Resumo:Desde as mais remotas civilizações, os deficientes físicos são postos a margem da sociedade, sendo recente leis que protegessem esse segmento social e permitissem sua inclusão no mercado de trabalho. A inclusão do portador de deficiência no mercado de trabalho vem crescendo constantemente, em 2009, 288,6 mil vínculos empregatícios criados naquele ano foram declarados como para pessoas com deficiência; em 2010, 306,0 mil vínculos foram declarados como pessoas com deficiência, sendo este aumento da magnitude de 6% no número de deficientes físicos com empregos formais. As leis que tratam de inclusão social dos deficientes remetem ao início da década de 1990, tendo desdobramentos importantes posteriores, sendo a lei de cotas a mais utilizada para garantir esse direito fundamental do portador de deficiência – direito ao trabalho digno e aplicação do principio da isonomia – esses, tão caro a Constituição Federal de 1998. Embora tenha havido avanços na legislação brasileira para com o portador de deficiência, ainda precisa avançar em campos tais como fiscalização do cumprimento dessas leis.[1]
Palavras-chave: Deficiente Físico . Mercado de Trabalho . Inclusão Social.
Abstract: Since the most remote civilizations, disabled people are put to the margins of society, thought laws protecting this segment of society and allowing their inclusion in the labor market are recent. The inclusion of people with disabilities into the labor market has been growing steadily, in 2009, it was created 288.600 employment contracts in which are registered disabled; in 2010, 306.0000 employment contracts were declared as disabled people, magnitude of this increase is 6% in the number of disabled people with formal jobs. The laws that rules social inclusion of disabled people back to the beginning of the 1990’s, evolving in the following years, with the “Law of quotas” as its most important law to ensure this fundamental right of people with disabilities – the right to decent work and application of the principle of equality – these, so dear to the Federal Constitution of 1998. Although it there have been advances in the Brazilian legislation for people with disabilities, it still needs to advance in fields such as the enforcement of these laws.
Key-words: Physical Disability . Labor Market . Social Inclusion.
Sumário: Introdução. 1. O deficiente físico. 1.1. Evolução histórica e social da população deficiente. 1.2. Conceito de inclusão. 1.3. Conceito de pessoa com necessidade especial (NPE.) 1.4. Conceito de pessoa com deficiência. 1.5. Tipos de deficiência. 1.5.1. Deficiência Física. 1.5.2. Deficiência Auditiva. 1.5.3. Deficiência Visual. 1.5.4. Deficiência Mental. 1.5.5. Deficiência Multipla. 1.6. A comprovação da deficiência. 1.7. Dignidade da pessoa humana. 2. O deficiente físico e o mercado de trabalho. 2.1. O mercado de trabalho. 2.2. A situação do deficiente físico inserido no mercado de trabalho. 3. O deficiente físico e a legislação brasileira. 3.1. Motivos para a proteção social dos deficientes. 3.2. Legislação brasileira para o deficiente. 3.2.1 Constituição Federal de 1988. 3.2.2 A Lei 7.853/1989. 3.2.3 A Lei de Cotas (Lei 8.213/1991). 3.2.4 Outras Leis e Decretos. 3.3. Caso especial: vigilância a saúde dos trabalhadores com deficiência. 3.4. O Brasil e a legislação internacional. Conclusão. Bibliografia.
INTRODUÇÃO
A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes preparada pela Assembléia Geral das Nações Unidas no ano de 1975[2] define o deficiente físico como uma pessoa incapaz de assegurar, por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas.
De acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) existem cerca de 610 milhões de pessoa portadoras de algum tipo de deficiência no mundo hoje, dos quais cerca de 390 milhões (63,3%) fazem parte da população economicamente ativa[3]. No Brasil, por sua vez, segundo dados do Censo de 2000, há por volta de 24,6 milhões de pessoas com deficiência (visual, auditiva, física ou múltipla), o que representa cerca de 15% da população brasileira. Por ser um número representativo da população em geral, motivou o presente trabalho de conclusão, o qual visa apresentar um panorama da inserção do portador de deficiência física no mercado de trabalho no Brasil.
Para realizar o trabalho aqui apresentado, fez-se uma extensa e exaustiva revisão da literatura por meio de pesquisa documental bibliográfica. Neste trabalho de revisão da literatura buscaram-se os principais e mais destacados artigos, livros, papers e leis disponíveis. Tendo como resultado o presente estudo sobre a inserção do deficiente físico no mercado de trabalho brasileiro.
No primeiro capítulo, denominado O Deficiente Físico, inicialmente define-se o conceito de deficiente físico conforme resolução n° 2.542/75 da ONU, e a partir da definição da população em estudo, traça-se uma evolução histórica do tratamento social dado a essa população, visando ter uma perspectiva temporal. A seguir, trabalha-se o conceito de inclusão o qual sugere uma ação que combate a exclusão social, isto é, uma situação bem comum entre os deficientes físicos, em função de inúmeros problemas, tais como acessibilidade, transporte público, entre outras dificuldades diárias. Na sequência se discute a relação entre os conceitos de Deficiente Físico, Pessoa com necessidade Especial e Pessoa com Deficiência.
Dá-se destaque para a maneira como esses três conceitos são utilizados para caracterizar a população em estudo. Também se conceitua os tipos de deficiência admitidos na legislação brasileira, por meio do Decreto n° 3.298, de 20 de dezembro de 1999, as quais são: (1) deficiência física, (2) deficiência auditiva, (3) deficiência visual, (4) deficiência mental e (5) deficiência múltipla. A seguir, se analisa a forma que se dá a comprovação da deficiência de acordo com o Ministério do Trabalho e do Emprego. E por fim, destaca-se a importância da dignidade da pessoa humana para a compreensão da inclusão do portador de deficiência física no mercado de trabalho.
O próximo capítulo – O Deficiente Físico e o Mercado de Trabalho – traça um perfil da situação do deficiente inserido no mercado de trabalho. Para tanto, inicia-se descrevendo o funcionamento das relações sociais dentro de um sistema de mercado. Partindo dessas relações, começa-se a analisar como elas se dão dentro de um mercado de trabalho, onde o bem transacionado é a mão-de-obra. Para avançar um pouco mais nessa discussão, se trabalha o tema do modo de produção capitalista no qual a sociedade atual vive.
A seguir, se examina o Estado de Direito Democrático e sua relação com a inclusão social de deficientes físicos, e como a evolução do primeiro conceito se relacionou e influenciou de maneira positiva a inclusão de portadores de deficiência. Por fim, traça-se, conforme o Relatório Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego, o perfil dos deficientes brasileiros já inseridos no mercado de trabalho, a composição dos trabalhadores com necessidades especiais por tipo de deficiência, a remuneração média dos trabalhadores deficientes e a diferença salarial entre os sexos.
No último capítulo se analisa o deficiente físico e a legislação brasileira. O processo de exclusão, historicamente infligido às pessoas com deficiência, pode ser amenizado através da execução de políticas afirmativas e, especialmente, pela conscientização acerca das potencialidades desses indivíduos. Para tanto, várias leis foram criadas visando à inclusão dos cidadãos com deficiência. Para se ter um conhecimento mais abrangente em relação às leis trabalhistas direcionadas à população em estudo, selecionou-se, neste capítulo as leis mais significativas para a inclusão do deficiente na sociedade brasileira. Primeiramente, se destaca a relação da Constituição federal de 1988 e sua relação com os fundamentos da cidadania e da dignidade humana (art. 1°, II e III) e, por conseguinte, seus desdobramentos para cidadãos com deficiência. Destaca-se também, a responsabilidade, inscrita na CF/88, da União, dos Estados e Distrito Federal para com a proteção e integração das pessoas com deficiência e a questão da Acessibilidade contemplada na Carta Magna brasileira.
