A natureza jurídica dos animais: rompendo com a tradição antropocêntrica

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Resumo: O presente artigo tem como objetivo explorar o tema do status jurídico conferido aos animais não humanos pelo Direito. Pretende-se analisar o panorama jurídico atual, que atribui a condição de “coisa” a tais animais, para revelar a incompatibilidade do modelo dominante com a realidade do atual período histórico. Assim, o trabalho tem como propósito debater essa polêmica questão para evidenciar que os animais não humanos podem, e devem ser entendidos como sujeitos de direitos, uma vez que são titulares de situações jurídicas. Para tanto, serão examinados e redefinidos conceitos clássicos da teoria geral do direito, bem como a utilização de tais conceitos pelo Direito Civil tradicional e pelas doutrinas clássicas do Direito Animal. Por fim, será apresentada a uma proposta de nova categorização e classificação dos animais não humanos perante o ordenamento jurídico que garanta a sua proteção e o reconhecimento de sua dignidade. [1]

Palavras-Chave: Direito Civil, Direito Animal, Status jurídico, sujeito de direito.

Sumario 1. Introdução – 2. Fundamentos do Antropocentrismos Jurídico – 3. O Atual Panorama Jurídico: 3.1 O Direito Civil Tradicional; 3.2 O Animal Não Humano e a Constituição Federal Brasileira – 4. A Crise do Paradigma Dominante e o Direito Animal: 4.1. Teorias Clássicas do Direito Animal: Animais Como Sujeitos de Direitos – 5. A Proposta – 6. Conclusão – 7. Referências Bibliográficas.

1 Introdução

Este artigo é fruto da nossa crença de que o direito é um processo que se mantém em contínua reconstrução. Em razão disso, pretende-se analisar a atual abordagem do tema do status jurídico dos animais não humanos pelo ordenamento jurídico, em especial pelo Direito Civil, com o propósito de demonstrar que o atributo de “coisa” concedido a esses seres não mais se sustenta, já que incompatível com as influências e tendências da nossa época.

Desse modo, objetiva-se revelar uma nova perspectiva, através do reconhecimento de um novo Estado de Direito, de um ordenamento jurídico onde o homem não se situe como único protagonista de todo enredo social. Constrói-se, assim, um caminho para alcançarmos a conscientização de que o ser humano é apenas um dos elementos no emaranhado da vida.

Este trabalho, portanto, é uma tentativa de encorajar os operadores do direito a revisar a teoria clássica de que apenas o animal humano pode figurar como sujeito de direito, e, consequentemente, adaptar o ordenamento jurídico a tais mudanças, conferindo novos sentidos a institutos outrora considerados consolidados, inquestionáveis, como a noção de que o animal não humano é um bem jurídico apropriável pelo homem. Nesse sentido, acredita-se que os animais não só podem, como devem ser considerados sujeitos de direito.

Para tanto, este paper foi divido em quatro partes fundamentais. Inicialmente, analisa-se o tratamento dispensado aos animais não humanos no decorrer do processo histórico, para, ato contínuo, compreendermos o atual panorama jurídico antropocêntrico, em especial, o civilista. Segue-se revelando-se a crise do modelo vigente através do desvelamento das Teorias Clássicas do Direito Animal, para, ao fim, ser apresentada a proposta de criação de uma nova categoria jurídica para a inclusão dos animais não humanos, que se revele mais justa e solidária com todas as espécies.

2 Fundamentos do antropocentrimos jurídico

O atual paradigma jurídico dominante, baseado no modelo contratualista adotado pelo Direito, é aquele que exclui os animais não humanos da esfera de consideração moral e jurídica, já que esse modelo estabeleceu a ideia de que o nosso sistema legal teria como fundamento um contrato social do qual poderiam participar apenas os animais racionais/humanos.

O modelo contratualista foi influenciado, nesse aspecto, principalmente, pela doutrina do filósofo René Descartes[2] (século XVII) que – bebendo em Aristóteles[3] –, através das tradições e conceituações da Teoria Racionalista, defendeu que os animais não humanos seriam meras máquinas, que possuíam um organismo mecânico, destituído de alma e sentimento, e, portanto, não poderiam ter experiências de prazer, dor, sofrimento, ou qualquer outra emoção, sendo, assim, seres inferiores ao homem, o ser racional.

A ideia cartesiana de que “[…] a razão ou o senso é a única coisa que nos torna homens e nos distingue dos animais […]”[4], desse modo, colocou o animal humano em uma posição hierarquicamente superior a de todos os demais animais, instituindo o chamado modelo racionalista antropocêntrico adotado pela tradição ocidental. Esse modelo, ao exaltar a razão, excluiu os animais não humanos da comunidade moral. Para Descartes, os animais teriam como única finalidade servir ao homem.

Foi esse o modelo adotado pela teoria contratualista que fundou o paradigma dominante no meio jurídico.

Segundo o filósofo estadunidense Thomas Kuhn, a ciência normal, ou seja, “a pesquisa firmemente baseada em uma ou mais realizações científicas passadas[5]”, se desenvolve justamente de acordo com o paradigma instituído por tais pesquisas, no caso, o paradigma racionalista difundido por Descartes. Nesse sentido, os cientistas que se seguiram, após esse período, empenharam-se para, ao longo do processo histórico, reforçar o modelo de racionalidade antropocêntrico.

Na área do Direito, a teoria contratualista desenvolveu – e reforçou – o paradigma vigente. Os principais expoentes desse modelo jurídico foram Jean-Jacques Rousseau e Immanuel Kant (século XVIII), que elegeram a racionalidade cartesiana como critério fundamental para a superposição e diferenciação entre os animais humanos e os animais não humanos perante o Direito. Segundo tais autores, na mesma linha de pensamento de Descartes, somente os animais humanos, por serem dotados de racionalidade, mereceriam consideração moral e jurídica.

Desse modo, com fundamento no modelo racionalista, Kant e Rousseau se opuseram a ideia de reconhecer direitos e deveres aos animais não humanos. Para Rousseau, seguindo o modelo edificado por Descartes, os animais não humanos não passariam de meras máquinas:

“Não vejo em todo animal senão uma máquina engenhosa, à qual a natureza deu sentidos para prover-se ela mesma, e para se preservar, até certo ponto, de tudo o que tende a destruí-la ou perturbá-la. Percebo precisamente as mesmas coisas na máquina humana, com a diferença de que só a natureza faz tudo nas operações do animal, ao passo que o homem concorre para as suas na qualidade de agente livre. Um escolhe ou rejeita por instinto, o outro por um ato de liberdade, o que faz com que o animal não possa afastar-se da regra que lhe é prescrita, mesmo quando lhe fosse vantajoso fazê-lo, e que o homem dela se afaste frequentemente em seu prejuízo. (Grifos nossos)”[6]

Rousseau, contudo, enxergava um ponto de semelhança entre os animais humanos e os não humanos: a sensibilidade, o que implicaria em um dever, por parte dos humanos, de não causar mal, desnecessariamente, a tais animais. Nas palavras do Autor:

“Por esse meio, terminam também as antigas disputas sobre a participação dos animais na lei natural; porque é claro que, desprovidos de luz e de liberdade, não podem reconhecer essa lei; mas, unidos de algum modo à nossa natureza pela sensibilidade de que são dotados, julgar-se-á que devem também participar do direito natural e que o homem está obrigado, para com eles a certa espécie de deveres. Parece, com efeito, que, se sou obrigado a não fazer nenhum mal a meu semelhante, é menos porque ele é um ser racional do que porque é um ser sensível, qualidade que, sendo comum ao animal e ao homem, deve ao menos dar a um o direito de não ser maltratado inutilmente pelo outro. (Grifos nossos)”[7]

Igualmente, para Kant, a moralidade do homem estaria fundada na razão. Inclusive, a atual noção de dignidade adotada pelo nosso ordenamento jurídico, base do Estado Democrático de Direito, se funda na deontologia kantiana. O Autor formou seu entendimento de dignidade a partir da ideia de “autonomia ética do ser humano”, em razão da qual este possuiria atributos próprios, não podendo, assim, ser tratado como um objeto nem por ele próprio.

