Constituição é a determinação de uma obrigação, e ainda, a declaração de nulidade de tal ato.
Assim, o controle de constitucionalidade leva à nulidade da lei; o controle de conformidade tem como conseqüências as injunctions, ou seja, determinações de obrigação de fazer e não fazer ao agente estatal, além da nulidade dos atos desconformes[53].
A inconstitucionalidade leva à anulação da lei, com os efeitos ex tunc e ex nunc, apenas. Mas o controle conformidade – que deriva do Estado Democrático de Direito na tutela de direitos fundamentais – pode gerar a invalidade do ato e ordens para atuar ou condenação em obrigação de fazer e não fazer (injunctions, astreintes). As conseqüências são substancialmente diversas[54].
A diferença, da inconstitucionalidade e da desconformidade constitucional, é a possibilidade de obrigar o Ente Estatal a cumprir com determinada obrigação, além da declaração de nulidade do ato objeto.
Na declaração de nulidade é implícita a inexistência de produção de qualquer efeito jurídico do ato administrativo. Assim o ato é dado como nunca existente, sendo necessário que todos os seus efeitos sejam suprimidos da sistematicidade jurídica, retornando ao status quo anterior a produção do ato administrativo.
Este é o efeito jurídico do nulo constitucional: a inexistência total do ato administrativo, não deixando pistas temporais de sua validade. Não deixando assim margem ao Executivo para manobras burocráticas na composição de interesses prejudiciais ao interesse público.
Isto implica dizer que em Mandado de Segurança visando a nulidade de ato administrativo, por ser arbitrário, com fundamento em desconformidade constitucional, o efeito produzido pela sentença alcança momento anterior a impetração da Ação.
O ato está em desconformidade constitucional, assim recebe a taxativa natureza de nulo, não anulável. E neste diapasão o efeito jurídico da decisão de desconformidade constitucional alcança o espaço temporal entre produção do ato até a sua nulificação.
IV.Apontamentos Conclusivos
A história demonstra que oprimido e a opressão lutam incessantemente sobre o calvário da tutela do Estado por seus interesses. A dialética desta luta resultou ao longo do tempo o surgimento teses e antíteses sobre o que o Estado pode ou não pode dever ao seu povo.
As instituições públicas foram surgindo, pelo menos na teoria, para tentar fazer valer as teses que foram sendo positivadas em favor dos oprimidos. A primeira delas como tratado por Aristóteles e Platão é a de que as próprias teses surgem de acordo com as leis, ou seja, dos representantes do povo, e não da vontade unilateral do governante.
Alguns modelos de instituições faliram, outros tantos ainda não são admitidos à falência. Assim neste eivar de manter o status foram criadas novas instituições para tentar fazer valer as instituições já criadas ante a iminência da sucumbência.
Neste monstro de arremedos que virou o Estado, as instituições em determinado momento essencial da concreção de seu fim (tentar fazer valer as teses positivas) vão se esvaziando, e, logo após, simplesmente como um balão que troca de gás, inflam sobre novos auto-interesses, os chamados interesses institucionais. Assim o interesse de criação da instituição que era público, agora é representado pela própria mantença da vida da criatura-instituição.
Neste ínterim o criador (povo) vê sua criatura (instituição) não mais controlada, e, muita das vezes a própria criatura volta-se contra o criador. Isto pode ser freqüentemente observado em todas as instituições brasileiras.
Principalmente o que se refere ao Poder Executivo, órgão responsável pela dita administração, com o poder do orçamento na mão, tornou-se mecanismo de administrar dos interesses das outras instituições em prol dele próprio, conforme a benesse aos comanditários da criatura e não dos criadores.
Assim o Estado Democrático de Direito Social, última versão filosófica da tentativa do homem dar ao homem aquilo que minimamente o homem precisa (princípio da dignidade humana), incluiu em seu bojo mecanismos de controle deste propenso desvirtuamento da Administração Pública.
A Constituição da República é o manual de limitação deste agir institucional. Assim o controle da ação da Administração será, ao contrário que muitos pensam, primeiramente constitucional e em segundo aspecto legal.
O Estado Democrático de Direito, na chamada reversão copernicana, reconstruiu a possibilidade de tanger os atos administrativos, sobretudo do mastodonte do Executivo sob a conformidade destes com o determinado diretamente pela Constituição, é o chamado por Oswaldo Palu, de controle de conformidade constitucional dos atos administrativos.
A instituição responsável para fazer valer o interesse público no Executivo como determinado pela Constituição é o Judiciário, caso este assim não o faça a estrutura oscilante do Estado baseada no pêndulo do contrabalanceio dos controles tombará empurrada pela reacionária antítese da impossibilidade da judicialização da política ou politização da justiça.
Assim, rejuvenescido o caminho de concreção efetiva da própria idéia conceptiva do Estado, de que cabe a este como criação organizativa do homem por um justo meio social de vida, fazer valer o axioma de que o ser humano é o ser homem com a garantia de uma vida minimamente digna.
A contemporaneidade, esperançosa pelo regaste dos valores do humanismo e surgimento de novos ideais sociais, houve de reconstruir a tangibilidade dos atos do Poder Executivo pelo Estado Democrático de Direito por meio do controle de conformidade constitucional. A subsunção dos Poderosos contemporaneamente não é precipuamente ao Governo das Leis, mas sim o Governo da Lei das Leis: a Constituição da República.
