A noção de falsidade benigna e a possibilidade de sua aplicação jurídica: o exemplo da legítima defesa putativa

Resumo: Nos últimos anos, desenvolveram-se na Epistemologia, ao lado dos estudos relacionados aos conceitos de “verdadeiro” e “falso”, estudos sobre o conteúdo das falsidades, notadamente para argumentar sobre a possibilidade de algumas falsidades serem “benignas” ou “úteis”. O presente ensaio realiza uma aproximação entre esse desenvolvimento da Epistemologia e o Direito, na tentativa de aplicação do conceito de “falsidade benigna” à resolução de um caso envolvendo a chamada legítima defesa putativa. Com essa aproximação, busca-se: do ponto de vista do Direito, o acréscimo de um conhecimento usualmente não operado na área; do ponto de vista da Epistemologia, o acréscimo de um possível e curioso exemplo prático de aplicação. *

Palavras-chave: Epistemologia. Direito. “Falsidade benigna”. Legítima defesa putativa.

Abstract: In recent years, it was developed in Epistemology, next to the studies related to the concepts of “true” and “false”, studies on the content of falsehoods, arguing the possibility of some falsehoods being “benign” or “useful”. This essay aims to connect these epistemological developments with the Law, in an attempt to apply the concept of “benign falsehood” to the resolution of a case involving the so-called putative self-defense. With this approach, we seek to: from the Law point of view, to add a knowledge usually not embraced in this field; from the Epistemology point of view, to add an interesting practical example of application.

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Key: Epistemology. Law. “Benign falsehood”. Putative self-defense.

Sumário: Introdução 1. As três condições do conhecimento e sua insuficiência após Edmund Gettier 2. A evolução das condições do conhecimento e a contribuição de Peter Klein sobre o “conteúdo” das falsidades 3. O conteúdo das falsidades em face de um exemplo de legítima defesa putativa Conclusão: conseqüência prática da aplicação

Introdução

Antes de iniciar este trabalho – incorrendo expressa e conscientemente em algo análogo ao “paradoxo do prefácio” – uma mensagem impera: qualquer tentativa de aduzir novum científico à Epistemologia por alguém não versado nesta ciência tenderia, naturalmente, a cair na frustração de um abismo gnosiológico. Isto ocorre, principalmente, em face do vertiginoso crescimento qualitativo desta sophia (σοφία), quase estanque desde a antiguidade clássica, operado no início do século passado com Frege e Russel e, principalmente, a partir dos escritos chamados pós-Gettier, os quais a tornaram bastante inacessível senão para alguns poucos expertos e restrita inclusive para boa parte do público filosófico. Absolutamente, inovação epistemológica não é o mote deste pequeno ensaio.

Todavia, enquanto nossa autocrítica não nos permite a incursão em domínios que para nós recém se começam a descortinar, nossa crítica do Direito permite-nos verificar uma séria de possibilidades de aplicação do trabalho desenvolvido na Epistemologia a alguns de seus institutos. É caso, v.g., do conceito de justificação, da diferenciação entre princípios e regras, do problema do nexo de causalidade, da questão acerca do processo de confiabilidade. E é também o caso da recente contribuição de Peter Klein sobre o conteúdo das falsidades (ou, melhor dito, sobre a possibilidade de falsidades benignas ou úteis[1]) que pretendemos desenvolver num caso daquilo que chamamos, em Direito, “legítima defesa putativa”, o qual acreditamos, aí sim, poder ser aproveitado tanto pelo Direito quanto pela Epistemologia. A contribuição àquele, como se verá, dá-se pela conseqüência prática de se pensar a possibilidade de uma falsidade benigna na resolução de um caso jurídico; a contribuição a esta, se houver, será pela via oblíqua que lhe permite somar um curioso exemplo[2].

2. As três condições do conhecimento e sua insuficiência após Edmund Gettier

No seu famoso e altissonante ensaio de duas páginas intitulado “Is Justified True Belief Knowledge?[3], Edmund Gettier apresentou, em 1963, não apenas uma refutação a uma tese específica de alguns autores dentro da Epistemologia. O que faz de seu ensaio um marco histórico é o fato de que a indagação que deu título ao ensaio, ali apresentada e demonstrada inovadoramente com resposta negativa, endereçou-se à questão mais central de toda Epistemologia, vale dizer, à questão de saber quais são as condições suficientes e necessárias para o conhecimento.

