A legitima defesa putativa como causa de justificação exculpante à luz do direito penal brasileiro

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Resumo: A presente pesquisa tem por escopo analisar as causas de exclusão da antijuridicidade e o instituto da legítima defesa putativa como causa de exclusão da culpabilidade do agente. A inexistência fática da agressão é a diferença entre a legítima defesa real e a putativa. Diferentemente da legítima defesa real, que exclui a antijuridicidade do fato, a legítima defesa ficta recai sobre a culpabilidade, que é o juízo de reprovabilidade subjetivo, ponderando a culpa do agente. Enquanto na primeira o fato é respaldado pelo Direito, no segundo caso, o fato é típico e antijurídico, verifica-se o dolo, mas, na ausência da culpabilidade, o fato não é punível.


Palavras-chave: Excludente de Antijuridicidade – Legítima Defesa – Culpabilidade – Direito Penal.


Sumário: Introdução. 1. A antijuridicidade e o Direito. 2. Os excludentes de antijuridicidade. 2.1. Estado de necessidade. 2.2. Estrito cumprimento de dever legal. 2.3. Exercício regular de direito. 2.3.1. Offendiculas. 2.4. Consentimento do ofendido. 2.5. Legítima defesa 13 2.5.1. Agressão injusta, atual ou iminente. 2.5.2. Direito próprio ou alheio. 2.5.3. Uso moderado dos meios necessários para repelir a agressão injusta. 2.5.4. Animus defendendi. 3. Legítima defesa putativa como causa de justificação exculpante à luz do Direito Penal brasileiro. Considerações finais. Referências


INTRODUÇÃO


O jus puniendi depende da robustez de provas, da ausência de lacunas na sequência lógico descritiva dos fatos para que a ilação do julgador seja concisa e sem faltas, cumprindo assim o papel jurisdicional do Estado, trazendo de volta o equilíbrio jurídico anteriormente abalado. Todavia, toda a solidez do conjunto probatório – acusatório, advindo do inquérito policial, pode se desfazer a partir da descoberta das causas de justificação, haja vista estas excluírem a antijuridicidade do fato ou a culpabilidade. Daí, se percebe que a não-existência de uma causa de justificação deve ser um pressuposto do tipo e/ou da aplicação da pena. O Estado, detentor do jus puniendi e tutor, por força constitucional, dos bens jurídicos da sociedade, não é hábil para obstar agressões ilegítimas aos bens tutelados, de tal forma que confere ao cidadão a legitimidade para, diante da agressão injusta, defender subsidiariamente o bem jurídico que pertence a si ou a terceiro. O ato de repelir o injusto, por autorização normativa, não constitui ilícito, restando legitimada a ação e excluída a antijuridicidade do fato, desde que preenchidos os requisitos legais. Nos casos em que o agente recai em erro acerca das circunstâncias que o levam a agir acreditando atuar em legítima defesa, a análise pormenorizada do conjunto de fatos é imprescindível para que se verifique a exclusão da culpabilidade e, consequentemente, da aplicação da pena, uma vez que o Direito não se perfaz inerte ante ao ilícito, nem apena aquele que não age com culpa.


A escolha do tema se justifica pela sua importância e pelo seu caráter polêmico, haja vista a falsa certeza de uma agressão injusta provocar lesão ao bem jurídico de um indivíduo, agressão esta não autorizada pelo Direito, advinda do simples temor, quer fundado ou não, e que não enseja em sanção para o autor do fato, cujas ações mantêm-se típicas e antijurídicas aos olhos da legislação penal vigente. Eventualmente, a polêmica jurídica faz com que as pesquisas ou sejam superficiais, ou sejam ricas acerca de um tópico e um tanto escassas acerca doutros. No que tange à culpabilidade e à antijuridicidade, em especial nos aspectos que tratam da colisão de bem jurídicos e sua proteção, toda e qualquer discussão e pesquisa resultam em fonte enriquecedora para o Direito. Acerca destes tópicos, a pesquisa e o debate não se esgotam tão facilmente.


Metodologicamente, o estudo em tela foi pautado em pesquisa bibliográfica, imprescindível à argumentação do tema, que, pelos motivos expostos, tornam este ensaio enriquecedor para o mundo jurídico.