Notas:
[1] L´Etat de droit. Paris: Montchrestien,1992.p12.
[2] “O poder é, «por natureza», difuso e flutuante. Só com o recurso à distinção entre o poder de acordo com o direito ou em oposição a ele é que se pode ter uma alternativa clara.” In: O Poder, trad. Martine Creusot Martins, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1992. p.29.
[3] “Civilizations, like individuals, are known by their works. (…) Our culture debt to that remote civilization is far more substantial and varied than is generally recognized. When we rockon today our years by the sun and our weeks by the mon, and call the days of the week after the planets; when we look at our time-pieces to tell the hours and the minutes ad the seconds in conformance with sexagesimal system of numeration; when we approach the “babel” of tongues with the tooles of linguistic analysis; when we write our official records, our scholarly treatises, our literary creations, or our provate letters; when we reaffirm our faith in laws impersonally conceived and in government that shuns autocracy – when we do these and many other things, we are utilizing, whether we know it or not, the results os an immemorial experiment in living in wich ancient Mesopotamia played a leading part. (…) Mesopotamian law in its domestic operation. Its strength derived from the premise that law on earth derived from premise that law on earth must be in harmony with cosmic law and a order. It remans now to examine the dynamic capacbilities of the Mesopotamian system as evidenced by its effect on Babylonia´s neighbors, other societies of the ancient Near East, and finally the Classical word and hence ultimately also Western civilization.” In:
Cuneiform Law and the History of Civilization. American Philosophical Society Proceedings. vol. 107, n.º 6, 1963. American Philosophical Society. P.536 – 538.
[4] “From about 2350 B.C., during the reign of Urukagina of Lagash, we have one of the most precious and revealing documents in the history of man and his perennial and unrelenting struggle for freedom from tyranny and oppression. This document records a sweeping reform of a whole series of prevalent abuses, most of which could be traced to a ubiquitous and obnoxious bureaucracy consisting of the ruler and his palace coterie; at the same time it provides a grim and ominous picture of man’s cruelty toward man on all levels–social, economic, political, and psychological. Reading between its lines, we also get a glimpse of a bitter struggle for power between the temple and the palace–the “church”and the “state”–with the citizens of Lagash taking the side of the temple. Finally, it is in this document that we find the word “freedom” used for the first time in man’s recorded history; the word is amargi, which, as has recently been pointed by Adam Falkenstein, means literally “return to the mother.” In: The Sumerians: Their History, Culture, and Character. Chicago: University of Chicago Press, 1971. p.79
[6] “He substantiated his declarations with deeds promoting prosperity, order and peace. In the same way, he showed religious and social sensitivity by giving primacy to his divine mission of legally protecting the oppressed and forsaken. (…)Urukagina’s reform was brief; it lasted just seven years, and ended with his death. But his reforming reign was not simply a shooting star. It demonstrates, rather, the traditional tendency to create and reform legal structures so that citizens
can easily fulfill their purpose in life, which was to serve the divine world. Urukagina’s reform was fleeting, but it made a permanent contribution to the culture of the ancient Near East: it reinforced the tradition to give justice a legal base, so that all citizens might have a healthy and prosperous life. In: Rise Up, O Judge: A Study of Justice in the Biblical World , trad. Seán Charles Martin; Peabody: Hendrickson Publishers, 2004. p3 – 4”
[7] “Then did Ur-Nammu, the mighty warrior, king of Ur, king of Sumer and Akkad, by the might of Nanna, lord of the city (of Ur), and in accordance with the true word of Utu, establish equity in the land (and) he banished malediction, violence and strife… The orphan was not delivered up to the rich man; the widow was not delivered up to the mighty man; the man of one shekel was not delivered up to the man of one mina.”
[8] Exemplos: “If the wife of a man, by employing her charms, followed after another man and he slept with her, they (i.e. the authorities) shall slay that woman, but the male (i.e. the other man) shall be set free.; If a man divorces his primary wife, he must pay (her) one mina of silver.; If a man accused the wife of a man of fornication, and the river (-ordeal) proved her innocent, then the man who had accused her must pay one-third of a mina of silver.; If a man, in the course of a scuffle, smashed the limb of another man with a club, he shall pay one mina of silver.; If a man’s slave-woman, comparing herself to her mistress, speaks insolently to her (or: him), her mouth shall be scoured with 1 quart of salt.; If a man appeared as a witness (in a lawsuit), and was shown to be a perjurer, he must pay fifteen shekels of silver.; If a man flooded the field of a(nother) man with water, he shall measure out (for him) three kōr of barley per ikū of field.”
[9] In: The Laws of Eshnunna. Brill Academic Publishers. 1988. p.19-20.
