Resumo: O presente artigo visa analisar a possibilidade no direito brasileiro de extensão do adicional de 25% previsto no artigo 45 da Lei 8.213 para os segurados aposentados de forma espontânea que necessitem do auxílio permanente de terceiros. Contextualizou-se a evolução da previdência social sob o panorama da seleção dos riscos sociais a serem protegidos, e, verificou-se que o sistema brasileiro pode se adequar a realidade social, elegendo novas contingências que devam ser protegidas. Analisou-se o artigo 45 da Lei 8.213, que não garante o adicional literalmente a todos os aposentados, deixando os aposentados de forma espontânea desamparados quando necessitarem do auxílio de terceiros. A não concessão do acréscimo para as demais aposentadorias ocasionou uma série de demandas judiciais, que resultaram em uma jurisprudência antagônica. Inicialmente a jurisprudência era conservadora e, guiando-se pela legalidade estrita, não concedia o adicional independente da situação fática do segurado aposentado. Depois, a jurisprudência evoluiu, baseando-se em princípios constitucionais para conceder o adicional, até a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais uniformizar o entendimento de ser devido o adicional para todas as aposentadorias. Foi observado que cabe aos Juízes, na aplicação do direito, utilizarem, além da lei estrita, também os princípios constitucionais da Dignidade da pessoa humana, da Isonomia e da Adequada prestação previdenciária, bem como, respeitar as normas da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que o Brasil incorporou com status constitucional. De modo, que negar a concessão do adicional é uma afronta aos direitos fundamentais e aos objetivos constitucionais.
Palavras Chave: Regime Geral de Previdência Social. Grande Invalidez. Adicional de 25% do art. 45 da Lei 8.213/91. Aposentadorias Espontâneas. Dignidade da Pessoa Humana
Abstract: This article aims to examine the possibility in Brazilian law additional extension of 25% provided for in Article 45 of Law 8213 for retired insured spontaneously requiring permanent assistance of a third party. Contextualized the evolution of social security in the panorama of selection of social risks to be protected, and it was found that the Brazilian system can fit the social reality, electing new contingencies that must be protected. Analyzed Article 45 of Law 8213, which does not guarantee the additional literally all retirees, leaving retired helpless spontaneously when they need third party assistance. The failure to grant the increase for all other pensions led to a series of lawsuits that have resulted in an antagonistic jurisprudence. Initially the case was conservative and guided by the strict legality, did not grant additional independent of the factual situation of the insured retirement. Then, the case law has evolved, based on constitutional principles to grant additional, until the Uniform National Panel of Special Courts to standardize the understanding be due additional to all pensions. It has been observed that it is for the Court, in law enforcement, use, beyond strict law, also the constitutional principles of dignity of the human person, the Isonomy and Adequate pension provision, as well as respect the rules of the International Convention on the Rights of Persons with Disabilities that Brazil has incorporated with constitutional status. Mode, which refuses to grant the additional is an affront to fundamental rights and constitutional objectives.
Keywords: General Social Security Regime. Great Disability. Additional 25% of the art. 45 of Law 8.213 / 91. Spontaneous retirement. Dignity of human person.
Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução da Previdência Social e a Proteção dos Riscos Sociais. 2.1 Riscos Sociais. 2.2. Evolução Histórica da Previdência Social. 2.2.1. Evolução Histórica da Previdência Social no Brasil. 3. Grande Invalidez – art. 45 da lei 8.213/91. 3.1. Realidade dos Aposentados Desamparados. 3.2. Jurisprudência Contrária à Possibilidade de Extensão do Adicional do art. 45 da Lei 8.213 para as demais Aposentadorias. 3.3. Jurisprudência Favorável à Possibilidade de Extensão do Adicional do art. 45 da Lei 8.213 para as demais Aposentadorias. 4. Fundamentos da Jurisprudência Favorável à Concessão do Adicional. 4.1. Isonomia. 4.2. Dignidade da Pessoa Humana. 4.2.1. Direitos Humanos dos Deficientes. 4.3. Adequada Prestação Previdenciária. Conclusão
1 Introdução
A relevância da matéria encontra-se no momento em que se torna necessário o estudo sobre o direito fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, indispensável à existência do ser humano, elevado a tal status pela Constituição Federal de 1988.
A legislação infraconstitucional previdenciária ao só mencionar que seria devido adicional para os aposentados por invalidez deixou desamparados os demais segurados aposentados que sejam acometidos de “grande invalidez” num momento posterior à concessão da aposentadoria espontânea, ou seja, estarão à própria sorte e do valor de sua aposentadoria, quando sofrerem algum acidente ou ficarem debilitados em razão da idade avançada. Assim, em momento crítico de suas vidas, quando passarem a necessitar de auxílio permanente de cuidadores, a Seguridade Social como responsável pela devida proteção dos seus segurados não dará condições mínimas de existência a estes que contribuíram por muito tempo para o sistema.
A omissão legislativa afronta a Constituição Federal, ao ferir princípios como da Dignidade da Pessoa Humana, da Isonomia, da Adequada Proteção Previdenciária, de modo que se faz necessária uma intervenção do Poder Judiciário para sanar a proteção insuficiente ao segurado do RGPS.
Além do mais, o Brasil incorporou ao seu ordenamento jurídico a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência, de modo que não cabe só ao Poder Executivo criar políticas públicas para inclusão dessas pessoas, mas principalmente ao Poder Judiciário o dever de julgar visando a proteção das pessoas com deficiência.
Neste sentido, muitas ações foram propostas por segurados já aposentados por idade ou contribuição que se viram acometidos por moléstias graves que lhes incapacitaram para os atos da vida civil, necessitando de ajuda permanente de terceiros. No entanto, a maioria das decisões foram contrárias à possibilidade de conceder o adicional previsto no art. 45 da Lei 8.213/91 para as aposentadorias espontâneas, sob o argumento de que a extensão do benefício não está prevista em lei, e que o Judiciário não pode legislar, por efeito de afrontar o princípio constitucional da Separação dos Poderes.
Porém, com a evolução doutrinária e com o trabalho de juízes ativistas no Direito Previdenciário, começaram a surgir teses e jurisprudências favoráveis à concessão do adicional, baseadas em princípios constitucionais, como, da Isonomia, Dignidade da Pessoa Humana, Direitos Humanos dos Deficientes e Adequada Proteção Previdenciária. Estas novas decisões merecem ser tema de estudo aprofundado, principalmente a mais nova jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização, que, ainda que não unanimemente, unificou o entendimento de ser possível a concessão do adicional de 25% sobre o valor da aposentadoria para os aposentados por idade e contribuição que sofram de grave moléstia e necessitem do auxílio permanente de terceiros.
Portanto, o trabalho versará sobre a análise dos fundamentos jurídicos da possibilidade de concessão do adicional previsto no artigo 45 da Lei 8.213 aos benefícios dos segurados que se aposentaram de forma programada e passaram a necessitar do auxílio permanente de terceiros para realizar todas as suas necessidades básicas vitais. Assim, o estudo será dividido em três capítulos.