Ainda no capítulo final, se examina a Lei 7.853/1989, a qual estabelece normas gerais dos direitos das pessoas com deficiência; as competências dos órgãos da administração pública em relação às pessoas com deficiência; as normas de funcionalidade das edificações e vias públicas; as competências da CORDE; entre outros assuntos de especial interessa para os portadores de deficiência física. A lei de cotas (Lei 8.213/1991) é objeto de especial interesse neste estudo, recebendo a devida atenção uma vez que é a principal lei de ação afirmativa do estado de inclusão do deficiente físico no mercado de trabalho. Destaca-se os principais artigos da lei, as discussões em torno deles e as posteriores leis que vieram a regulá-la. Ainda, se destaca outras leis de interesse da população deficiente e a legislação internacional ratificada pelo Brasil.
Este trabalho de conclusão visa expor o estado atual do deficiente físico brasileiro e sua relação com o mercado de trabalho. Para alcançar esse objetivo, fez-se uso da legislação vigente e dos estudos de especialistas na área de deficiência física. Não se teve o intuito de exaurir a discussão em relação ao deficiente e o mercado de trabalho, mas sim levantar novas questões e trazer essa fatia importante da população brasileira (cerca de 15%, segundo dados do IBGE) para o centro do debate acadêmico. Apesar de ser recente a legislação sobre os deficientes físicos, percebe-se que a inclusão se materializou por meio dessa legislação afirmativa – aumento de 6% no número de deficientes físicos com empregos formais, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego entre os anos de 2009 e 2010. Esse avanço é pequeno em magnitude, porém de grande importância social e que abre perspectivas de maiores melhorias, como se verá a seguir.
1 O DEFICIENTE FÍSICO
Segundo a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes elaborada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1975[4], o deficiente físico é caracterizado como uma pessoa incapaz de assegurar, por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas. Conforme estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) há, no mundo hoje, 610 milhões de indivíduos com deficiência, dos quais cerca de 390 milhões (63,3%) fazem parte da população economicamente ativa[5], já dados do Censo de 2000 afirmam que no Brasil há cerca de 24,6 milhões de pessoas com deficiência (visual, auditiva, física ou múltipla), cerca de 15% da população brasileira. Por constituírem importante fração da população mundial e brasileira, faz-se necessário o estudo dos deficientes. No entanto, primeiramente precisam-se entender sua evolução histórica e social, além de definir alguns conceitos essenciais, tais como deficiente físico, tipos de deficiência, inclusão, Pessoa com Necessidade Especial (PNE) e Pessoa com Deficiência (PCD) para ter-se uma melhor compreensão da população em estudo
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E SOCIAL DA POPULAÇÃO DEFICIENTE
Para melhor entender a condição atual de exclusão em que se encontra a
pessoa portadora de deficiência é importante atentar para a sua progressão histórica e social ao longo do tempo.
Na antiguidade remota e entre os povos primitivos, o trato dos portadores de deficiência teve dois aspectos: 1) ou, os exterminavam por considerá-los grave empecilho à sobrevivência do grupo; ou (2) os protegiam e sustentavam para buscar a simpatia dos deuses. Nas civilizações clássicas – tais como os hebreus, gregos e romanos – povos com uma vida em sociedade regrada por ampla legislação, encontra-se várias referências acerca das pessoas portadoras de deficiência.[6]
A Bíblia contém registros de tratamento discriminatório às pessoas portadoras de qualquer tipo de deficiência; os Hebreus, por exemplo, com base na Lei de Moisés.
Na cidade grega de Esparta a orientação era no sentido da exterminar as crianças “mal-constituídas”. O povo guerreiro espartano via as crianças como propriedade do Estado, e ao conselho de Anciãos da cidade-Estado cabia a função examinar as crianças após o nascer. Se fossem consideradas “fracas” ou “disformes” eram jogadas do alto do Taigeto (Taygetos), abismo de dois mil e quatrocentos metros de altitude. Já os escolhidos, os que preenchiam os pré-requisitos estabelecidos pelo Estado, eram, a partir dos doze anos de idade, enviados para o campo, onde deveriam aprender, completamente sozinhos, a sobreviver. Já, os atenienses, por forte influência de Aristóteles, protegiam seus doentes e deficientes em sistema parecido com a Previdência Social dos dias de hoje, em que todos contribuíam para a manutenção dos heróis de guerra e de suas famílias. Os hindus, no Oriente, estimulavam o ingresso dos deficientes visuais nas funções religiosas.
Durante o período conhecido como Idade Média, já sob a influência do Cristianismo, alterna-se a concepção de deficiência ora como noções teológicas de possessão pelo demônio, ora como desígnios divinos.
Por fim, as pessoas com deficiência, via de regra, receberam dois tipos de tratamento quando se observa a História Antiga e Medieval: a rejeição e eliminação sumária, de um lado, e a proteção assistencialista e piedosa, de outro.
Após a Revolução Francesa e até o Século XIX foi um período de inovações para a inclusão do deficiente físico, ela trouxe as ideias de capitalismo mercantil e de divisão social do trabalho e seus posteriores desdobramentos – como a Revolução Industrial – surgindo assim o modelo de caracterização da deficiência como questão médica e educacional, direcionando os portadores de deficiência a viver em conventos e hospícios ou até mesmo o ensino especial (criou-se nesse momento histórico o modelo do paradigma da institucionalização do indivíduo, mantido segregado e com vínculo permanente com a instituição). Vários inventos se forjaram com o intuito de propiciar meios de trabalho e locomoção aos portadores de
deficiência, tais como a cadeira de rodas, bengalas, bastões, muletas, coletes,
próteses, macas, veículos adaptados, camas, móveis, criação do Código Braille por
Louis Braille para deficientes visuais.
No Século XX, as duas Guerras Mundiais impulsionaram o desenvolvimento que se chamou de reabilitação científica[7], não só pela carência de mão-de-obra surgida no período pós guerra, mas também pela necessidade de propiciar uma atividade remunerada e uma vida social digna aos soldados mutilados.
Surgindo, então, na década de 60, o que Otto Marques da Silva chamou de nascimento da defesa dos direitos das minorias:
“Na década de 60, a Guerra do Vietnã foi responsável por um número crescente de deficientes físicos, não só naquele país, mas também nos EUA. Surgem então os movimentos de defesa dos direitos das minorias. A lei passou a ser o arranjo ideal para inserir o portador de deficiência na sociedade, aproximando-o em condições e padrões na vida das demais pessoas”[8].
Na lei brasileira, a Carta Magna de 1824 considerava as pessoas com deficiência como incapazes, logo, não tinham direitos.[9] Após enpreenderem uma longa batalha, de avanços e recuos, os deficientes conseguiram conquistar um espaço na Constituição de 1988. E a partir de então, inúmeras leis vieram estimular sua inclusão.
A Constituição de 1988 rompeu com o modelo assistencialista, até então
em vigor, assegurando-se a igualdade de oportunidades baseada no princípio de
isonomia. O legislador visou assegurar um direito fundamental ao indivíduo, inscrito no art. 5º da Constituição Federal de 1988, que é o da igualdade entre os homens. A égide do princípio é que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Assim, deve-se igualar os desiguais levando em conta suas diferenças.. Reconheceu-se que a sociedade é caracterizada pela diversidade, pois é constituída de indivíduos diferentes entre si.[10]
Mesmo que já tivesse ratificado a Convenção 159 da OIT em 1991[11], o Brasil ainda não havia elaborado uma normativa hábil a preparar o portador de deficiência para a inclusão, baseada na educação inclusiva, na saúde e assistência social adequadas, no trabalho produtivo, na acessibilidade (logradouros públicos e privados, transportes adaptados), esporte, lazer e cultura.
O primeiro passo dado nesta direção foi o
estabelecimento da reserva de vagas no art. 93, da Lei nº 8.213/91[12]. Entretanto, foi somente com a regulamentação da Lei 7.853/89[13] e a instituição da
Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e o Decreto
3.298/99[14], dez anos depois, que se concretizaram, em nosso ordenamento jurídico, os princípios de não discriminação e igualdade de oportunidades, baseados em conceitos amplos de inclusão social, visando dar apoio e suporte ao
portador de deficiência para a vida em comunidade.
1.2 CONCEITO DE INCLUSÃO
De acordo com o Novo Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio, o verbo incluir apresenta vários significados, todos eles com o sentido de algo ou alguém inserido entre outras coisas ou pessoas[15]. Porém, em nenhum momento essa definição pressupõe que o ser incluído precisa ser igual ou semelhante aos demais aos quais se agregou.