[10] Exemplos das normas do Código de Eshunna: “1 kor of barley is (priced) as 1 shekel of silver; 3 qa of “best oil” are (priced) at 1 shekel silver…; The hire for a wagon together with its oxen and its driver is 1 pan (and) 4 seah of barley.; If it is (paid in) silver, the hire is one third of a shekel. He shall drive it the whole day.; The wages of a harvester are 2 seah of barley; if they are (paid in) silver, his wages are 12 grain.; If a man takes a(nother) man’s daughter without asking the permission of her father and her mother and concludes no formal marriage contract with her father and her mother, even though she may live in his house for a year, she is not a housewife.; If a man bites the nose of a(nother) man and severs it, he shall pay 1 mina of silver. (For) an eye (he shall pay) 1 mina of silver; (for) a tooth ½ mina; (for) an
ear ½ mina; (for) a slap in the face 10 shekels of silver.; If an ox gores an(other) ox and causes (its) death, both ox owners shall divide (among themselves) the price of the live ox and also the meat of the dead ox.; If an ox is known to gore habitually and the authorities have brought the fact to the knowledge of its owner, but he does not have his ox dehorned, it gores a man a man and causes (his) death, then the owner of the ox shall pay two-thirds of a mina of silver.; If a wall is threatening to fall and the authorities have brought the fact to the knowledge of its owner (if nevertheless) he does not strengthen his wall, the wall collapses and causes a free man’s death, then it is a capital offence; jurisdiction of the king.; If a man divorces his wife after having made her bear children and takes [ano]ther wife, he shall be driven from his house and from whatever he owns and may go after him who will accept him.”
[11] Exemplos de normas do Código de Lipit-Ishtar: “If a man entered the orchard of (another) man (and) was seized there for stealing, he shall pay ten shekels of silver.; If a man cut down a tree in the garden of (another) man, he shall pay one-half mina of silver.; If a man married a wife (and) she bore him children and those children are living, and a slave also bore children for her master (but) the father granted freedom to the slave and her children, the children of the slave shall not divide the estate with the children of their (former) master.; If a man rented an ox (and) broke its horn, he shall pay one fourth of (its) price.”
[12] “(…)when Anu (and) Enlil called Lipit-Ishtar—Lipit-Ishtar, the wise shepherd…to the princeship of the land in order to establish justice in the land, to banish complaints, to turn back enmity and rebellion by the force of arms, (and) to bring well-being to the Sumerians and Akkadians, then I, Lipit-Ishtar, the humble shepherd of Nippur, the stalwart farmer of Ur… Verily…I made the father
support his children (and) I made the children [
support their] father; I made the father
sta[
nd by hi]s children (and) I made the children
stand by their father; in the father’s house (and) [in the brother’s] house…
[13] “The development of law in the Code of Hammurabi by roughly 1750bc is compared approximately with that in Athens over one thousand years later: “In athesn, Draco´s legislations of thereabouts seems to have represented the close of our primitive period…; while in his article ‘An eye for an eye in Iraq he compared the laws of Hammurabi with those of England in the Middle Ages: “The L.E (Laws o Eshnunna), and the laws of Ur-Nammu, as far as they go represent the legal situation in England in ad1150. The C.H. (Code of Hammurabi) represents England in 1250. So the word ‘primitive’ as used by A.S Diamon describe a stage of development regardless or whether it is ancient, recent or current.” In: Ancient Laws And Modern Problems: The Balance Between Justice and a Legal System. Intellect Books. 2005. p.168.
[14] “Em inscrições reais, listas de datas, cartas e documentos jurídicos do período babilônico antigo encontram-se mencionados atos reais, cuja finalidade era, sem dúvida, restaurar a ordem e a justiça na sociedade babilônica. Tais atos descrevem, sempre, uma intervenção do rei na sociedade e na economia do reino e significam uma suspensão temporária do direito vigente e de direitos adquiridos.
(..) A estela é uma inscrição real e está, naturalmente, a serviço da ideologia do rei. Nesta estela as prescrições foram emolduradas por um prólogo e um epílogo e a finalidade desta obra é, sem dúvida, celebrar o rei como o garante da justiça do país. In: Origem e Natureza das Coleções do Direito Cuneiforme. Revista Justiça e História. Vol.2. N.º 3.
[15] “Quando se invoca a legalidade do poder, exige-se que quem o detém o exerça não segundo o próprio capricho, mas em conformidade com as regras estabelecidas e dentro dos limites dessas regras. O contrário do poder legítimo é o poder de fato, o contrário do poder legal é o poder arbitrário. Toda a história do pensamento político ocidental está atravessada pela pergunta: “É melhor o governo das leis ou governo dos homens?” Desde Aristóteles, a resposta avança no sentido do primeiro termo do dilema:
“A lei não tem paixões – diz Aristóteles – que necessariamente encontramos em cada homem (Política, 128a).” In: Teoria Geral da política. RJ: Campus, 2000. p.237.
[16] “É mais útil ser governado pelo melhor dos homens ou pelas leis melhores? Os que apóiam o poder régio asseveram que as leis apenas podem fornecer prescrições gerais e não provêm aos casos que pouco a pouco se apresentam, assim como em qualquer arte seria ingênuo regular-se conforme normas escritas…
Todavia, aos governantes é necessária também a lei que fornece prescrições universais, pois melhor é o elemento que não pode estar submetido a paixões que o elemento em que as paixões são co-naturais. Ora, a lei não tem paixões, que ao contrário se encontram necessariamente em cada alma humana.” In: Política, 1286a. (Grifo nosso).
[17] Neste plano a antinomia é tratada no que entendemos hoje como direito público. Nas falas de Hêmom (versos 785/795 e no diálogo ápice de enfrentamento com Creonte versos 836/839 ) são reveladas o que Tebas pensa, e posteriormente confirmadas na última estrofe da peça pelo Coro (que tem como papel neste caso expressar o pensamento dos cidadãos).