Com efeito, Gettier começa demonstrando uma versão acerca de um certo consenso havido à época sobre as condições necessárias ao conhecimento (um sujeito S saber uma proposição P), referindo as mesmas serem:

(i) P ser verdadeiro;

(ii) S crer que P; e

(iii) S está justificado em crer que P.

Na seqüência, Gettier apresenta ainda duas variações não substanciais, de Roderick Chisholm e A. J. Ayer, acerca deste consenso (a primeira trocando a idéia de “justificação” pela de “adequada evidência” e a segunda a trocando pela idéia de “direito de ter certeza”) para, só então, chegar no núcleo de sua tese: tais condições “não constituem uma condição suficiente para a verdade da proposição S sabe que P”[4].

Gettier evidencia sua afirmação com base em dois exemplos, dos quais descrevemos um, resumidamente, para ilustrar. Suponhamos que duas pessoas, Smith e Jones, estejam postulando um emprego. Smith tem fortes evidências para acreditar que Jones conseguirá a vaga (por exemplo, porque o presidente disse e que Smith que Jones seria o selecionado) e que Jones tem dez moedas no bolso (porque Smith as contou) e, com base nisto, formula a proposição (P): “O homem que conseguirá o emprego tem dez moedas em seu bolso”. Suponhamos, entretanto, que, sem saber, Smith é quem obtém a vaga e que, por coincidência, ele também tem dez moedas no bolso. Ora, neste caso, sendo condições suficientes para o conhecimento as três anteriormente apresentadas, a proposição asserida por Smith deveria ser conhecimento. Isto porque: (i) P é verdadeira; (ii) Smith acreditava em P; (iii) Smith estava justificado em crer que P. Ocorre que não se pode dizer que Smith sabia P, uma vez que ela é verdade em virtude de uma coincidência acerca do fato de que ele, Smith, que acabou conseguindo o emprego em vez de Jones, também tinha dez moedas no bolso. Como a coincidência, evidentemente, não pode valer como conhecimento, as três condições (crença verdadeira justificada) não são suficientes para o conhecimento.

2. A evolução das condições do conhecimento e a contribuição de Peter Klein sobre o “conteúdo” das falsidades

A partir do ensaio de Gettier, os epistemólogos passaram a trabalhar nas condições do conhecimento, em sua maior parte na tentativa de inserir às três anteriores uma quarta condição que abarcasse aqueles que passaram a ser chamados exemplos tipo Gettier, em vista do fato de que, além dos exemplos do próprio Gettier, novos e mais sofisticados exemplos de refutação eram dados a medida em que as formulações sobre a quarta condição eram construídas. Outra tentativa de estabelecer as condições do conhecimento foi a de suprimir a condição de justificação e substituí-la por uma teoria causal do conhecimento.[5]

Nosso objetivo aqui, todavia, não será o de fazer um exame acurado do desenvolvimento dessas formulações diferenciadas de condições e das polêmicas geradas pelos exemplos delas refutadores. Explicitada panoramicamente a polêmica gerada pelo ensaio de Gettier e o desenvolvimento da Epistemologia desde então, nosso escopo aqui é o de apresentar, em linhas gerais, especificamente uma das tentativas de resolução do problema do conhecimento em face das falsidades geradoras de conteúdos proposicionais antes ditos como conhecimento, qual seja o exame, pensado pioneiramente por Peter Klein, do conteúdo das falsidades e, por conseqüência, a possibilidade de existência de falsidades benignas ou úteis[6], falsidades que não importam à geração do conhecimento.

Para desenvolver tal teoria, Peter Klein aproveita uma formulação de Risto Hilpinen no sentido de que a falsidade deveria estar, de alguma forma, “próxima à verdade” (“close to the truth”) e explica da seguinte maneira o fenômeno da falsidade benigna:

A crença de que fb é uma falsidade benigna para S (para adquirir conhecimento) por produzir uma crença doxasticamente justificada que h, se e semente se:

1. fb é falsa

2. A crença que fb é doxasticamente justificada para S

3. A crença que fb é essencial na produção causal da crença que h

4. fb justifica proposionalmente h

5. fb implica uma proposição verdadeira, v

6. v justifica proposionalmente h

7. Tudo que justifica doxasticamente a crença que fb para S também justifica proposicionalmente v para S.[7]

Para melhor entender, eis o exemplo dado pelo próprio Peter Klein, resumido por Jonathan Kvanvig no referido site “Certain Doubts”:

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Você acredita que sua secretária lhe falou na sexta-feira que você tem um compromisso na segunda-feira. Como resultado, você acredita que tem um compromisso na segunda-feira e, como sua secretária é confiável, respeitável, etc., e o que ela lhe falou é verdade, você sabe que tem um compromisso na segunda-feira. Mas ela não lhe contou isto na sexta-feira; ela lhe contou isto na quinta-feira.[8]

No exemplo de Klein, nota-se claramente que a crença de que a secretária falou do compromisso na sexta-feira e não na quinta-feira, como realmente aconteceu, não deixa de possibilitar o conhecimento asserido na proposição: “eu tenho um compromisso na segunda-feira”. Assim, posso considerar, na designação de Klein, que eu possuo aqui uma falsidade benigna, posto que esta não impossibilita a obtenção do meu conhecimento. Esta descoberta mostra-se ainda mais sofisticada do que aquela impulsionada pelos exemplos anteriores tipo-Gettier, posto que, como afirma Cláudio de Almeida: “…o que é mais saliente nos casos de falsidade útil é que, diferentemente do que ocorre com a falsidade tipo Gettier, a evidência para uma falsidade útil não induz em erro.”[9] E segue o autor, na afirmação, adiantando aquilo que pretendemos demonstrar como a tarefa mais difícil no que se refere a esta possibilidade de aplicação jurídica do conceito de falsidade benigna: “O desafio, é claro, é fornecer uma explicação satisfatória da natureza de não-indução-a-erro da evidência nestes casos.[10]

3. O conteúdo das falsidades em face de um exemplo de legítima defesa putativa

Antes de referir o exemplo sobre o qual pretendemos demonstrar a possibilidade de aplicação jurídica acerca deste desenvolvimento de Peter Klein sobre falsidades benignas e malignas na obtenção do conhecimento, cumpre fornecer, brevemente, alguns acordos semânticos sobre termos jurídicos necessários à compreensão do exemplo.

Em Direito, usa-se o termo “putativo” para designar a prática de um determinado ato jurídico que se acredita ocorrer, em virtude de sua aparência, sob uma determinada circunstância mas que, de fato, não ocorreu ou ocorreu de maneira diferente, podendo, com isto, ser modificada a situação jurídica anteriormente pensada. A legítima defesa, ato jurídico que aqui traremos como exemplo, ocorre quando alguém repele uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Neste sentido, como antes explicado, a legítima defesa putativa ocorrerá quando alguém, acreditando estar na iminência de ser agredido, repele esta suposta agressão contra aquele que acreditava ser o seu agressor, muito embora, de fato, não o fosse[11]. Eis o seguinte exemplo clássico: um sujeito S é desafeto de um sujeito S’. Ao cruzarem pela rua S’ coloca a mão no bolso. Neste momento S, acreditando que S’ sacará uma arma para lhe matar (P), retira uma arma que portava rapidamente e puxa o gatilho na direção de S’, matando-o. No entanto, S’ estava tirando de seu bolso sua carteira.

Transportando para a Epistemologia, mais especificamente para as condições demonstradas para o conhecimento até Gettier, poderíamos dizer que: (ii) S crê que P (que S’ sacará uma arma para lhe matar) e (iii) S está justificado em crer que P (em face de serem ambos desafetos e, por exemplo, em face de S’ ser, reconhecidamente, uma pessoa violenta). Todavia, S carece da primeira condição apontada para a obtenção do conhecimento, posto que P não é verdadeiro (vale dizer, S’ não iria matar S). Neste caso, sem maior complexidade, pode-se dizer que S não estava em legítima defesa própria, mas putativa. Em outras palavras, sua defesa baseava-se numa crença falsa cujo conteúdo importava ao conhecimento da situação. A falsidade sobre circunstância que conduzia a P, usando a distinção de Klein, não era do tipo benigna.