Por outro lado, também para Kant, os animais não humanos, por não possuírem racionalidade, não eram dignos de consideração pelo homem. O autor afirmava que os humanos não têm “deveres diretos com relação aos animais. Eles não possuem autoconsciência e existem meramente como meios para um fim. Esse fim é o homem. ”[8] Conclui ele que o animal humano, por ser dotado de razão, seria um fim em si mesmos, ou seja, seria dotado de um valor intrínseco. Os seres irracionais, por sua vez, os animais não humanos, só teriam um valor relativo, e, por isso mesmo, deveriam ser considerados “coisas”. Nas palavras do Autor:

“Os seres, cuja existência não depende precisamente de nossa vontade, mas da natureza, quando são seres desprovidos de razão, só possuem valor relativo, valor de meios e por isso se chamam coisas. Ao invés, os seres racionais são chamados pessoas, porque a natureza deles os designa já como fins em si mesmos, isto é, como alguma coisa que não pode ser usada unicamente como meio, alguma coisa que, consequentemente, põe um limite, em certo sentido, a todo livre arbítrio (e que é objeto de respeito). ” (Grifos nossos)”[9]

No século XIX, dentro da lógica da ciência dominante, os expoentes jurídicos apenas consolidaram tais ideais, e o homem passou a ser a medida de todas as coisas, sendo o animal não humano apenas um meio para suprir as suas necessidades.

A doutrina jurídica mais expressiva, conforme dito anteriormente, se apoiou, e ainda hoje, tem no pensamento kantiano sua fundamentação básica, contudo, como afirma Kuhn, nenhuma ciência normal pode se estabelecer de modo definitivo e eterno.

Nesse sentido, Ingo Sarlet questiona até que ponto tal concepção poderá ser efetivamente adotada sem reservas ou ajustes na atual quadra da evolução social, econômica e jurídica. Para esse autor, tanto o pensamento de Kant quanto todas as concepções que sustentam ser a dignidade atributo exclusivo da pessoa humana, encontram-se, ao menos em tese, sujeitos à crítica de um excessivo antropocentrismo, notadamente, naquilo em que sustentam que a pessoa humana, em função de sua racionalidade “ocupa um lugar privilegiado em relação aos demais seres vivos. ” [10]

O argumento que o autor desenvolve e que se articula com a linha desse trabalho, é o de que sempre haverá como sustentar a dignidade da própria vida, sobretudo, ressalta, numa época em que o reconhecimento da proteção do meio ambiente, enquanto valor fundamental, indica que estão em causa, não apena a vida humana, mas a preservação de todos os recursos naturais, inclusive todas as formas de vida existentes no planeta.[11]

Esses questionamentos apontam para uma mudança de cultura, da consciência da necessidade de que o antropocentrismo possa vir a dar lugar ao entendimento de que, em sua essência, a natureza precede ao próprio homem.

Desse modo, surgiram correntes e movimentos em prol da defesa dos direitos dos animais, tais como os movimentos do “Abolicionismo Animal” e de “Libertação Animal”, dentre outros, que, contrariando o modelo baseado no imperativo jurídico kantiano, alertam que o Direito, e, consequentemente, o enfoque da dignidade, exaltam diferenças especistas para a exclusão da justiça, menosprezando outras vidas. Isso levou a uma crise no modelo instituído, uma vez que o paradigma dominante tem se mostrado incapaz de responder satisfatoriamente às demandas apresentadas.

A crise do paradigma racional instituído por Descartes, ressalte-se, começou a se desenhar, de forma mais concreta no mundo jurídico, a partir da teoria de Jeremy Benthan. O Autor inglês escreveu em 1789 “Uma introdução aos princípios da moral e da legislação”, obra na qual defendeu que o requisito básico de todos os interesses estaria baseado no princípio da potencialização do bem-estar e minimização do sofrimento dos seres sencientes, independentemente do grau de racionalidade.

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Ou seja, para Benthan, embora existam diferenças concretas entre os humanos e os animais não humanos, ambos são seres sencientes, ou seja, tanto humanos como não humanos podem sofrer, e a capacidade de sofrer deve ser considerada o fundamento básico para que um ser possa fazer parte da comunidade moral.

Assim, Benthan foi de encontro à ideia sustentada por Descartes, Rousseau e Kant, de que o critério básico de diferenciação entre os animais humanos e não humanos seria a racionalidade, e defendeu que devemos usar como critério para a consideração moral dos seres o princípio da igual consideração de interesses de todos os seres sencientes. Até porque, segundo o defensor dos direitos dos animais Gary L. Francione “Não há qualquer característica que sirva para distinguir os humanos dos outros animais. Qualquer atributo que possamos pensar que torna os humanos ‘especiais’, e assim diferentes dos outros animais, é compartilhado por algum animal não humano. ”[12]

A teoria de Benthan foi, portanto, o ponto de partida mais importante para a tomada de consciência com relação a consideração moral dos animais não humanos e o questionamento do pensamento acerca do status desses animais, ao estabelecer uma obrigação direta e imediata aos humanos de não causar sofrimento desnecessário aos animais.

Foi com base nesses conceitos de Benthan que Peter Singer – filósofo Australiano e principal proponente contemporâneo das ideias de Benthan – lançou a ideia do preconceito especista, o que começou a preparar o caminho para uma mudança do paradigma dominante.

O filósofo australiano, seguindo os passos do psicólogo britânico Richard Ryder, definiu como preconceito especista a discriminação moral fundada na razão arbitrária da espécie. Para Singer, assim como com a recusa aos preconceitos de raça e sexo, a verdadeira igualdade só seria alcançada a partir da recusa ao preconceito especista.

Segundo o autor:

“Se um ser sofre não pode haver qualquer justificativa moral para deixarmos de levar em conta esse sofrimento. Não importa a natureza do ser, o princípio da igualdade requer que seu sofrimento seja considerado em pé de igualdade com os sofrimentos semelhantes […] o limite da senciência […] é a única fronteira defensável de consideração dos interesses alheios. […]. Os racistas violam o princípio da igualdade ao conferirem mais peso aos interesses de membros de sua própria raça quando há um conflito entre seus interesses e os daqueles que pertencem a outras raças. Os sexistas violam o princípio da igualdade ao favorecerem os interesses de seu próprio sexo. Analogamente, os especistas permitem que os interesses de sua própria espécie se sobreponham àqueles maiores de membros de outras espécies. O padrão é idêntico em todos os casos.”[13]

Numa perspectiva utilitarista clássica, como na defendida por Benthan e Singer, ter interesse no seu próprio bem-estar, desejando ativamente prazer e evitando a dor (não só sentir o prazer e sentir a dor), é o fundamento do princípio de igual consideração de interesse, entendido como a ideia de que, para interesses iguais deve haver uma consideração moral igual, independentemente de raça, sexo ou espécie.

Em linhas gerais, foram essas as ideias centrais que começaram a questionar o paradigma dominante, e, como será visto adiante, abriu caminho para as correntes que abraçam a tese da concessão do status jurídico de sujeito de direito aos animais não humanos.

3 O atual panorama jurídico

3.1. O direito civil tradicional

3.1.1 O animal como “coisa”

O direito civil clássico, pós-revolução francesa, como consequência do processo histórico de formação do antropocentrismo jurídico analisado supra, adotou a Teoria do Direito que submete os animais não humanos ao regime de propriedade, na medida em que os considera como “coisas”, sendo assim regidos, no âmbito do direito privado, pelos Direitos Reais (ou direito das coisas).

O direito das coisas simboliza um conjunto de normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem, segundo uma finalidade social humana.

Nas palavras de Arnoldo Wald, Direitos Reais são as normas que regulam “as relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação, estabelecendo um vínculo imediato e direto entre o sujeito ativo ou titular do direito e a coisa sobre a qual o direito recai e criando um dever jurídico para todos os membros da sociedade. ”[14]

Ressalte-se, contudo, que as expressões “bem” e “coisa”, como utilizadas nesse trabalho[15], devem ser compreendidas a partir de uma relação de gênero e espécie. A noção jurídica de bem representa tudo aquilo que pode ser objeto de uma relação jurídica, confundindo-se, desse modo, com a própria noção de objeto de direito.