[18] “Agora, o coro ganhou uma nova posição: a força natural dos antagonismos se legitima e torna-se em Sófocles e Ésquilo, a partir do impetuoso coto dionisíaco, o “espectador idealizado”, o sereno representante do ponto de vista geral.” In: Friedrich Nietzche. Introdução á tragédia de Sófocles; apresentação à edição brasileira, tradução do alemão e notas Ernani Chaves. RJ: Jorge Zahar Ed, 2006. p.62.
[19] “Em princípio, por ser divina, a lei era imutável. Devemos notar que nunca se revogam as leis. Podiam se fazer leis novas, mas as antigas subsistiam sempre, por mais contradição que houvesse.” In: Fustel de Coulanges. Cidade Antiga. Trad. Jean Melville. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005. p.209.
[20] “Seja-me concedido pelos fados compartilhar da própria santidade não só em todas as minhas palavras como em minhas ações, sem exceção, moldadas sempre nas sublimes leis originárias do alto céu divino. Somente o céu gerou as santas lei; não poderia a condição dos homens, simples mortais, falíveis, produzi-las. Jamais o óbvio as adormecerá; há um poderoso deus latente neles, eterno, imune ao perpassar do tempo.” Édipo Rei, Sófocles, versos 1029 – 1040.
[21] “Sófocles não é poeta da perfeita harmonia entre o divino e humano: submissão e resignação incondicionais, eis a sua doutrina.” Ob.cit. p.71.
[22] Ver Antígona: mãe da individualização do direito. Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9440>
[23] “Chamei aqui de servidores das leis aqueles que ordinariamente são chamados de governantes, não por amor a novas denominações, mas porque sustento que desta qualidade dependa sobretudo a salvação ou a ruína da cidade. De fato, onde a lei está submetida aos governantes e privada de autoridade, vejo pronta a ruína da cidade; onde, ao contrário,
a lei é senhora dos governantes e os governantes seus escravos,
vejo a salvação da cidade e a acumulação nela de todos os bens que os deuses costumam dar às cidades.”In:Leis, 715d. (Grifo nosso).
[24] “En toda relación feudal hay un señor y un junior, un señor que confia el feudo a un vasallo reservándose el dominium proprietatis del mismo, y un vasallo que recibe este feudo sobre el cual sólo tiene un dominium possessionis. Para completar la pirámide, para encontrar la piedra-chave del edificio, el feudalismo necesita de un ápice y este ápice, esta piedra-chave es precisamente el Emperador, cuya alta suzerania universal – si bien imprecisa – es el toque de unidad del mundo, la coranación del sistema feudal, la fuente de oda jurisdicción. (…) La esencia del “estado”medieval radica no tanto en una integridad territorial, sino más bien en ser la esfera del monarca en su doble capacidad de protector en el campo político, y magistrado en el campo jurídico. Como magistado, su más alto cometido es el jugar; Alvaro Pelagio define esta actividad como “la determinación equitativa de lo que es justo.” Como para la menta ,edieval el Derecho Natural es la inmutable personificación de la justicia, se sigue que le actividad regia de juzgar se reduce a un simple “declarar” el derecho (ius dicere). De acuerdo con el pensamiento político medival, el rey es el juez natural en todo su reino, siendo todo los jueces menores y cortes particulares meros representantes suyos: “el rey es el juez común dondequiera”, dice el Espejo de Sajonia. Este básico concepto muestra su consistencia cuando al principio de la etapa transicional a la creación del Estado moderno, Durantes, el canonista y civilista de más importancia en la segunda mitad del siglo XIII, frente a la teoria de que “el rey es Emperador dentro de su reino”, el que noes posible en manera alguma, apelar del judicio del rey, constituido así como el más alto de los jueces, al tomar dentro de su reino la posición del Emperador en la Cristiandad.” El Pensamiento Político Medieval y las bases para un Nuevo Derecho Internacional. Universdad Nacional Autonoma de México: México, 1950. p. 35; 78 e79.
[25] “Não venderemos, nem recusaremos, nem protelaremos o direito de qualquer pessoa a obter justiça. (…) Só serão nomeados juízes, oficiais de justiça, xerifes ou bailios os que conheçam a lei do reino e se disponham a observá-la fielmente.(…) Todos os direitos e liberdades, que concedemos e que reconhecemos enquanto for nosso o reino, serão igualmente reconhecidos por todos, clérigos e leigos, àqueles que deles dependerem.”
[26] “Se a economia do mundo do século XIX foi formada principalmente sob a influência da revolução industrial britânica, sua política e ideologia foram formadas fundamentalmente pela Revolução Francesa. A Grã-Bretanha forneceu o modelo para as ferrovias e fábricas, o explosivo econômico que rompeu com as estruturas sócio-economicas tradicionais do mundo não europeu;mas foi a França que fez suas revoluções e a elas deu suas idéias, a ponto de bandeiras tricolores de um tipo ou de outro terem-se tornado o emblema de praticamente todas as nações emergentes, e apolítica européia (ou mesmo mundial) entre 1789 e 1971 foi em grande parte a luta a favor e contra os princípios de 1789, ou os ainda mais incendiários de 1793. A França forneceu o vocabulário e os temas da política liberal e radical-democrática para maior parte do mundo. A França deu o primeiro grande exemplo, o conceito e o vocabulário do nacionalismo. A França forneceu os códigos legais, o modelo de organização técnica e científica e o sistema métrico de medida para a maioria dos países. A ideologia do mundo moderno atingiu as antigas civilizações que tinham até então resistido as idéias européias inicialmente através da influência francesa. Esta foi a obra da Revolução francesa.” In: A Era das Revoluções. Trad.: Maria Tereza Lopes Teixeira, e Marcos Penchel. 9 ed.RJ: Paz e Terra, 1977.