No primeiro capítulo será feita uma abordagem sobre a evolução da previdência social a partir da proteção dos riscos sociais. De modo que no primeiro subcapítulo será trazido o conceito dos riscos sociais e, a partir disso, no segundo subcapítulo será exposta a evolução histórica da previdência, até chegar à Lei 8.213/91 que rege atualmente os benefícios previdenciários no Brasil.
Então, no segundo capítulo se abordará o benefício previdenciário que é o foco principal do trabalho, ou seja, o adicional do artigo 45 da Lei 8.213. Em seguida, no primeiro subcapítulo discorre-se sobre o desamparo dos aposentados acometidos de grande invalidez que não estão mencionados literalmente no artigo em comento. Desta forma, nos subcapítulos seguintes serão trabalhadas as controvérsias e a evolução da jurisprudência sobre a possibilidade de extensão aos demais aposentados.
Por fim, no terceiro capítulo serão analisados os principais argumentos contidos nas jurisprudências mais recentes e favoráveis à extensão do benefício para os segurados que já se aposentaram de forma programada. Sendo assim, nos subcapítulos subsequentes são abordados respectivamente os princípios da Isonomia, da Dignidade da Pessoa Humana e da Adequada Prestação Previdenciária.
2 Evolução da Previdência Social e a Proteção dos Riscos Sociais
Inicialmente, cabe trazermos uma breve definição de previdência social, instituto pertencente ao complexo ramo do estudo do direito previdenciário[1], e, tema de constante evolução juntamente com o desenvolvimento das sociedades.
Os doutrinadores Rocha e Baltazar Junior conceituam a previdência social como um seguro social mantido essencialmente através de contribuições dos trabalhadores e de toda sociedade, com a finalidade de garantir aos segurados e seus dependentes meios de subsistência quando eles não puderem alcançá-los ou não seja socialmente desejável que eles sejam buscados através do trabalho, como no caso de maternidade, velhice, etc.[2]
Neste mesmo sentido é a definição de Previdência Social dos Juízes Castro e Lazzari:
“Previdência Social é o sistema pelo qual, mediante contribuição, as pessoas vinculadas a algum tipo de atividade laborativa e seus dependentes ficam resguardadas quanto a eventos de infortunística (morte, invalidez, idade avançada, doença, acidente de trabalho, desemprego involuntário), ou outros que a lei considera que exijam um amparo financeiro ao indivíduo (maternidade, prole, reclusão), mediante prestações pecuniárias (benefícios previdenciários) ou serviços”.[3]
Vianna ao conceituar a previdência social, ressalta a diferença que ela possui dos sistemas de seguro privado. Sendo que, apesar de ser um esquema parecido com o seguro privado, possui como princípio a solidariedade, inerente aos sistemas de seguridade social, e que, diferentemente dos interesses particulares que estão em jogo no seguro privado, na previdência social estão os interesses de toda a sociedade.[4]
Pode-se também definir a Previdência Social como competência de atuação do Estado que busca proteger os indivíduos que trabalhem em atividade remunerada e seus dependentes do estado de necessidade decorrente da perda ou redução das condições laborais necessárias para obter o sustento básico.[5]
“Ibrahim corrobora o entendimento de que a Previdência Social funciona como uma: garantia institucional que visa manter um seguro compulsório diante das necessidades sociais, com o intuito de fornecer a seus beneficiários algum rendimento que substitua sua remuneração, seja indenizatório de sequelas ou em razão de encargos familiares”.[6]
Ademais, afirma que todos os tipos de regimes previdenciários cingem-se a essa definição, somente havendo variação sobre a cobertura pessoal e o plano dos benefícios.[7]
Neste mesmo sentido, Vianna conclui que qualquer modelo de proteção social, principalmente os modernos, tem como objetivo assegurar ao indivíduo a superação de uma circunstância de insuficiência social causado por uma contingência social.[8]
Assim, pode-se verificar que o conceito de previdência social é pacífico em qualquer regime previdenciário, o que pode ser alterado são os riscos sociais abrangidos pelo sistema.
Deste modo, Rocha e Baltazar Junior afirmam que cada sociedade deve eleger a melhor forma de proteger a sua população contra as consequências dos riscos sociais, levando em consideração a sua estrutura de Estado e as peculiares condições sociais, econômicas e demográficas.[9]
Sendo assim, é mister analisar o conceito de riscos sociais, parte essencial dos sistemas previdenciários.
2.1 Riscos Sociais
Rocha e Baltazar Junior ao trazer o conceito de risco social expõem que:
“O termo risco social é empregado para designar os eventos, isto é, os fatos ou acontecimentos que ocorrem na vida de todos os homens, com certeza ou probabilidade significativa, provocando um desajuste nas condições normais de vida, em especial a obtenção dos rendimentos decorrentes do trabalho, gerando necessidades a serem atendidas, pois nesses momentos críticos, normalmente não podem ser satisfeitas pelo indivíduo. Na terminologia do seguro, chamam-se tais eventos de “riscos”, e por dizerem respeito ao próprio funcionamento da sociedade, denominam-se “riscos sociais”. Os regimes previdenciários são instituídos com a finalidade de garantir aos seus beneficiários a cobertura de determinadas contingências sociais. Em sua essência, as normas buscam amparar os trabalhadores e seus dependentes quando vitimados por eventos, reais ou presumidos que venham a produzir uma perda integral ou parcial dos rendimentos familiares ou despertem outra necessidade considerada socialmente relevante”.[10]
Assim, verifica-se que riscos sociais são os infortúnios naturais que ocorrem na vivência humana, causadores de perda da capacidade laborativa, gerando impossibilidade de obtenção dos víveres familiares, e que o Estado através da Previdência Social deve propiciar aos indivíduos meios de sustentação quando vitimados por tais eventos.