No livro Dignidade Humana e Inclusão Social, Sena e Delgado relacionam o conceito de democracia contemporânea e inclusão social:
“A sociedade democrática é – e tem de ser – uma sociedade includente. A incorporação de todas as pessoas, independente de sua origem, poder e riqueza, à estrutura e à dinâmica do sistema político, econômico, social, e cultural, ainda que desempenhando papéis distintos, é nuclear à ideia e à prática da Democracia.
No plano da vida econômica e da vida social, essa incorporação tem de se materializar por meio de políticas públicas e normas jurídicas, em face de ser o capitalismo incapaz, pelo exercício e dinâmica de suas meras forças de mercado, de realizar semelhante processo inclusivo.
Na sociedade contemporânea a vasta maioria das pessoas vive de rendimentos propiciados por seu trabalho. Nessa medida, a ordem jurídica trabalhista de cada sociedade e de cada Estado pode cumprir, se bem estruturada, a função decisiva de realizar social e economicamente a democracia, concretizando, em boa medida, seu objetivo de permanente inclusão das correspondentes populações.”[16]
A Inclusão social sugere uma ação que combate a exclusão social. Esta última geralmente associada a pessoas de classe social mais baixa, nível educacional mínimo, portadoras de deficiência física e mental, idosos ou minorias raciais entre outras que não têm acesso a várias oportunidades. Em outras palavras, a inclusão social visa oferecer aos mais necessitados oportunidades de participarem da distribuição de renda do País, dentro de um sistema que beneficie a todos e não somente uma camada da sociedade[17].
Em relação à questão trabalhista, a lei exige a inclusão de deficientes no mercado de trabalho, também dependendo do grau de deficiência. Dessa forma, o deficiente se sente valorizado e aceito na sociedade em que vive.
De acordo com a Lei n. 8.213/91, em seu artigo 93, estabelece cotas compulsórias de vagas a serem respeitadas pelas empresas do setor privado com mais de cem empregados, observando proporção: I – de 100 a 200 empregados, 2%; II – de 201 a 500, 3%; III – de 501 a 1000, 4%; IV – 1001 ou mais, 5%. Acrescente-se que a dispensa do empregado deficiente ou reabilitado, somente pode ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante. Trata-se de uma garantia no emprego e não uma forma de estabilidade.[18]
Um dos objetivos fundamentais da República Federativa é construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como promover o bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3, IV da CF). Negar a alguém emprego ou trabalho, sem justa causa e por motivo derivado de sua deficiência, constitui crime, punível com reclusão de um a quatro anos e multa (art. 8º, II).[19]
1.3 CONCEITO DE PESSOA COM NECESSIDADE ESPECIAL (PNE)
Segundo o artigo 3º do Decreto 3298 de dezembro de 1999[20], o qual regulamenta a lei 7853/1989[21], considera-se deficiência a perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade dentro do padrão considerado normal para o ser humano.
A deficiência permanente é aquela que não permite recuperação ou alteração apesar do aparecimento de novos tratamentos, por já ter corrido tempo suficiente para a sua consolidação. Já a incapacidade, é redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida, conforme estabelece o artigo III do Decreto nº 3.298/99[22].
O artigo 4º do referido decreto enumera as categorias em que se enquadram os portadores de deficiência física; (1) o portador de alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física; (2) o deficiente auditivo, acometido de perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras; (3) o deficiente visual, aquele que possui diminuição da acuidade visual, redução do campo visual ou ambas as situações; (4) o deficiente mental, aquele cujo funcionamento intelectual é significativamente inferior à média, sendo esta manifestação presente desde antes dos dezoito anos de idade e associada a limitações em duas ou mais áreas de habilidades adaptativas (comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais, utilização da comunidade, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer e trabalho); (5) a deficiência múltipla, quando ocorrem associações de duas ou mais deficiências.[23]
1.4 CONCEITO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA (PCD)
Por que se adota o termo pessoa portadora de deficiência ou pessoa com deficiência? O nome usado para se referir às pessoas que tem algum tipo de limitação – física, mental ou sensorial – teve diversas formas ao longo dos anos, conforme afirma Sassaki:
“Utilizavam-se expressões como “inválidos”, “incapazes”, “excepcionais” e “pessoas deficientes”, até que a Constituição de 1988, por influência do Movimento Internacional de Pessoas com Deficiência, incorporou a expressão “pessoa portadora de deficiência”, que se aplica na legislação ordinária. Adota-se, hoje, também, a expressão “pessoas com necessidades especiais” ou “pessoa especial”. Todas elas demonstram uma transformação de tratamento que vai da invalidez e incapacidade à tentativa de nominar a característica peculiar da pessoa, sem estigmatizá-la. […] Igualmente se abandona a expressão “pessoa portadora de deficiência” com uma concordância em nível internacional, visto que as deficiências não se portam, estão com a pessoa ou na pessoa, o que tem sido motivo para que se use, mais recentemente,[…], a forma “pessoa com deficiência”[24]
No Brasil há duas normas internacionais devidamente ratificadas, o que lhes confere status de leis nacionais, que são a Convenção nº 159/83 da OIT e a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, também conhecida como Convenção da Guatemala, que foi promulgada pelo Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001. Ambas conceituam deficiência, para fins de proteção legal, como uma limitação física, mental, sensorial ou múltipla, que incapacite a pessoa para o exercício de atividades normais da vida e que, em razão dessa incapacitação, a pessoa tenha dificuldades de inserção social.[25]
1.5 TIPOS DE DEFICIÊNCIA
De acordo como o Artigo 4º do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999,[26] é considerada pessoa com deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: (1) deficiência física, (2) deficiência auditiva, (3) deficiência visual, (4) deficiência mental e (5) deficiência múltipla.
1.5.1. Deficiência Física
A deficiência física caracteriza-se pela alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções[27].
Para melhor entendimento, seguem-se algumas definições:
Amputação – perda total ou parcial de um determinado membro ou segmento de membro;
Paraplegia – perda total das funções motoras dos membros inferiores;
Paraparesia – perda parcial das funções motoras dos membros inferiores;
Monoplegia – perda total das funções motoras de um só membro (inferior ou superior);
Monoparesia – perda parcial das funções motoras de um só membro (inferior ou superior);
Tetraplegia – perda total das funções motoras dos membros inferiores e superiores;
Tetraparesia – perda parcial das funções motoras dos membros inferiores e superiores;
Triplegia – perda total das funções motoras em três membros;
Triparesia – perda parcial das funções motoras em três membros;
Hemiplegia – perda total das funções motoras de um hemisfério do corpo (direito ou esquerdo);
Hemiparesia – perda parcial das funções motoras de um hemisfério do corpo (direito ou esquerdo);
Ostomia – intervenção cirúrgica que cria um ostoma (abertura, ostio) na parede abdominal para adaptação de bolsa de fezes e/ou urina;
Paralisia Cerebral – lesão de uma ou mais áreas do sistema nervoso central, tendo como conseqüência alterações psicomotoras, podendo ou não causar deficiência mental;
Nanismo – deficiência acentuada no crescimento.
1.5.2 Deficiência Auditiva
É caracterizada pela perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na seguinte forma: (1) surdez leve – de 25 a 40 decibéis (db); (2) surdez moderada – de 41 a 55 db; (3) surdez acentuada – de 56 a 70 db; (4) surdez severa – de 71 a 90 db; (5) surdez profunda – acima de 91 db; e, por último, anacusia – ausência de audição[28].
1.5.3 Deficiência Visual
É definida pela acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º (tabela de Snellen), ou ocorrência simultânea de ambas as situações[29]. Podendo ainda ser distinguida como:
1. Cegueira – na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica;
2. Baixa Visão – significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica;
Os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60°; Ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores. Ressalta-se, ainda, a inclusão das pessoas com baixa visão a partir da edição do Decreto nº 5.296/04[30]. As pessoas com baixa visão são aquelas que, mesmo usando óculos comuns, lentes de contato, ou implantes de lentes intra-oculares, não conseguem ter uma visão nítida. As pessoas com baixa visão podem ter sensibilidade ao contraste, percepção das cores e intolerância à luminosidade, dependendo da patologia causadora da perda visual.
