A importância da regulamentação da Lei do Gás

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O gás natural adquiriu grande importância na matriz energética brasileira na última década e o mercado passou a requerer um marco regulatório próprio, capaz de trazer mais segurança jurídica para os investimentos.


Para tanto, contribuíram a sua diversidade de usos na indústria, na geração de energia a partir das termelétricas, os aspectos favoráveis quanto ao impacto ambiental, o quadro internacional da elevação do preço do petróleo e outras razões já conhecidas e amplamente comentadas na mídia.  A Lei do Petróleo (9.478/97) não tratou de inúmeras questões suscitadas por esse segmento e não é suficiente para abarcar todas as peculiaridades do mercado de gás natural, apesar do quadro normativo já criado pela ANP.


Entendemos que a denominada Lei do Gás já foi objeto de ampla discussão e que o embate entre diferentes projetos já provocou um salutar efeito de convergência em alguns aspectos. O processo por si só já pode representar um avanço na atração de investimentos para o setor.


Contudo, algumas críticas podem ser levantadas em relação ao projeto em tramitação (Projeto de Lei 6.673-A de 2006): algumas são suscitadas por imprecisões terminológicas e outras por aspectos mais graves que levantam dúvida sobre a sua constitucionalidade.


As referências à ‘regulamentação’, por exemplo, representam imprecisão. Qual entidade ou órgão da Administração Pública será competente para regulamentar todos os artigos do projeto que mencionam a regulamentação? O termo regulamentação é utilizado no projeto como sinônimo de regulação? E, na hipótese, de determinada matéria já ter sido regulada pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), poderá uma regulamentação do Ministério de Minas e Energia dispor em sentido contrário?


No que tange ao compartilhamento de infra-estrutura, tema tão candente no direito e na economia, o projeto de lei retrocedeu ao excluir a possibilidade de livre acesso aos gasodutos destinados ao escoamento da produção de gás natural que integram o contrato de concessão para produção e exploração. O livre acesso a este tipo de infra-estrutura propiciaria o maior aproveitamento das reservas de gás natural e possivelmente poderia aumentar a viabilidade de projetos de exploração e desenvolvimento de áreas com pouca infra-estrutura para o escoamento do gás natural produzido.


Ponto positivo do projeto que podemos citar é a previsão da arbitragem como cláusula para resolução de conflitos nos contratos de comercialização do gás e nos contratos de concessão da atividade de transporte de gás natural, inclusive admitindo a convenção de arbitragem para as sociedades de economia mista e empresas públicas. Tal previsão está alinhada com o posicionamento do STJ quanto à possibilidade das empresas públicas e sociedades de economia mista participarem de arbitragens.


A maior polêmica em torno do projeto de lei é suscitada pela questão da repartição de competências prevista no art. 25, §2º da Constituição Federal. Pode se argumentar que alguns artigos do projeto violam, em alguma medida, o monopólio dos Estados nos serviços locais de gás canalizado, ao permitirem o by pass retirando a participação dos Estados na atividade de distribuição, bem como de suas concessionárias. Mencionamos a título ilustrativo o art. 3º, §1º: “O regime de autorização de que trata o inciso II do caput deste artigo aplicar-se-á aos gasodutos de transporte que envolvam acordos internacionais ou interesse específico de um único usuário final, enquanto o regime de concessão aplicar-se-á a todos os gasodutos de transporte considerados de interesse geral”.


Alega-se que a exclusão da participação dos Estados fere o pacto federativo, princípio constitucional basilar no ordenamento jurídico brasileiro. O by pass amplia a competência da União alterando a previsão constitucional do art. 25, §2º. A alegada inconstitucionalidade estaria no tratamento, ao nível da legislação ordinária, de repartição de competências entre a União e os Estados.



Informações Sobre o Autor

Marilda Rosado de Sá Ribeiro

Sócia responsável pela área de Petróleo e Gás do escritório Doria, Jacobina, Rosado e Gondinho Advogados Associados, é Doutora em Direito Internacional pela USP e Professora de Direito Internacional da UERJ.


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