A participação de crianças e adolescentes na mediação familiar

Resumo: O século XXI é marcado pela restruturação da família e pela participação das mulheres no mercado de trabalho, ocasionando, assim, uma mudança nos valores sociais e familiares. No entanto, essas mudanças são também responsáveis por novas espécies de conflitos, como por exemplo o divórcio. Acontece que muitas vezes há uma necessidade de mesmo após o divórcio que os litigantes continuem a ter um relacionamento amigável, seja para velar pelos interesses dos filhos, ou razão diversa. Nesses casos, é indicado que as partes solucionem seu conflito através da mediação de Conflitos. Porém, nos casos em que os mediandos têm filhos, há uma discussão acerca da participação ou não dessas crianças na mediação. Dessa forma, este­ estudo buscou analisar a opinião de diversos mediadores e doutrinadores acerca do tema, tratando sobre a inserção ou não dos jovens na mediação, quando ela deve ser feita e quando ela é contraindicada. Acredita-se que a participação dos filhos na mediação familiar, nos assuntos pertinentes a eles podem ser benéficas para a mediação e para a relação familiar ou prejudiciais, dependendo de como ela é feita. Em sendo assim, destacando mais uma vez a importância do mediador no processo, devendo ele se capaz e capacitado.

Palavras-chave: Mediação. Família. Mediação Familiar. Participação das crianças na Mediação Familiar.

Abstract: The XXI century is marked by the restructuring of the family and the participation of women in the labor market, causing thus a change in social and family values. However, these changes are responsible also for new kinds of conflicts, such as divorce. It turns out that there is often a need for even after the divorce litigants continue to have a friendly relationship, either to ensure the interests of children or another reason. In such cases, it is indicated that the parties resolve their conflict through conflict mediation. However, when the parties have children, there is a discussion about the participation or not of these children in mediation. Thus, this study aimed to analyze the opinion of many mediators and scholars on the subject, trying on the inclusion or not of young people in mediation when it should be done and when it is contraindicated. It is believed that the participation of children in family mediation, in the issues relevant to them can be beneficial to mediation and the family relationships or harmful, depending on how it is made. That being so, highlighting once again the importance of the mediator in the process, should he be able and capable.

Sumário: Introdução. 1. Mediação de Conflitos. 2. O que é? 2.1. Características. 2.2. A Voluntariedade. 2.2.1. Respeito e cordialidade. 2.2.2.  Confidencialidade. 2.2.3. Informalidade. 2.2.4. Celeridade. 2.2.5. Baixo Custo. 2.2.5. Terceiro Imparcial. 2.2.7. Mediação x Conciliação. 2.3. Quando deve ser usada a mediação. 2.4. Mediação Familiar. 3. Conceito. 3.1. Principais características de Mediação Familiar. 3.2. Tipos de Mediação Familiares. 3.3. Processo. 3.4. Mediação de Conflitos Familiares com Filhos. 3.5. Desafios. 3.6. Participação de Crianças e Adolescentes na Mediação Familiar. 4. Desvantagens. 4.1. Vantagens. 4.2. Conclusão. 5.

1. INTRODUÇÃO

O conflito entre as pessoas existem desde que o homem passou a conviver com o outro homem, pois são dois mundos, duas cabeças e, consequentemente, pensarão de formas diferentes e discordar, dando início a um conflito, geralmente solucionado por meio da violência, seja ela física ou verbal.

Com o passar do tempo e a organização da sociedade de forma civilizada, surgiu a figura de uma terceira pessoa apta a apontar uma solução, como hoje temos o juiz.

Porém, com a grande demanda para o Judiciário, tornando-o moroso, além de bastante oneroso e, muitas vezes não apresentar uma solução que deixe as partes realmente satisfeitas, foi ganhando força a figura da mediação, como forma alternativa à resolução de conflitos, tendo em vista que esta tem um processo mais célere, mais desburocratizado, sendo voluntário, menos oneroso e ainda mais satisfatório para as partes, posto que estas acordam da forma que melhor lhes convém.

A mediação pode ser usada em diversas áreas do relacionamento humano como, a trabalhista, a familiar, a empresarial, dentre outras.

Nesse sentido, o presente trabalho trata da mediação familiar, especificamente da participação de crianças e adolescentes. Esse tema foi escolhido em razão da crescente onda de uso da mediação como forma alternativa de resolução de conflitos, principalmente no âmbito familiar, em razão do solo tão instável que permeia as relações familiares e da necessidade de manter ou reestabelecer os laços afetivos, muitas vezes abalados em razão de separações e disputas por guarda das crianças.