1.5.4 Deficiência Mental
De acordo com o Decreto nº 3.298/99, alterado pelo Decreto nº 5.296/04[31], conceitua-se como deficiência mental o funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos 18 anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:
a) comunicação;
b) cuidado pessoal;
c) habilidades sociais;
d) utilização dos recursos da comunidade;
e) saúde e segurança;
f) habilidades acadêmicas;
g) lazer; e
h) trabalho.
1.5.5 Deficiência Múltipla
A deficiencia multipla, por sua vez, é caracterizada pela associação de duas ou mais deficiências.
1.6 A COMPROVAÇÃO DA DEFICIÊNCIA
Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego[32] a condição de pessoa com deficiência pode ser comprovada de duas formas, por meio de laudo médico ou por meio Certificado de Reabilitação Profissional.
O laudo médico pode ser emitido por médico do trabalho da empresa ou outro médico, atestando enquadramento legal do empregado para integrar a cota, de acordo com as definições estabelecidas na Convenção nº 159 da OIT, Parte I, art. 1; Decreto nº 3.298/99, arts. 3º e 4º, com as alterações dadas pelo art. 70 do Decreto nº 5.296/04. Este laudo, por sua vez, deverá especificar o tipo de deficiência e ter autorização expressa do empregado para utilização do mesmo pela empresa, tornando pública a sua condição.
O Certificado de Reabilitação Profissional, depois de concluído o processo de reabilitação profissional, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) emite este certificado indicando a atividade para qual o trabalhador foi capacitado profissionalmente[33].
1.7 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Ingo Wolfgang Sarlet define dignidade da pessoa humana como:
“a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.”[34]
Sarlet nos afirma que Kant constrói sua concepção de dignidade da pessoa humana a partir da natureza racional do ser humano. O autor sinaliza que a autonomia da vontade, compreendida como a capacidade de determinar a si mesmo e agir em conformidade com a representação de certas leis, é um atributo apenas encontrado nos seres racionais, constituindo-se no fundamento da dignidade da natureza humana.[35]
Ainda segundo Kant, afirmando a qualidade peculiar e insubstituível da pessoa humana,
“no reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, ela tem dignidade.”[36].
O reconhecimento e a garantia de direitos de liberdade – e dos direitos fundamentais de um modo geral -, por sua vez, constituem uma das principais exigências da dignidade da pessoa humana. Portanto, a dignidade da pessoa humana constitui uma barreira absoluta e instransponível, isto é, um limite inclusive para os atores estatais. Protegendo, assim, a individualidade e autonomia da pessoa contra qualquer tipo de interferência por parte do Estado e de terceiros, de tal sorte a assegurar o papel do ser humano como sujeito de direitos[37].
2 O DEFICIENTE FÍSICO E O MERCADO DE TRABALHO
A inclusão do portador de deficiência no mercado de trabalho vem crescendo constantemente, segundo dados do Ministério do Trabalho e do Emprego[38] (MTE), em 2009, do total de 41,2 milhões de vínculos de emprego ativos em 31 de dezembro, 288,6 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios. Em 2010, dos 44,1 milhões de vínculos ativos em 31 de dezembro desse ano, 306,0 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios – percebe-se que foi mantido esse peso relativo de trabalhadores com deficiência, representando um aumento de 6% no número de deficientes físicos com empregos formais.
Porém, ainda é preciso progredir ainda mais em aspectos tais como da cultura corporativa[39], quebra de preconceitos, como o da baixa produtividade do trabalho deste tipo de profissional, por exemplo, entre outros. No entanto, para avançar nesta discussão é necessário definir alguns conceitos, como mercado de trabalho e sua dinâmica, o perfil dos trabalhadores portadores de deficiência, a dificuldades práticas das firmas na contratação e as questões relativas ao setor de recursos humanos.
2.1 O MERCADO DE TRABALHO
As relações econômicas do sistema de mercado capitalista são regidas, basicamente, pela lei da oferta e a lei da procura. A primeira – lei da oferta – sendo caracterizada pelo seguinte mecanismo: quanto maior a oferta de um bem ou serviço, se a procura se mantiver a mesma, menor será o preço desse bem ou serviço; já a segunda – a lei da oferta – diz que: quanto maior for à procura por determinado bem ou serviço, mantida a oferta constante, maior será o preço do bem ou serviço. O mecanismo de ajuste dos preços em função da oferta e da demanda se dá no mercado[40].
O mercado de trabalho, por sua vez, relaciona aqueles que procuram emprego e aqueles que oferecem emprego num sistema típico de mercado como visto acima, onde se negocia para determinar os preços e quantidades de um bem, no caso, o trabalho. O seu estudo procura perceber e prever os fenômenos de interação entre estes dois grupos tendo em conta a situação econômica e social do país, região ou cidade.[41]
Em relação ao mercado de trabalho, também há os desajustes entre a oferta e a quantidade que caracterizam todos os tipos mercados. Pode-se dizer que quando existe a formação de excesso de profissionais – oferta de trabalhadores – e falta de procura desses profissionais – demanda por trabalhadores -, não há um equilíbrio entre a oferta e a procura – a oferta é maior do que a procura – ocorre o que se chama, segundo Blanchard[42] (2006), de saturação de mercado. Situação na qual existem insuficientes postos de trabalho para absorver os profissionais.
Outro desequilíbrio entre oferta e procura no mercado de trabalho é quando a oferta de postos de trabalho é maior do que a procura por trabalho por parte dos trabalhadores. Esta é uma situação que ocorre quando, por exemplo, a indústria progride e inova rapidamente e o mercado de trabalho não consegue suprir as novas vagas geradas. A diminuição da procura por profissionais com dada qualificação que estão sendo substituídos pela demanda de outra profissão ou qualificação em que ainda não há oferta suficiente acaba também gerando desemprego, o qual pode estar associado ao aumento no número de máquinas, que podem substituir a mão de obra[43].
O modo de produção que caracteriza a sociedade atual é o modo de produção capitalista[44], o qual pode ser caracterizado por um sistema de organização econômica baseado na propriedade privada dos meios de produção, isto é, os bens de produção ou de capital. O termo capital geralmente tem diferentes significados, inclusive na linguagem comum é entendido como certa soma de dinheiro. Todavia, o conceito de capital aqui utilizado é o conjunto (estoque) de bens econômicos heterogêneos, tais como máquinas, instrumentos, fábricas, terras, matérias-primas, capaz de reproduzir bens e serviços. O uso do capital na produção introduz a divisão do trabalho, além de contribuir para aumentar a produtividade do trabalho.
O modo de produção vigente recebe o nome de capitalismo, porque esse capital é essencialmente propriedade privada de alguém: o capitalista. É pela propriedade dos meios de produção que o capitalista se apropria de parte da renda gerada nas atividades econômicas. Podendo ser definido como um sistema econômico e social baseado na propriedade privada dos meios de produção, que tem em vista o lucro, do qual os trabalhadores não participam; estes recebem um salário em troca de sua força de trabalho[45].
As economias de produção em massa, sobre as quais se baseiam os padrões modernos de vida, não seriam exeqüíveis se a produção ainda se processasse individualmente ou por núcleos familiares. A produção massificada deve-se principalmente a divisão do trabalho, ou seja, à especialização de funções que permite a cada pessoa usar, com a máxima vantagem, qualquer diferença peculiar em aptidões e recursos. Pois a especialização, além de se basear nas diferenças individuais de aptidões, cria e acentua essas diferenças.
Conforme Paulani[46], no plano das relações materiais essas diferenças parecem inexistir, como demonstra Marx, a igualdade e liberdade afiguram-se como efetivamente existentes, uma vez que no mundo das trocas e do mercado, todos são igualmente donos de mercadorias e livres para efetuar ou não as trocas possíveis. Da mesma forma, a propriedade se mostra uma instituição efetivamente universal, visto que, em princípio, todos possuem algo de seu para vender, mesmo que este algo seja uma mercadoria que, em determinadas circunstancias, pode não ser desejada por ninguém, como força de trabalho.