Segundo a teoria do risco social, a responsabilidade pela manutenção daqueles indivíduos que em razão de contingências sociais ficaram inabilitados para prover meios de subsistência é da sociedade e deve ser materializada através de políticas públicas.[11]
Ainda, mencionam Castro e Lazzari que a responsabilidade do Estado perante as vítimas dos riscos sociais deve ser objetiva:
“Segundo tal teoria, cabe à sociedade assegurar seu sustento ao indivíduo vitimado por uma incapacidade laborativa, já que toda a coletividade deve prestar solidariedade aos desafortunados, sendo tal responsabilidade de cunho objetivo – não se cogitando, sequer, da culpa do vitimado. Se a proteção dos infortúnios decorrentes de acidente do trabalho, por exemplo, vier a ser feita somente por intermédio de seguros privados, desaparece o conceito de risco social, ficando a encargo do tomador dos serviços, exclusivamente, a obrigação de reparar o dano à capacidade de trabalho”.[12]
Vianna citando Assis apoia tal entendimento, dizendo que na nova concepção de risco social, o perigo que assola o indivíduo, por ser componente de um todo, se transfere para toda a coletividade. De modo que tais eventos são mais que meros infortúnios particulares, são riscos que devem ser superados por toda a sociedade.[13]
Portanto, deve-se destacar que foi a partir da ideia da superação de um estado de necessidade por meio do empenho coletivo que surgiram os primeiros projetos de proteção social.[14]
2.2 Evolução Histórica da Previdência Social
Na Idade Média Feudal da Europa, aparecem os primeiros grupamentos de indivíduos que, fugindo das terras dos nobres em que eram servos, fixavam-se nas urbes ou burgos, onde a divisão do trabalho ficava por conta das corporações de ofício, que se encarregavam da produção, ainda bastante rudimentar.[15]
Martinez define as corporações de ofício como protótipos dos sindicatos atuais, e menciona que surgiram a partir do século XII, na Itália (compagnia), França (confréries), Alemanha (innungen), Espanha (grêmio) e Inglaterra (friendly society).[16]
Com a crise do Feudalismo, viu-se nascer nas urbes instituições mutualistas para proteção social, que tinham como objetivo proteger os seus integrantes, que eram somente os membros das chamadas corporações de ofício, de modo que não se deve considerar estes sistemas como de proteção social universal.[17]
A concepção da proteção particular ao indivíduo somente irá sofrer uma mudança no começo do Estado Contemporâneo com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, que garante a Seguridade Social como direito subjetivo universal. Esta forma de previdência social organizada pelo Estado com a participação de toda a sociedade surge por influência dos movimentos de trabalhadores já presentes neste período, em que o liberalismo político impera.[18]
Entre os principais motivos para a transição do Estado Moderno para o Estado Contemporâneo, está a Revolução Industrial, quando as novas tecnologias de maquinários descobertas fizeram com que poucos burgueses detentores do capital dispusessem de quase todo poder econômico da sociedade, ao passo que, todos que necessitassem manter seu sustento teriam de se sujeitar as condições de trabalho impostas pelos empresários burgueses. A Revolução Industrial concretizou todos os ideais liberais burgueses, contrários ao anterior Estado Absoluto, em que não haveria interferência do Estado nas relações privadas, favorecendo o capitalismo individualista, a liberdade contratual, a possibilidade de concentração de renda e a exploração do trabalho assalariado sem nenhuma restrição.[19]
Rocha ao abordar sobre a revolução industrial assevera que:
“A sociedade experimentou um desenvolvimento econômico sem precedentes – conquanto favorecesse apenas uma pequena parcela da sociedade, gerando um regime de exploração bárbara e cruel dos trabalhadores.”[20]
O trabalho era retribuído por salário, mas por não haver nenhuma regulamentação, os trabalhadores viviam em situação análoga às dos escravos. Não existindo, até então, nada de proteção estatal dos direitos dos trabalhadores quanto à exploração dos empregadores, e também, relativamente aos riscos de perda da capacidade laborativa. Cabe mencionar, que prevalecia a autonomia da vontade em todas as relações privadas, sendo que os direitos dos trabalhadores eram aqueles assegurados pelos seus contratos, sem que o Estado interviesse para garantir mínimas condições.[21]
As garantias individuais mencionadas nas declarações de direitos estavam voltadas apenas contra a tirania estatal, não se preocupando com a opressão econômica feita pela burguesia detentora do capital. Assim, a proteção ao individualismo das declarações de direito e a consequente neutralidade do Estado nas relações sociais fez com que a igualdade material e a justiça social fossem deixadas de lado.[22]
Esta forma de política e economia gerou grande aumento da marginalização social e da miséria para a população urbana, o que ocasionou que os trabalhadores começassem a lutar por melhores condições de trabalho e de subsistência, com greves e revoltas, que foram reprimidas violentamente pelo poder de polícia estatal.[23]
Nesse contexto, os levantes operários continuaram por todo o século XIX, abalando a equilíbrio da estrutura social, forçando o Estado a abdicar de sua atitude de mero espectador das relações econômicas e sociais, com o objetivo de restabelecer um equilíbrio mínimo entre os indivíduos.[24]
Neste sentido, Castro e Lazzari citam algumas revoluções que foram importantes neste processo de transformação histórica:
“Assim, os cartistas, na Inglaterra; as revoluções de 1848 e 1871, na França; e a revolução de 1848, na Alemanha, representaram muito no despertar dos então governantes dos Estados para a intervenção e regulamentação na vida econômica.”[25]
Desta forma, percebe-se que foi em decorrência da insatisfação popular evidenciada pelas revoltas dos trabalhadores, que surgiram de fato as primeiras preocupações dos governantes com a proteção previdenciária do trabalhador, com o intuito de prevenir uma possível revolução classista, o Estado passaria a intervir nas relações de trabalho e segurança do trabalhador quanto a acidentes.[26]
Para ilustrar tal ideia, Castro e Lazzari trazem frase de Bismarck, governante alemão daquela época, justificando a adoção das primeiras normas previdenciárias: “por mais caro que pareça o seguro social, resulta menos gravoso que os riscos de uma revolução”.[27]
Rocha afirma que o Estado para garantir mínimos direitos sociais interviu na sociedade, alterando o direito privado, mediante a criação de leis, diminuindo a prevalência absoluta da autonomia da vontade, e, também, pela instituição de políticas de inclusão social, gerando deveres de proteção do Estado para com os mais necessitados.[28]
Vianna salienta que foi na Alemanha, em 1883, que surgiu o primeiro sistema de seguro social, por obra do Chanceler Otto Von Bismarck. Foi um sistema pioneiro, que estipulou a tríplice forma de custeio, em que mediante contribuição do Estado, dos empregados e dos empregadores era possível garantir diversos benefícios aos trabalhadores, como, seguro-doença, seguro de acidentes do trabalho, seguro de invalidez e proteção à velhice.[29]