O objetivo desse estudo é avaliar a necessidade e prudência da participação das crianças na mediação familiar, quando tratar de divórcio. Nesse sentido, o presente trabalho realça o papel do mediador que precisa avaliar se os pais estão agindo com respeito e boa-fé para com o outro e se estão zelando pelos direitos de seus filhos. Além disso, deve-se estar atento para ver como está o diálogo entre as partes e destas com a criança, se esta tem interesse em participar do processo de mediação.

2. Mediação de Conflitos

2.1. O que é?

A mediação de conflitos é uma forma alternativa de solução de conflitos. Ela permite que duas partes com pontos de vistas diversos, com auxílio de um terceiro neutro e imparcial cheguem a um acordo. Em outras palavras, o mediador de conflitos é a ponte que liga duas pessoas com pontos de vistas diferentes.

Para o Professor Jean Carlos Lima a mediação ocorre quando:

“Duas ou mais pessoas que estão envolvidas em uma disputa, recorrem a uma terceira pessoa, qualificada profissionalmente, neutra e imparcial, para orientá-los a chegaram, voluntariamente, igualmente e sozinhos a um entendimento. Este entendimento denomina-se resolução do conflito ou acordo, no qual elas, as pessoas que estão vivendo o conflito, tem total controle sobre o processo para por fim a disputa”.[1]

2.2. Características

Para que a mediação de conflitos possa fluir e atingir o seu fim, qual seja de encontrar uma solução de forma pacífica para uma controvérsia, é necessário que ela possua algumas regras e características que devem ser respeitadas, são elas:

2.2.1. A Voluntariedade

A primeira e talvez a mais importante característica da mediação de conflitos é a voluntariedade, ou seja, as partes, de comum acordo, decidem buscar uma solução para o seu conflito através da mediação e portanto podem dela desistir a qualquer momento.

Os mediandos (assim são chamados aqueles que se submetem ao processo de mediação), não são obrigados a continuar na mediação, nem mesmo são obrigados a chegar a um acordo.

Uma vez instaurado o processo de mediação, caso alguma das partes não se sinta mais confortável ou por qualquer outro motivo não queira mais levar adiante a mediação ela pode desistir sem qualquer prejuízo ao seu direito, podendo, inclusive pleitear em juízo o seu direito.

2.2.2. Respeito e cordialidade

É primordial para o fiel seguimento do processo de mediação que as partes estejam dispostas a tentar chegar a um acordo (elas não são obrigadas a chegar a um acordo, mas para que participem da mediação é preciso que os envolvidos estejam pelo menos dispostos a chegar a um acordo) e portanto, os mediandos devem tratar um ao outro e ao mediador com respeito e cordialidade.

2.2.3. Confidencialidade

O processo de mediação é confidencial, ou seja, tudo que for abordado na mediação não pode ser usado em eventual processo judicial como prova ou confissão. Além disso, o mediador não pode atuar como testemunha ou perito para qualquer uma das partes.

No entanto, existem algumas exceções como nos casos em que houver violência por parte de algum dos mediandos ou nos casos em que os mediandos, de comum acordo, autorizem.

Vale lembrar também que no CAUCUS, tudo que for abordado entre o mediando e o mediador só será comunicado ao outro mediando se o primeiro assim dispuser.

2.2.4. Informalidade

A mediação, diferentemente do processo judicial, é informal, simples, no qual é valorizado a oralidade. Vale ainda mencionar, que não necessita da presença de advogados, as partes tentam resolver o conflito entre elas com auxílio apenas de um terceiro neutro e imparcial.

2.2.5. Celeridade

Ao contrário do processo judicial, a mediação de conflitos é muito célere. Uma demanda que demoraria 4 (quatro) ou 5 (cinco) anos para resolver no judiciário pode ser resolvida em apenas 3 (três) ou 4 (quatro) meses.

2.2.6. Baixo Custo

Outro ponto bastante atrativo na mediação é o baixo custo, pois não há necessidade de contratar advogados, produzir provas, nem do pagamento de honorários sucumbenciais.

2.2.7. Terceiro Imparcial

Na mediação, diferentemente do processo judicial, as partes escolhem um terceiro neutro e imparcial que irá auxiliá-los a alcançar um acordo. Esse terceiro pode ser qualquer pessoa de confiança das partes, capaz e capacitada, não necessita de nenhum curso ou formação.