DESENVOLVIMENTO



1. A ANTIJURIDICIDADE E O DIREITO

A antijuridicidade é conduta contrária ao conjunto jurídico-normativo. É, pois, à luz da doutrina penalista, uma ação atentatória ao Direito, sendo formulado juízo de reprovabilidade normativa acerca do ato praticado pelo agente. Este conceito não se confunde com o de culpabilidade, conceito este muito mais amplo e que se refere ao juízo de reprovabilidade social da conduta,[1] sendo pressuposto de aplicação da pena. O elemento antijurídico do tipo tem como característica analítica a objetividade. Ou seja, a verificação da antijuridicidade que reveste a conduta, independe da análise subjetiva da ação ou omissão praticada pelo agente. Leciona Cezar Roberto Bitencourt:


“[…] A antijuridicidade é concebida fundamentalmente de um modo objetivo, o que, aliás, é perfeitamente explicável, uma vez que se tratava de dotá-la de autonomia ante a característica da culpabilidade, concebida então, como a parte subjetiva das infrações penais”.[2]


Apesar de a análise em questão recair sobre o sistema normativo penal, é importante frisar que condutas antijurídicas são verificadas em todos os ramos do ordenamento jurídico. Dito isto, há que se diferenciar a antinormatividade do instituto em análise. Welzel leciona que “toda realização do tipo de uma norma proibitiva é certamente antinormativa, mas nem sempre é antijurídica”.[3] A antinormatividade recai sobre a conduta contrária ao tipo descrito numa norma proibitiva, enquanto a antijuridicidade recai de forma conglobante sobre o sistema jurídico. Luiz Regis Prado confirma este pensamento quando afirma que  a antijuridicidade “exprime a relação de contrariedade de um fato com todo o ordenamento jurídico (uno e indivisível), com o Direito positivo em seu conjunto”[4] e novamente ratifica a ideia quando o autor cita em sua obra o jurista Welzel: “[a antijuridicidade] é a violação da ordem jurídica em seu conjunto, mediante a realização do tipo”.[5] Infere-se daí que uma norma, isoladamente, pode ser proibitiva em relação a uma conduta e, interpretando-a sistematicamente, uma excepcionalidade pode permitir tal conduta, fazendo com que esta seja antinormativa em relação à norma que a proíbe, mas não sendo antijurídica, pois não afronta o ordenamento jurídico. Ora o Direito veda uma conduta, ora permite a realização de uma ação tipificada. Para que seja antijurídica, a conduta deve se amoldar ao tipo penal ante a ausência de causa que a justifique (causa de justificação).[6]


A doutrina divide a antijuridicidade em formal e material. A antijuridicidade formal contraria a norma em si, enquanto a material lesa efetivamente o bem jurídico tutelado. Bitencourt afirma que a antijuridicidade é instituto indissolúvel, uma vez que uma conduta contraria a norma, concomitantemente, lesionará o bem jurídico tutelado.[7] Cláudio Brandão afirma que a antijuridicidade não é elemento do crime, mas o próprio crime em si, sendo a tipicidade a ratio cognoscendi da antijuridicidade.[8]


2. OS EXCLUDENTES DE ANTIJURIDICIDADE


Quando o Estado se tornou detentor do jus puniendi (direito de prescrever sanções coercitivamente), avocou para si a tutela dos bens jurídicos, sendo vedado ao cidadão a autotutela, sob pena de agir em exercício arbitrário das próprias razões, ressalvando-se os casos excepcionados pela legislação pátria.[9] Tais permissões normativas são as denominadas causas justificantes ou de justificação.  Excludente de antijuridicidade é um instituto que afasta a afronta ao ordenamento jurídico, tornando a conduta do agente acolhida pelo Direito. Nos dizeres do insigne jurista Cláudio Brandão, “em determinados casos excepcionais, o Estado concede ao particular a tutela dos bens jurídicos”,[10] adequando assim a conduta, em tese, contrária aos ditames legais, consonante com a lei. Aduz-se, então, que as causas justificantes têm caráter permissivo,[11] mesmo perante a qualidade impeditiva inerente à legislação penal. Cezar Roberto Bitencourt enriquece nosso entendimento com suas palavras:


“A antijuridicidade, entendida como relação de contrariedade entre o fato e a norma jurídica, tem sido definida, por um setor doutrinário, como puramente objetiva (grifo do autor), sendo indiferente a relação anímica entre o agente e o fato justificado (grifo do autor). No entanto, segundo entendimento majoritário, assim como há elementos objetivos e subjetivos no tipo, originando a divisão em tipo objetivo e tipo subjetivo, nas causas de justificação (grifo do autor) – que excluem a antijuridicidade – há igualmente componentes objetivos e subjetivos (grifo do autor). Por isso, não basta que estejam presentes os pressupostos objetivos de uma causa de justificação, sendo necessário que o agente tenha consciência de agir acobertado por uma excludente, isto é, com a vontade de evitar um dano pessoal ou alheio.”[12]


As causas legais de excludente de ilicitude estão elencadas no artigo 23 do Código Penal brasileiro vigente, in verbis:


Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato:


I – em estado de necessidade;


II – em legítima defesa;


III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. […]”[13]


Entretanto, o aludido rol não é exaustivo, sedo meramente regra geral, verificando-se outras causas de excludente de antijuridicidade mais específicas nos artigos: 128, I (aborto necessário) e 146, §3º, I (constrangimento ilegal), ambos do Código Penal[14] pátrio em vigor e, ainda que não esteja codificado penalmente, o Art. 188, II (permissão para deteriorar ou destruir coisa alheia, a fim de remover perigo iminente) do Código Civil de 2002[15] traz em seu bojo uma causa de excludente de antijuridicidade. A doutrina aponta o consentimento do ofendido como causa supralegal de excludente de ilicitude do fato.[16]


2.1 ESTADO DE NECESSIDADE


O jure necessitatis é uma ideia norteada pelo conflito de interesses juridicamente tutelados causado por um contexto de perigo atual ao qual o indivíduo não deu causa voluntariamente. Há um conflito de bens jurídicos tutelados pelo Estado em cuja situação um deve ser sacrificado em detrimento de outro. A situação de perigo deve ser inevitável e deve haver proporção entre o bem jurídico preservado e o lesionado.[17] Bitencourt afirma que o Direito, nestas situações, reconhece sua imponência para tutelar os bens jurídicos que se encontram em perigo admitindo o sacrifício de um deles em detrimento de outro e, para tanto, aguarda e (poder-se-ia dizer) autoriza uma “solução natural” que ponha fim ao conflito em pauta e proclama a solução conflituosa legítima.[18] Luiz Regis Prado aponta que atua em estado de necessidade o agente que, para preservar do perigo atual e inevitável, não provocado voluntariamente por si, objeto jurídico legitimamente tutelado próprio ou de outrem, é obrigado a lesar um bem jurídico alheio também legítimo.[19] Neste caso, entende Bitencourt que o Direito não se faz ausente, “apenas acomoda-se dentro dos limites das possibilidades humanas, para manter-se eficaz, sob pena de normativizar paradoxalmente, alheio à realidade social”.[20]


A doutrina faz uma dicotomia explanatória acerca da natureza jurídica do instituto, nascendo as teorias diferenciadora e unitária. A teoria diferenciadora defende que o estado de necessidade pode excluir a culpabilidade ou a antijuridicidade, dependendo da valoração conferida ao bem de outrem sacrificado na situação concreta. Afirma esta corrente que a culpabilidade será excluída caso o bem sacrificado seja de mesmo valor que o bem preservado, enquanto será excluída a antijuridicidade caso o bem sacrificado possua valor inferior ao bem preservado. A teoria unitária defende apenas a exclusão da antijuridicidade, e é a teoria adotada pelo Direito Penal brasileiro, que, na opinião de Gimbernat Ordeig, é a mais acertada, vez que “se o estado de necessidade é uma causa de exclusão de antijuridicidade, é porque o Direito não valora negativamente, não querendo combatê-la”.[21]


Além dos requisitos de perigo atual que ameace direito próprio ou alheio não provocado voluntariamente pelo agente e não havendo outro meio de preservar o bem jurídico em perigo para configurar o estado de necessidade, deve haver a inexistência do dever legal de enfrentar o perigo (salvo em caso de sacrifício próprio ou de extremo perigo que coloque em risco a vida ante um bem jurídico de valoração ínfima – aqui, vige o princípio da razoabilidade).


2.2 ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL


Acerca do instituto em comento, o ilustre jurista Cláudio Brandão afirma:


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“O estrito cumprimento de um dever legal é a causa de exclusão da antijuridicidade que se baseia em uma norma de caráter geral, cujo preceito determina a alguém o dever de realizar uma conduta típica, dentro dos limites desta dita norma. (grifo do autor).