O personagem principal dessa sociedade é evidentemente o indivíduo, e seu funcionamento dentro da nova engrenagem é caracterizado por um duplo posicionamento. De um lado, pela própria complexidade da nova ordem social que ele protagoniza sua relação com seu outro, que é a sociedade, é uma relação contraditória, de atração e repulsa, de necessidade e repulsa, de necessidade e indiferença. Ele precisa dela para seus fins particulares, mas não pode abrir mão de seu autocentramento. Sua participação na sociedade é apenas formal: ele faz parte dela, mas não se sente organicamente a ela ligado. É determinado por ela, mas a forma dessa determinação o faz cultivar a sensação contrária da pura e total autodeterminação[47].
Dada as relações sociais que se dão no mercado de trabalho, faz-se necessário o estudo dos diversos segmentos de indivíduos que o compõe, a seguir analisam-se as relações de trabalho dando ênfase no deficiente.
2.2 A SITUAÇÃO DO DEFICIENTE FÍSICO INSERIDO NO MERCADO DE TRABALHO
A inclusão do portador de deficiência no mercado de trabalho vem crescendo constantemente, conforme dados do Ministério do Trabalho e do Emprego[48] (MTE). Em 2009, do total de 41,2 milhões de vínculos de emprego ativos em 31 de dezembro, 288,6 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios. Em 2010, dos 44,1 milhões de vínculos ativos em 31 de dezembro desse ano, 306,0 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios – percebe-se que foi mantido esse peso relativo de trabalhadores com deficiência, representando um aumento de 6% no número de deficientes físicos com empregos formais.
Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) há, no mundo hoje, 610 milhões de indivíduos com deficiência, dos quais cerca de 390 milhões (63,3%) fazem parte da população economicamente ativa[49]. Conforme dados do Censo de 2000, no Brasil há cerca de 24,6 milhões de pessoas com deficiência (visual, auditiva, física ou múltipla), cerca de 15% da população brasileira.
A despeito destes números e estatísticas, a prática da inclusão social[50] teve seu início tardiamente no Brasil. Foi somente com a regulamentação da Lei 7.853/89, da instituição da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Decreto 3.298/99 e a Lei de Cotas que se concretizaram, no ordenamento jurídico, os princípios de não discriminação e igualdade de oportunidades, baseados em conceitos amplos de inclusão social e, por isso, muitas empresas ainda encontram dificuldades na sua implantação.
Analisando o preâmbulo do texto constitucional brasileiro, podemos depreender, que o “Estado democrático” é proposto para “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”[51]. Sem discutir sua força normativa, o texto preambular representa um robusto conteúdo determinador da interpretação constitucional. Ao possuir a prerrogativa de assegurar um rol de direitos fundamentais, a doutrina moderna afirma que o Estado não pode mais tomar para si a mesma postura neutra, característica da doutrina liberal dos séculos XVII e XVIII, que permeava o discurso dos textos constitucionais anteriores[52].
Segundo Canotillo[53] o postulado substancial da igualdade é um dos elementos fundamentais para a realização plena da democracia econômica e social; por conseguinte, a sua aplicação torna-se essencial e determinante uma vez que
“Não se pode interpretar o princípio da igualdade como um princípio estático, indiferente à eliminação das desigualdades, e o princípio da democracia econômica como um princípio dinâmico, impositivo de uma igualdade material […]. A igualdade material postulada pelo princípio da igualdade é também a igualdade real veiculada pelo princípio da democracia econômica e social.”[54]
Segundo STRECK, L. L. e MORAIS, J. L. B. de “o Estado Democrático de Direito, tem um conteúdo transformador da realidade, não se restringindo, como o Estado Social de Direito, a uma adaptação melhorada das condições sociais de existência”[55]. Sendo assim, o seu teor vai além do seu aspecto material de concretização de uma dignidade do homem e começa a atuar simbolicamente como incentivo a participação pública quando o democrático adjetiva o Estado, o que estende os valores democráticos sobre todos os seus elementos constitutivos do Estado e, por conseguinte, também sobre a ordem jurídica. E mais, a idéia de democracia contém e implica, necessariamente, a questão da solução do problema das condições materiais de existência beneficiando, principalmente, grupos sociais excluídos.
A organização Democrática da Sociedade, como é postulado como um princípio do Estado Democrático de Direito por STRECK, L. L. e MORAIS, J. L. B. de[56], garante um sistema de direitos fundamentais individuais e coletivos, por meio dos direitos fundamentais, assegurando ao homem uma autonomia face aos poderes públicos, e também por intermédio do respeito a dignidade da pessoa humana, empenhando-se na defesa e garantia da liberdade, da justiça e da solidariedade. Ou por outro prisma, garante a justiça social como um mecanismo corretor das desigualdades – possibilitando aos indivíduos o direito da igualdade não apenas como possibilidade formal, todavia, também como articulação de uma sociedade justa.
Por fim, o Estado Democrático de Direito possuiria a qualidade fundamental de extrapolar “não só a formulação do estado Liberal de Direito, como também a do Estado Social de Direito”[57]. Portanto, é com ideia de Estado de Direito, que o liberalismo e a democracia se misturam, possibilitando, assim, a aparente redução das disparidades econômicas e sociais à unidade formal do sistema legal, principalmente através de Constituição, onde deve predominar o interesse da maioria.
A lei de cotas[58], por exemplo, pode representar uma ação afirmativa assumida pelo poder público e pela sociedade civil. Entendo a ação afirmativa conforme SELL[59] a caracteriza, isto é, como um conjunto de estratégias políticas, cuja finalidade é, em última análise, promover a igualdade de oportunidades sociais, mediante tratamento preferencial daqueles que historicamente têm sido os perdedores da disputa pelos bens escassos de nossa sociedade. Assim, são políticas de discriminação positiva dispensada aos segmentos populacionais que, devido ao preconceito que sofrem, encontram-se em posição de desvantagem na disputa pelas oportunidades sociais.
Os percentuais estabelecidos pelo Decreto 3298[60] possibilitaram e ainda hoje possibilita a transformação do panorama da inclusão econômica das pessoas com deficiência física. Como indicam os dados da Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN)[61] extraídos da Delegacia Regional do Trabalho do Estado de São Paulo, em 2004 havia 14.239 deficientes empregados, em 2005 esse indicador aumentou para 35.782, um acréscimo equivalente a 150%. Segundo esse estudo, o mesmo aconteceu com as empresas, em 2004 1.965 empresas cumpriam a cota, em 2005 eram 4.004 corporações, um aumento de cerca de 100%.
Conforme a Relação Anual de Informações Sociais[62] de 2008, 323,2 mil trabalhadores portadores de necessidades especiais estão ativos no mercado de trabalho no Brasil. Por tipo de deficiência, o levantamento da RAIS 2008 demonstra que os deficientes físicos representam 55,24% dos trabalhadores com deficiência. A seguir estão os deficientes auditivos, 24,65%; e os visuais, com 3,86%. Os deficientes mentais representam 3,37% e os portadores de deficiências múltiplas, 1,09%. Na situação de Reabilitados foram declarados 11,78% dos deficientes com vínculo trabalhista.
Fonte: Relação Anual de Informações Sociais de 2008, Ministério do Trabalho e Emprego[63].
Segundo a Relação Anual de Informações sociais de 2008 do Ministério do Trabalho e Emprego, os homens têm a maior incidência em todos os tipos de trabalhadores com deficiência, com participação de cerca de 65%. Entre os deficientes físicos, o percentual médio de participação masculina é de 61,33%, com 67,65% auditivos, 66,61% visuais, 73,88% mentais e 70,46% múltiplos.