2.3. Mediação x Conciliação

Um erro muito comum é o de confundir a mediação com a conciliação. Embora os dois possam ser muito parecidos, não devem ser confundidos pelas seguintes razões.

Embora ambos os institutos contem com a presença de um terceiro imparcial, a diferença remonta no fato que na mediação, o mediador além de ser imparcial ele também deve ser neutro. Em outras palavras, o mediador ser imparcial que dizer que ele tem que ser equidistante, ou seja, não pode favorecer nenhuma das partes, além disso ele deve ser neutro, ou seja, não pode em momento algum expressar seu ponto de vista ou dar sugestões de como o conflito deve ser resolvido.

Já na conciliação, o conciliador deve ser imparcial, porém, ele não precisa ser neutro, em sendo assim, o conciliador pode tomar uma posição mais ativa e sugerir como deve ser resolvido o conflito.

2.4. Quando deve ser usada a mediação

Há controvérsias a respeito de quando a mediação deve ser utilizada. Há quem diga que ela pode ser aplicada em qualquer situação e outros defendem que existem situações em que o conflito não pode ser resolvido pela mediação, devendo então ser submetido a apreciação do judiciário.

A doutrina dominante é a de que a mediação deve ser aplicada quando existia alguma relação entre as partes antes do conflito, e onde ainda subsiste a vontade de que a relação permaneça após sanada a causa do problema.

No entanto, a mediação é contraindicada nos seguintes casos:

I – quando uma das partes se mostrar resistente a mediação;

II – quando houver histórico de violência entre as partes;

III – quando se verificar a vontade de uma das partes em impor o seu desejo a outra;

IV – quando a mediação não for voluntária.

3. Mediação Familiar

3.1. Conceito

O conceito de família e aquilo que ela representa não é mais o mesmo de 50 anos atrás. Antigamente, o homem possuía o papel de provedor da família, enquanto a mulher era responsável por cuidar da casa e dos filhos. Acontece que junto com a industrialização e a globalização, adveio também uma mudança no papel da mulher dentro da família, que deixou de ser apenas a dona de casa e partiu para o mercado de trabalho.

Além disso, vale ressaltar que houve também uma mudança nos valores da sociedade, tendo em vista que há um tempo atrás, se uma mulher se divorciasse ela seria recriminada socialmente, o que não acontece mais atualmente, pois o divórcio é tido como algo comum.

Em sendo assim, é possível perceber um aumento nos casos de divórcio e muitos desses são litigiosos.

No entanto, grande parte desses casais que passam pelo processo de divórcio ou acabam se separando por pequenos motivos, por terem filhos precisam dar continuidade a uma relação amigável para o bem-estar das crianças.

Nessas situações, ao submeterem a lide a apreciação do Judiciário, haverá um custo muito grande para as partes, e não está se falando somente em relação ao valor econômico, mas também ao custo emocional e da própria relação.

Em sendo assim, deve ser encorajada a mediação nesses casos, para que as partes possam resolver o seu problema de forma que beneficie aos dois, e minimizando o dano causado pela separação, não só o dano ao casal, mas também para os filhos. Vale ainda mencionar que a mediação familiar permite que haja um relacionamento amigável entre os indivíduos, favorecendo a todas as pessoas envolvidas.

3.2. Principais características de Mediação Familiar

Na visão de Parkinson[2] os princípios delimitadores da mediação familiar são:

· Participação voluntária das partes;

· Neutralidade e imparcialidade do mediador;

· A revelação de qualquer conflito de interesses por parte do mediador;

·  A capacitação das partes para alcançar as suas próprias decisões;

·  O respeito pelas pessoas e pela diversidade cultural;

· A segurança pessoal e proteção face ao risco;

· A confidencialidade

· O enfoque no futuro;

·  A ênfase nos interesses mútuos mais que nos direitos individuais;

·  Atenção às necessidades de toda a família, especialmente das crinças;

·  A competência do mediador.

É possível perceber que muitos desses princípios coincidem com os princípios gerais da mediação de conflitos, acrescentando apenas alguns.

