A natureza jurídica do lançamento do imposto de renda das pessoas jurídicas

A questão da natureza jurídica do lançamento do imposto de renda das pessoas jurídicas é, ainda, bastante controvertida. Alguns estudiosos entendem tratar-se de um tributo sujeito ao lançamento por declaração, e outros, mais recentemente, defendem a tese de que se trata de lançamento por homologação. Entendemos que essa última tese é a mais correta.

Até o advento do Decreto-lei nº 1.967/82 havia um consenso na doutrina pátria, no sentido de considerar o lançamento do imposto de renda das pessoas jurídicas como sendo lançamento por declaração. Isto porque, até aquela época, o fisco, no ato da entrega da declaração pelo contribuinte, examinava o seu conteúdo e, no mesmo momento em que procedia ao lançamento, notificava aquela do imposto que lhe foi lançado.

Com o advento do diploma legal retro citado, passou-se para o critério de apuração mensal do lucro, por meio de balancetes. Atualmente, essa apuração e recolhimento mensal do imposto sofreu alteração pela Lei nº 9.430/96, que facultou às pessoas jurídicas a opção entre a apuração do lucro trimestral e a apuração do lucro anual, com base em balanço encerrado em 31 de dezembro, hipótese em que, o contribuinte deverá proceder ao recolhimento mensal do imposto e da contribuição social sobre o lucro, por estimativa, seguindo-se a declaração de ajuste no final do exercício.

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Desde a entrada em vigor do Decreto-lei nº 1.967/82 desvinculou-se o prazo de pagamento do imposto à entrega da declaração dos rendimentos, não havendo mais o prévio exame do lançamento pela autoridade administrativa. O recolhimento do imposto independe de qualquer manifestação da autoridade administrativa.

Não restam dúvidas, ao nosso sentir, de que o lançamento do imposto de renda das pessoas jurídicas passou a ter natureza jurídica de lançamento por homologação.

Nessa linha de entendimento já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

“TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TERMO INICIAL. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. A retenção do tributo na fonte pagadora é inconfundível com a extinção do crédito tributário. O crédito tributário não surge com o fato gerador. Ele é constituído com o lançamento (Art. 142 do CTN). Em se tratando de Imposto de Renda, o lançamento deve ocorrer após as informações do sujeito passivo, na declaração de ajuste (Lei nº 8.8383/91, artigo 15) ou pela informação da fonte que promoveu a retenção; Qualquer das hipóteses leva ao exame dos artigos 147 e 150, § 4º. Não havendo homologação expressa, ela ocorreria tacitamente, decorridos 05 (cinco) anos do fato gerador e só aí há a extinção do crédito.

Recurso parcialmente provido” (Recurso Especial 250306/DF – Primeira Turma – Rel. Min. Garcia Vieira – Julgado em 06/06/2000 – DJU de 01/08/2000).

Alguns autores e parte da jurisprudência, ainda, sustentam a tese de que, no caso de não pagamento do tributo, relativo aos valores declarados, a contagem do prazo decadencial se faria na forma do artigo 173, I do CTN, que estabelece como dies a quo da decadência, o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.

Os que assim entendem, argumentam que a ausência de pagamento implica perda do objeto do ato homologatório, ou seja, sustentam que, sem o pagamento, não haveria o que homologar.

Todavia, divergimos desse posicionamento. O que se homologa não é o pagamento, mas, toda a atividade procedimental tendente a verificar a ocorrência do fato gerador, levada ao conhecimento da autoridade.

Trazemos à colação a lição de Souto Maior Borges em sua obra sobre o Lançamento Tributário, volume 4 do Tratado de Direito Tributário Brasileiro, Forense, 1981:

“…Compete à autoridade administrativa, ‘ex vi’ do artigo 150, caput, homologar a atividade previamente exercida pelo sujeito passivo, atividade que em princípio implica, embora não necessariamente, em pagamento. E, o ato administrativo de homologação, na disciplina do CTN, identifica-se precisamente com o lançamento (…) consequentemente, a tecnologia contemplada no CTN é, sob esse aspecto, feliz: homologa-se a ‘atividade’ do sujeito passivo, não necessariamente o pagamento”.

No nosso entender, na hipótese de imposto apurado pelo contribuinte ainda que não tenha sido pago antecipadamente, sujeita-se ao prazo decadencial, a contar da data da ocorrência do fato gerador. Cuida-se de caso de lançamento por homologação.

Entretanto, se entender que, naquela hipótese, aplica-se a regra do inciso I do art. 173 do CTN, que rege a decadência para o lançamento por declaração, na contagem do prazo de cinco anos, há que se levar em conta o ano calendário e não o ano civil, como tem considerado parcela ponderável da doutrina e da jurisprudência. O exercício financeiro está vinculado ao ano calendário e não ao ano civil.

Nesse sentido a jurisprudência do Egrégio TRF da 1º Região, que adotou a tese do lançamento por declaração procedendo a contagem do prazo como se tratasse de ao civil:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. “O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” (art. 173, I, do CTN).

 Não tendo havido pagamento antecipado do imposto de renda no ano de 1983, ano-base de 82, surgiu para o Fisco o direito de constituir o crédito tributário a partir do primeiro dia do exercício seguinte, 1/01/84, nos termos do referido art. 173, I, do CTN, prazo esse que findaria a 1/01/89, tendo, no entanto, a Fazenda concluído essa constituição antes, aos 25/03/88, com a notificação do lançamento de ofício ao sujeito passivo, não se operando, portanto, a decadência.

Provimento ao apelo e à remessa” (Apelação Cível 96.01.22951-5/MG – Juíza Relatora Eliana Calmon – Juiz Relator para Acórdão João V. Fagundes – Quarta Turma – Julgado em 02/09/1997 – DJU de 02/04/1998, p.109).

Ora, o inciso I do art. 173 do CTN refere-se ao primeiro dia do exercício seguinte. O exercício fiscal, pela legislação do imposto sobre a renda, coincide com o ano calendário, que começa no dia 1º de janeiro e termina no dia 31 de dezembro. Difere do ano civil, que é o decurso do prazo de doze meses, contados do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte, conforme definição do art. 1º da Lei nº 810, de 6-9-1949. O ano civil é, pois, o período corrido de 365 dias. Não é nesse sentido a determinação do CTN.

Portanto, o acórdão supra contém um equívoco. No caso considerado, a decadência consumar-se-ia em 31-1-1988, e não em 1-1-1989. Apenas para argumentar, se o último exercício terminasse em 1-1-1989, nessa data, poderia haver majoração do imposto, para ser cobrada a partir de 2-1-1989, que já seria o início de um outro exercício. À toda evidência, isso afrontaria o princípio constitucional da anterioridade.

Como se vê, a questão não está pacificada na jurisprudência, nem quanto ao tipo de lançamento do imposto, e nem quanto ao dia do término do prazo decadencial de cinco anos.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Camillo Soubhia Netto

 

Advogado, especializado na área do Direito Público, pós graduando em Direito Tributário, sócio do escritório Soubhia Netto Advogados Associados, membro da Associação dos Advogados de São Paulo.

 


 

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