Os dados do Relatório do Ministério do Trabalho e Emprego de 2008 mostram ainda que a remuneração média dos trabalhadores deficientes é de R$ 1.717, superior à média dos rendimentos do total de vínculos formais (R$1.494,66). Esse comportamento pode ser devido à forte influência da remuneração dos deficientes auditivos, cuja média é de R$ 2.162, único valor acima da média de rendimentos entre todos os tipos de deficiência. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (TEM) “Esse rendimento mais alto dos deficientes se dá por conta de remunerações mais elevadas em todos os graus de escolaridade, comparativamente aos outros trabalhadores”[64].
Percebe-se que a maior diferença entre os rendimentos recebidos por homens e por mulheres ocorreu nos vínculos declarados como portadores de deficiência auditiva (64,29%), decorrente dos rendimentos de R$ 2.476,64 recebidos pelos homens, e de R$ 1.507,48 pelas mulheres, seguida dos deficientes múltiplos (40,48%), expressa pelos rendimentos de R$ 1.397,47 para os homens e de R$ 994,78, para as mulheres.
Vencer as barreiras físicas e o preconceito são condições prévias e indispensáveis para fazer com que os profissionais portadores de deficiência física possam exercer suas funções com equiparação de oportunidades. No emprego de medidas que tenham como objetivo incluir os portadores de deficiência pode-se identificar dois grupos, o primeiro que advoga que o tratamento jurídico é suficiente para sanar esta questão, e um segundo grupo que defendem o tratamento econômico.
Para Romita:
“[…] a verdade parece estar na combinação dos dois argumentos. Os portadores de deficiência não necessitam de medidas preferenciais, mas sim de remoção das barreiras que impedem a sua inserção no mercado de trabalho, mas por não haver uma integração eficiente desses três pontos (qualificação profissional, habitação e reabilitação, estímulos financeiros) no Brasil, uma grande parte dos portadores de deficiência são pedintes de rua e trabalham na economia informal, como: camelôs distribuidores de propaganda nos semáforos etc., estando,via de regra, fora do mercado formal de trabalho e sem a proteção do sistema de seguridade social”.[65]
Além de uma legislação específica que incentive a inclusão desse estrato social, é importante destacar outros fatores importantes para que a inclusão do deficiente físico no mercado de trabalho efetivamente ocorra. Entre esses fatores, o principal é a educação. De acordo com levantamento realizado pela Febraban, aproximadamente 80% da população com deficiência possui até 7 anos de estudos[66]. Esse dado é grave e ajuda a dificultar, ainda mais, a inclusão deste grupo social no mercado de trabalho que atualmente preceitua um alto nível de exigência no que diz respeito à qualificação profissional. Por conseguinte, para as instituições e empresas com vistas a contratar tal público é necessário investir em programas de capacitação e/ou tornar-se menos rígidas em relação ao grau de instrução destes.
A Lei nº 7.853/89[67] prevê a adoção de legislação específica que discipline reserva de mercado de trabalho aos portadores de deficiência física (art. 2º, II, d) e a proteção dos seus interesses coletivos ou difusos. Estas se dão por meio de ações civis públicas que poderão ser propostas pelo Ministério Público, União, Estados, Municípios e Distrito Federal, por associações constituídas há mais de um ano, por autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista que inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção de pessoa portadora de deficiência (art. 3º).
O Decreto nº 914/93, o qual instituiu a Política Nacional para a Integração da Pessoa portadora de Deficiência, tem como uma de suas diretrizes (art. 5º), “promover medidas que visem à criação de empregos que privilegiem atividades econômicas de absorção de mão-de-obra de pessoas portadoras de deficiência, assim como proporcionar ao portador de deficiência qualificação e incorporação no mercado de trabalho”[68].
Atualmente, a política Nacional para integração de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho e na sociedade em geral é disciplinada pelo Decreto n. 3.298/99 do Poder Executivo Federal[69]. Este decreto compreende o conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência (art. 1º), observando os seguintes princípios: a) desenvolvimento de ação conjunta do Estado e da sociedade civil, de modo a assegurar a plena integração da pessoa portadora de deficiência no contexto socioeconômico e cultural; b) estabelecimento de mecanismos e instrumentos legais e operacionais que assegurem às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciam o seu bem-estar pessoal, social e econômico; c) respeito às pessoas portadoras de deficiência, que devem receber igualdade de oportunidades na sociedade por reconhecimento dos direitos que lhes são assegurados, sem privilégios ou paternalismos (art. 5º, I, II e III).
No âmbito da União, é assegurado o direito da pessoa portadora de deficiência se inscrever em concurso público para provimento de cargos cujas atribuições lhe sejam compatíveis e reservado até 20% das vagas oferecidas no concurso (art. 5º, § 2º, Lei n. 8.112/90)[70].
3 O DEFICIENTE FÍSICO E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
O conceito de pessoa portadora de deficiência que guiou a escolha das normas aqui presentes é o mesmo adotado pela própria legislação. É considerada, resumidamente, portadora de deficiência a pessoa que apresenta, em caráter permanente, perda ou anormalidade de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, que gere incapacidade para o desempenho de atividades dentro do padrão considerado normal para o ser humano[71]. A pessoa nessa condição é normalmente classificada em uma das seguintes categorias de deficiências reconhecidas pela legislação[72]: física, mental, auditiva, visual, múltipla.
O processo de exclusão, historicamente imposto às pessoas com deficiência, deve ser minimizado por meio da execução de políticas afirmativas e, sobretudo, pela conscientização acerca das potencialidades desses indivíduos. Como foi dito anteriormente, várias leis foram criadas visando à inclusão dos cidadãos com deficiência, para ter um conhecimento mais abrangente em relação às leis trabalhistas direcionadas à população em estudo, selecionou-se as leis mais significativas para a inclusão do deficiente na sociedade brasileira.
3.1 MOTIVOS PARA A PROTEÇÃO SOCIAL DOS DEFICIENTES
Ainda que as conquistas, a partir da Revolução Francesa de 1789, tenham possibilitado a consolidação do conceito de cidadania, elas não foram suficientes[73], uma vez que se constatou que a simples declaração formal das liberdades nos documentos e nas legislações era pouco eficiente face à grande exclusão econômica da maioria da população. No entanto, foi apenas após a Segunda Guerra Mundial que a afirmação da cidadania se completou, percebeu-se a necessidade de valorizar a vontade da maioria, respeitando-se, sobretudo, as minorias, suas necessidades e peculiaridades. Em outras palavras, verificou-se nitidamente que a maioria pode ser opressiva, a ponto de conduzir legitimamente ao poder o nazismo ou fascismo. Sendo este, conforme o Ministério do Trabalho, o fundamento primeiro das políticas em favor de quaisquer minorias[74].
Quanto às pessoas com deficiência, o direito de ir e vir, de trabalhar e de estudar é o ponto de partida da inclusão de qualquer cidadão. E, para que se efetive em face das pessoas com deficiência, há que se exigir do Estado a construção de uma sociedade livre, justa e solidária ( conf. art. 3º, Constituição Federal), através de políticas públicas compensatórias e eficazes[75]. Segundo o Ministério do Trabalho:
“A obrigação, no entanto, não se esgota nas ações do Estado. Todos são igualitariamente responsáveis pela efetiva compensação de que se cuida. As empresas, por sua vez, devem primar pelo respeito ao princípio constitucional do valor social do trabalho e da livre iniciativa, para que se implementem a cidadania.”[76]
3.2 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA PARA O DEFICIENTE
A reserva de cargos para pessoas com deficiência aparece em vários dispositivos legais, tais como Constituição Federal de 1988, Lei nº 7.853/1989, Lei nº 8.213/1991 da Previdência Social (Lei de Cotas) e disciplinada pelo Decreto nº 3.298/1999, e, em complementação quanto aos procedimentos sobre a fiscalização do trabalho, a Instrução Normativa nº 20/2001 do Ministério do Trabalho e Emprego.
3.2.1 Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal de 1988 acolheu como fundamentos da República brasileira a cidadania e a dignidade da pessoa humana (art.1º, II e III), considerando um de seus objetivos primordiais a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV).
Dispõe no art. 5º que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” e garante o direito de ir e vir dos cidadãos (inciso XV). Os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais estão assegurados no art. 7º, XXXI, que proíbe qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência.