3.3. Tipos de Mediação Familiares

Segundo a magistrada Paula Lucas Rios a mediação poderá ser de dois tipos: global ou parcial, consoante aborde para além da problemática da regulação do exercício do poder paternal (guarda, regime de visitas e alimentos), as questões da partilha dos bens, casa de morada de família e alimentos ou apenas se cinja à regulação do exercício do poder paternal ou incumprimento/alteração da regulação do exercício do poder paternal, respectivamente.[3]

3.4. Processo

A mediação familiar se instaura a partir da manifestação de vontade das partes, desde que de forma voluntária.[4]

Uma vez instaurada a mediação, as partes serão submetidas a pré-mediação, na qual o mediador avaliará as partes para saber se a lide pode ser submetida ao processo de mediação, e também para elucidar as dúvidas e explicar as regras do processo, que deverão ser aceitas por ambos.

Nesse primeiro contato, as partes deverão expor qual o motivo do litígio e seus respectivos pontos de vista, além de elencar quais são os objetivos pretendidos com o instituto.

No decorrer da sessão os mediandos devem enumerar possíveis soluções para que possam estabelecer uma base sólida para as negociações de um eventual acordo.

Após enumeradas possíveis soluções, os mediandos tentam efetivamente chegar a um acordo que atenda às necessidades de todos os envolvidos.

Tendo chegado a um acordo, o mediador elabora o termo, que deve ser assinado pelos mediandos contendo todos as circunstâncias abordados na mediação.

O termo de acordo tem valor de título executivo extrajudicial, podendo ou não ser homologado judicialmente, a contragosto das partes.

3.5. Mediação de Conflitos Familiares com Filhos

No que diz respeito aos conflitos familiares, a mediação é o meio mais adequado para o tratamento de conflitos, tendo em vista as peculiaridades dos conflitos em família e da necessidade da manutenção do vínculo familiar.

Como uma técnica que busca o entendimento entre as partes, visando a relação de continuidade, a mediação de conflitos, em suas formas extrajudicial ou judicial, faz-se cada vez mais necessária, pois, em observância aos princípios familiares, tem como pilar o respeito à dignidade humana, tornando proveitosa e satisfatória a sessão, tanto para os mediandos quanto para o mediador.

Ademais, no que pertine à questão afetiva, que um processo judicial não soluciona, tende a ser amenizada, pois o diálogo entre todos impera na medição, propiciando a continuidade da relação, fazendo com que cada indivíduo assuma a responsabilidade pelos seus atos.

Muitas vezes os filhos são usados como instrumento de agressão contra o outro e, através do diálogo propiciado pela mediação, os pais conseguem perceber que o filho merece atenção e não ser usado como arma contra o outro.

Nesse sentido, muitas vezes tais conflitos acarretam prejuízos ao desenvolvimento psicológico e comportamental das crianças, pois geram um estresse em suas cabeças. A forma como são prejudicadas e suas necessidades frente a um conflito familiar, geralmente um divórcio, variam de acordo com sua idade e estágio de desenvolvimento, sendo exemplos de algumas necessidades as seguintes: [5]

·           não ser envolvida no conflito;

·           compreender que não é o responsável pela separação;

·           expressar-se a respeito da separação;

·           sentir que seus pais são capazes de conversar;

·           conhecer a realidade da manutenção do divórcio;

·           ser informada para entender o que está acontecendo.

É mister ressaltar que cada explicação deve ser adaptada à idade da criança, razão pela qual o mediador deve ter conhecimento de tais necessidades, a fim de informar os pais envolvidos e facilitar a comunicação destes com seus filhos.

O apoio oferecido pelos pais torna-se mais fácil à medida que a criança expressa seus medos, desejos e necessidades, o que permitirá ao mediador entrar em contato com a criança e colher informações acerca de suas necessidades afetivas e observar a interação entre pais e filhos. A presença da criança, pode findar por incentivar os pais a agir de forma mais cooperativa, facilitando o processo de mediação e a busca por uma solução satisfatória para os envolvidos.

Faz-se necessário relembrar que em hipótese alguma a criança ou adolescente deve ser “obrigada” (ou de qualquer modo “induzida”) a participar do processo de mediação contra sua vontade, sem prejuízo da possibilidade da realização de intervenções destinadas a orientá-la acerca das vantagens da medida, com o fito de obter o seu consentimento.

3.6. Desafios

Quando a mediação de conflitos familiar envolver crianças e adolescentes requer uma maior atenção dos mediadores. Isto ocorre porque em muitas situações, no meio das discussões os casais acabam focando nos interesses pessoais ou apenas em não ceder para o outro, esquecendo-se de velar pelo bem-estar dos filhos. Há também os casos em que os pais querem a opinião dos filhos, porém esses não conseguem expor seus desejos aos pais.

Sendo assim, cabe ao mediador lembrar aos mediandos para velarem pelo melhor interesse das crianças e adolescentes e também intermediar o diálogo entre os pais e os filhos.