Problematizemos, porém, o exemplo. Suponhamos que o empirista escocês David Hume (H), invejando de modo patológico as publicações de um acadêmico já consagrado chamado Immanuel Kant (K) resolve ir à Prússia, em 1776, para matá-lo. Apesar de H não conhecer K, ele fora informado pelos habitantes da cidade de Königsberg, onde K morava, que K saía de casa diariamente, com rigorosa pontualidade, às 17hs30min para fazer seu passeio vespertino[12]. Ciente disso, H, no dia planejado, dirige-se com arma em punho ao endereço de K para matá-lo em frente a sua casa. Ocorre que K, no dia anterior, recebera uma denúncia, assinada pelo confiável filósofo Adam Smith (S), um pretenso amigo de H, avisando que no outro dia H iria matá-lo quando K saísse de casa em seu passeio vespertino. S esquecera-se de avisar a K, porém, que H não sabia nada sobre a descrição física de K, motivo pelo qual não poderia matá-lo senão em frente a sua casa. Precavido, para se proteger de H e para o despistar, K sai de casa com uma arma[13] dez minutos antes do que costumava. E, pouco depois de sair de casa, ainda em sua rua, K enxerga um sujeito com fisionomia escocesa e com arma em punho e, acreditando que este iria matá-lo (P), K desfere dois tiros em H, matando-o[14].

Praticando o mesmo exercício efetuado no exemplo anterior de verificar as condições do conhecimento, teremos: (ii) K crê que P (H iria matá-lo) e (iii) K está justificado em crer que P (em face da informação, confiável, de S). Porém, diferente do exemplo anterior, (i) P era verdadeiro. A falsidade, aqui, existe, mas não está na proposição P (H iria matá-lo). Está na crença de K – baseada no fato de que S não referiu que H não conhecia K – de que H mataria-o naquele momento.

No exemplo da secretária, de Peter Klein, o fato de que a secretária me avisou na quinta-feira do meu compromisso na segunda-feira, embora acreditasse que ela havia avisado na sexta-feira do meu compromisso na segunda-feira, não afeta a verdade da proposição “tenho um compromisso na segunda-feira”. Da mesma forma, no exemplo aqui trazido, o fato de que S não referiu que H não conhecia K, e que por isto K acreditou que H atiraria nele naquele momento, não afeta a verdade da proposição “H iria matá-lo”. Note-se que, acrescentando a P o advérbio de tempo “naquele momento” (ficando “H iria matá-lo naquele momento”), a proposição será falsa; sem o advérbio, como ela aparece no problema (“H iria matá-lo”), ela é verdadeira. O que era falso era o fato de que H iria matá-lo naquele momento. Neste caso, haverá a necessidade de se fazer um juízo sobre o conteúdo da falsidade que levou a verdade de P (K pensar que H mataria-o naquele momento), se benigna ou maligna.

Conclusão: conseqüência prática da aplicação

E aqui se mostra a importância da distinção de falsidade benigna e maligna bem como a própria possibilidade de aplicação jurídica desta distinção. Isto porque, entendendo falsidade benigna como a falsidade que não importa à geração do conhecimento, no exemplo dado, devo considerar a falsidade (“H iria matá-lo naquele momento”) como uma falsidade benigna, que não importa à verdade e obtenção da proposição (“H iria matá-lo”). Apenas isto não iria acontecer naquele momento. Para a Epistemologia, usando a distinção de Klein, uma vez K estando baseado numa crença falsa cujo conteúdo não importa ao conhecimento da situação, a falsidade deve ser considerada do tipo benigna. Eis a conseqüência jurídica: K teria agido em legítima defesa. Todavia, se considero que a falsidade da proposição “H iria matá-lo naquele momento” importa à verdade da proposição final “H iria matá-lo”, então minha falsidade, neste caso, para a Epistemologia, será do tipo maligna – ou não útil. E dela decorrerá uma diferente conseqüência jurídica: K teria agido em legítima defesa putativa.

E, por fim, o requinte desta diferenciação, traduzida numa mudança efetiva de conseqüência para K, seja na órbita do direito penal, seja na órbita do direito civil: se considerada a atitude de K baseada em falsidade benigna, ou seja, estando em legítima defesa própria, é excluída a antijuridicidade de sua conduta e ele não responderá nem a título de responsabilidade civil, nem a título de responsabilidade penal; se considerada a atitude de K baseada em falsidade maligna, ou seja, estando em legítima defesa putativa, sua conduta será antijurídica (embora não culpável)[15] e, portanto, K responderá por danos de natureza civil e poderá responder penalmente por homicídio culposo, se previsto no ordenamento e cominada pena na forma culposa[16].

A despeito do humor no exemplo, tentou-se demonstrar, com este ensaio, uma possibilidade de aplicação jurídica-prática da distinção fornecida pela Epistemologia quanto ao conteúdo das falsidades. O propósito, aqui, foi o de propor uma reflexão sobre a possibilidade de um incipiente casamento entre a Epistemologia e o Direito, nunca o de dar uma resposta jurídica a um caso talvez aproveitável pela Epistemologia. Ao revés, se bem sucedido o presente ensaio, ele poderá demonstrar como a Epistemologia pode dar valorosas respostas e contribuições ao Direito.