Não existe essa causa de justificação, portanto, quando falte uma norma de caráter geral. Se o dever de agir for imposto por uma norma de caráter particular, como aquela emanada de um superior hierárquico, não se pode falar em incidência do estrito cumprimento do dever legal, embora se possa, eventualmente, reconhecer a obediência hierárquica (art. 22 do Código Penal) para excluir a culpabilidade do agente.”[22]


Age em estrito cumprimento de dever legal aquele (geralmente, um agente público) que, rigorosamente dentro dos limites previstos em norma jurídica (lei, decreto, regulamento, portaria, etc.), cumpre o dever prescrito, tolhendo bem jurídico de outrem. Como mencionado, o dever prescrito deve emanar de fonte jurídica, não estando englobadas no instituto regras morais, religiosas ou costumeiras. Por imposição da lei, a conduta do agente é típica, mas não antijurídica, em que pese ser cumprida a prescrição normativa ipsi literis. Quando o dever não é cumprido rigorosamente dentro do âmbito da legalidade, caracteriza abuso, sendo a ação imprópria e abusiva.[23] A doutrina[24] afirma que tal causa justificante da antijuridicidade pressupõe um elemento subjetivo: o animus de defender bens jurídicos. Conforme explanado anteriormente, o dever decorre da legislação, não sendo coerente afirmar que o cumprimento do dever legal é revestido de caráter subjetivo, tendo em vista que aí se constitui uma obrigação de agir, não uma faculdade de agir.


2.3 EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO


Este instituto difere do estrito cumprimento de dever legal porque este último, como aduzido anteriormente, infere numa obrigação emanada da lei, enquanto o exercício regular de direito é uma faculdade de agir que a norma confere ao particular.


Brandão afirma que aquilo que é permitido pelo universo jurídico não pode ser vedado pela norma penal isoladamente, ainda que a conduta resulte em um tipo de delito penal.[25] Para que o ato do agente represente exercício regular de direito, o mesmo deve obedecer aos requisitos objetivos, subjetivos, formais e materiais impostos pela norma, sob pena de não ser excluída a antijuridicidade, uma vez que esta só é afastada quando um direito, seja público ou privado, penal ou extrapenal, é regularmente exercido.[26]


2.3.1 Offendiculas


A natureza jurídica das offendiculas representa discussão doutrinária fervorosa. Offendiculas, que são defesas predispostas, constituem-se de dispositivos ou instrumentos que tem por escopo obstruir ou dificultar a ofensa a bem jurídico protegido.[27] A discussão traz a offendicula de um lado, apontada como legítima defesa preordenada e, de outro, como exercício regular de direito. A corrente que defende a offendicula como exercício regular de direito preconiza que não se pode considerar os artifícios predispostos como legítima defesa se não há uma agressão injusta atual ou iminente, que é o requisito fundamental do instituto da legítima defesa. Cláudio Brandão aponta que a offendicula “dirige-se a uma agressão futura, que poderá acontecer ou não”.[28]


Ponto pacífico na doutrina é que, independente de ser considerada legítima defesa preordenada ou exercício regular de direito, deve a offendicula, manifestada através de qualquer instrumento, ser utilizada com parcimônia e extrema cautela, sendo o excesso punido pelo Estado. A existência de offendicula deve ser pública e notória, além de que, obrigatoriamente, avisos acerca de sua existência devem ser afixados no local.


Ante o exposto, justifica-se a corrente majoritária entender que a natureza jurídica da offendicula é de exercício regular de direito, resguardando o titular o seu bem jurídico, não podendo, no entanto, cometer excessos no emprego desse meio de proteção.


2.4 CONSENTIMENTO DO OFENDIDO


Quando o bem jurídico em questão for disponível, o consentimento do ofendido atua como causa excludente da antijuridicidade. Esta é uma justificante considerada como de tipo supralegal, posto que não está prevista explicitamente na legislação penal, como se encontram os institutos do estado de necessidade, da legítima defesa, do estrito cumprimento do dever legal, do exercício regular de direito, do aborto necessário, do constrangimento ilegal e da permissão para deteriorar ou destruir coisa alheia, a fim de remover perigo iminente (esta última, causa justificante prevista no Código Civil, como apontado anteriormente). Ainda que a conduta do agente se ajuste ao tipo penal, não há que se falar em antijuridicidade, uma vez que não há ofensa ao bem jurídico disponível. Entretanto, em que pese ser o bem jurídico tutelado indisponível, o consentimento do ofendido não possui relevância jurídica.