É importante lembrar que essas crianças e adolescentes ainda são pessoas em formação, em sendo assim, cabe ao mediador identificar qual o estágio de desenvolvimento e também qual a capacidade de compreensão acerca do sentido e do alcance da intervenção respectiva desse jovem para que possa melhor se comunicar.

Para Murillo José Digiácomo

“Como tudo em matéria de infância e juventude, a intervenção destinada a inserir a criança ou adolescente no “processo”29 de mediação deve ser precedida de um “diagnóstico” interprofissional da situação em que esta se encontra, de modo a verificar se, dadas as peculiaridades do caso, assim como suas condições pessoais (inclusive sob o prisma “emocional”), é ou não recomendável desencadeá-lo.”[6]

Embora qualquer pessoa possa atuar como mediador, é clara então a necessidade de uma melhor qualificação profissional para a realização de uma mediação familiar envolvendo crianças e adolescentes, e sendo assim devendo-se evitar que qualquer mediador atue na área.

Câmaras extrajudiciais mais sérias e mais respeitadas já dispõe dessa forma, exigindo-se, inclusive, que nessas situações os mediadores tenham filhos para que possam estar mais próximos daquela realidade e dessa forma atender melhor as necessidades de todas as pessoas envolvidas naquele conflito.

4. Participação de Crianças e Adolescentes na Mediação Familiar

A mediação familiar baseia-se na intervenção de um terceiro neutro e imparcial (mediador) nas famílias, visando evitar o divórcio, interferindo nos arranjos pertinentes à situação ou buscando manter ou restabelecer as relações afetivas entre os envolvidos, principalmente quando existem filhos frutos da relação que está tendo fim.

Inicialmente, é preciso analisar como está se dando a separação do casal, pois se ambos estiverem seguros de sua decisão, agindo com respeito e boa-fé e sempre integrando a(s) criança(s) e pensando sempre no melhor para ela, não há razão para trazê-la à mediação.

Porém, se entre o casal a comunicação está prejudicada, não estão agindo pautados no respeito e boa-fé com o próximo, visando apenas magoar o outro, os interesses da criança restarão igualmente prejudicados, assim como a comunicação entre pais e filhos, podendo vir a comprometer as relações afetivas dos mesmos.

Sendo caso de inserir a criança na mediação, o mediador deve estar atento a alguns pontos, como por exemplo:[7]

a) Idade da criança e como ela está reagindo à separação dos pais, a fim de procurar uma boa abordagem;

b) Ambiente aconchegante, que remonte à ideia de lar, para que a criança se sinta à vontade;

c) Procurar não manter a criança, bem como seus pais, em uma sala de espera com mais pessoas, como forma de manter o sigilo da mediação e preservar a identidade da criança;

d) Verificar se a presença dos pais no momento em que o mediador houve a criança é benéfica ou estes atrapalham/intimidam a criança.

Após a observância de tais circunstâncias, dá-se início à sessão de mediação. Na presença da criança, é sempre importante tratá-la como parte daquele processo, interagir com ela.

No que pertine ao melhor momento em que a criança deve participar do processo de mediação familiar existem várias alternativas, a saber: as crianças podem ser trazidas ao final da sessão, para serem informadas dos acordos dos pais ou para serem consultadas pelo mediador e pais depois dos acordos serem obtidos para saber a sua opinião, podem também ser entrevistadas pelo mediador no início do processo de mediação para que este proceda com a coleta das suas opiniões, sentimentos e preferências o que pode ser feito individualmente, com os irmãos, com um ou os dois pais. O mediador introduz os dados coletados nas negociações dos pais e vai defender os seus direitos. Podem ainda ser trazidas às sessões de forma periódica, sempre que se levantar uma questão que as envolva, podem estar presentes ao longo do processo de mediação e participar da decisão em igualdade de circunstâncias (adolescentes).Em alguns casos, podem ainda ser incluídas na pré-mediação. Todos estes métodos envolvem uma implícita ou explícita fase de envolvimento da criança.

De forma geral, a maioria dos estudiosos entende ser preferível incluir a criança antes de serem tomadas decisões, de modo que sua opinião esteja refletida no acordo.

Há situações nas quais não é aconselhável a inclusão das crianças no processo de mediação, como por exemplo: se as crianças não quiserem, em situações de grande conflituosidade entre os pais ou se os pais não quiserem que as crianças participem, se os pais discutem porque não desejam ter a responsabilidade da criança, quando os pais descrevem as mesmas necessidades da criança e têm ideias similares quanto ao plano que melhor assegura os seus interesses.