Já a expressão coisa, segundo Washington de Barros Monteiro é “tudo quanto seja suscetível de posse exclusiva pelo homem, sendo economicamente apreciável”[16], ou seja, a coisa seria o bem que possui expressão econômica.

Segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, é “possível a existência de bens com ou sem qualquer expressão econômica, enquanto a coisa sempre apresenta economicidade e é inevitavelmente corpórea. ” [17]

Nessa ordem de ideias, portanto, existem utilidades ideais que, embora não sejam coisas, são bens jurídicos. E mais: a economicidade não é, no moderno Direito Civil, inerente à noção de bem jurídico. A vida e a liberdade, por exemplo, são bens jurídicos, embora não sejam economicamente mensuráveis.

De acordo com o Código Civil Brasileiro de 2002, o animal possui o status jurídico de coisa, sendo o bem que contém expressão econômica, objeto, portanto, de apropriação pelo homem. É o que se extraí da combinação dos artigos 82 e 1.228 do CC/02. Litteris:

Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”[18]

Segundo a lei civil, o direito de propriedade se exerce, tradicionalmente, através da faculdade de usar, gozar e dispor da coisa (art. 1.228 do CC/02). O direito de usar é aquele que dá a faculdade ao proprietário de se servir das utilidades da coisa, sem, contudo, alterar-lhe a essência. O direito de gozar, por sua vez, é aquele que o proprietário tem de fruir da coisa, ou seja, de obter os seus frutos. Já o direito de dispor é aquele direito que tem o proprietário de dar a destinação que entender a coisa, seja consumindo-a, alienando-a, doando-a, dentre outras.[19] Dessa maneira, de acordo com o Código Civil, o homem pode usar, gozar e dispor do animal não humano, de acordo com a finalidade social que lhe destine.

Ressalte-se, todavia, que o exercício desses direitos pelo proprietário não é absolutamente livre e ilimitado como pode parecer à primeira vista. O próprio Código de Civil, no §1º do artigo 1.228, em consonância com os preceitos constitucionais (função social da propriedade, prevista no artigo 5º, XXIII, da CF/88) exige que o direito de propriedade seja

“[…] exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.”[20]

Contudo, apesar do inegável avanço que se deu com previsão do §1º do artigo 1.228 do CC/02, o diploma civil ainda se mostra incompatível com a nossa realidade e a evolução histórica do Direito, e prevê apenas dois regimes para regular as relações jurídicas: o de bens, que seriam os objetos de direito, e o de pessoas, que seriam os sujeitos de direito, ignorando completamente a realidade dos sujeitos de direitos que não são pessoas. É caso dos animais que, a par da realidade, são considerados coisas pelo Código Civil.

Como visto, esse enquadramento dos animais como “coisa” pelo Código Civil é fruto da ideologia antropocêntrica adotada pela ciência desde os tempos de Descartes, reproduzida, como consequência, no âmbito jurídico.

Assim, em que pese trajetória de evolução científica, com o reconhecimento da ideia de que animais humanos e não humanos são seres igualmente sencientes, e, que, portanto, devem ter o seu interesse em não sofrer igualmente considerado (princípio da igual consideração de interesse), não há como levar a sério os interesses dos animais não humanos enquanto possuírem o status jurídico de “coisa”.

Inclusive, segundo Francione, “A razão da profunda inconsistência entre o que dizemos sobre os animais e como realmente os tratamos é o status, ou a condição, dos animais como nossa propriedade. ”[21] Para o Autor, “O direito de não ser tratado como propriedade alheia é básico, pois é diferente de quaisquer outros direitos que poderíamos ter porque é a fundação para esses outros direitos; é uma precondição para a posse de interesses moralmente significativos. ”[22]

Percebe-se, desse modo, que esse enquadramento dos animais vai na contramão da evolução histórica de luta pelos seus direitos e da própria Constituição Federal, que já reconhece os animais não humanos enquanto sujeitos de direito, como será visto adiante nesse trabalho.

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3.1.2 O Sujeito de Direito

Para a doutrina Clássica, sujeito de direito é aquele que possui direitos e deveres de acordo com a ordem jurídica. Não seria esse o caso dos animais, classificados pelo Código Civil, e pela doutrina majoritária, como objeto de direito economicamente apreciável (coisa).

Diversos foram os autores que propuseram definições para a ideia de sujeito de direito. Segundo Clóvis Beviláqua, “sujeito de direito é o ser a que a ordem jurídica as­segura o poder de agir contido no direito”[23]. Para Orlando Gomes, “sujeito de direito é a pessoa a quem a lei atribui a faculdade ou a obrigação de agir, exercendo poderes ou cumprindo deveres”[24]. Maria Helena Diniz, por sua, assevera que: “pessoa é o ente físico ou coletivo suscetí­vel de direitos e obrigações, sendo sinônimo de sujeito de direi­to”[25]. Para Washington de Barros Monteiro “na acepção jurídica, pessoa é o ente físico ou moral, suscetível de direitos e obrigações. Nesse sentido, pessoa é o sinônimo de sujeito de direito ou sujeito de relação jurídica. ”[26]

A partir de uma breve análise da literatura jurídica, verifica-se facilmente que grande parte da doutrina adere a corrente que identifica os conceitos de pessoa e sujeito de direito.

Assim, como visto acima, Clóvis Beviláqua, Orlando Gomes, Maria Helena Diniz, Washington de Barros, dentre outros autores como Carlos Roberto Gonçalves[27] e Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona[28], partilham da ideia de que para a atribuição do status de sujeito de direito é necessária a personalidade jurídica. Ou seja, somente as pessoas seriam sujeito de direitos. Pode-se afirmar, nesse sentido, que para a teoria tradicional dos sujeitos de direito existem apenas duas espécies de sujeitos de direito: as pessoas físicas e as pessoas jurídicas.

Por outro lado, já observamos que, classicamente, haveria, de igual modo, uma identidade entre os conceitos de objeto de direito e bem (que incluí o conceito de coisa – bem com expressão econômica).

Essas construções dicotômicas são típicas do pensamento ocidental. Segundo o Jack Balkin, as teorias de filósofos ocidentais expressaram, em vários momentos, uma série de diferentes valores binomiais: sujeito/objeto, normal/anormal, bem/mal, positivo/negativo, identidade/diferença, ideal/não-ideal.[29]

Embora essas questões pareçam metafísicas, filosóficas, apartadas do mundo jurídico, é preciso lembrar que as doutrinas jurídicas refletem a vida social. A escolha de direitos protegidos e de técnicas de aplicação reproduzem os pontos de vista sobre as relações sociais de um determinado período. A nossa visão social e o sistema de leis não são formados com base na natureza, como ela realmente é, mas sim sobre uma interpretação humana da natureza, uma metáfora, um privilégio. [30]

Desse modo, é preciso descontruir esse sistema instituído e reproduzido de forma acrítica pelos manuais dos cursos de graduação, para recordarmos aspectos da vida que foram empurrados para o fundo pelas necessidades da concepção jurídica dominante.

Nessa linha de pensamento, alguns autores como Pontes de Miranda, defendem o rompimento dessa clássica identificação dos conceitos de sujeito de direito e pessoa. Segundo o autor “sujeito de direito é o ente que figura ativamente na relação jurídica fundamental ou nas relações jurídicas que são efeitos ulteriores”[31] Sendo assim, para Pontes de Miranda, o conceito de sujeito de direito é mais amplo que o de pessoa e a equiparação entre ambos não é correta.

Para ser sujeito de direito é necessário ter titularidade, ou seja, é necessário ser titular de direitos ou deveres, é necessário ser titular de uma situação jurídica, independentemente de ser pessoa ou não. Assim, sujeito de direito pode ser uma pessoa, ou um grupo delas, uma universalidade patrimonial, ou qualquer ente ao qual o ordenamento atribua capacidade jurídica.