Para que o consentimento do ofendido tenha o condão de excluir a antijuridicidade do fato, é necessário que:


– O ofendido tenha manifestado seu consentimento livremente, despido de quaisquer vícios de vontade;


– O ofendido possua capacidade de discernimento no momento da aquiescência;


– Seja o bem jurídico ora alvo da ofensa ou perigo de livre disponibilidade do ofendido;


– O fato se amolde ao tipo e se constitua em objeto de consentimento do ofendido.[29]


Há de se frisar que, em determinados delitos, o dissenso da vítima é elemento do tipo penal. Nestes casos, o consentimento do ofendido enseja em conduta atípica. Há uma tênue diferença entre as situações, mas que remete a consequências jurídicas distintas. Em um caso, há tipicidade e exclusão da antijuridicidade; quando a discórdia da vítima é elemento do tipo e esta inexiste, a conduta é atípica.


2.5 Legítima defesa


A legítima defesa é a causa de justificação mais antiga. O Código de Manu já fazia alusão ao instituto em comento mas, historicamente, a versão mais aperfeiçoada do instituto surgiu no Direito Romano, que a admitia “não só para salvaguardar a vida e a integridade corporal, senão também para a proteção do pudor e dos bens quando o ataque contra eles estivesse acompanhado de perigo para a pessoa”.[30] O Direito Germâmico não legislava expressamente sobre o instituto, mas a morte do agressor era interpretada como execução antecipada de sua pena. O Direito Medieval não considerava culpado aquele que agia respaldado pela legítima defesa[31]. No Brasil, o Código Criminal do Império, datado de 1830, consagra o instituto formalmente[32]. Ante o exposto, percebe-se que as raízes da legítima defesa encontram-se enlaçadas com as raízes do Direito Penal.


A legítima defesa é uma reposta a uma agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou de outrem. De acordo com Bettiol, é um instinto natural que leva o agredido a repelir a ofensa, mediante lesão a bem jurídico do agressor.[33] É, então, a legítima defesa, além do reconhecimento dos instintos humanos mais primitivos, também o reconhecimento, por parte do Estado, de que o mesmo não é onipresente, sendo incapaz de proteger os bens jurídicos da sociedade a qualquer tempo e em qualquer lugar.


As teorias subjetivas consideram a legítima defesa como causa excludente da culpabilidade. Já as teorias objetivas a consideram causa de exclusão da antijuridicidade. O Direito pátrio adota a teoria objetiva, considerando excluída, ante o instituto, a antijuridicidade do fato.


A figura jurídica em análise tem fulcro no Art. 25 do Código Penal brasileiro vigente (“Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.”)[34]. A lei prevê como requisito para que a legítima defesa se configure: agressão injusta atual ou iminente, meios moderados para repelir tal agressão e animus defendendi. O bem jurídico a ser protegido pode ser daquele que repele a agressão ou de terceiro. É, nas palavras de Cláudio Brandão, “um contra-ataque, uma reação”.[35]


2.5.1 Agressão injusta, atual ou iminente


A agressão é ato comissivo, posto que não se poderia reagir a uma omissão. Ato omissivo não dá causa à legítima defesa por ausência de causalidade e voluntariedade de realização.[36] A reação pressupõe uma ação anterior. Cláudio Brandão frisa que esta ação é humana, não podendo alegar legítima defesa quem age contra animal ou contra ação reflexa.[37] É imprescindível que “o ato agressivo seja consciente e voluntário (grifo do autor), com o objetivo de lesar o bem jurídico”.[38] Sem a ausência de consciência e voluntariedade, pode-se invocar estado de necessidade, conforme a preleção de Roxin:


“Não agride quem golpeia à sua volta em um ataque convulsivo epilético ou durante o sono; quem vagueia pelas ruas e cai sem sentidos por estar ébrio; quem desmaiado perde o domínio de seu veículo, nem aquele que é jogado pela janela e com a queda põe em perigo outras pessoas”.[39]