Sendo assim, a participação das crianças na mediação familiar cabe ao mediador, devendo partir do pressuposto de que as crianças têm direitos e devem ser ouvidas, cabe a ele apresentar-se com as habilitações e formação adequadas (em dinâmica familiar e desenvolvimento infantil), deve analisar o contexto de cada situação, assim como analisar e compreender as capacidades de desenvolvimento das crianças, avaliando as necessidades individuais das crianças e pais, por meio de entrevistas e avaliações .

Por fim, é importante salientar que o mediador não deve agir como um advogado da criança, pondo seus interesses acima de tudo. O papel do mediador, nesses casos, é assegurar que os direitos da criança estão sendo respeitados e tentar direcionar o acordo feito pelos pais a uma direção convergente com o bem-estar do menor.

4.1. Desvantagens

A participação das crianças em um conflito litigioso pode ser muito traumatizante para os filhos, pois muitas vezes se encontram presentes num ambiente hostil, no qual os pais estão se digladiando para defender seus interesses, na presença de pessoas estranhas à criança (advogados, juiz, assessor, assistentes sociais), e muitas vezes é imposto ao jovem que escolha se quer morar com o pai ou com mãe, não oportunizando, inclusive, que ele se manifeste sobre suas escolhas.

Por outro lado, a participação das crianças na mediação permite que elas apresentem seus pontos de vista, seus entendimentos ou desentendimentos acerca da situação em que se encontram e também seus interesses, oportunizando, assim, que os pais possam considerar os interesses e preferências dos filhos nas suas decisões. Além disso, é imperativo que o ambiente seja acolhedor e permita que a criança se sinta à vontade, e diferentemente da via judicial, na mediação a criança pode se comunicar com o mediador separadamente, dando uma maior liberdade para a criança.

A mestra Andreia Alexandra Cardoso dos Santos Chrystêllo[8] revelou que a participação dessas crianças na mediação apresentava vantagens e desvantagens ao processo. Dentre as desvantagens destacam-se:

·            As crianças não são responsáveis pelo conflito parental e nesta medida não devem ser envolvidos no mesmo;   

·           A sua participação no processo aumenta a sua dor e confusão (ficarem mais conscientes do conflito parental aumenta a sua perturbação e o seu sofrimento);

·           As crianças não devem ser envolvidas em assuntos ou negociações que dizem somente respeito aos adultos; 

·           Os desequilíbrios de poder entre pais e filhos não se compadecem com o processo de mediação;

·           Sobrevalorizar e colocar no centro da mediação as crianças corre-se o risco de desvalorizar um ou ambos os pais;

·           O papel do mediador pode ser confundido com o de conselheiro ou advogado das crianças;

·           A participação das crianças pode levar à criação nestas de expectativas positivas irrealistas quanto ao seu futuro; 

·           A inclusão das crianças pode levá-las a se sentirem pressionadas a expressar os seus pensamentos, sentimentos e opiniões;  

·           Podem sentir-se constrangidas a fazer escolhas;

·           As crianças não podem julgar de forma fiável quais serão os seus próprios interesses a longo prazo;

·           O risco de o mediador poder ficar “triangulado” entre pais e filhos;

·           Se as crianças confiarem ao mediador segredos ou opiniões que as mesmas não desejam partilhar com os pais, colocam o profissional numa situação delicada;

·           Pode levar à intensificação dos conflitos de lealdade das crianças em relação aos pais;

·           A incapacidade ou dificuldade dos pais em lidar com os seus sentimentos na presença dos filhos;

·           A probabilidade dos pais pressionar os filhos sobre o que dizer ao mediador;

·           As possibilidades de os pais se sentirem desapontados com alguma coisa dita pelos filhos;  

·           As crianças ao observarem os pais comunicar de forma cordata, podem ficar com infundadas e irrealistas esperanças quanto a uma reconciliação.