A personalidade jurídica, por sua vez, é uma qualidade jurídica criada pelo Direito, atribuída aos seres humanos e a outros entes por eles criados com a finalidade atribuir-lhes direitos e deveres. A personalidade é, portanto, para a doutrina civilista tradicional[32] um requisito para que determinados seres e entidades sejam classificados como sujeitos de direito, uma vez que os dota da capacidade para aquisição de direitos e deveres, bem como para o seu exercício.

Assim, ser pessoa é uma situação que qualifica um ser humano, ou mesmo um ente jurídico, como sujeito de direito, mas não é condição necessária e exclusiva para tanto. Para Jorge Miranda, ser pessoa representa uma das possibilidades de se qualificar algo como sujeito de direito:

“[…] ser pessoa é fato jurídico: com o nascimento com vida, o ser humano entra no mundo jurídico, como elemento do suporte fático em que o nascer é núcleo. Esse fato jurídico tem a sua irradiação de eficácia. A civilização contemporânea assegurou aos que nela nasceram o serem pessoas a ter o fato jurídico do nascimento efeitos da mais alta significação. Outros direitos, porém, surgem de outros fatos jurídicos em cujos suportes facticos a pessoa se introduziu e em tais direitos ela se faz sujeito de direito.”[33]

E o que permite a qualificação de determinado ser ou ente como pessoa? De acordo com Pontes de Miranda, são circunstâncias do período histórico que determinam a personalidade. Na Roma antiga, por exemplo, somente o ser humano livre e cidadão Romano era considerado pessoa. Com o tempo, a consideração jurídica se ampliou para assegurar direitos para mais seres humanos.

Sobre a condição de pessoa, César Fiuza assevera que:

“É interessante observar que personalidade é invenção do Direito. Daí dizemos que personalidade é atributo jurídico. A personalidade não é natural. Tanto não é natural, que antigamente havia seres humanos aos quais o Direito não atribuía personalidade. Eram escravos, considerados coisas perante o ordenamento jurídico.”[34]

Percebemos que o Direito evolui à medida que novos caminhos ganham horizonte, e, assim, os operadores do direito procuram adaptar o ordenamento jurídico a tais mudanças, conferindo novos sentidos a institutos outrora considerados consolidados, inquestionáveis.

Desse modo, com o tempo e evolução do Direito, passou a ser garantido a todo ser humano, em razão do princípio da igualdade, a qualidade de pessoa. As primeiras codificações (Code Napoléon e BGB), com caráter fortemente antropocêntrico, incorporaram essa concepção, influenciando na formação do primeiro Código Civil Brasileiro, de 1916, que determinava no seu artigo 2º, que todo ser humano teria personalidade jurídica. Litteris: “Art. 2º. Todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil”.[35]

Atualmente, contudo, o ordenamento jurídico atribui, a além dos seres humanos, a alguns agrupamentos humanos, a universalidades patrimoniais e aos entes estatais a qualidade de pessoa, ou seja, personalidade jurídica.[36] Percebe-se, com isso, que a qualidade de pessoa sequer é um atributo exclusivamente humano, é, sim, um produto do direito, uma imputação jurídica.[37]

Para o nosso ordenamento, existem as pessoas físicas (humanas) e as pessoas fictícias (não humanas). Roxana Borges explica que “o ordenamento brasileiro atribui personalidade jurídica a todos os seres humanos (pessoa física ou pessoa natural) e a algumas entidades abstratas (pessoas jurídicas). ”[38] E continua autora, afirmando, contudo, que “nem todos os sujeitos de direito têm personalidade e direitos de personalidade. ”[39]

Podemos afirmar, assim, que, segundo a corrente adotada nesse trabalho, existem mais sujeitos de direitos do que pessoas, uma vez que toda pessoa é sujeito de direito, mas a afirmativa contrária não é verdadeira. É preciso reconhecer que existem, obviamente, entes despersonalizados que, uma vez titulares de situações jurídicas, figuram, efetivamente, como sujeitos de direitos (a tese será melhor desenvolvida adiante).

Adotamos, portanto, a corrente doutrinária que define o sujeito de direito como o titular de uma situação jurídica. Ou seja, o sujeito de direito é aquele que tem capacidade de ter direito, a possibilidade de ser titular de direitos, como os animais, o que é reconhecido pela própria Constituição Federal brasileira e por parte da doutrina. É o que veremos a seguir.

3.2 O animal não humano e a constituição federal brasileira

Diferente da concepção privatista do Direito Civil, entendemos que a Constituição de 1988 não adota a concepção do animal como “coisa”. O artigo 225, §1º, VII, da CF/88, ao vedar práticas cruéis contra o animal não humano, garante-lhe direitos subjetivos e, consequentemente, reconhece a sua condição de sujeito de direito.

Portanto, tomando o direito subjetivo como parâmetro, ou seja, a faculdade assegurada pelo ordenamento jurídico a alguém de exigir do outro uma conduta que está, por lei ou ato jurídico, obrigado a cumprir, e tendo em vista a previsão constitucional de proibição da prática de atos de crueldade contra animais, estes titularizam uma situação jurídica e figuram, consequentemente, como sujeitos de direito.

Para nós, tal regra da Constituição Federal/88 tem como destinatário o próprio animal, não o homem, não a coletividade, não a fauna. Observa-se, inclusive, que muitas vezes a regra de proteção entra em conflito com os direitos do próprio “proprietário”. Portanto, em sentido contrário ao que defende a doutrina civilista tradicional[40] não nos parece que a regra constitucional exista em benefício de um “meio ambiente equilibrado” ou do direito do “proprietário”.

Assim, a CF/88, ao elevar a proibição das práticas que submetem animais não humanos à crueldade à categoria jurídica de norma constitucional, veio reforçar a teoria apoiada pelos defensores dos direitos dos animais de que os animais não humanos seriam sujeitos de direitos, ou seja, titulares de uma situação jurídica.

Nesse sentido, Edna Cardozo Dias[41] e Laerte Levai[42] defendem que os animais não humanos já são reconhecidamente sujeitos de direito perante o ordenamento jurídico brasileiro, justamente e na medida em que a Constituição Federal e a lei de proteção Ambiental conferem diversos direitos subjetivos aos animais e impõe, expressamente, a vedação à crueldade (art. 225, §1º, VII, CF/88).

A nossa Carta Magna trouxe a questão dos direitos dos animais, há muito debatida nos campos da filosofia do direito, para o seio da dogmática jurídica, objetivo intensamente pretendido pelos partidários dessa causa.

E mais, ao alçar os direitos dos animais à categoria constitucional, o legislador conferiu enorme força jurídica ao movimento de defesa dos direitos dos animais, uma vez que está alicerçado pelos princípios da supremacia da Constituição e da proibição do retrocesso.

Conclui-se, por isso, que se direito for considerado como um interesse protegido pela lei, ou uma faculdade do julgador de exigir determinada conduta de outrem, ou mesmo uma garantia conferida pelo Estado que pode ser invocado sempre que um dever for violado, é necessário admitir que os animais são sujeitos de direito perante o ordenamento jurídico brasileiro.[43]

4 A crise do paradigma dominante e o direito animal

Como dito, acreditamos que o direito é um processo que se mantém em uma contínua reconstrução. É a partir das necessidades sociais, as quais, embora pertençam a todos os tempos, sempre se alteram, que ocorre a elaboração da regra jurídica. É o que aconteceu com a elaboração do artigo 225 da Constituição Federal/88, e é o que precisa acontecer com o Código Civil brasileiro. É preciso compreender que as regras de direito também se modificam “modeladas à luz das influências ou das tendências de cada época”.[44]

Observamos que, inicialmente, a proteção do meio ambiente, aí incluindo a fauna e a flora, através do Direito Ambiental, era estritamente antropocêntrica. Ou seja, a natureza deveria ser protegida com a finalidade de permitir o alcance dos interesses humanos, como defende, até hoje, a doutrina civilista tradicional. Em um segundo momento, com a transição do modelo do antropocentrismo puro para o antropocentrismo mitigado, a proteção da natureza passou a se basear na ideia de sustentabilidade. Esse ideário foi incorporado, em parte, pela Constituição Federal Brasileira de 1988, que determina que a proteção da fauna e da flora tem como propósito garantir o “meio ambiente ecologicamente equilibrado” para as “gerações presentes e futuras”. Contudo, atualmente, os modelos do antropocentrismo têm sido bastante questionados, e muitos autores já defendem um modelo chamado de não-antropocêntrico.