[27] “Restaurando os laços com o postulado da Antiguidade sobre a unidade da espécie humana e a idéia platônica de que a legitimidade da ordem política não pode se fundar na força, mas sim no direito; alimentando-se da idéia medieval de liberdade e dos direitos dos vassalos à autonomia e ao controle do Estado; confrotando-se com a conquista dos novos mundos, o extermínio dos índios, a escravidão dos negros, a expropriação dos pequenos produtores – a filosofia do direito natural moderno construiu, num esforço cosmopolita, uma ética e uma teoria política centradas no direito natural à liberdade, pretendendo libertar a humanidade do despotismo.” In:
As declarações do direito natural 1789-1793. França Revolucionária. Org. Michel Vovelle. Trad. Denise Bottman. Editora brasilense. p.378.
[28] GOYARD-FABRE, Simone. Os fundamentos da ordem jurídica. Tradução: Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 111-113.
[29] “a experiência eterna mostra que todo homem que tem poder é tentado a dele abusar; vai até onde encontra limites. Até a virtude, quem diria, necessita de limites!
Para que não possa abusar do poder é necessário que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder.” In: O espírito das leis. 2. ed. Brasília: UnB. p.118. (Grifo nosso).
[30] “Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica, e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais Poderes Politicos. Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade alguma.”
[31] “Se há uma coisa a estranhar na nossa história política, pelo menos, é esta impressão causada no meu espírito, é que se há um poder forte, um poder onipotente, cujo pedido de faculdade não se possa tomar a sério,
um poder que só carece de ser limitado, contra o qual os direitos constitucionais têm necessidade de se rodear de novas garantias, é o Poder Executivo.” In: Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva. Vol. 4, II, p.265. (Grifo nosso).
[32] “Art 44 – Ao empossar-se no cargo, o Presidente pronunciará, em sessão do Congresso, ou se este não estiver reunido, ante o Supremo Tribunal Federal esta afirmação: “Prometo manter e cumprir com perfeita lealdade a Constituição federal, promover o bem geral da República, observar as suas leis, sustentar-lhe a união, a integridade e a independência.”
[33] “(…) com o sistema federativo, único adaptável no Brasil, não se compadecem as formas parlamentares. A ele, na República, se liga essencialmente o Presidencialismo, a cujos vícios congeniais temos de buscar, pois, o remédio nos freios e contrapesos do mecanismo: a brevidade da duração do poder supremo; a inelegibilidade do Presidente, a larga autonomia dos estados; a posição oracular da justiça na aplicação da lei e nas questões de constitucionalidade.” In: Rui Barbosa/ ensaio de Bolívar Lamounier; fotografias de Cristiano Mascaro; [prefácio de Mario Brockmann Machado] – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p.95
[34] “Em todos os regimes livres, os poderes políticos têm freios e contrapesos à vontade, inclinada sempre a transpor barreiras legaes. Sob o governo de gabinete, esses freios e contrapesos estão quanto ao Poder Executivo, na responsabilidade ministerial, e, quanto às Câmaras Legislativas, na dissolução do Parlamento. Com o governo presidencial, onde não existe nem o apparelho das maiorias parlamentares para a nação, nem a responsabilidade parlamentar dos Ministros, a garantia da ordem constitucional, está nesse templo da justiça, nesse inviolável sacrário da lei, onde a consciência jurídica do Paiz tem a sua sede suprema, o seu refugio inacessível, a sua expressão final.” In: Direito intertemporal. 2ª ed. 1955. p.46.
[35] “Esse era o ponto de vista vigente entre os membros da Convenção Constituinte norte-americana em 1787, que também possuíam alguma experiência na questão: – Sir, existem duas paixões que têm poderosa influência nos negócios dos homens: a ambição e a avereza, o amor pelo poder e o amor pelo dinheiro, disse o representante mais velho,
Benjamim Franklin. Um dos mais jovens,
Alexandre Hamilton, concordava: – Os homens adoram o poder.
George Mason, um dos representantes mais experientes e de maior influência, também concordava com eles: – Da natureza humana, podemos ter a certeza de que os que detêm o poder em suas mãos … sempre que puderem, tratarão de aumentá-lo.”In: Sobre a Democracia. Brasília: Ed. UNB, 2001. p. 88.
[36] Commentarios à Constituição Federal Brasileira, vol.IV. p.1.933.
[37] “A juridicidade da administração pública é fruto do liberalismo político.