4.2. Vantagens

No entanto, o Estudo também apresentou aspectos postivos da participação dos jovens na mediação, a serem expostos a seguir:[9]

·            A maioria das crianças que já participaram na mediação afirma ser uma experiência vantajosa e útil para si; 

·           Constitui a possibilidade de as crianças poderem ser informadas do que se passa na família e serem apaziguadas quanto à sua vida (presente e futura);

·           Possibilita às crianças de poderem compreender melhor as decisões dos pais e com isso adaptarem-se à nova situação familiar; 

·           Mostra o reconhecimento de que aquilo que crianças pensam/sentem é importante e a manifestação de que são tratadas com respeito, amor e dignidade;

·           Permite que os pais prestem atenção em relação ao que os filhos dizem e pensam;

·           Estabelece uma oportunidade para os pais poderem receber apoio especializado na tarefa por vezes complexa de explicar aos filhos as suas decisões;

·           Oferece um espaço/ocasião para dissipar equívocos e esclarecer malentendidos familiares;

·           Permite que os filhos façam perguntas, comentários e contribuam para o processo com as suas ideias;

·           Permite que as crianças expressem uma preocupação ou interesse particular;

·           Faz fluir a comunicação familiar e reduzir tensões relacionais (relação pais-filhos, por exemplo).

·           Constitui a oportunidade para as crianças, a sós com o mediador, falarem tranquilamente dos seus sentimentos e preocupações (particularmente, em casos ou circunstâncias em que poderá existir alguma pressão própria à presença dos pais, inibindo-as);

·           Ajuda as crianças a prepararem as mensagens e os discursos que pretendem transmitir aos pais e a se sentirem capacitadas para fazê-lo;

·           Permite às crianças receber indiretamente mensagens dos pais sempre que não seja possível fazê-lo presencialmente e diretamente;

·           Possibilita ao medidor, com o prévio consentimento das crianças, transmitir aos pais o teor das conversas tidas com elas sobre as suas preocupações e sentimentos, para que estes sejam respeitados e considerados nas decisões a serem tomadas pelos adultos.

Em sendo assim, é possível perceber que a participação dos filhos na mediação familiar pode ser vantajosa ou desvantajosa, cabendo ao mediador analisar o caso concreto para saber se deve acontecer ou não.

Porém, visando facilitar o trabalho do mediador, existem algumas orientações de quando deve ocorrer a participação das crianças na mediação familiar:[10]

·           As crianças manifestarem repetidamente junto de um dos progenitores a sua preferência por uma certa partilha de tempo e este desejo é tido em conta e debatido pela outra parte;

·           As crianças pedirem explicitamente para falar como o mediador;

·           Os progenitores necessitam ouvir da voz dos filhos para sentir o impacto negativo que a disputa está a ter sobre as crianças;

·           As crianças possuem capacidades cognitivas que lhe permitem relacionar as suas opiniões com os seus desejos e apresentam uma certa independência que facilita conhecer o que efetivamente pretendem.

Há, também, casos em que é contraindicada essa integração, são eles:[11]

·            Ambos os pais conseguem acordar sobre as necessidades dos filhos e manifestam capacidade para desenvolver um plano de mútua responsabilidade em relação aos mesmos (co-parentalidade responsável);

·           Um dos pais, ou ambos, não aceitam incluir os filhos no processo.

·           As crianças são muito pequenas e não possuem capacidade cognitiva e maturidade para comunicar de forma fiável os seus desejos (ou seja, geralmente crianças menores de 3 anos de idade);

·           As crianças apresentam um quadro de instabilidade emocional e comportamental por terem que falar com o mediador;

·           As crianças são manipuladas pelos pais (pai ou mãe).

5. CONCLUSÃO

Ante o exposto no presente trabalho, é possível perceber que nos casos de conflitos familiares no qual os litigantes ainda possuem um interesse em dar continuidade a um relacionamento amigável, mesmo após a separação, ou nos casos em que o existe a necessidade de um relacionamento agradável e respeitosos entre as partes por conta dos filhos é aconselhável a mediação de conflitos.

Isso ocorre porque quando o conflito é submetido ao judiciário há uma tendência que ele aumente de proporções, ocasionando um mal-estar e uma rivalidade onde não existia, ou até mesmo aumentando de forma exponencial essas tratativas.

Quando os casais têm filhos, mesmo após o divórcio, ainda existe a necessidade de um relacionamento entre os pais para tratar sobre os assuntos pertinentes aos filhos, e nesses casos é sempre indicado que o relacionamento possa ser o mais amistoso possível, e por essa razão indica-se a mediação de conflito familiar, pois este instituto é capaz de resolver a lide de uma forma consensual, e assim, reparar ou até mesmo diminuir os motivos que deram origem ao conflito, permitindo que as pessoas possam voltar a se relacionar, quando houver cessado, ou que continuem a se relacionar de forma amistosa.