 

Refereências
ALMEIDA, Cláudio de. “Knowledge and Benign Falsehoods”, in Anais do Second Principia International Symposium, Florianópolis – 6 a 10 de agosto de 2001. http://www.cfh.ufsc.br/~nel/resumo.htm.
ALMEIDA, Cláudio de. “On Useful Falsehoods”. In: “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/).
COSTA, Cláudio. Filosofia da Linguagem. Coleção Filosofia Passo-a-Passo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003, p. 26-27.
FOLEY, Richard. A Trial Separation between the Theory of Knowledge and Theory of Justified Belief. In: Ernest Sosa and his critics. John Greco (edited by). Oxford: Blackwell, 2004.
GETTIER, Edmund. Is Justified True Belief Knowledge? In: Epistemology: An Anthology. Ernest Sosa and Jaegwon Kim (edited by). Oxford: Blackwell, 2000.
KVANVIG, Jonathan. “Klein on Useful Falsehoods”. In: “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/).
KVANVIG, Jonathan. “The Significance of Useful Falsehoods”. In: “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/).
LYRA, Roberto e HUNGRIA, Nelson. Compêndio de Direito Penal. Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1938.
MORRIS, Clarence (org.) Os Grandes Filósofos do Direito. Leituras escolhidas em direito. Tradução de Reinaldo Guarany. Revisão da Tradução de Silvana Vieira e Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
WELZEL, Hans. Derecho Penal. Parte General. Buenos Aires: Roque Depalma Editor, 1956.
 
 
Notas:
* Texto apresentado em 08/10/2005, em seminário da disciplina “Conhecimento e Linguagem II: Conhecimento e Virtude Intelectual”, ministrada pelo Prof. Dr. Cláudio de Almeida no PPG em Filosofia da PUCRS, válida como disciplina conexa ao Mestrado em Direito da PUCRS.

[1] A questão sobre a possibilidade de falsidades benignas, inserida por Klein, apesar de ainda não publicada em artigo, ganhou espaço em discussão no site “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/), especialmente com as reflexões de Jonathan Kvanvig, em “Klein on Useful Falsehoods” e “The Significance of Useful Falsehoods”, e Cláudio de Almeida, em “On Useful Falsehoods”. Ainda, esta discussão foi apresentada por Cláudio de Almeida no trabalho “Knowledge and Benign Falsehoods”, in Anais do Second Principia International Symposium, Florianópolis – 6 a 10 de agosto de 2001. http://www.cfh.ufsc.br/~nel/resumo.htm.

[2] É de ser lembrado, por interessante, uma relação episódica histórica ocorrida entre um exemplo jurídico e a filosofia da linguagem. Diz-se que Wittgenstein teria sido levado à descoberta da “teoria pictorial da frase”, explicativa da conexão entre linguagem e mundo com base nas figurações (Bilder) da realidade feitas por frases declarativas, em 1914, ao ver em uma revista a maneira como um acidente de trânsito foi apresentado a uma Corte de Justiça, primeiro por um modelo em miniatura e, depois, por frases. Cf. COSTA, Cláudio. Filosofia da Linguagem. Coleção Filosofia Passo-a-Passo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003, p. 26-27.

[3] O ensaio, originalmente publicado in Analysis (1963), pp. 121-123, é aqui citado na coleção editada por Ernst Sosa e Jaegwon Kim com a seguinte referência: GETTIER, Edmund. Is Justified True Belief Knowledge? In: Epistemology: An Anthology. Ernest Sosa and Jaegwon Kim (edited by). Oxford: Blackwell, 2000.

[4] “…do not constitute a sufficient condition for the truth of the proposition that S knows that P.” GETTIER, p. 58.

[5] Alguns trechos de artigo de Richard Foley, a fim de ilustrar de maneira mais explicativa, bem sintetizam esta evolução: “Gettier’s article inspired numerous other counterexamples, and the search was on for a fourth condition of knowledge, one that could be added to justification, truth, and belief to produce an adequate analysis of knowledge. (…) However, a secondary and very different kind of response to Gettier’s counterexamples was to wonder whether something less explicitly intellectual than justification, traditionally understood, is better suited for understanding knowledge. (…) D. M. Armstrong and Alvin Goldman were among the earliest proponents of a causal theory of knowledge, which requires, in place of justification, that there be an appropriate causal connection between the fact that makes a belief true and the person’s having that belief.” FOLEY, Richard. A Trial Separation between the Theory of Knowledge and Theory of Justified Belief. In: Ernest Sosa and his critics. John Greco (edited by). Oxford: Blackwell, 2004, p. 59.