Os direitos do homem geram os deveres do Estado. Nos regimes absolutos, o administrador -veículo da vontade do soberano- é, como este, irresponsável. A administração é, apenas, uma técnica a serviço de privilégios de nascimento. O Estado de Direito, ao contrário, submete o Poder ao domínio da Lei: a atividade arbitrária se transforma em atividade jurídica. O Direito administrativo surge entre as cinzas ainda quentes do regalismo. A sua certidão de nascimento é, de acordo com parecer de Zanobini, a lei de 28 pluviose do ano VIII (1800 no calendário gregoriano), que deu feição jurídica à administração francesa. O episódio central da história administrativa no século XIX é a subordinação do Estado ao regime da legalidade. A lei, como expressão da vontade coletiva, incide tanto sobre os indivíduos como sobre as autoridades públicas. A liberdade administrativa cessa onde principia a vinculação legal. O Executivo opera dentro em limites traçadas pelo Legislativo, sobre a vigilância do Judiciário.” In: Temas de Direito Público (estudos e pareceres). RJ: Renovar, 1.997. p.2. (Grifo nosso).
[38] A centralização do processo de tomada de decisão dentro do Congresso também serve a este propósito. As regras internas da Câmara garantem aos líderes dos partidos na Mesa Diretora e no Colégio dos Líderes um papel central na condução do processo legislativo e na definição do sistema de comissões. De maneira geral, é prerrogativa dos líderes dos partidos nomear, assim como substituir, a qualquer momento, os membros das comissões (Art. 10). Não há restrições quanto ao tempo de permanência dos deputados nas comissões. Aparentemente, existe uma auto-seleção por parte dos deputados, porém, há evidências (que serão discutidas mais adiante) de que os líderes dos partidos interferem significativamente no processo de nomeação dos integrantes das comissões. Como mostraremos, estas apresentam uma alta rotatividade. Os deputados mudam de comissão freqüentemente, não só a cada novo ano legislativo, como também em um mesmo ano. Além disso, demonstraremos que o Executivo, através dos líderes do partido ou coalizão governista, manipula as nomeações de certas comissões para colocar nelas um número estratégico de membros fiéis aos seus interesses. In: PEREIRA, Carlos; MUELLER, Bernardo. Uma teoria da preponderância do Poder Executivo: o sistema de comissões no Legislativo brasileiro. Rev. bras. Ci. Soc., São Paulo, v. 15, n. 43, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092000000200004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 24 Fev 2007. Pré-publicação. doi: 10.1590/S0102-69092000000200004
[39] “Descobriremos, então, que o direito público não é – como poderia aparecer, inicialmente, de um ramo jurídico relativo à disciplina do poder público – um direito autoritário, mas certamente o oposto:
um conjunto de normas cuja finalidade primordial é cercear o poder e, como conseqüência, proteger os indivíduos.” In: Fundamentos de Direito Público. 4ª. São Paulo: Malheiros, 2002. p.28. (Grifo nosso).
[40] “Mas a principal limitação é a descaracterização da sua unidade, com a virtualização do método de origem e desenvolvimento da criação de um de seus elementos, as normas, que atualmente não obedecem a própria norma fundamental do ordenamento (todo o poder origina-se do povo), porque são fabricadas condizentes com os interesses econômicos e políticos distorcidos, mas muito pouco influente é o interesse público, o querer da sociedade cidadã.” Ver: A desconstrução da operacionalidade do direito. Disponível em:
http://www.juristas.com.br/revista/coluna.jsp?idColuna=1771
[41] “O direito hoje está nas Constituições como ontem esteve nos Códigos.De último, sua legitimidade, após atravessar a crise das ideologias, assenta sobre princípios. Dentre estes, um avulta por envolver todo o Direito: princípio da constitucionalidade. Antigamente, a legitimidade cabia toda na lei e nos códigos, porque não se desmembrava da legalidade. O princípio legal, derivado da razão, que o amparava, regia todas as ramificações do poder. Doravante, porém, a legitimidade, sobreposta à lei, governa a Constituição e os órgãos por onde a soberania se exerce. Desde algumas décadas, a axiologia da justiça é o portal da legitimidade. Seu grau normativo é superior ao da legalidade. Dantes, a lógica da razão com a regra, a lei, código; daqui por diante, o humanismo das idéias, com o valor, o princípio, a Constituição. (…) A ordem interna dos ordenamentos jurídicos deste continente mostra que o ramo constitucional dos Poderes, que mais colide com a harmonia civil da sociedade é, por sem dúvida, o Poder Executivo, cuja competência incha, cujos abusos de traduzem não raro em intervenções funestas à economia, ao desenvolvimento social, à política e à legitimidade do sistema. Além de que, observa-se, o Poder Executivo tudo pode onde não prepondera a Constituição, onde a liberdade se abdica nos estratagemas do absolutismo, onde a centralização dos poderes desfigura o regime político, onde fraca cidadania faz medrar a vocação dos caudilhos. Coarctado o Judiciário, a república se desintegra, o fantasma da ditadura desponta, a Federação se desnatura e o regime, humilhado, começa de descrer na Justiça, que sempre foi, é e será a mais poderosa das garantias sociais, e a maior força auxiliar da liberdade. Quando isso acontece, já não desempenha ela o papel de escudo protetor do cidadão, de guardiã das franquias públicas, de baluarte dos direitos individuais e sociais. Tampouco exerce por sua magistratura suprema e pela jurisdição de seus tribunais a salvaguarda da Constituição e a tutela da ordem republicana.” In: Revista Interesse Público – Ano 8, n.º 40, novembro/dezembro de 2.006 – Porto Alegre: Notadez. p.15 – 20.