A partir daí, os demais Estados da Europa, influenciados por Bismarck, passaram a instituir sistemas jurídicos que garantiriam aos trabalhadores normas de proteção nas suas relações contratuais de trabalho, e um sistema de seguro, que consistia no direito a uma renda em caso de perda da capacidade de trabalho, por velhice, doença ou invalidez, ou a pensão por morte, devida aos dependentes.[30]
Castro e Lazzari afirmam que além da Revolução Industrial, o advento da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) também pode ser considerado fator primordial na formação de um novo molde estatal, as consequências econômicas e sociais da guerra fizeram com que o Estado revisse os princípios da legislação social e trabalhista vigente.[31]
Ainda, é lembrado a Revolução Soviética de 1917, que foi uma grave ameaça aos sistemas liberais vigentes, pois caso os Estados não modificassem os seus princípios sociais poderiam perder o poder político para as classes revolucionárias.[32]
Portanto, vale trazer conclusão de Castro e Lazzari sobre os fatores que influenciaram a mudança na concepção social do Estado para dar maior proteção aos trabalhadores:
“Assim, o que se percebe é que o surgimento do Estado Contemporâneo é produto de uma situação em que os detentores do poder, no afã de obter a manutenção de tal estado de coisas, e a partir dos movimentos sociais, num processo lento e gradativo, modificam a ação do Estado, que tende a interferir diretamente em determinadas relações privadas, inicialmente, como será visto, de modo específico no campo das relações de trabalho e na proteção social de indivíduos alijados do mercado de trabalho”.[33]
Adiante, no início do século XX, surge a fase de constitucionalização dos direitos sociais e políticos. Em 1917 houve a promulgação da Constituição Mexicana, que foi pioneira em sistematizar os direitos sociais e que deu ao seguro social status constitucional. Com o final da 1ª Guerra Mundial, surgiu a Constituição alemã de Weimar, de 1919, que teve grande influência no constitucionalismo mundial na garantia dos direitos sociais.[34]
Também em 1919, com o Tratado de Versalhes, foi criada a Organização Internacional do Trabalho – OIT, com função não apenas de cuidar das normas internacionais referentes ao trabalho, mas também daquelas relativas à seguridade social.[35]
Rocha discorre sobre o avanço dos direitos sociais neste período de constitucionalização posterior a Primeira Guerra:
“O conceito de Estado Social de Direito, nascido no pós-guerra, tem por função transferir parte essencial das tarefas sociais da sociedade Civil para o Estado, buscando conciliar os distintos segmentos sociais e determinando que, com base na ordem constitucional, o Estado assumisse compromissos de organização do espaço social e a gestão da miséria material.”[36]
No entanto, foi com a crise desencadeada no mundo com a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929, e posteriormente com a Segunda Guerra Mundial e seus efeitos devastadores, que as políticas de intervenção estatal se consolidaram.[37]
Neste contexto, surgem teorias econômicas aliadas a políticas estatais, como o New Deal norte-americano, em que Franklin Roosevelt, para combater os graves efeitos da crise de 1929, interveio fortemente no domínio econômico mediante investimentos públicos na economia[38], e assumiu a responsabilidade pela segurança social geral.[39]
Neste sentido, Rocha descreve como ficou estabelecida a seguridade social após as mudanças decorrentes das políticas do New Deal:
“A seguridade social, então, passou a ser compreendida como um sistema abrangente que incorpora, no mínimo, os seguros sociais e a assistência social, seus órgãos e estrutura, numa concepção integral que, atuando de maneira coordenada e publicamente organizada, colimará defender e impulsionar o desenvolvimento de toda a população, e não apenas dos trabalhadores”.[40]
Mais tarde, após a Segunda Guerra, com a situação de miséria geral que se instalou, se disseminaram outras ideias para proteção social, como as do economista John Keynes, que pregava, em síntese, o crescimento econômico num contexto de intervenção estatal para distribuição de renda de forma mais igualitária.[41]
Castro e Lazzari destacam que até este momento já existia o seguro social, no entanto, faltava participação efetiva do estado e que o sistema abrangesse de todos os cidadãos:
“Até então, é importante frisar, os planos previdenciários (de seguro social), em regra, obedeciam a um sistema chamado bismarckiano, ou de capitalização, ou seja, somente contribuíam os empregadores e os próprios trabalhadores empregados, numa poupança compulsória, abrangendo a proteção apenas destes assalariados contribuintes. Ou seja, embora o seguro social fosse imposto pelo Estado, ainda faltava a noção de solidariedade social, pois não havia a participação da totalidade dos indivíduos, seja como contribuintes, seja como potenciais beneficiários.”[42]
Em 1941, Lorde William Beveridge, revisando os sistemas previdenciários da Inglaterra, criou o Plano Beveridge – um sistema universal, abrangendo todos os indivíduos, com a participação compulsória de todas a população. Afirmava que o cidadão deveria ter proteção social do “berço ao túmulo”.[43]
Assim, nasceu o regime de repartição, em que as prestações que garantam o sustento daqueles que sejam atingidos por um dos riscos sociais, previstos no ordenamento jurídico, devem ser retiradas de um fundo previdenciário único, mantido mediante contribuição de toda a sociedade.[44]
Deste modo, evidencia-se que após a segunda guerra mundial prevaleceram dois modelos de proteção social, o sistema Bismarckiano e o sistema Beveridgeano, o primeiro com mais características de um seguro social e o segundo mais com funções de redistribuição de renda. No entanto, ambos são baseados no ideal de solidariedade e na intervenção do Estado no domínio econômico, diferenciando-se quanto à parcela da população destinatária e aos limites da participação do Estado no sistema de proteção.[45]
Ainda a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, contemplou a seguridade social como direito de qualquer pessoa. Neste sentido, cabe citar o artigo 25, como fez Rocha:
“Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem–estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade”.
2.2.1 Evolução Histórica da Previdência Social no Brasil
No Brasil, devido à sua peculiar colonização, que não houve a transição do feudalismo para o capitalismo moderno, com um mínimo de intervenção estatal, e, que no período de revolução industrial europeu o Brasil recém estava conquistando sua independência, sua economia era arcaica, baseada na produção agrícola de grandes latifúndios utilizando mão-de-obra escrava. De modo que, antes mesmo de ingressar na era industrial, nosso País já apresentava uma realidade social marcada por grandes desigualdades, especialmente na distribuição de renda.[46]
Portanto, somente no século XX que foram criadas normas efetivas de caráter geral em direito previdenciário no Brasil. Anteriormente, apesar de haver previsão constitucional, apenas alguns diplomas isolados tratavam sobre o tema.
