A nova competência da Justiça Do Trabalho

O Direito do Trabalho tem como objeto o trabalho, buscando de que maneira ele se manifesta e como é regulado. Existindo um conflito no que tange as mais diversas relações de trabalho quando manifestadas, existe a Justiça do Trabalho que tem como competência conciliar e julgar essas lides.

Até dezembro de 2004 a Justiça do Trabalho apenas tinha como competência julgar e processar lides oriundas da relação de emprego e não oriundas da relação de trabalho. Apesar de estarem associadas, toda relação de emprego é relação de trabalho, mas nem toda relação de trabalho é relação de emprego.

Eis aí a essência do Texto Constitucional de 1988 em seu artigo 114:

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Art.114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.

§ 1º – Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.

§ 2º – Recusando-se qualquer das partes à negociação ou à arbitragem, é facultado aos respectivos sindicatos ajuizar dissídios coletivos, podendo a Justiça do Trabalho estabelecer normas e condições, respeitadas as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho.

A Justiça do Trabalho não estava acompanhando as mudanças no mercado, deixando novas formas de prestação de serviço sem proteção jurisdicional, necessitando de uma reforma no Poder Judiciário através de uma Emenda Constitucional que já vinha sendo tramitada no Congresso Nacional.

Após anos de tramitação perante o Congresso Nacional, em 08 de dezembro de 2004 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 45/2004.

A referida Emenda trata-se de uma reforma no Poder Judiciário que provocou uma profunda alteração no Texto Constitucional.

O propósito da Emenda nº 45 foi de criar mecanismos que possibilitem o direcionamento de alguns processos a uma justiça especializada, mais habituada a solucionar os conflitos relativos ao trabalho.

Não mais compete a Justiça do Trabalho processar e julgar conflitos entre empregado e empregador, mas sim, de julgar e processar conflitos oriundos da relação de trabalho, sendo assim mais abrangente e genérica. Contudo o legislador não definiu o que seja relação de trabalho, o que certamente causará muitos debates,para concluir qual seria o alcance da relação de trabalho que quis atingir.

Destarte, não vemos muitas possibilidades de fugir a regra de que a relação de trabalho compreende o oferecimento da capacidade de trabalho em proveito de outrem. Assim, teremos a existência de direitos e obrigações, para quem trabalha e para quem remunera o trabalho tomado.

Mas para que essa relação de trabalho seja consolidada terão sempre que ser observadas as características fáticas do contrato de trabalho, onde o negócio jurídico é um contrato ‘’stricto sensu’’ em que uma pessoa física se obriga, mediante pagamento de uma contraprestação, a prestar trabalho não eventual em proveito de outra pessoa, física ou jurídica, a quem fica juridicamente subordinado.

A Emenda Constitucional n° 45/2004, por sua vez, ampliou substancialmente a competência da Justiça do Trabalho. Senão vejamos o teor da nova redação conferida ao mencionado artigo 114:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II – as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V – os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI – as ações de indenização por dano morais ou patrimoniais, decorrentes da relação de trabalho;

VII – as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII – a execução de ofício das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

§ 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.

§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.

§ 3º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídios coletivos, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.

Não é simplesmente a Justiça do emprego, da CLT ou dos desempregados. Faz jus, agora na plenitude, à denominação que carrega desde a sua instituição pela Carta de 1934 – de início com natureza administrativa – para dirimir então questões entre empregadores e empregados.

Passou a ser, agora sim de fato e de direito, verdadeiramente a Justiça do Trabalho, considerado o vocábulo que a qualifica -Trabalho – na sua mais ampla acepção.

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Além do propósito da possibilidade de direcionar lides a justiça especializada em relação de trabalho, a emenda visa também proporcionar ao trabalhador e ao tomador de serviços um autentico e verdadeiro acesso à Justiça, antes reprimida pelo fato do desestimulo ao ingresso em juízo daqueles que se encontravam envolvidos nesse tipo de problemas, devido a morosidade, formalidade e onerosidade da Justiça Comum, na qual era competente antes da Emenda nº 45.