[42] “Dito de outro modo, significa que se tem de intensificar o controle principiológico (interno, externo, jurisdicional e social) que auxilie a extirpar os grandes males administrativos públicos nas suas raízes mais profundas, como sucede com a crônica falta de resguardo da imparcialidade. Convém sublinhar: o controle jamais será exitoso se se cingir à legalidade estrita. O que precisa é subordinar nobre e paradigmaticamente a Administração Pública ao Direito, visto como totalidade de princípios, regras e de valores, avultando a dignidade da pessoa, que implica redefinição da própria ordem pública. Apenas assim edificar-se-á o Estado essencial, promotor da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais. Mais proximamente, quiçá, poder-se-á alcanças a dimensão de País-potência, no sentido que importa, isto é, na robusta e contínua promoção do desenvolvimento físico, psíquico e espiritual.” In: O Controle dos Atos Administrativos e os princípios fundamentais. 3 ed. SP: Malheiros. 2004, p.347.
[43] “Siendo la naturaleza humana como es, no cabe esperar que el detentador o los detentadores del poder sean capaces, por autolimitación voluntaria, de liberar a los destinatarios del poder y a sí mismos del trágico abuso del poder. Instituciones para controlar el poder no nacen ni operan por sí solas, sino que deberían ser creadas ordenadamente e imcorporadas conscientemente en el processo del poder. Han pasado muchos siglos hasta que el hombre político ha aprendido que la sociedad justa, que le otorga y garantiza sus derechos individuales, depende de la existencia de límites impuestos a los detentadores del poder en el ejercicio de su poder, independientemente de si la legitimación de su dominio tiene fundamentos fácticos, religiosos o jurídicos”. In: Teoría de la Constitución. Tradução Alfredo Gallego Anabitarte.Barcelona: Editorial Ariel, 1986. p.54.
[44] Jacques Robert, que foi membro do Conselho Constitucional durante nove anos (1989-1998), conta que o “bloco de constitucinalidade” foi sendo construído pouco a pouco, pedra por pedra. Inicialmente, o Conselho descobriu um feixe de direitos especialmente guarnecidos na Declaração de 1789, direitos do homem e do cidadão que são os direitos individuais e políticos, ditos hoje de primeira geração. A esse rol se junta em 1946 certo número de “princípios políticos, econômicos e sociais”, tais como os direitos de asilo, de greve, direitos ao desenvolvimento, à saúde, ao trabalho, à solidariedade nacional, à instrução, à cultura, ao ensino, ditos hoje de segunda geração. Mas o Preâmbulo da Constituição de 1946 não se limitou a essa enumeração. Foi além, mencionando a reafirmação solene pelo povo francês dos “princípios fundamentais reconhecidos pelas leis da República” para proceder à integração constitucional de todas as liberdades proclamadas ao longo dos anos, tais como a liberdade de imprensa, a liberdade de reunião, a liberdade sindical, a liberdade de associação. Bastava isso. No entanto, o Conselho indagava: como evoluiriam essas liberdades com o tempo? Não lhes nasceriam outras? Não seria necessário, com o desenvolvimento das técnicas e dos costumes, o surgimento,
ex nihilo, de novos princípios? Não poderia o Conselho Constitucional, sem se vincular a um texto antigo suscetível de conformar sua legitimidade, criar esses novos princípios que não devessem sua existência e seu valor senão a uma decisão, necessariamente subjetiva, de seus membros? Enfim, para resumir, a partir dessas considerações e do princípio de que é indispensável, para que o juiz constitucional cumpra a missão que consiste em acompanhar seu tempo, que seja ele inelutavelmente conduzido a criar ele próprio novos princípios para responder às múltiplas indagações da época. Assim o “bloco de constitucionalidade” se enriqueceu regularmente de novas criações que, na maior parte das vezes, não encontram sua fonte direta numa norma escrita da Constituição, da Declaração de Direitos do Homem ou do Preâmbulo da Constituição de 1946, mas que resultam da combinação de todos esses documentos. In: Interpretação da Constituição e Democracia. Revista de Interesse Público, n.º 35, ano 2005. p.16
[45] La lucha contra las inmunidades Del poder. Madri: Gaudernos Civitas, 1983. p.22
[46] “Assim, o Direito no Estado Providência é um regulador global, implicando expressivas mudanças qualitativas. Três interessam-nos mais diretamente neste momento. Em segundo, o agigantamento dos aparatos administrativos e das tarefas legislativas. Em segundo, a configuração do sistema jurídico como um espaço heterogêneo, plural e contraditório. Em terceiro lugar, a ampliação da incidência do código “lícito/ilícito”, alcançando uma maior quantidade de conflitos interindividuais e também
políticas públicas (necessárias à tutela dos direitos sociais, coletivos e difusos). Estes três fatores estão na base da ‘explosão de litigiosidade’ que os sistemas judiciais vivenciaram no Século XX, exigindo que eles se transformassem no “terceiro gigante”, de que fala Mauro Cappelletti: ‘… a dura realidade da história moderna logo demonstrou que os tribunais (…) não podem fugir de uma inflexível alternativa. Eles devem de fato escolher uma das duas possibilidades seguintes: a) permanecer fiéis, com pertinácia, à concepção tipicamente do Século XIX, dos limites da função jurisdicional, ou b) elevar-se ao nível dos outros poderes, tornar-se enfim o terceiro gigante, capaz de controlar o legislador mastodonte e o leviatanesco administrador.(…) Ao contrário da tese montesquieuniana, o juiz não é, nem nunca foi, a ‘boca inanimada da lei’. É inevitável a presença do elemento subjetivo no ato jurisdicional, na medida em que aplicar é indissociável dos atos de interpretar e criar. Aquilo que se diz ser uma percepção racional do direito positivo é, em verdade, um ato de vontade. Juízes neutros somente são encontráveis nos cemitérios (não como visitantes…).” In: A função realizadora do Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil. In: Revista Interesse Público – Ano 6, n.º 28, novembro/dezembro de 2.004 – Porto Alegre: Notadez. p.70 – 71.