A primeira Constituição do Brasil, 1824, previa a garantia dos socorros públicos, no entanto, era uma norma meramente programática.[47]Posteriormente, a constituição de 1891 protegeu os funcionários públicos, garantindo aposentadoria por invalidez.[48]
Em 1923, foi publicada a lei Eloy Chaves, considerado o marco oficial da previdência social no Brasil. Vianna explica que “Essa lei criou caixas de aposentadorias e pensões para os trabalhadores das estradas de ferro, com tríplice forma de custeio: trabalhadores, empresas e Estado.”[49]
Ainda, foram criadas muitas outras caixas atreladas a certas categorias profissionais, mas sempre vinculadas à ideia de mutualismo na proteção.[50]
Inspirada na Lei Eloy Chaves, a Constituição de 1934 foi a primeira a estabelecer a forma tripartite de custeio para a previdência, já com o enfoque em buscar o equilíbrio financeiro do sistema.[51]
Posteriormente, a Constituição de 1946 substituiu a expressão “seguro social” por “previdência social”, modernizou o sistema e instituiu um seguro obrigatório dos empregadores contra acidentes do trabalho.[52]
No ano de 1960, foi criado o Ministério do Trabalho e Previdência Social e promulgada a Lei 3.087, Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS. Este diploma não unificou todos os sistemas de previdência vigentes, mas instituiu normas padrões para a proteção de segurados e dependentes dos vários programas existentes, traçando um caminho para o nosso sistema atual.[53]
Em 1967, foram unificados os Institutos de Aposentadorias e Pensões existentes, com o surgimento do Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, criado pelo Decreto-lei nº 72.[54]
Cabe mencionar a Lei 6.439/77 que promoveu mudanças no sistema organizacional do modelo previdenciário vigente, criando diversos institutos para gerir a seguridade social. Como expõem Castro e Lazzari:
“Criou-se o SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social, que teria as atribuições distribuídas entre várias autarquias. Foram criados o IAPAS – Instituto da Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (para arrecadação e fiscalização das contribuições) e o INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (para atendimentos dos segurados e dependentes, na área da saúde), mantendo-se o INPS (para pagamento e manutenção dos benefícios previdenciários), a LBA (para o atendimento a idosos e gestantes carentes), a FUNABEM (para atendimento a menores carentes), a CEME (para a fabricação de medicamentos a baixo custo) e a DATAPREV (para o controle dos dados do sistema)”.[55]
A última Consolidação das Leis da Previdência Social – CLPS antes da Constituição de 1988 ocorreu em 1984 e reuniu os planos de custeio e de benefícios e, ainda, as matérias referentes aos acidentes de trabalho.[56]
Finalmente, em 1988, a Constituição Cidadã instituiu verdadeiro sistema de seguridade social, integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social. Sendo a seguridade social definida como objetivo a ser alcançado pelo Estado brasileiro, de modo que as contribuições sociais passaram a custear as ações do Estado nestas três áreas, e não mais somente no campo da Previdência Social.[57]
Castro e Lazzari ressaltam que a previdência social somente abriga os contribuintes do sistema e seus dependentes:
“O Regime Geral de Previdência Social – RGPS, nos termos da Constituição atual (art. 201), não abriga a totalidade da população economicamente ativa, mas somente aqueles que, mediante contribuição e nos termos da lei, fizerem jus aos benefícios, não sendo abrangidos por outros regimes específicos de seguro social.”[58]
Este sistema previsto na Constituição foi sendo gradativamente regulamentado por legislação infraconstitucional específica.
Cabe mencionar, que em 1990, substituindo o INPS e o IAPAS, nas funções de arrecadação, pagamento de benefícios e prestação de serviços, foi criado o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, autarquia federal que ficou responsável por gerir o RGPS. No entanto, ressalta-se que o papel de realizar a arrecadação, fiscalização, cobrança de contribuições e aplicação de penalidades, bem como a regulamentação da matéria ligada ao custeio da Seguridade Social foram transferidas, em 2007, do INSS para a Secretaria da Receita Federal do Brasil – Lei 11.457/2007.[59]
Em 1991 foram publicados os principais diplomas sobre a previdência social, as Leis 8.212 e 8.213. A primeira dispôs sobre a organização da Seguridade Social e instituiu o Plano de Custeio; a segunda instituiu o Plano de Benefícios da Previdência Social.
Ao analisar a Lei do Plano de Benefícios da Previdência Social – PBPS verifica-se que foi diversas vezes alterada pela legislação posterior, e passou por sucessivas regulamentações por meio de Decretos. Presentemente, a Lei 8.213/91 está regulamentada pelo Decreto 3.048, de 1999 (Regulamento da Previdência Social – RPS), que também já sofreu diversas alterações.[60]
A Lei 8.213/91 dispõe sobre os benefícios e serviços que serão prestados sob a relação jurídica existente entre os segurados, dependentes e a previdência social. Destaca-se que o art. 1º da Lei 8.213/91 elenca os riscos sociais cobertos pelo plano de benefícios, quais sejam a incapacidade, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.[61]
Assim, a partir destas contingências enumeradas, o artigo 18 estabelece as prestações que serão prestadas aos segurados e aos dependentes. Exclusivamente aos segurados, é garantido, inclusive em razão de acidente do trabalho, aposentadoria por invalidez, aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial, auxílio-doença, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente. Aos dependentes são devidos pensão por morte e auxílio-reclusão. E para ambos existe direito ao serviço social e a reabilitação profissional.[62]
No entanto, a listagem dos riscos sociais cobertos pela Lei 8.213/91, em harmonia com o artigo 201 da Constituição Federal, não exclui outros decorrentes do regime previdenciário e dos princípios constitucionais, ou, ainda, dos tratados internacionais que o Brasil seja signatário, conforme o artigo 5º, §2º, da Carta Magna.[63]
Desta maneira, é possível definir novas contingências sociais a serem protegidas pelo Estado, adequando o sistema previdenciário a realidade social, uma vez que, como lembra Vianna ao citar Ligero: “a seguridade social deve aspirar a alcançar novas realizações, a fim de seguir a evolução das necessidades e as aspirações das novas sociedades industriais”.[64]
Pois como salienta Vianna “o direito da seguridade social, e em especial o direito previdenciário, é um direito de luta, ou seja, um direito onde as garantias existentes são decorrência das conquistas dos movimentos sociais”.[65] De modo, que o direito previdenciário deve acompanhar a evolução dos direitos fundamentais, e, por conseguinte, as necessidades da população.
3 Grande Invalidez – Art. 45 Da Lei 8.213/91
Dentre os benefícios estipulados na Lei 8.213/91 – Plano de Benefícios da Previdência Social prevista na Constituição Federal de 1988, foi criado um adicional para os aposentados que sofram de “grande invalidez”, como se refere Vianna.[66]
O artigo 45 da Lei 8.213/91 versa sobre a aposentadoria valetudinária: o valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25%[67], assim, cabe trazer a legislação:
“Lei 8.213/91:
Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
Parágrafo único. O acréscimo de que trata este artigo:
a) será devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal;
b) será recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado;
c) cessará com a morte do aposentado, não sendo incorporável ao valor da pensão.”[68]
O Decreto 3.048/99, que regulamenta a Lei 8.213/91, em seu artigo 45, determina a observância de seu Anexo I, que arrola as situações em que o aposentado por invalidez possuirá direito ao acréscimo de 25%:
“Decreto 3.048/99:
Anexo 1:
1. cegueira total;
2. perda de nove dedos das mãos ou superior a esta;
3. paralisia dos dois membros superiores ou inferiores;
4. perda dos membros inferiores, acima dos pés, quando a prótese for impossível;
5. perda de uma das mãos e de dois pés, ainda que a prótese seja possível;
6. perda de um membro superior e outro inferior; quando a prótese for impossível;
7. alteração das faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social;
8. doença que exija permanência contínua no leito;
9. incapacidade permanente para as atividades da vida diária.”[69]
Cabe destacar, que este rol não é taxativo, pois existe a possibilidade de o Juiz analisar o caso conforme a doença e o grau de incapacidade do segurado para deferir o adicional, ainda que não esteja listada na relação de situações do anexo I do Decreto mencionado.[70]
Ainda, vale mencionar que a pessoa que dará assistência permanente ao segurado não precisa ser de sua família, pois se a lei não faz restrições, não pode o intérprete fazer.[71]
3.1 Realidade dos Aposentados Desamparados
Percebe-se que a legislação infraconstitucional previdenciária ao só mencionar que seria devido adicional para os aposentados por invalidez deixou desamparados os demais segurados aposentados que sejam acometidos de “grande invalidez” num momento posterior à concessão da aposentadoria espontânea, ou seja, estarão à própria sorte e do valor de sua aposentadoria, quando sofrerem algum acidente ou ficarem debilitados em razão da idade avançada. Assim, em momento crítico de suas vidas, quando passarem a necessitar de auxílio permanente de cuidadores, a Seguridade Social como responsável pela devida proteção dos seus segurados não dará condições mínimas de existência a estes que contribuíram por muito tempo para o sistema.