A construção teórica do não-antropocentrismo ensina que os animais humanos, assim como os não humanos fazem parte da natureza, sendo inexistente uma “linha divisória” que separe tais espécies. Assim, os animais não humanos, tanto quanto os humanos, são sencientes e possuem valor inerente, devendo ser protegidos como um fim em si mesmos e não como um meio para o alcance dos interesses humanos.[45]

Nesse sentido, as doutrinas que surgiram a partir de então, como o Direito Animal, têm como objetivo ultrapassar os valores morais mais antigos, sustentando que o paradigma vigente – antropocêntrico/racionalista – é artificial e ineficaz, e está, claramente, em contradição com a realidade, de modo a evidenciar que a exclusão dos animais da esfera de consideração moral humana não se sustenta mais.

Contudo, a expressão direito dos animais, quando empregada genericamente, tem sido geradora de alguns equívocos, pois abrange diversas teorias, como a teoria que defende que os animais possuem direitos morais, a teoria que defende os direitos legais dos animais, e, até mesmo, a teoria que defende o chamado bem-estar animal.[46]

De modo geral, a expressão direitos dos animais, latu sensu, abrange dois níveis de análise dentro da ética animal: o do bem-estar animal e dos direitos dos animais, esse último subdividindo-se nas esferas moral e jurídica.

Para o propósito desse trabalho, nos interessa analisar as clássicas correntes doutrinárias que defendem que os animais não humanos possuem direitos, e, mais especificamente, as correntes que defendem a personificação do animal não humano. Essas teorias foram traçadas, a nosso entender, por três autores principais: Peter Singer, Tom Regan e Steven Wise. Vejamos.

4.1 Teorias clássicas do direito animal: animais como sujeitos de direito

4.1.1 Peter Singer – Projeto Grandes Primatas

Peter Singer, filósofo australiano, juntamente com a filósofa italiana Paola Cavalieri, desenvolveu em 1993 o projeto Grandes Primatas. Esse projeto reivindica a imediata extensão de direitos humanos para chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos, os chamados grandes primatas.

Singer e Cavalieri, para fundamentarem seu projeto, partiram do estudo realizado em 1984 pelos biólogos Charles Sibley e Jon Ahlquist. De acordo com o estudo biológico os homens e os grandes primatas são mais próximos entre si do que os próprios macacos.[47]

Diferente da maioria dos estudos executados ainda hoje, que se baseia em uma taxonomia tradicional, ou seja, que leva em consideração apenas as diferenças anatômicas e biológicas entre as espécies, a análise realizada por Sibley e Ahlquist, aplicou o método da biologia molecular à taxonomia do estudo sobre o DNA dos humanos e de todos os seus parentes mais próximos. Explicamos.

O novo modelo empregado pelos biólogos nas suas experimentações e utilizado por Singer no projeto, leva em consideração não só a similaridade anatômica, como também a distancia genética e o tempo de separação entre as espécies, comprovando, portanto, que o homem e os grandes primatas pertencem à mesma família e ao mesmo gênero.

Partindo dessa premissa genética, Singer e Cavalieri reivindicam a extensão dos direitos humanos aos grandes primatas. Como afirma Heron Gordilho:

“É com base nesse argumento evolucionista que Singer e Cavalieri reclamam a concessão imediata de direitos fundamentais para os grandes primatas, tais como o direito à vida, à liberdade individual e à integridade física, entendendo que eles seriam dotados de uma capacidade jurídica semelhante à dos recém-nascidos ou deficientes mentais, o suficiente para abolir toda sorte de aprisionamento em zoológicos, circos, fazendas ou laboratórios científicos. […]. Em suma, como os grandes primatas possuem atributos mentais muito semelhantes aos da espécie humana, a sua exclusão da comunidade de iguais é moralmente injustificável, arbitrária e irracional.”[48]

Para Singer, pelo menos aos grandes primatas deve ser concedido o atributo da personalidade jurídica, na medida em que tais animais possuem consciência de si no tempo e se mostram capazes de projetar a sua existência no futuro, tendo interesse, portanto, em permanecer vivos. Ou seja, Singer, seguindo a corrente civilista clássica, reclama a personificação desses animais para que possam figurar como sujeitos de direitos.

Contudo, Singer, em Libertação Animal, não defende a extensão da personalidade para outros animais. Para o Autor, os demais animais não humanos podem continuar na condição de propriedade dos humanos, desde que esses animais tenham respeitado o seu interesse em não sofrer.

Assim, apesar de se propor a combater o Especismo e o paradigma vigente, a estratégia utilizada por Singer não deixa de ser especista, na medida em que utiliza a proximidade genética entre as espécies – a capacidade de raciocínio e a consciência/modelo racionalista – para defender a personificação dos grandes primatas, excluindo todas as demais espécies de consideração. Ou seja, para a linha de entendimento adotada pelo nosso trabalho, o projeto de Singer não rompe, de modo definitivo, com o paradigma dominante.

4.1.2 Tom Regan – Sujeitos-De-Uma-Vida

A teoria que defende que os animais não humanos possuem direitos morais, por sua vez, foi encabeçada pelo filósofo estadunidense Tom Regan. Segundo o autor, os animais, enquanto sujeitos-de-uma-vida, possuem direitos morais, ou seja, devem ter seus bens mais importantes – a vida, seus corpos e sua liberdade – protegidos pelo nosso ordenamento.

Assim, o autor adverte que é necessário que haja uma mudança do paradigma dominante na cultura ocidental para que se possa entender os seres não humanos como sujeitos-de-uma-vida. Isto é, é preciso que os não humanos sejam reconhecidos enquanto seres com vidas próprias e que precisam de proteção, e não como instrumentos, como ainda são vistos nas sociedades capitalistas contemporâneas.[49]

Para Regan, os sujeitos-de-uma-vida são aqueles seres conscientes do mundo, conscientes de si mesmos, e mais, seres que se importam com o que acontece com eles, quer os outros se importem ou não.[50]

Para defender sua teoria, Regan se propõe a enfrentar três condições básicas para a atribuição de direitos aos animais: a capacidade de reivindicação do direito por parte de quem pretende possuí-lo; a reciprocidade entre direitos e deveres para com os outros, e; o acordo intersubjetivo prévio que dá direito de ter direito.

Segundo o autor, tais condições deveriam ser aplicadas somente a agentes morais ou humanos paradigmáticos, ou seja, aqueles caracterizados pela autonomia – com capacidade de agir segundo princípios morais, decidir em função deles e responder perante os outros. Condições essas que não são levadas em conta quando são atribuídos direitos a pacientes morais, como as crianças e deficientes mentais, comprovando que não há diferença entre agentes e pacientes quando se fala em direitos.

Sendo assim, segundo ele, por uma questão de coerência lógica, os mesmos direitos devem ser atribuídos aos animais que possuem as mesmas capacidades dos pacientes morais, tais como os primatas e os mamíferos.