[47] “O papel do Juiz é acentuadamente marcante, não só como recriador através do processo hermenêutico, mas também como adaptador das regras jurídicas às novas e constantes condições da realidade social. É contribuindo para a transformação e democratização contínua da ordem jurídica positiva que o Juiz, em seu mister interpretativo, insere a semente vivificadora e inspiradora do Direito Justo. Como se pode verificar, o Juiz não se atém somente à interpretação da legalidade oficial ou a provenientes de codificações, pois, como símbolo que pode ser transgressor de um órgão que resume em si o espírito da estrutura jurídica dominante, compete-lhe alternativamente adequar a satisfação das necessidades fundamentais de novos sujeitos sociais aos recentes pressupostos paradigmáticos de valoração jurídica emancipadora”. In: Ideologia, Estado e Direito. 3 ed. São Paulo: RT, 2000. p.180.
[48] “È certo de que o juiz não se vai substituir ao administrador, no núcleo do poder discricionário. Mas não o estará fazendo se verificar que, diante de uma aparente legalidade, esteja em face de uma grande injustiça, de um procedimento administrativo desarrazoado, ilógico, contrário à técnica, à economicidade, à logicidade, que são parâmetros do controle jurisdicional, nesse campo específico da legitimidade”. In: A identidade da função de controle da Administração Pública. In: Perspectivas do Direito Público – Estudos em Homenagem a Miguel Seabra Fagundes. Carmem Lúcia Antunues Rocha (coord.). Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p.368.
[49] “Nesse sentido, vale lembrar o dizer de Jorge Miranda, para quem o Direito Público passou por uma revolução coperniana, ou seja, a passagem de uma fase em que as normas contitucionais dependiam da interpositio legislatori a uma fase em que se aplicam (ou são suscetíveis de se aplicar) diretamente nas situações de vida – não resultou só em mudanças do regime político ou da idéia de Constituição. Resultou, sobretudo, no aparecimento de uma justiça constitucional, como tal estruturada e legitimada. Por isso, assevera que o mestre português, não bastam proclamações como as do art. 1º, nº 3, da Lei Fundamental da Alemanha, do art.18º da Constituição de Portugal, do art. 53º, nº 1, da Constituição da Espanha ou do art.5º, §1º, da Constituição brasileira para assegurar a força normativa dos preceitos constitucionais. Sem a justiça constitucional, o princípio da constitucionalidade fica sem tradução prática. (…) Por isso, é possível sustentar que, no Estado Democrático de Direito, em face do caráter compromissário dos textos constitucionais e da noção de força normativa da Constituição, ocorre, por vezes, um sensível deslocamento do centro das decisões do Legislativo e do Executivo para o plano da jurisdição constitucional. Isto porque, se com o advento do Estado Social e o papel fortemente intervencionista do Estado o foco do poder/tensão passou para o Poder Executivo, no Estado Democrático de Direito há (ou deveria haver) uma modificação desse perfil. Inércias do Poder Executivo e falta de atuação do Poder Legislativo podem ser supridas pela atuação do Poder Judiciário, justamente mediante a utilização dos mecanismos jurídicos previstos na Constituição que estabeleceu o Estado Democrático de Direito.” In: Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. 2 ed. RJ: Forense, 2004. p.18,19 e 20.
[50] “E a justiça constitucional, normalmente, possui cinco ramos de competência: a) o controle da constitucionalidade das leis e atos normativos do poder público; b) a proteção dos direitos fundamentais; c) controle das regras da democracia;
d) controle do bom funcionamento dos poderes públicos e de suas competências; e e) o equilíbrio da federação.” Legitimidade da justiça constitucional, As vertentes do direito constitucional contemporâneo, América Jurídica, 2002. p.560.
[51] “A constituição pretende “dar forma”, “constituir”, “conformar” um dado esquema de organização política”. (…) A Constituição só se compreende através do Estado. O Conceito de Estado Constitucional servirá para resolver este impasse: a constituição é uma lei proeminente que conforme o Estado.” In: Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina. p.87-89
[52] In: Controle de atos de governo pela jurisdição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. p. 24 e 361.
[53] Oswaldo Luiz Paulu. In: Ob.cit. p.119 e 159.
[54] Oswaldo Luiz Paulu. In: Ob.cit. p.22.
Informações Sobre o Autor
Bruno José Ricci Boaventura
Advogado militante em Cuiabá em direito público, sócio-gerente da Boaventura Advogados Associados S/C; Assessor Jurídico do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público de Mato Grosso – SINTEP/MT; Assessor Jurídico da Presidência da Câmara Municipal de Campo Novo do Parecis/MT e Associações ligadas a radiodifusão comunitária. Especialista em Direito do Estado, com ênfase em Constitucional, pela Escola Superior de Direito de Mato Grosso.