Savaris, neste sentido, expõe sobre o desamparo legal previdenciário de que estão acometidos os beneficiários de aposentadorias programadas ao sofrerem alguma contingência que os incapacitem para a vida independente:
“De fato, após a concessão de uma aposentadoria por idade, tempo de contribuição ou especial, a previdência social entrega o segurado ao acaso da própria sorte, fazendo extinguir o direito à proteção previdenciária adequada, concedendo um benefício que se traduz em uma cobertura previdenciária insensível a qualquer fato superveniente que reclame grau mais elevado de proteção social”.[72]
Além do mais, o aumento da expectativa de vida no Brasil eleva a possibilidade de pessoas se tornarem incapacitadas para a vida independente após a implantação de suas aposentadorias programadas, tendo como principais causas a idade avançada ou a ocorrência de doenças graves. E, embora a expectativa de vida tenha sido alterada, a legislação sobre o tema permanece inalterada, desamparando uma grande parte da população que contribuiu para a previdência social e necessita do adicional de 25% mesmo já estando aposentados.[73]
3.2 Jurisprudência Contrária à Possibilidade de Extensão do Adicional do Art. 45 Da Lei 8.213 para as Demais Aposentadorias
Vale relembrar que a legislação somente relaciona o acréscimo devido aos segurados que necessitem de acompanhamento permanente de terceiros aos aposentados por invalidez.
Assim, o INSS, órgão da administração indireta que deve respeitar a legalidade estrita dos atos administrativos, tem concedido administrativamente o adicional de 25% apenas nos casos de aposentadorias por invalidez.
Neste mesmo sentido, de observar a legalidade estrita, foi a jurisprudência majoritária por muito tempo, costumava-se negar o pedido para as demais aposentadorias de modo contumaz:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ART. 45 DA LEI Nº 8.213/91. ASSISTÊNCIA PERMANENTE. INCABÍVEL O ACRÉSCIMO DE 25% ( VINTE E CINCO POR CENTO) SOBRE O BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
1. A pretensão de recebimento do percentual de 25% (vinte e cinco por cento) previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91 a incidir sobre o valor da aposentadoria por tempo de serviço não encontra guarida no ordenamento jurídico por inexistência de previsão normativa.
2. A análise sistemática e teleológica da lei previdenciária não favorece a interpretação da parte requerente de ampliar a tutela do Estado a todos os segurados da previdência social que, por deficiência, são dependentes da assistência permanente de terceiros.
3. Como a hipótese em comento não se amolda a qualquer equívoco da Administração no ato de deferimento do tipo de aposentadoria, mas, ao contrário, trata-se da concessão do direito assegurado ao trabalhador que satisfez o período contributivo exigido ao RGPS, sem qualquer discussão acerca da higidez física ao momento do ingresso na inatividade, nada a reparar na sentença que julgou improcedente o pedido.
4. Recurso de apelação a que se nega provimento.”[74]
Ainda, corroborando este entendimento pode-se citar julgado da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. SEGURADO APOSENTADOR POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO QUE VEM A NECESSITAR DA ASSISTÊNCIA PERMANENTE DE OUTRA PESSOA. ACRÉSCIMO DE 25% PREVISTO NO ARTIGO 45 DA LEI 8.213/91. DESCABIMENTO. 1. O caput do artigo 45 da Lei 8.213/91 estabelece expressamente que "o valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25%", deixando de contemplar o benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. 2. A extensão do acréscimo de 25% aos casos de aposentadoria implicaria reconhecimento da invalidade parcial da norma, do que não se cogita, pois o reconhecimento da mácula da norma somente se justificaria no caso em apreço com base em possível afronta ao princípio da isonomia. 3. Não há igualdade entre a situação do segurado que desempenhando atividade laborativa se depara com a contingência da incapacidade, e a situação do aposentado que tempos após obter sua aposentadoria por idade, tempo de serviço ou contribuição, vem a ficar doente ou sofrer acidente. Diversas as bases fáticas, o legislador não está obrigado a tratá-los de forma idêntica. 4. A concessão do adicional no caso da denominada "grande invalidez" não é determinada pela Constituição Federal, de modo que não ofenderia a Constituição Federal a Lei 8.213/91 se não tivesse sequer criado acréscimo previsto em seu artigo 45. Não se pode, assim, afirmar que inválida a norma porque não contemplou outros benefícios que não a aposentadoria por invalidez”.[75]
Rocha e Baltazar Junior explicam que a Quinta Turma do TRF4 também utilizou o argumento de que a discriminação entre as aposentadorias foi vontade do legislador, que há motivo fático que justifica a discriminação porque a aposentadoria por invalidez é algo não esperado, não se espera a incapacidade, não se pode prevê-la, ao contrário das outras aposentadorias, que são relativamente previsíveis. Assim, a lei poderia discriminar, tratando de forma privilegiada apenas quem tenha se aposentado por invalidez, e não todo e qualquer benefício previdenciário ou toda e qualquer aposentadoria, não ferindo o princípio constitucional da isonomia.[76]
Desta forma, deve-se destacar que os aposentados, na grande maioria das vezes, tiveram seu acréscimo no benefício sumariamente negado judicialmente, não importando se a perícia médica demonstrasse a necessidade de auxílio permanente, não era levado em conta o contexto fático-social do aposentado e de sua família, afrontando gravemente os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Isonomia.[77]
3.3 Jurisprudência Favorável à Possibilidade de Extensão do Adicional do Art. 45 da Lei 8.213 para as Demais Aposentadorias
No entanto, com a colaboração da doutrina, a jurisprudência evoluiu no sentido de não se limitar à lei para analisar a aplicação do direito, passaram a considerar outros princípios constitucionais elencados na Constituição Federal de 1988.
Com efeito, o Judiciário passou a ter uma posição mais ativa, buscando utilizar todo o ordenamento jurídico para analisar os casos concretos, e, neste caso da extensão do adicional para as demais aposentadorias foram levados em conta vários princípios constitucionais e previdenciários, como dignidade da pessoa humana, isonomia, adequada prestação previdenciária, do descompasso da lei com a realidade social.