O art. 24, XIV, define a competência da União, Estados e Distrito Federal para legislar concorrentemente, sobre a proteção e integração das pessoas com deficiência. “A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte: …a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão” (art.37, VIII). Esse artigo traduz um mecanismo compensatório, inserido no contexto de ação afirmativa que busca a igualdade ou equiparação de oportunidades para um grupo em relação ao contexto social mais amplo.
A acessibilidade está contemplada na Constituição Federal em dois artigos:
– art.227, § 2º. “A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência;”
– art. 244. “A lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, conforme disposto no artigo 227, § 2º.”
3.2.2 A Lei 7.853/1989
A Lei 7.853/1989[77] estabelece normas gerais dos direitos das pessoas com deficiência; às competências dos órgãos da administração pública em relação às pessoas com deficiência; as normas de funcionalidade das edificações e vias públicas; as competências da CORDE; institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas e, pela primeira vez, disciplina a atuação do Ministério Público e define crimes cometidos contra as pessoas com deficiência.
Assim, por meio da Secretaria Especial de Direitos Humanos – Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE)–, a NBR 9050[78]. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) elaborou em 2004 a segunda edição da Norma Brasileira NBR 9050, que versa sobre: Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos.
São exemplos das disposições da NBR 9050/2004: a vaga reservada com o símbolo internacional de acessibilidade na entrada das empresas; as rampas de acesso com até 8% de inclinação; largura das portas e áreas de circulação adequadas para cadeiras de rodas; sinalização tátil, visual e auditiva; tipos de piso; adequação de mobiliários, sanitários, vestiários e bebedouros, dentre outros. Assim, encontram-se normatizados, desde a entrada nas empresas, edifícios até o detalhamento de como deve ser o ambiente de trabalho para acolher todos os trabalhadores com deficiência ou não.
Na área da formação profissional e do trabalho, esta lei propõe a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho para as pessoas com deficiência nas entidades da administração pública e do setor privado, porém, sem especificar o percentual de vagas.
O Decreto 3298 de 20 de dezembro de1999 regulamenta a lei 7.853/89; dispõe sobre a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência na sociedade. Traz a conceituação de deficiência e fixa os parâmetros de avaliação de todos os tipos de deficiência.
De fundamental importância para os trabalhadores reabilitados e pessoas com deficiência, essa lei é considerada o principal mecanismo de inserção no mercado de trabalho. Por tratar dos benefícios da Previdência Social, houve questionamentos sobre a quem caberia a competência da fiscalização do seu cumprimento, sendo que a questão só foi disciplinada com a edição do Decreto nº 3.298.
O Decreto dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e consolida normas de proteção. Em seu art. 3º traz os conceitos de deficiência, deficiência permanente e incapacidade.
A habilitação e a reabilitação profissionais são consideradas enquanto processo orientado a possibilitar que a pessoa com deficiência, a partir da identificação de suas potencialidades laborativas, adquira nível suficiente de desenvolvimento profissional para ingresso e reingresso no mercado de trabalho e participe da vida comunitária (art. 31).
3.2.3 A Lei de Cotas (Lei 8.213/1991)
Em 24 de julho de 1991 entrou em vigor, em nível nacional, a Lei 8.213[79]. Esta lei estabelece cotas de contratação para empresas privadas com mais de cem funcionários, e, além disso, dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. Também conhecida como Lei de Cotas, ela obriga toda empresa a ter em seu quadro de funcionários 2% portadores de necessidades especiais quando atingir o número de 100 empregados, 3% de 201 a 500, 4% de 501 a 1000 e a partir daí 5%. No caso de descumprimento, a empresa será multada em R$ 1.105,00 para cada funcionário não contratado.
A Lei nº 8.213/91 define as regras das cotas para deficientes no mercado de trabalho, ou seja, há regras, aliás, uma lei que define o que empresas privadas e públicas devem fazer em relação ao espaço que se deve reservar aos deficientes. Esta lei foi criada com o objetivo de fomentar a oportunidade de trabalho para os deficientes. De 1991 para cá, muito se avançou e isso é inegável. Por outro lado, algumas questões se destacam:
– A primeira é a necessidade de se fazer uma lei para que pessoas com necessidades especiais possam mostrar suas capacidades, competências e habilidades;
– A segunda é que as empresas preferem contratar deficientes físicos, especificamente aqueles com bastante mobilidade, para justamente fazerem poucas adaptações no local de trabalho;
–A terceira é o fato concreto de que as empresas contratam deficientes, apenas e tão somente para o cumprimento das cotas e não porque são pessoas com capacidades e habilidades como outro ser humano qualquer.
Todos os países conscientes e civilizados se preocupam com a situação das pessoas com deficiência.
A Lei é conhecida como a Lei de Cotas em decorrência do seu art. 93, abaixo transcrito:
“A habilitação e a reabilitação profissionais são consideradas enquanto processo orientado a possibilitar que a pessoa com deficiência, a partir da identificação de suas potencialidades laborativas, adquira nível suficiente de desenvolvimento profissional para ingresso e reingresso no mercado de trabalho e participe da vida comunitária (art. 31).”[80]
As três modalidades de inserção laboral estão definidas no art. 35 como sendo a colocação competitiva, colocação seletiva e o trabalho por conta própria.
O art. 36, que disciplina a Lei nº 8.213/1991, determina que a empresa com 100 ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% a 5% de seus cargos com beneficiários da Previdência Social reabilitados ou com pessoa portadora de deficiência habilitada, bem como estabelece a competência do MTE para fiscalizar, avaliar e controlar as empresas no que diz respeito à inserção das pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Em 31 de agosto de 2011, a Presidenta Dilma sancionou a Lei 12.470[81], a qual contempla demandas antigas do movimento das pessoas com deficiência. A referida Lei traz alterações substanciais nas regras do Benefício da Prestação Continuada e da Pensão para as pessoas com deficiência. Com essas mudanças passa-se a haver de fato incentivo ao trabalho das pessoas, até então excluídas do mercado de trabalho em razão de medo de perda de benefício assistencial ou de pensão previdenciária. Um novo momento da Lei de Cotas se inaugurou. Em resumo, a Lei 12.470, a lei prevê que a parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente, que exerça atividade remunerada, será reduzida em 30% (trinta por cento), devendo ser integralmente restabelecida em face da extinção da relação de trabalho ou da atividade. O benefício de prestação continuada será suspenso quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada. Extinta a relação trabalhista e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro desemprego, e não tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim. A contratação de pessoa com deficiência como aprendiz não acarreta a suspensão do benefício de prestação continuada, limitado a dois anos o recebimento concomitante da remuneração e do benefício.
3.2.4 Outras Leis e Decretos
A Lei 10.098 de 19 de dezembro de 2000 estabelece as normas de supressão de barreiras e obstáculos às pessoas com deficiência em espaços públicos, edifícios, meios de transporte e comunicação.
Essa Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e trata da acessibilidade ao meio físico, aos meios de transporte, à comunicação e informação e ajudas técnicas
Já a Lei 10.048 de 08 de novembro de 2000[82] dá prioridade de atendimento às pessoas com deficiência em repartições públicas e bancos. Esta lei trata do atendimento prioritário às pessoas portadoras de deficiência, aos idosos com idade igual ou superior a 60 anos, às gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo e, também, da acessibilidade nos meios de transporte.
A Instrução Normativa n° 20, de 26 de janeiro de 2001[83] determina que o auditor fiscal do trabalho verificará, mediante fiscalização direta ou indireta, se as empresas estão cumprindo a cota.
Já o Decreto 5296 de 04 de dezembro de 2004[84] regulamenta as Leis 10.098 e 10.048, que tratam de atendimento e acessibilidade para pessoas com deficiência. Redefine as deficiências físicas, visual e auditiva – o que vale para a cota.
O Decreto nº 5.904/2006[85] regulamenta a Lei nº 11.126/2005 e assegura em seu art. 1º: “a pessoa com deficiência visual usuária de cão-guia tem o direito de ingressar e permanecer com o animal em todos os locais públicos ou privados de uso coletivo.”