Tentando justificar quem são os seres que podem figurar como sujeito-de-uma-vida, Regan afirma que essa escolha não pode ser baseada em razões arbitrárias, como a raça, por exemplo, pois essas razões não são moralmente fundamentais. Nas palavras do autor:

“Direitos morais nunca podem ser negados, justificadamente, por razões arbitrárias, preconceituosas ou moralmente irrelevantes. Raça é uma dessas razões. Sexo é outra. Resumindo, diferenças biológicas são razões desse tipo. Como, então, poderemos acreditar que ser membro de uma espécie marque um limite defensável entre os animais que têm e os que não têm direitos? Logicamente, isso não faz sentido. Moralmente, isso indica um preconceito do mesmo tipo que o racismo e o sexismo, o preconceito conhecido como especismo.”[51]

O ponto crucial na teoria de Regan, no entanto, ocorre quando ele chega à conclusão de quem deve, precisamente, ser considerado sujeito-de-uma-vida. Para o autor, do ponto de vista moral, o que é fundamental para ser sujeito-de-uma-vida, é estar consciente do mundo e do que acontece, e mais, se importar, com o que acontece consigo, mesmo que isso não importe para os outros. Ou seja, para ele, os animais, assim como os humanos, são criaturas psicologicamente complexas. Regan explica:

“Entre os bilhões de animais não humanos existentes, há animais conscientes do mundo e do que lhes acontece? Se sim, o que lhes acontece é importante para eles, quer alguém mais se preocupe com isso, quer não? Se há animais que atendem a esse requisito, eles são sujeito-de-uma-vida. E se forem sujeitos-de-uma-vida, então têm direitos, exatamente como nós.”[52]

Dessa forma, Regan, assim como Singer, coloca o homem, e, portanto, a racionalidade, como parâmetro para a consideração moral dos animais não humanos como sujeitos-de-uma-vida, a partir da consideração da complexidade psicológica que determinados animais apresentam (mamíferos e aves), e, por conseguinte, a similaridade com o ser humano.

Assim, apesar de combater o especismo, a teoria de Regan também comete uma falha especista ao tentar justificar os direitos dos animais e a sua personificação a partir de uma comparação hierarquizada entre as espécies, se mantendo sob a dominação do paradigma vigente.

4.1.3 Steven Wise

Por fim, a teoria de que os animais não humanos possuem direitos não só morais, como também direitos legais, foi protagonizada pelo advogado e presidente do Center for the Expansion of Fundamental Rights, o estadunidense Steven Wise.

Wise argumenta que os animais, além de sujeitos de direito, devem ser considerados pessoas, assim como é defendido por Singer no Projeto Grandes Primatas e por Tom Regan.

O autor defende a imediata extensão da personalidade jurídica para Chimpanzés e Bonobos, partindo da premissa de que esses animais possuem capacidade mental que os permitiria serem aprovados em testes de comportamento humano. Ou seja, é invocada, mais uma vez, a racionalidade como parâmetro para extensão da personalidade jurídica a determinados animais.[53]

Na sua teoria, Wise cria uma tabela onde divide os animais em três categorias, em função dos respectivos valores de autonomia prática. As categorias são dividias em uma escala de 0 a 1, sendo esta última correspondente ao ser humano. Na primeira categoria, estariam incluídas as espécies com valores entre 0.9 e 1 (abarcando os grandes primatas e o golfinho, por exemplo); na segunda categoria, ficariam os animais com valores entre 0.51 e 0.89 (o cão, o papagaio cinzento africano e o elefante africano estariam incluídos nessa categoria) e, na terceira, aqueles que apresentam valores iguais ou abaixo do 0.50. Assim, Wise considera que todos os que se encontram na primeira categoria são dotados de autonomia prática suficiente para possuírem direitos básicos.[54]

O autor afirma que, com a sua teoria, buscou utilizar elementos que pudessem ser reconhecidos pelos juízes estadunidenses sem que fosse necessário mudar o sistema legal americano atual, possibilitando, assim, a imediata proteção dessas espécies. Ou seja, o próprio autor reconhece que a sua intenção não é romper com o modelo dominante, mas de adaptar-se a ele, estendendo direitos para um determinado número de espécies. Contudo, segundo Kuhn, um novo paradigma jamais pode ser criado dentro da ciência normal:

“Paradigmas não podem, de modo algum, ser corrigidos pela ciência normal. Em lugar disso, como já vimos, a ciência normal leva, ao fim e ao cabo, apenas ao reconhecimento de anomalias e crises. Essas terminam não através da deliberação ou interpretação, mas por meio de um evento relativamente abrupto e não estruturado semelhante a uma alteração da forma visual.”[55]

Apesar de ser considerada progressista, por alguns, e, por isso mesmo, rejeitada pelos mais conservadores, a teoria de Wise é muito criticada por algumas correntes de defesa de direitos dos animais por ser considerada especista, uma vez que, ao invés de mudar o paradigma da sociedade contemporânea para proteger um número maior de animais, utiliza argumentos preconceituosos, a partir de critérios arbitrários, para a defesa de um pequeno número de espécies.

5 A proposta

Como visto, as doutrinas civilistas tradicionais defendem que os conceitos de sujeito de direito e de pessoa se identificam e, portanto, apenas os entes personalizados seriam sujeitos de direito. Seguindo essa linha de raciocínio, as doutrinas clássicas do direito animal, usualmente, utilizam a proximidade entre a capacidade intelectiva dos animais humanos e não humanos como critério para defender a classificação dos animais não humanos como pessoas, e, consequentemente, como sujeitos de direito. No nosso trabalho pretendemos romper com essa lógica. Vejamos.

Ao contrário da doutrina civil tradicional, bem como das teorias clássicas dos direitos dos animais, seguimos uma linha de entendimento fundada no pensamento de autores como Fábio Ulhôa Coelho, Pontes de Miranda, Daniel Lourenço, dentre outros. Para Ulhôa Coelho, sujeito de direito “é o centro de imputação de direitos e obrigações referido em normas jurídicas, com a finalidade de orientar a superação de conflitos de interesses […]”. [56]

Destarte, como Ulhôa, acreditamos que sujeito de direito é o titular dos interesses em sua forma jurídica, de modo que, sujeito de direito é o gênero e pessoa é espécie, ou seja, “nem todo sujeito de direito é pessoa, embora toda pessoa seja sujeito de direito”.[57]

O jurista estabelece dois critérios para a classificação dos sujeitos de direito: o primeiro classifica os sujeitos de direito em personificados e despersonificados. O segundo critério divide-os em sujeitos humanos e não humanos.[58] [59] De acordo com essa classificação, as pessoas seriam classificadas como sujeitos de direito personificados, humanas ou não. As pessoas físicas seriam sujeitos de direito personificados humanos, já as pessoas jurídicas sujeitos de direito personificados não humanos.

Por outo lado, existiriam ainda os sujeitos de direito despersonalizados, mais uma vez, humanos ou não. No primeiro grupo temos, por exemplo, o nascituro (sujeito de direito alojado no útero materno) e o embrião (sujeito de direito isolado in vitro).[60] Entre os sujeitos de direito despersonalizados não humanos encontramos os entes despersonalizados, como o condomínio, a massa falida, o espólio, e, para nós, também os animais.

Dessa maneira, diferente das doutrinas tradicionais visitadas acimas, acreditamos que os sujeitos de direito podem ser dotados de personalidade jurídica, ou não. Nesse sentido, defendemos a criação de uma nova categoria jurídica, a categoria dos “animais”, pertencente ao grupo dos sujeitos de direitos despersonalizados não humanos.

No mesmo sentido, ou em sentido semelhante, autores como Heron Gordilho e Daniel Lourenço defendem a concepção de que os animais são sujeitos de direito despersonalizados. Para Gordilho, assim como para nós, o conceito de sujeito de direito é mais amplo do que o de pessoa, uma vez que para ser sujeito de direito é necessária a titularidade de direitos, independentemente do atributo da personalidade jurídica.[61]

Do mesmo modo, Daniel Braga Lourenço, segue a linha de entendimento apresentada por Ulhôa. O autor explica que a classificação criada Fabio Ulhôa é profícua para compreender a classificação dos entes enquanto sujeitos de direito:

“A distinção, contudo, é útil à compreensão do instituto e sua funcionalidade. Homens e mulheres, portanto, são sujeitos de direitos humanos personificados; nascituros são sujeitos humanos despersonificados; fundações, sujeitos de direito não humanos personificados; massa falida, um não humano despersonificado e assim por diante.” [62]

Partindo dessa lógica, Daniel Lourenço mostra que:

“A teoria dos entes despersonalizados, baseando-se na distinção conceitual entre “pessoa” e “sujeito de direito”, conforme se verificou, permite, portanto, que se prescinda da qualificação do ente como “pessoa” para que ele venha a titularizar direitos subjetivos. No que diz respeito aos animais ela poderá ser aplicada para caracterizá-la como autênticos sujeitos de direitos despersonificados não humanos, tal qual propõe a criteriosa classificação de Ulhôa Coelho.”[63]

Nesse ponto, é necessário explicar brevemente os caminhos (fundamentos) que nos levam a defender a criação de uma nova categoria jurídica e o seu enquadramento dentro da classificação dos sujeitos de direito despersonalizados não humanos.