É injusta a ação não autorizada nem permitida pelo Direito, ou seja, a agressão não legitimada. A agressão permitida pelo Direito não pode ser entendida como antijurídica, não cabendo, portanto, a alegação de legítima defesa. Percebe-se, então, que a agressão advinda do estado de necessidade não é contrária ao ordenamento jurídico e, diante desta, a parte que sofre a agressão, que no caso não é injusta, não pode invocar a legítima defesa, mas pode, em contrapartida, também invocar estado de necessidade, vez que o Direito não exige que um indivíduo suporte agressão contra bem jurídico seu, em que pese ser a agressão contra este bem injusta. O jurista Cláudio Brandão explana que, diante de agressões autorizadas pelo Direito, a reação nunca estará respaldada pela legítima defesa, eventualmente sendo invocado o estado de necessidade.[40] Excepcionalmente, no caso de excesso cometido quando da repulsão do injusto, o agressor inicial pode invocar legítima defesa para repelir o excesso cometido pelo inicialmente agredido por este – é a denominada legítima defesa sucessiva. A agressão, frise-se, não pode ser confundida com provocação ao agente.[41] Não é necessário que constitua um ato ilícito penal, mas, em sentido amplo, esta agressão, para ensejar legítima defesa, deve constituir um ato ilícito, posto que não pode ser invocada legítima defesa contra ato lícito[42], conforme comentário supra.


Não há que se questionar se a agressão repelida era previsível ou evitável, sendo irrelevante a possibilidade de fuga do agredido.[43] O Direito não admoesta a autodefesa, censura apenas a autotutela.


É cabível legítima defesa contra agressão provocada por inimputáveis, inclusive vulnerável[44]; por aqueles que fizeram uso de entorpecentes e contra agressão provocada em razão de erro de proibição inevitável.[45] Luiz Regis Prado afirma ainda que é cabível o instituto em tela contra, em geral, aqueles que agem inculpavelmente.[46] Tal afirmação é incongruente com a posição majoritária da doutrina, posto que é pressuposto para ensejar legítima defesa a agressão dolosa, conforme supramencionado.


Quanto ao momento da agressão, esta pode ser atual ou iminente. Atual é aquela que está ocorrendo naquele instante e ainda não foi encerrada, sendo a agressão em si suportada naquela ocasião pelo agredido. Iminente é aquela que está por suceder, sendo este momento bastante próximo, não sendo admitida a demora na repulsa. Não se deve confundir agressão iminente com perigo futuro, pois este último dá ensejo a atitude diversa da repulsão do injusto. No primeiro caso, ao repelir a ação, o agredido tem por objetivo sustar a agressão, fazer com que esta cesse. No segundo caso, o escopo daquele que está por ser agredido é evitar o início do injusto. Não se admite legítima defesa contra ato que já cessou, podendo vir a constituir-se autodefesa ou exercício arbitrário das próprias razões, que se configura em usurpar do Estado o jus puniendi.


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2.5.2 Direito próprio ou alheio


Qualquer bem jurídico pode ser objeto de resguardo através da legítima defesa, seja este bem disponível ou indisponível, pessoal ou impessoal.[47] A classificação da legítima defesa em própria ou de terceiro depende da titularidade do bem jurídico que sofre a ofensa ilegítima. É denominada legítima defesa própria quando o indivíduo age para defender bem jurídico se sua titularidade. A legítima defesa de terceiro é aquela que ocorre quando o indivíduo age para salvaguardar bem jurídico de outrem. Neste caso, a natureza do bem jurídico agredido deve ser observada, uma vez que, em sendo um bem disponível, pertencente a pessoa capaz, esta pode decidir-se por outra via para proteger o seu bem, ou até mesmo pode exercer o direito de optar por não oferecer resistência ao injusto sofrido.


2.5.3 Uso moderado dos meios necessários para repelir a agressão injusta


De acordo com o exposto, infere-se que o Direito não é inerte ante ao ilícito, permitindo que o particular intervenha para proteger-se. A ação do particular, no entanto, restringe-se unicamente à proteção do bem lesado, não podendo ultrapassar a intensidade do injusto nem o momento em que o mesmo é acometido pela hostilização ilegítima. Bitencourt afirma que a configuração do instituto jurídico em argumentação “está diretamente relacionada com a intensidade e gravidade da agressão, periculosidade do agressor e com os meios de defesa disponíveis”.[48]


Meio necessário, ensina João Mestieri, “é aquele que, estando disponível ao agente, é hábil para repelir agressão injusta” (grifo do autor).[49] Ao permitir o uso dos meios necessários para repelir a ação injusta, o Direito não está autorizando a possibilidade de causar lesão a outrem indiscriminadamente, mas tão somente permite que o injusto seja afastado da maneira menos lesiva quanto possível. Adverte Bitencourt:


“Necessários são os meios suficientes e indispensáveis para o exercício eficaz da defesa. Se não houver outros meios, poderá ser considerado necessário o único meio disponível (ainda que superior aos meios do agressor), mas, nessa hipótese, a análise da moderação do uso deverá ser mais exigente”.[50]


É, então, necessário que, durante a análise do caso concreto, busque-se aplicar o princípio da proporcionalidade, examinando a natureza e a relação entre a agressão injusta e o meio utilizado para repeli-la.