Sem parecer contraditório, porém, as ações oriundas da relação de trabalho, quando envolver relação jurídica de direito material estatutária, não estão, ainda, na competência da Justiça do Trabalho.

Os servidores estatutários submetem-se a um estatuto, fixado em lei, para cada uma das unidades da federação. Assim, os novos servidores, ao serem investidos no cargo, já ingressam numa situação jurídica previamente delineada, não podendo modificá-la, mesmo com a anuência da Administração, vez que o estatuto é lei, portanto, normas públicas, cogentes, inderrogável pelas partes.

Portanto, os servidores públicos estatutários deveriam solucionar seus conflitos com a Administração Pública na Justiça Comum, uma vez que não estavam regidos por uma relação empregatícia, nos moldes em que dispõe a Consolidação das Leis do Trabalho.

Como os estatutários estão diretamente ligados a Administração Pública não se equipara ao empregador privado quando a Administração estabelece uma relação estatutária com os seus servidores.

Todavia, com a recente publicação da Emenda Constitucional nº 45/04, alguns autores e estudiosos do tema passaram a considerar que os conflitos decorrentes da índole institucional dos servidores públicos estatutários incluir-se-iam no rol de competência da Justiça do Trabalho.

Vale salientar que o texto aprovado no Senado continha ressalva de exclusão dos servidores estatutários, constante da promulgação, que foi suprimida quando da publicação da Emenda Constitucional.

O fato é que, por força da liminar proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395-6, pelo Ministro Nelson Jobim, restabeleceu-se o quanto pactuado durante a tramitação do projeto de Emenda Constitucional, sem prejuízo do nosso posicionamento pessoal de que é muito mais lógico que tais conflitos também esteja submetidos à Justiça do Trabalho.

Conclui-se portanto, que ao ampliar a competência da Justiça do Trabalho, a Emenda Constitucional nº 45/04 buscou dirigir questões que necessitassem de julgamento por uma justiça mais especializada no caso das demandas relativas à relação de trabalho.

Todavia, para aqueles mais conservadores, tal modificação não teria vindo em benefício da sociedade, pois influenciaria negativamente na celeridade processual, tão prestigiada no processo trabalhista, uma vez que a ampliação da atuação jurisdicional impediria que os magistrados pudessem se dedicar da mesma forma de outrora à solução das lides.

Pelo exposto vê-se que a Justiça do Trabalho não é mais simplesmente a Justiça do empregado, e sim a de qualquer forma de trabalhador

A sua competência fora consideravelmente ampliada, entretanto, como o conceito de “relação de trabalho” é vago, dúvidas já surgem e só com o tempo os Tribunais pacificarão o entendimento dos limites da abrangência deste conceito. Já há opiniões conflitantes no âmbito do STJ e de Ministros do TST, o que evidencia que só haverá pacificação quando o STF emitir juízo de valor quanto ao alcance do conceito de “relação de trabalho”.

Embora de fato o fluxo de demandas e o grau de complexidade aumentaram consideravelmente, a Justiça do Trabalho mostrou-se devidamente preparada para acolher sua nova competência, prestando uma tutela jurisdicional mais efetiva, haja vista que sempre fora, das Justiças, a mais célere.

Em conclusão, pela nova redação do texto constitucional, pensamos que a Justiça do Trabalho não pode mais ser vista como aquele órgão que dirimia apenas conflitos entre partes desiguais, sempre “equilibrando” a balança desequilibrada, haja vista que haverá relações de trabalho em que o trabalhador não pode ser visto como hipossuficiente, estando em total igualdade com o tomador de serviços, como é o caso do Advogado que presta assessoria a empresa e esta, não pagando seus honorários, faz aquele demandar cobrando os valores pactuados e inadimplidos. Caberá aos julgadores, usando da razoabilidade, aplicar os princípios que “equilibram” a balança e sempre nortearam a Justiça do Trabalho quando de fato houver desequilíbrio e desigualdade na relação de trabalho.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Ana Claudia Chianca Rodrigues Braga

 

Estudante de Direito

 


 

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