Em primeiro lugar, para nós, como visto, o animal não humano é um ser senciente, assim como o homem, e por isso deve ter o seu interesse em não sofrer igualmente tutelado pelo nosso ordenamento jurídico – o que, de fato, já foi feito pela Constituição Federal de 1988, ao proibir a prática de atos cruéis contra os animais não humanos. Desse modo, a legislação civilista precisa se adequar a essa realidade e reconhecer a condição de sujeito de direito do animal não humano.

Assim, para nós, não é correta, nem necessária, a comparação entre a capacidade intelectiva humana e não humana para qualquer fim, uma vez que a racionalidade é um conceito arbitrário, e, portanto, especista para a classificação de seres como sujeito de direito ou não. O animal não precisa se aproximar em capacidade cognitiva ao homem para merecer a tutela do nosso ordenamento enquanto sujeito de uma situação jurídica. Basta, para isso, que utilizemos o princípio da igual consideração de interesses, e, consequentemente, consideremos igualmente interesses iguais, no caso, o interesse em não sofrer dos seres sencientes.

Em segundo lugar, nos distanciamos também da corrente que defende a concessão do atributo de pessoa aos animais não humanos. Para nós, os animais são sim sujeitos de direito perante o ordenamento jurídico, uma vez que são titulares de situações jurídicas, porém, são sujeitos de direito despersonalizados, uma vez que não possuem o atributo da personalidade jurídica.

Inclusive, como visto, já são, efetivamente, sujeitos de direito perante o nosso ordenamento, uma vez que, em consonância com a evolução do pensamento científico, a Constituição Federal de 1988 e Lei de Proteção Ambiental reconhecem que os humanos possuem deveres em relação aos animais (de não lhes causar sofrimento, dentre outros), e, portanto, existem direitos que correspondem a tais deveres, tornando os animais não humanos sujeitos de direitos subjetivos.[64]

Nesse sentido, Edna Cardozo Dias assevera que o dever jurídico que os humanos possuem em relação aos animais os torna sujeitos de direito:

“O fato de o homem ser juridicamente capaz de assumir deveres em contraposição a seus direitos, e inclusive de possuir deveres em relação aos animais, não pode servir de argumento para negar que os animais possam ser sujeitos de direito. É justamente o fato dos animais serem objeto de nossos deveres que os fazem sujeitos de direito, que devem ser tutelados pelos homens.” (Grifos nossos)[65]

Por fim, feita a modificação do status jurídico do animal, com a criação de uma nova categoria jurídica, a categoria dos “animais”, incluída no grupo dos sujeitos de direito despersonificados não humanos, e, portanto, com o reconhecimento de que os animais são titulares de direitos, resta saber quais direitos devem ser concedidos aos animais não humanos. O primeiro e mais básico direito de todos é, logicamente, o direito de não ser tratado como coisa e ter o seu status de sujeito de direito reconhecido.

Além disso, defendemos nesse trabalho que os animais têm o direito de satisfazer a suas finalidades, já que possuem valor inerente e não devem servir aos objetivos humanos. Desse modo, devem ser concedidos direitos que garantam que tais animais vivam de acordo com seus próprios fins, ou seja, de acordo com a sua natureza, instinto e intelecto. Logicamente, quanto mais complexo o animal, mais complexos seriam os seus direitos.

Desse modo, os direitos concedidos vão variar de acordo com o animal a ser tutelado. Não temos a pretensão de enumerar exaustivamente todos os direitos que devam ser concedidos aos animais não humanos nesse trabalho, até porque, tal tarefa, neste momento, nos parece impossível, em razão versatilidade inerente à própria condição animal. Contudo, seguindo a linha de raciocínio do estadunidense Thomas Kelch, acreditamos que existem alguns direitos que se aplicam a todos os animais não humanos, indistintamente. Segundo Kelch, existem alguns direitos que podemos chamar “fundamentais” para todos os tipos de animais, quais sejam:

“Proposição. 2.1.a – animais devem ser livres de dor causada por humanos, salvo quando a dor seja causada em benefício do animal.

Proposição 2.1.b – os animais devem ser livres de restrição, salvo quando para a sua proteção.

Proposição 2.1.c – animais devem ser livres da interferência humana em suas condições físicas, incluindo condições de habitat, exigidas para a satisfação do telos do animal.”[66]

Portanto, defendemos que com o reconhecimento da natureza jurídica de sujeito de direito aos animais devem ser garantidos direitos que permitam que os animais não humanos vivam de acordo com seus próprios interesses, pondo fim, de uma vez por todas, à lógica antropocêntrica que utiliza os animais como coisas apropriáveis para alcance dos objetivos humanos.

6 Conclusão

Estas são apenas algumas breves considerações que consideramos necessárias trazer à baila, tendo em vista as atuais discussões doutrinárias sobre o tema do status jurídico dos animais não humanos.

Da análise do tema, revelou-se que a atual classificação dos animais pelo Direito Civil como “coisa” não mais se sustenta no nosso ordenamento jurídico, sendo necessário redefinir os institutos jurídicos de uma maneira não antropocêntrica, com o propósito de reconhecer os interesses dos animais não humanos.

Nesse sentido, faz-se necessário, inclusive, uma modificação das regras do direito, uma vez que a atual classificação adotada pela legislação civil não se coaduna com a Constituição Federal/88 e as necessidades éticas e morais que surgiram na sociedade.

A partir de uma releitura da temática, adotando por base a noção de que os conceitos de sujeito de direito e pessoa não se identificam, sendo o sujeito de direito aquele titular de uma situação jurídica, conclui-se que é imperiosa a construção de um novo status jurídico para os animais afim de garantir o reconhecimento da dignidade animal e da sua proteção jurídica perante um ordenamento jurídico mais justo para todas as espécies.

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Notas:
[1] Artigo apresentado como requisito parcial para obtenção de aprovação na disciplina Fundamentos do Direito Civil à Professora Doutora Roxana Borges, no Curso de Mestrado em Direito Privado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da Universidade Federal da Bahia.

[2] Considerado ainda hoje o pai da filosofia moderna.

[3] De um modo geral, os filósofos da antiguidade desenvolveram a imagem de que o homem era superior ao animal não humano e essa ideia serviu como fundamento para a formação, mais tarde, do pensamento racionalista. Aristóteles afirmava que o animal não humano, como “um escravo na sociedade, tendo como única finalidade servir o homem, é um bem útil para a alimentação, matéria prima, uso diário, vestuário. ” ARISTÓTOLES. A política – Coleção Fundamentos de Filosofia. Icóne, 2007.

[4] DESCARTES, René. Discurso do Método. 2ª Reimpressão. São Paulo: Martin Claret, 2008, p. 21

[5] KUHN, Thomas. As Estruturas das Revoluções Cientificas. Trad. Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 9ª. ed. São Paulo: Pespectiva, 1998, p.29

[6] ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 17 jun. 2015, p. 17/18

[7] Ibid., p.11

[8] KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Disponível em http://www.consciencia.org/kantfundamentacao.shtml. Acesso em: 16 jun. 2015

[9] KANT, op. cit.

[10] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 34

[11] Ibid.

[12] FRANCIONE, Gary L. Introdução aos direitos animais. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 32.

[13] SINGER, Peter. Libertação Animal. Porto Alegre: Lugano, 2008, p.10-11.

[14] WALD, Arnoldo. Direito das Coisas. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p.17.