2.5.4 Animus defendendi


O animus defendendi é a intenção de defender-se da ação lesiva ilegítima. Este é o único elemento subjetivo da configuração da legítima defesa, sendo os outros elementos objetivos do instituto em tela. Esta análise é fundamental, pois, nos dizeres de Bitencourt, “um fato que na aparência exterior apresenta-se objetivamente com os mesmos aspectos pode, dependendo da intenção do agente, receber definição variada”.[51] Assim, na ausência do ânimo de defesa, pode a ação configurar-se discrepante da legítima defesa.


3. LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA COMO CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO EXCULPANTE À LUZ DO DIREITO PENAL BRASILEIRO


Legítima defesa putativa é a também denominada legítima defesa ficta. A situação de perigo existe tão somente no imaginário daquele que supõe repelir legitimamente um injusto. Constitui descriminante putativa ou seja, o agente “supõe a ocorrência de uma excludente de criminalidade que, se existisse, tornaria sua ação legítima”.[52] Por conseguinte, a ação do que se supõe agredido é revestida de antijuridicidade, em divergência daquele que age em legítima defesa real. Afirma Jescheck que “o fato praticado sob a suposição errônea de uma causa de justificação continua, pois, sendo um fato doloso”.[53]


Conforme discorrido nas laudas supra, a legítima defesa é instituto que exclui a antijuridicidade da ação daquele que repele a agressão injusta. Diferentemente, a legítima defesa putativa, por constituir erro sobre a situação fática, pode ser causa justificante através da eliminação da culpabilidade do agente ou causa de diminuição de pena, conforme expõe Bitencourt:


“A legítima defesa putativa supõe que o agente atue na sincera e íntima convicção da necessidade (grifo do autor) de repelir essa agressão imaginária (legítima defesa subjetiva). […] No entanto, se esse erro, nas circunstâncias, era inevitável, exculpará o autor; se era evitável diminuirá a pena, na medida de sua evitabilidade”.[54]


A culpabilidade é elemento pressuposto da aplicação da pena, não excluindo a antijuridicidade do fato, incidindo apenas sobre o momento no qual o Estado inflige a punição ao agente. A análise da culpabilidade é um juízo de reprovação subjetivo, acerca do autor do fato típico e antijurídico, e sua presença se perfaz quando o autor do fato, podendo agir em conformidade com o Direito, resolve, voluntariamente, agir em desconformidade com o sistema normativo.[55] A análise do instituto da culpa, em tela, é jurídica, não moral ou religiosa. Excluída a culpa, por conseguinte, verifica-se excluída a aplicação da pena, uma vez que esta é proporcional à responsabilidade subjetiva do autor do fato.


Rememorando os vernáculos supramencionados de Bitencourt, ao destrinchar o caso concreto da legítima defesa putativa, quando o erro for inevitável, não podendo exigir-se do indivíduo conduta diversa, restará excluída a culpa do autor e, quando evitável, o injusto ficto atua como causa de diminuição da pena. O julgador, ao apreciar os fatos, deve ter a cautela de analisar as provas, vincular sua análise ao animus defendendi e às circunstâncias que levaram o autor do ilícito ao erro, buscando assim a verdade real, escopo investigatório do processo penal brasileiro, que leva à aplicação da justiça.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Onde o homem vive organizado em grupos, se faz presente Direito e Religião. Daí, infere-se que o Direito é, certamente, mais relevante que a ciência. O propósito do Direito é o justo, a razoabilidade e a resolução dos conflitos de direitos que colidem entre si. Embasado neste objetivo, o Estado, tutor dos bens jurídicos da sociedade e provedor do bem-estar social, confere ao particular a faculdade de agir, em situações específicas, de forma a resguardar bem jurídico que sofre ou possa vir a sofrer agressão ilegítima. A ação do indivíduo, nesta situação, é típica, mas não antijurídica. Ou, ainda, pode ser típica e antijurídica, mas uma conduta tal que não se reveste de culpabilidade, como no caso da legítima defesa putativa.