3.3 CASO ESPECIAL: VIGILÂNCIA A SAÚDE DOS TRABALHADORES COM DEFICIÊNCIA
Quando os profissionais dos serviços de saúde, durante inspeção nos ambientes de trabalho, constatarem que o número de funcionários da empresa é de 100 ou mais trabalhadores, deverão perguntar se a mesma emprega pessoas com deficiência. Caso isso não ocorra, o profissional deverá informar o fato, mediante ofício, à Delegacia Regional do Trabalho (DRT) – atualmente Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) – ou às suas Gerências Regionais, relatando a situação para fins de fiscalização[86].
É importante atentar, ainda, ao estipulado na Lei de Cotas, observando que o total de trabalhadores daquela empresa no Brasil inclui matriz e filiais, quando for o caso.
Os profissionais das vigilâncias sanitárias estaduais, municipais e dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador deverão verificar nas empresas que tenham trabalhadores com deficiência como é a qualidade dessa inserção laboral, se estão sendo cumpridas as disposições contidas no Código Sanitário Estadual e as Normas de Saúde e Segurança no Trabalho da Portaria nº 3214/1978 do MTE, ou outras legislações pertinentes à saúde do trabalhador nos níveis federal, estadual e municipal.Também deve ser avaliado o cumprimento da NBR 9050 da ABNT sobre acessibilidade, bem como outras legislações referenciadas neste estudo, tendo em vista que o ambiente de trabalho deve ser seguro, saudável e adequado para todos os trabalhadores, indistintamente.
Um outro canal que pode ser acionado para relatar que uma empresa não está cumprindo a Lei de Cotas é o Ministério Público do Trabalho, que, constatando a irregularidade, firma Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a empresa. E, se não houver acordo, inicia um processo judicial.
3.4 O BRASIL E A LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL
Em 1968 o Brasil ratificou, por meio do Decreto nº 62.150[87], a Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – órgão ligado à ONU – sobre a discriminação em matéria de emprego e profissão, na qual, em seu art. 1º, as palavras “emprego” e “profissão” incluem o acesso à formação profissional, ao emprego e às diferentes profissões, bem como às condições de emprego.
O Brasil assumiu compromisso internacional com a OIT, no sentido de adotar medidas positivas que visam a superação, por parte dos deficientes, de suas dificuldades naturais.
Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho: a OIT recomenda aos países membros que considerem o “objetivo da readaptação profissional, que é permitir que pessoas portadoras de deficiência consigam e mantenham um emprego conveniente e progridam profissionalmente, e facilitar sua inserção ou sua reinserção na sociedade”.
A OIT também determina que “pessoas com deficiência desfrutem com eqüidade das oportunidades de acesso, conquistem e desenvolvam o seu trabalho, o qual, sempre que possível, deve corresponder à sua própria escolha e trazer qualidade de vida sustentável”.
A Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência de 2006[88], em seus diversos artigos, estabelece direitos quanto à acessibilidade, educação, saúde, habilitação e reabilitação, trabalho e emprego, e monitoramento da implementação dessa Convenção, entre outros. Trata-se de um instrumento de extrema importância e que foi ratificado pelo Brasil como Decreto Legislativo nº 186, publicado no Diário Oficial da União em 20 de agosto de 2008.
CONCLUSÃO
Este trabalho de conclusão de curso versou sobre a inserção do deficiente físico no mercado de trabalho no Brasil. Para tanto, utilizou-se o conceito de deficiente físico definido pela Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes elaborada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1975[89], isto é, deficiente físico é uma pessoa incapaz de assegurar, por sim mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas.
A população alvo do presente estudo, historicamente foi colocada à margem da sociedade. Desde as mais remotas civilizações até a Revolução Francesa, via de regra, os deficientes tiveram dois tipos de tratamento: a rejeição e a eliminação sumária ou a proteção assistencialista e piedosa. A partir da Revolução Francesa e da Revolução Industrial do século XIX, começou os avanços dos direitos sociais dessa parcela da população. Porém, somente nos anos 60, segundo Otto Marques da Silva, surge o movimento de defesa dos direitos das minorias, o qual vê a lei como um arranjo ideal para inserir o portador de deficiência na sociedade, aproximando-o em condições e padrões de vida das demais pessoas. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 rompeu com o modelo assistencialista até então vigente, assegurando-se a igualdade de oportunidades baseada no princípio da isonomia.
Embora já tivesse ratificado a Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1991[90], o Brasil ainda não havia elaborado uma normativa hábil a preparar o portador de deficiência para a inclusão, esta norma deveria estar baseada na educação inclusiva, na saúde e assistência social adequadas, no trabalho produtivo, na acessibilidade (logradouros públicos e privados, transportes adaptados), esporte, lazer e cultura. O primeiro passo dado nesta direção foi o estabelecimento da reserva de vagas no art. 93, da Lei nº 8.213/91 – Lei de Cotas. Entretanto, foi somente com a regulamentação da Lei 7.853/89 e a instituição da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e o Decreto 3.298/99, dez anos depois, que se concretizaram, em nosso ordenamento jurídico, os princípios de não discriminação e igualdade de oportunidades, baseados em conceitos amplos de inclusão social, visando dar apoio e suporte ao portador de deficiência para a vida em comunidade.
Os percentuais estabelecidos pelo Decreto 3298[91] possibilitaram e ainda hoje possibilita a transformação do panorama da inclusão econômica das pessoas com deficiência física. Como indicam os dados da Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN)[92] extraídos da Delegacia Regional do Trabalho do Estado de São Paulo, havia 14.239 deficientes empregados em 2004, já em 2005, esse indicador aumentou para 35.782 – um acréscimo equivalente a 150%. Segundo esse estudo, o mesmo aconteceu com as empresas, em 2004 1.965 empresas cumpriam a cota, em 2005 eram 4.004 corporações, um aumento de cerca de 100%.
Quando se atenta para a inclusão do portador de deficiência no mercado de trabalho com dados factuais, percebe-se que ela vem crescendo constantemente. Segundo dados do Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE), em 2009, do total de 41,2 milhões de vínculos de emprego ativos em 31 de dezembro, 288,6 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios. Em 2010, dos 44,1 milhões de vínculos ativos em 31 de dezembro desse ano, 306,0 mil foram declarados como pessoas com deficiência, representando 0,7% do total de vínculos empregatícios – percebe-se que foi mantido esse peso relativo de trabalhadores com deficiência, representando um aumento de 6% no número de deficientes físicos com empregos formais.
Políticas afirmativas direcionadas às pessoas portadoras de deficiência aparece em vários dispositivos legais, tais como Constituição Federal de 1988, Lei nº 7.853/1989, Lei nº 8.213/1991 da Previdência Social (Lei de Cotas) e disciplinada pelo Decreto nº 3.298/1999, e, em complementação quanto aos procedimentos sobre a fiscalização do trabalho, a Instrução Normativa nº 20/2001 do Ministério do Trabalho e Emprego. Sendo a Lei n° 8.213/1991 – Lei de Cotas -, ao estabelecer cotas de contratação de deficientes físicos para empresas privadas com mais de cem funcionários, e, além disso, dispõe sobre o Plano de Benefícios da Previdência Social, a primeira lei que produz efeitos jurídicos e prepara o portador de deficiência para a inclusão.
Antes de mais nada, ressalta-se que de uma perspectiva histórica, a conquista de direitos por parte da população deficiente física é recente, porém mesmo assim vêem-se importantes avanços nessa legislação. No entanto, ainda é preciso avançar mais em aspectos tais como da cultura corporativa, quebra de preconceitos, como o da baixa produtividade do trabalho deste tipo de profissional, entre outros. Além de uma melhor definição de aspectos fiscalizadores do Estado em relação ao cumprimento das leis direcionadas aos portadores de deficiência física.
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm Acesso em: 11 jun. 2011.
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm Acesso em: 11 jun. 2011.
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm Acesso em: 11 jun. 2011.
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm Acesso em: 11 jun. 2011.
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 21 de dez. 1999.
Informações Sobre o Autor
Teresinha Helena Scheuermann
Acadêmica de Direito no IPA