A Lei Maria da Penha e o novo conceito de família

Resumo: A lei Maria da Penha, além de inovar no conceito de família, também representa um marco na proteção da família e um resgate da cidadania feminina, na medida em que a mulher ficará a salvo do agressor e, assim, poderá denunciar as agressões sem temer que encontrará com o agressor no dia seguinte e poderá sofrer conseqüências ainda piores.


Sumário: 1. Introdução. 2. A motivação da lei. 3. Inovações trazidas pela lei Maria da Penha


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1 INTRODUÇÃO


Em 7 de agosto de 2006, foi sancionada a lei n.º Lei 11.340, que “cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências”.


Esta lei ganhou o nome de “lei Maria da Penha” como forma de homenagear a mulher, Maria da Penha Fernandes, símbolo da luta contra a violência familiar e doméstica.


2 A MOTIVAÇÃO DA LEI


Em breves linhas, aquela mulher sofreu duas tentativas de homicídio por parte do ex-marido. Primeiro, levou um tiro enquanto dormia, sendo que o agressor alegou que houve uma tentativa de roubo. Em decorrência do tiro, ficou paraplégica. Como se não bastasse, duas semanas depois de regressar do hospital, ainda durante o período de recuperação, Maria da Penha sofreu um segundo atentado contra sua vida: seu ex-marido, sabendo de sua condição, tentou eletrocutá-la enquanto se banhava.


A punição do agressor só se deu 19 anos e 6 meses após o ocorrido. Essa situação injusta provocou a formalização de denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA – órgão internacional responsável pelo arquivamento de comunicações decorrentes de violação desses acordos internacionais, pelo Centro pela Justiça pelo Direito Internacional (CEJIL) e pelo Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), juntamente com a vítima.


Ante a denúncia, a Comissão da OEA publicou o Relatório nº 54, de 2001, que dentre outras constatações, sugeriu a continuidade e o aprofundamento do processo reformatório do sistema legislativo nacional, a fim de mitigar a tolerância estatal à violência doméstica contra a mulher no Brasil.


A sanção dessa lei representa, assim, um avanço na proteção da mulher vítima de violência familiar e doméstica, incluindo-se, também, uma inovação legal quanto às formas familiares já positivadas.


3 INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI MARIA DA PENHA


A lei Maria da Penha, além de inovar no conceito de família, também, rompe com a dicotomia público/privado evidenciada pelo antigo ditado “em briga de marido e mulher, ninguém bota a colher”. O espaço doméstico que estava destinado exclusivamente à mulher era inatingível. Isso gerou um sentimento de impunidade pela violência doméstica, como se o que acontecesse dentro da casa não interessasse a ninguém. A autoridade do marido, no moldes da família patriarcal, permitia o direito de dispor do corpo, da saúde e até da vida da sua esposa. Essa autoridade do homem/marido sempre foi respeitada de forma que a Justiça parava na porta do lar, e a polícia sequer podia prender o agressor em flagrante.


Dessa forma, considera-se que a lei Maria da Penha representa um marco na proteção da família e um resgate da cidadania feminina, na medida em que a mulher ficará a salvo do agressor e, assim, poderá denunciar as agressões sem temer que encontrará com o agressor no dia seguinte e poderá sofrer conseqüências ainda piores.


No que concerne ao reconhecimento legal de uniões homoafetivas femininas, a lei institucionaliza uma situação inegável e com clara constatação fática, além de significar um avanço para romper com os preconceitos existentes.


4 CONCLUSÃO


A família homoafetiva é uma realidade. O conservadorismo do legislador brasileiro quanto à evolução no conceito de família representa a influência daqueles pessimistas que pensam que a civilização corre o risco de ser engolida por clones, bárbaros bissexuais ou delinqüentes da periferia, concebidos por pais desvairados e mães errantes. Um conservadorismo que fecha os olhos para a realidade e se omite em dar sustentação ao instituto já previsto na norma inclusiva, que é o art. 226 da CR/88.


Aceitar novos modelos familiares não significa dizer que a família será destruída. Conceber apenas a família nuclear composta pelo casal heterossexual e filhos como o único modelo de família aceitável, é incompatível com a natureza afetiva da família. A noção de família como núcleo de afetividade e base da sociedade deve ser encarada, como de fato é, como um fator cultural. E, dessa maneira, a legislação deve acompanhar a evolução da sociedade e, conseqüentemente, dos arranjos familiares.


Efetivamente, a família, como fruto da cultura, é constantemente reinventada e, hoje, se reinventa para propiciar o alcance da felicidade de seus membros.


 


Referências

BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. Rio de Janeiro, Editora Rio, 1976.

BRASIL. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988.

BRASIL. Congresso Nacional. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente.

BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil Brasileiro. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Lei Maria da Penha.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

ROUDINESCO, Elisabeth. A família em desordem. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2003.


Informações Sobre o Autor

Maria de Fátima Santos de Santana


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