Por ser o estudo um tanto polêmico, o pesquisador pode ser levado falsamente a vislumbrar, no caso da legítima defesa putativa, uma excludente de antijuridicidade. Tal não condiz com as teorias de tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade adotadas pela legislação penal brasileira A ação de defesa putativamente legitimada, em conformidade com a nomenclatura, pressupõe uma agressão fictícia, que só subsiste no imaginário do suposto agredido. Em sendo este pensamento fundado, sendo invencível o embuste, não se pode conferir culpa ao agente. Amoldando a situação às teorias adotadas pelo Código Penal brasileiro e ao escopo do Direito, não seria razoável apenar ou apenar rigorosamente aquele que age se julgando em perigo. Negaria, se assim agisse o Estado, todo o equilíbrio da tutela dos bens jurídicos e também os mais primitivos instintos humanos, dos quais prevalece o instinto à sobrevivência.


 


Referências bibliográficas

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, volume 1: parte geral. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRANDÃO, Cláudio. Curso de Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de setembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/del2848.htm>. Acesso em: 24 de set. de 2010.

______. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 24 de set. de 2010.

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120. 6.ed.ver., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

 

Notas:

[1] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, volume 1: parte geral. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 313.

[2] Ibidem.

[3] WELZEL, Hans apud ibidem. p. 314.

[4] PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120. 6.ed.ver., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 379.

[5] WELZEL, Hans apud loc.cit.

[6] PRADO, Luiz Regis. Loc. cit.

[7] Ibidem.

[8] BRANDÃO, Cláudio. Curso de Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 171 et seq.

[9] Idibem. p. 183.

[10] Loc. cit.

[11] PRADO, Luiz Regis. Op. cit. p. 380.

[12] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 327.

[13] BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de setembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/del2848.htm>. Acesso em: 24 de set. de 2010.

[14] Ibidem.

[15] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 24 de set. de 2010.

[16] BRANDÃO, Cláudio. Loc. cit.

[17] Ibidem. p. 185.

[18] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p.331.

[19] PRADO, Luiz Regis. Op. cit. p. 384.

[20] BITENCOURT, Cezar Roberto. Loc.cit.

[21] ORDEIG, Enrique Gimbernat apud BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 186.

[22] BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 196.

[23] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 347.

[24] BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 195.

[25] Ibidem. p. 196.

[26] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p.348.

[27] Ibidem. p.349.

[28] BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 197.

[29] TOLEDO, Francisco de Assis apud BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 198.

[30] ASÚA, Luis Jiménez de apud BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 191.

[31] BRANDÃO, Cláudio. Loc. cit.

[32] PRADO, Luiz Regis. Op. cit. p. 389.

[33] BETTIOL, Giusepe apud BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 340.

[34] BRASIL. Op. cit. Acesso em 27 de setembro 2010.

[35] BRANDÃO, Cláudio. Loc. cit.

[36] PRADO, Luiz Regis. Op. cit. p. 391.

[37] BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 192.

[38] PRADO, Luiz Regis. Loc. cit.

[39] ROXIN, Claus apud ibidem.

[40] BRANDÃO, Cláudio. Loc. cit.

[41] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 341.

[42] Ibidem. p. 342.

[43] HUNGRIA, Nelson apud ibidem.

[44] Nomenclatura utilizada atualmente para referir-se a indivíduo menor de 18 anos.

[45] PRADO, Luiz Regis. Op. cit., 392.

[46] Ibidem.

[47] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 343.

[48] Ibidem.

[49] MESTIERI, João apud BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 193.

[50] BITENCOURT, Cezar Roberto. Loc. cit.

[51] Ibidem. p. 344.

[52] Ibidem. p. 400.

[53] JESCHECK, H. H. apud ibidem. Loc. cit.

[54] BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit. p. 345.

[55] BRANDÃO, Cláudio. Op. cit. p. 200.


Informações Sobre o Autor

Bruna Fernandes Coêlho

Bacharela em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (2007); Escrivã da Polícia Civil do Estado de Pernambuco; Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Cândido Mendes (RJ); pós-graduanda em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho (RJ); pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal Militar pela Universidade Cândido Mendes (RJ); graduanda em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7399915688574739


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