Outro aspecto muito importante abordado no presente trabalho, é quanto a participação dos filhos na mediação familiar, pois ainda não é um tema pacífico, porém pode variar em cada caso e deve ser feita de acordo com o entendimento do mediador. Porém, não é nada fácil identificar quando deve ser feita a integração do jovem no processo. Em sendo assim, há casos em que é indicada a participação e há casos em que não.

Vale frisar então a importância da capacitação do mediador, para que possa perceber os sinais dos litigantes para identificar se o litígio em questão deve ser submetido a mediação e caso seja submetido para que possa lograr êxito, e também para perceber se as crianças devem integrar a mediação familiar e proceder da melhor forma possível, a fim de beneficiar as pessoas envolvidas no conflito.

 

Referências
I Congresso Internacional de Mediação organizado pelo CAPP (Centro de Investigação do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas) e pelo GRAl (Gabinete de Resolução Alternativa de litígios) do Ministério da Justiça e realizado no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas nos dias 7, 8 e 9 de Outubro de 2010, em lisboa – POÇAS, Isabel – A Participação Das Crianças Na Mediação Familiar
BARROS, Juliana Maria Polloni de – Mediação Familiar: Diálogo Interdisciplinar, 2013, 133 f, Tese (Doutora em Serviço Social), Universidade Estadual Paulista “JÚLIO De Mesquita Filho” Faculdade de Ciências Humanas E Sociais, Franca, 2013.
CHRYSTÊLLO, Andreia Alexandra Cardoso dos Santos – Os Menores e a Mediação Familiar, 2013, 93 f, Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Processuais), Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa, 2013.
DIGIÁCOMO, Murillo José – A mediação e o Direito da Criança e do Adolescente no Brasil: construindo alternativas para a desjudicialização do atendimento, 02/04/2015, Disponível em http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/doutrina/justica_restaurativa/mediacao_e_o_direito_da_crianca_e_adolescente.pdf. Acesso em 09 de julho 2016.
FONKERT, Renata – Mediação Familiar: Recurso Alternativo à Terapia Familiar Na Resolução de Conflitos Em Famílias Com Adolescentes, 1998.
GONÇALVES, Amanda Passos – A Mediação como Meio De Resolução De Conflitos Familiares, Rio Grande do Sul, 2015.
GRUNSPUN, Haim – Mediação Familiar: O Mediador e a separação de casais com filhos, Ed. LTR, São Paulo, 2000.
JAMES, Paula – The divorce Mediation Handbook, Ed. Jossey-Bass Pubishers, São Francisco, 1997.
SCHNITMAN, Dora Fried e LITTLEJOHN, Stephen – Novos Paradigmas em Mediação, Ed. ARTMED, Porto Alegre, 1999.
WEEKS, Dudley – The Eight Essential Steps to Conflict Resolution, Ed. Jeremy P. Tarcher Inc., Nova iorque, 1994.
VASCONCELOS, Carlos Eduardo de – Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas, São Paulo, Editora Método, 2008. 209.
 
Notas:
[1].DAL BIANCO, Jean Carlos Lima – Mediação de Conflitos, 5ª Ed., Editora Adsumus.

[2].CHRYSTÊLLO, Andreia Alexandra Cardoso dos Santos – Os Menores e a Mediação Familiar, 2013, 93 f, Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Processuais), Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa, 2013.

[3].RIOS, Paula Lucas – Mediação Familiar, Estudo Preliminar para uma regulamentação legal da Mediação Familiar em Portugal.

[4].Idem.

[5].GRUNSPUN, Haim – Mediação Familiar: O Mediador e a separação de casais com filhos, Ed. LTR, São Paulo, 2000.

[6].DIGIÁCOMO, Murillo José – A mediação e o Direito da Criança e do Adolescente no Brasil: construindo alternativas para a desjudicialização do atendimento.

[7].GRUNSPUN, Haim – Mediação Familiar: O Mediador e a separação de casais com filhos, Ed. LTR, São Paulo, 2000.

[8].CHRYSTÊLLO, Andreia Alexandra Cardoso dos Santos – Os Menores e a Mediação Familiar, 2013, 93 f, Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Processuais), Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa, 2013.

[9]Idem.

[10]. Idem.

[11].Idem.


Informações Sobre os Autores

Renato Pereira de Araújo

Advogado Graduado em direito pela Universidade Católica de Pernambuco

Rafaela Vieira de Souza

Advogada Graduada em direito pela Universidade Católica de Pernambuco


logo Âmbito Jurídico