Neste sentido, cabe lembrar a tese criada pelo Juiz Federal Savaris de substituição da aposentadoria espontânea por aposentadoria por invalidez, sustentada no artigo “O princípio constitucional da adequada proteção previdenciária: um novo horizonte de segurança social ao segurado aposentado.”[78]
Assim, vale citar trecho do artigo mencionado, em que Savaris define a idéia central do princípio da adequada proteção previdenciária:
“A ideia central do princípio da justa ou adequada proteção social é a de que a atuação previdenciária deve, a todo tempo, corresponder especificamente à contingência social que cerca o beneficiário e expressar-se em um montante que se entenda suficiente a satisfazer suas necessidades para uma existência digna. Essa necessária elasticidade da cobertura previdenciária busca evitar situações de insuficiência de proteção tanto quanto de sobre proteção.
Esse é o pressuposto fundamental de um sistema de segurança social realmente comprometido com os valores que se encontram na base de sua constituição, pois hospeda um valor que lhe confere legitimidade e empresta, ademais, contornos indispensáveis para uma segurança social que se repute justa e não se resigne ao domínio da subcidadania.”[79]
Esta tese foi concretizada na decisão da 3ª Turma Recursal do Paraná, que reconheceu o direito à aposentadoria por invalidez com acréscimo de 25% a segurado já aposentado por tempo de contribuição que continuava em atividade. Em que segue a ementa:
“DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. PRINCÍPIOS DA UNIVERSALIDADE DA SEGURIDADE SOCIAL E DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE. PRECEDENTE DO STF. INCAPACIDADE SUPERVENIENTE À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACRÉSCIMO DE 25%. DIREITO DO SEGURADO APOSENTADO À SUBSTITUIÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. A universalidade da proteção social (CF/88, art. 94, I), enquanto objetivo fundamental desta política social, não pode ser iludida por norma infraconstitucional que culmine por proteger insuficientemente o direito fundamental aos meios de subsistência em situação de adversidade.
2. O princípio da proibição de proteção insuficiente assegura que o direito fundamental social prestacional não pode ser iludido pelo Poder Público, quer mediante a omissão do dever de implementar as políticas públicas necessárias à satisfação desses direitos, quer mediante a adoção de política pública inadequadas ou insuficiente (Precedente do STF na Reclamação 4.374, j. 19/11/2013).
3. É preciso interpretar a legislação ordinária de modo a evitar-se que o direito fundamental social seja esvaziado em determinadas circunstâncias e culmine, como no caso, por não guardar possibilidade de prover ao segurado os recursos materiais necessários para assegurar-lhe o mínimo existencial.
4. Se o segurado aposentado mantém a qualidade de segurado e cumpriu período de carência sabidamente superior ao exigido para concessão de um benefício por incapacidade, ele fará jus à adequação previdenciária na hipótese de superveniência dos requisitos específicos às prestações por incapacidade.
5. É devida a substituição de aposentadoria espontânea por aposentadoria por invalidez com acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento), desde que comprovada a superveniente incapacidade para o trabalho e a assistência permanente de outra pessoa (Lei 8.213/91, art. 42 c/c art , 45).
ACORDAM os Juízes da 3ª TURMA RECURSAL DO PARANÁ, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do(a) Relator(a)”.[80]
Por outro lado, a 5ª Turma do TRF da 4ª Região, evoluindo sua jurisprudência, concedeu o adicional de 25% às aposentadorias espontâneas, sem precisar substituir o benefício, reconhecendo a natureza assistencial do adicional, o caráter protetivo da norma, o princípio da isonomia, a preservação da dignidade da pessoa humana, e o descompasso da lei com a realidade social, como interpretou Nogueira.[81]
Assim como aludem os doutrinadores Rocha e Baltazar Junior, in verbis:
“Recentemente, o TRF da 4ª Região evoluiu o seu entendimento para considerar que o art. 45 contempla a hipótese mais flagrante da necessidade de apoio suplementar. Ou seja, a situação do cidadão que se aposenta por invalidez e, desde o princípio, apresenta a necessidade de receber assistência permanente. Contudo, a melhor interpretação estaria orientada pelo princípio da isonomia, em que a invalidez poderia ser decorrente de episódio posterior a aposentadoria. Assim, não se poderia excluir o acesso à proteção adicional, como forma de garantir o direito à vida, à saúde e à dignidade humana.”[82]
Sendo assim, cabe trazer a baila ementa do julgado da 5ª Turma do TRF4:
“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ART. 45 DA LEI DE BENEFÍCIOS. ACRÉSCIMO DE 25% INDEPENDENTEMENTE DA ESPÉCIE DE APOSENTADORIA. NECESSIDADE DE ASSISTÊNCIA PERMANENTE DE OUTRA PESSOA. NATUREZA ASSISTENCIAL DO ADICIONAL. CARÁTER PROTETIVO DA NORMA. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESCOMPASSO DA LEI COM A REALIDADE SOCIAL. 1. A possibilidade de acréscimo de 25% ao valor percebido pelo segurado, em caso de este necessitar de assistência permanente de outra pessoa, é prevista regularmente para beneficiários da aposentadoria por invalidez, podendo ser estendida aos demais casos de aposentadoria em face do princípio da isonomia. 2. A doença, quando exige apoio permanente de cuidador ao aposentado, merece igual tratamento da lei a fim de conferir o mínimo de dignidade humana e sobrevivência, segundo preceitua o art. 201, inciso I, da Constituição Federal. 3. A aplicação restrita do art. 45 da Lei nº. 8.213/1991 acarreta violação ao princípio da isonomia e, por conseguinte, à dignidade da pessoa humana, por tratar iguais de maneira desigual, de modo a não garantir a determinados cidadãos as mesmas condições de prover suas necessidades básicas, em especial quando relacionadas à sobrevivência pelo auxílio de terceiros diante da situação de incapacidade física ou mental. 4. O fim jurídico-político do preceito protetivo da norma, por versar de direito social (previdenciário), deve contemplar a analogia teleológica para indicar sua finalidade objetiva e conferir a interpretação mais favorável à pessoa humana. A proteção final é a vida do idoso, independentemente da espécie de aposentadoria. 5. O acréscimo previsto na Lei de Benefícios possui natureza assistencial em razão da ausência de previsão específica de fonte de custeio e na medida em que a Previdência deve cobrir todos os eventos da doença. 6. O descompasso da lei com o contexto social exige especial apreciação do julgador como forma de aproximá-la da realidade e conferir efetividade aos direitos fundamentais. A jurisprudência funciona como antecipação à evolução legislativa. 7. A aplicação dos preceitos da Convenção Internacional sobre Direitos da Pessoa com Deficiência assegura acesso à plena saúde e assistência social, em nome da proteção à integridade física e mental da pessoa deficiente, em igualdade de condições com os demais e sem sofrer qualquer discriminação”.[83]
Deve-se ressaltar que a doutrina também mostra posicionamentos favoráveis à extensão do adicional às demais aposentadorias do RGPS, como se pode perceber nas palavras dos professores Rocha e Baltazar Junior:
“Já se decidiu pela impossibilidade de concessão do acréscimo em caso de aposentadoria por invalidez anterior à lei nº 8.213/91, entendimento do qual, porém, discordamos, não havendo razão para vetar a concessão do acréscimo a partir da vigência da lei, por aplicação do princípio da isonomia. Pela mesma razão, será possível conceder o acréscimo quando a necessidade da ajuda permanente de outra pessoa for posterior ao momento da concessão do benefício, caso em que deveria ser admitida até mesmo a transformação da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez.”[84]
Ainda, podemos observar o entendimento dos doutrinadores Lazzari e Castro:
“Entendemos que os aposentados acometidos de impedimentos para as atividades elementares do cotidiano devem ter tratamento isonômico pela Previdência em relação aos aposentados por invalidez (a exemplo do que ocorre, por exemplo, no Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais com a majoração dos proventos proporcionais para integrais pela superveniência de moléstia grave – art. 190 da Lei n. 8.112/90 com a redação conferida pela Lei n. 11.907/2009) e neste sentido serem beneficiados pelas mesmas vantagens.