[6] Peter Klein, em 1999, usou o termo “benigna” para designar este tipo de falsidade. Posteriormente, em 2004, em face de algumas refutações efetuadas por Cláudio de Almeida, ele passou a utilizar o termo “útil” para tais falsidades. O significado, contudo, não difere em razão do termo empregado, de modo que preferiremos utilizar, por acreditar mais adequado ao desenvolvimento deste trabalho, a designação “falsidade benigna”.

[7] Aproximação extraída do site “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/), nos posts de Jonathan Kvanvig (“Klein on Useful Falsehoods”) e de Cláudio de Almeida (“On Useful Falsehoods”): “The belief that uf is a useful falsehood to S (for acquiring knowledge) by producing a doxastically justified belief that h iff: 1. uf is false; 2. The belief that uf is doxastically justified for S; 3. The belief that uf is essential in the causal production of the belief that h; 4. uf propositionally justifies h; 5. uf entails a true proposition, t; 6. t propositionally justifies h; 7. Whatever doxastically justifies the belief that uf for S also propositionally justifies t for S.”

[8] “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/), no post de Jonathan Kvanvig em “Klein on Useful Falsehoods”: “You believe that your secretary told you on Friday that you have an appointment on Monday. As a result, you believe that you have an appointment on Monday, and since your secretary is reliable, trustworthy, etc., and what she told you is true, you know that you have an appointment on Monday. But she didn’t tell you this on Friday; she told it to you on Thursday.”

[9] “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/), no posts de Cláudio de Almeida em “On Useful Falsehoods”: “…what is most salient in useful falsehood cases is that, unlike what happens with a Gettier-type falsehood, the evidence for a useful falsehood is not misleading.”

[10] “Certain Doubts” (www.missouri.edu/~kvanvigj/certain_doubts/), no post de Cláudio de Almeida em “On Useful Falsehoods”: “The challenge, of course, is to provide a satisfactory explanation of the non-misleading nature of the evidence in those cases.”

[11] “Occorre a chamada legitima defesa putativa quando o agente reage, por julgar-se, embora erroneamente, na emergencia de uma aggressão injusta e inevitavel. A aggressão é méra illusão do agente de bôa fé, ou, juridicamente, um erro de facto essencial.” (sic) LYRA, Roberto e HUNGRIA, Nelson. Compêndio de Direito Penal. Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1938, p. 623.

[12] Para deixar nosso exemplo um pouco mais interessante, além da confirmação biográfica desses dados de Immanuel Kant (cf., v.g.: MORRIS, Clarence (org.) Os Grandes Filósofos do Direito. Leituras escolhidas em direito. Tradução de Reinaldo Guarany. Revisão da Tradução de Silvana Vieira e Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 236) poderia ser dito que há poucas evidências de que a morte de David Hume, em 1776, tenha acontecido efetivamente por causa de um tumor no intestino como aponta a escassa biografia que refere este fato.

[13] Lembrando, aqui, que seu escrito sobre a Paz Perpétua, publicado em 1795, ainda não havia sido escrito.

[14] Por certo sem pensar, aqui, se aquela conduta era ou não universalizável.

[15] “Si el autor supone erróneamente una situación de legítima defensa, el hecho es antijurídico, pero, a consecuencia del error sobre la antijuridicidad, queda excluída la culpa.” WELZEL, Hans. Derecho Penal. Parte General. Buenos Aires: Roque Depalma Editor, 1956, p. 95.

[16] No Brasil, por exemplo, esta pena poderia ser de 1 (um) a 3 (três) anos, conforme o art. 121 § 3º do Código Penal. Já a possibilidade de responsabilização penal na forma culposa na presença de descriminante putativa encontra-se no art. 20 deste mesmo Código, que dispõe: “Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. § 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.”


Informações Sobre o Autor

Mártin Haeberlin

Doutor em Direito (PUCRS/Universidade de Heidelberg, 2014). Mestre em Direito (PUCRS, 2007). Pesquisador Visitante do Instituto Max-Planck, em Heidelberg (2013). Professor de Teoria Geral do Direito e de Direito Administrativo (Laureate/UniRitter). Advogado


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
logo Âmbito Jurídico