[15] Observe-se, contudo, que não há consenso doutrinário quanto a diferenciação entre bem e coisa. Maria Helena Diniz defende que a noção de coisa é mais abrangente do que a de bem. Já Orlando Gomes, na linha de entendimento deste trabalho, sustenta que bem é gênero e coisa é espécie. Washington de Barros Monteiro, por sua vez, defende uma sinonímia entre os termos.

[16] MONTERIO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Parte Geral. V.1. 39ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 169.

[17] FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito reais. 5ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 01.

[18] BRASIL. Lei nº 10.406, publicada em 10 de janeiro de 2002. Extraída de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm

[19] MONTERIO, op. cit., p. 87/88.

[20] BRASIL. Lei nº 10.406, publicada em 10 de janeiro de 2002. Extraída de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm

[21] FRANCIONE, op. cit., p. 27.

[22] Ibid., p.31

[23] BEVILÁQUA, Clovis. Teoria Geral do Direito Civil. 3ª.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1980, p.58

[24] GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.142

[25] DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 461

[26] MONTEIRO, op. cit., p. 62.

[27] GONÇALVEZ, Carlos Roberto. “No direito Moderno, pessoa é sinônimo de sujeito de direito ou sujeito da relação jurídica. ” Teoria geral do direito civil. v.2. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999, p. 9

[28] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo: “Personalidade jurídica é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações, ou, em outras palavras, é o atributo necessário para ser sujeito de direito. ” Novo curso de direito civil. 10ª ed. v. 1 São Paulo: Saraiva, 2008, p. 80.

[29] BALKIN, Jack M. Deconstructive Practice and Legal Theory. Disponível em http://www.yale.edu/lawweb/jbalkin/articles/deconstructivepractice.pdf. Acesso em 16 jun. 2015.

[30] Ibid.

[31] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado – Parte geral. 4ª ed. São Paulo: RT, 1979, p.160.

[32] Observe-se, nesse ponto, que de acordo com a teoria da personalidade desenvolvida a partir do século XX, a noção de personalidade jurídica não coincide com a noção de atributo jurídico, já que inerente à condição humana, transcendendo a ideia de capacidade. Segundo Roxana Borges, “a personalidade vem sendo entendida mais como valor jurídico ou como princípio do que como atributo jurídico. ” Ou seja, para os autores mais modernos da teoria da personalidade, esta “significa mais do que a aptidão para desempenhar papéis no mundo do direito. ” (BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de Personalidade e Autonomia Privada. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 10,12 e 13). Contudo, não nos deteremos do tema, já que não é objetivo deste trabalho por dizer respeito a condição do ser humano e de sua dignidade.

[33] MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra, 1983, p. 153

[34] FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 4ª ed. rev e atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 63.

[35] BRASIL. Lei nº 10.406, publicada em 10 de janeiro de 2002. Extraída de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm

[36] MELLO, Marcos Bernardes. Teoria do fato jurídico – Plano de eficácia – 1ª parte. 2ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2004, p.140.

[37] Ressalte-se, mais uma vez, que a moderna teoria da personalidade, rechaça essa ideia, como visto acima. Vide n.r. 33.

[38] BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de Personalidade e Autonomia Privada. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 10

[39] BORGES, op. cit., p 10/11

[40] Em sentido contrário, Caio Mario da Silva, Washington de Barros Monteiro, Marco Aurélio S. Viana, dentre outros. Como não poderia ser diferente, autores que defendem a equiparação entre os conceitos de sujeito de direito e personalidade jurídica não concordam com a atribuição da natureza jurídica de sujeito de direito aos animais não humanos. Por todos, MONTEIRO, Washington de Barros: “existem, sem dúvida, leis de proteção aos irracionais (…). Por meio de seus dispositivos, estão eles a salvo contra atos de crueldade, de destruição, de perseguição ou de extinção. Nem por isso, entretanto, tornam-se sujeitos de direito. Como dizem Ruggiero-Maroi, os animais são tomados em consideração apenas para fins sociais, pela necessidade de se elevar o sentimento humano, evitando-se o espetáculo degradante de perversa brutalidade”. Op. cit., p. 63.

[41] DIAS, Edna Cardozo. A tutela jurídica dos animais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000, p. 120/121

[42] LEVAI, Larte Fernando. Direitos dos Animais. O direito deles e o nosso direito sobre eles. Campos do Jordão: Mantiqueira, 1998, p. 137

[43] GORDILHO, Heron José de S. Abolicionismo Animal. Editora Evolução, p. 112.

[44] PINHO, Ruy Rebello; NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Instituições de direito público e privado: introdução ao estudo do direito e noções de ética profissional. 19ª ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 31.

[45] BENJAMMIN, Antônio Herman. A natureza no direito brasileiro: coisa, sujeito ou nada disso? Caderno Jurídico da Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, ano 1, vol. 1, n° 2, julho/2001. p. 149-172.

[46] BECKERT, Cristina. Direito dos Animais, In Dicionário de Filosofia Moral e Política.

[47] GORDILHO, op. cit., p. 116.

[48]GORDILHO, op. cit., p. 119-120

[49] GORDILHO, op. cit., p. 37.

[50] REGAN, Tom. Jaulas Vazias: encarando o desafio dos direitos animais. Porto Alegre: Lugano, 2006, p. 60

[51] REGAN, op. cit., p. 78

[52] Ibid., p. 65-66

[53] WISE, Steven. Rattling the Cage. Toward Legal Rights for Animals. Massachusetts: Perseus Publishing, 2000, p. 170-268

[54] Ibid., p. 170-268

[55] KUHN, op. cit., p. 160.

[56] Discordamos, contudo, da posição do autor que defende que os interesses jurídicos devem envolver sempre “direta ou indiretamente, homens e mulheres. ” COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. V. 1. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 132.

[57] Ibid., p. 131

[58] Ibid.., p. 132

[59] Importante esclarecer, todavia, que discordamos, ainda, em parte da obra de Ulhoa, no momento que o Autor defende que o sujeito de direito não humano deve ser sempre criado com uma finalidade particular. Isso porque o autor defende que o sujeito não humano é uma criação humana, e sempre surge “com determinado objetivo, isto é, tendo em vista uma finalidade particular. ” Ao contrário, nos filiamos a ideia de que os animais não humanos, assim como os humanos, têm valor inerente, ou seja, são um fim em si mesmos. (COELHO, op. cit., p. 134)

[60] COELHO, op. cit., p. 134.

[61] GORDILHO, op. cit., p. 131

[62] LOURENÇO, Daniel Braga. Direito dos animais: fundamentação e novas perspectivas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris. Ed., 2008, p. 141.

[63] LOURENÇO, op. cit., p. 509.

[64] Nesse sentido, é importante destacar a construção de Hans Kelsen quanto aos conceitos de direitos subjetivos e sujeito de direito. Para o Autor, a relação jurídica não se estabelece entres os sujeitos do dever e do direito, mas através da própria relação entre o dever jurídico e o direito jurídico correspondente. Ou seja, para Kelsen, a relação jurídica se estabelece entre normas, e não entre sujeitos, e, portanto, o direito subjetivo seria, nada mais, do que o reflexo de um dever jurídico. Assim, a partir do momento em que consideramos moralmente os animais, e, em consequência, o nosso dever de respeitá-los e protege-los, podemos dizer que os animais possuem direitos subjetivos, e são, portanto, sujeitos de direito. Apud GORDILHO, Heron José de S. op. cit.

[65] DIAS, Edna Cardoso. Os animais como sujeitos de direito. Disponível em http://jus.com.br/artigos/7667/os-animais-como-sujeitos-de-direito. Acesso em 13 jul. 2015.

[66] KELCH, Thomas. A caminho de um status de não-propriedade para os animais In Revista Brasileira de Direito Animal. Ano 7, Volume 10, Jan – Jun 2012. p. 102


Informações Sobre o Autor

Juliana de Andrade Fauth

Mestranda em Direito das Relações Sociais e Novos Direitos pela Universidade Federal da Bahia especialista em Direito do Estado pela Faculdade Baiana de Direito/JusPodivm especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera Uniderp Bacharela em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Advogada


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