No caso, não se aplica a necessidade de prévia fonte de custeio (art. 195, § 5º da CF), pois no sistema não há contribuição específica para a concessão do adicional para o aposentado por invalidez.
A interpretação ao princípio da seletividade das prestações deve ser no sentido de que o adicional é devido/necessário a quem necessita do acompanhamento de terceiros independentemente da espécie de aposentadoria.
Cabe realçar que a distinção entre os beneficiários representa uma diferenciação, que se afigura intolerável, injurídico e inconstitucional, uma vez que o risco social objeto de proteção previdenciária consiste na necessidade da assistência permanente de outra pessoa, pouco importando a espécie de aposentadoria concedida.
Pode-se ainda afirmar que a não concessão do adicional aos aposentados em tais condições (que não recebem aposentadoria por invalidez) afronta a dignidade da pessoa humana, por colocar em risco a garantia das condições existenciais mínimas.
Assim, quando comprovada a necessidade pelos segurados da assistência permanente de terceira pessoa, deve ser deferido o acréscimo de 25% a todas as espécies de aposentadoria”.[85]
Os autores Bocchi Junior, Bocchi Neto e Lépore também possuem posicionamento neste sentido, como segue:
“Entendemos que há ofensa não só ao princípio constitucional geral da isonomia, mas também, e na nossa visão, principalmente, ao princípio específico previdenciário da uniformidade dos benefícios e serviços devidos às populações urbanas e rurais. Se os benefícios devem ser uniformes, então não podem ser diferentes.
Restaria a análise relativa ao custeio. O benefício por incapacidade é um dos que demandam menos contribuições (12 meses) ou até mesmo são isentos de carência.
Não tem sentido negar o acesso ao adicional de 25% ao segurado aposentado por idade, por tempo de contribuição, inclusive do professor, ou aposentadoria especial que contribuíram pelo menos, respectivamente, durante 15, 30 ou 35 e 25 anos e conceder para quem não contribuiu apenas 12 meses.”[86]
Por fim, vale citar os recentes julgamentos da Turma Nacional de Uniformização nos Processos de nº 0501066-93.2014.4.05.8502 e nº 5003392-07.2012.4.04.7205 que unificaram decisões controversas sobre o tema, decidindo pela concessão do adicional para todos os aposentados que sofram de doenças ou situações que acarretem a necessidade do auxílio permanente de terceiros. Os Juízes basearam-se principalmente no princípio da isonomia e na proteção dos deficientes, em decorrência do Brasil ser signatário da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
“EMENTA: PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. PREVIDENCIÁRIO. ADICIONAL DE 25% PREVISTO NO ART. 45 DA LEI 8.213/91. POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO À APOSENTADORIA POR IDADE. CABIMENTO. QUESTÃO DE ORDEM 20. PROVIMENTO DO INCIDENTE. RETORNO À TR DE ORIGEM. EXAME DAS PROVAS.”[87]
Os Juízes da TNU se baseando no princípio da isonomia e em uma análise sistêmica da norma concluíram que o adicional é previsto para assistir aqueles que necessitam de auxílio de terceira pessoa para a prática dos atos da vida diária, não importando se a invalidez é decorrente de fato anterior ou posterior à aposentadoria.
Afirmam que haveria uma afronta ao princípio constitucional da isonomia ao verificar que negar o adicional ao segurado inválido, que comprovadamente carece de auxílio de terceiro, apenas pelo fato de ele já se encontrar aposentado ao tempo da instalação da invalidez, seria uma desigualdade sem justo discrímen.
Ainda, mencionaram que a interpretação restritiva do dispositivo legal, dela extraindo comando normativo que contemple apenas aqueles que adquiriram a invalidez antes de obtido o direito à aposentadoria por idade ou tempo de contribuição, por exemplo, importaria em inegável afronta ao direito de proteção da dignidade da pessoa humana e das pessoas portadoras de deficiência.
Neste sentido, referiram a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que o Brasil ao ser signatário deu status constitucional às normas que visam proteger os direitos das pessoas deficientes.
4 Fundamentos da Jurisprudência Favorável à Concessão do Adicional
Para concretizar certos direitos fundamentais sociais, que são objetivos traçados pela Constituição Federal, os juízes devem tomar decisões inspiradas por princípios relevantes do ordenamento jurídico, tais como: dignidade da pessoa humana, isonomia, proporcionalidade, entre outros, os quais apresentam inegável relevância na solução dos problemas jurídicos que envolvem a previdência social.[88]
E neste sentido, a Constituição deve estar inserida num contexto político-social, em que atentando para as contingências dos riscos sociais, deve possibilitar aos operadores do direito criar condições para a satisfação das necessidades dos grupos sociais e da sociedade em geral.[89]
Pois como afirma Rocha:
“toda norma jurídica é uma espécie de instrumento forjado pelos homens com o desiderato de disciplinar determinado tipo de situação humana ou de conflito social, suscitada e condicionada em sua origem pelo contexto concreto que constitui a sua motivação. Ao intérprete incumbe promover um diálogo com a vontade objetiva da lei, conferindo sistematicidade à norma e inserindo-a de forma harmônica no ordenamento jurídico.”[90]
Tendo em vista que a interpretação da norma jurídica deve ser buscada através da Constituição, cabe destacar que a seguridade social está situada no Título VIII – Da ordem social; ou seja, é direito social, instrumento de preservação da dignidade da pessoa humana que é fundamento do Estado Democrático de Direito.[91]
Ademais, além de a Constituição Federal elencar os princípios que os operadores do direito devem levar em conta na aplicação do direito, a legislação infraconstitucional também trata sobre a interpretação, como dispõe o artigo 5º da LICC que, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.[92]
Sobre a interpretação das normas jurídicas, é como afirma Didier:
“Atualmente, reconhece-se a necessidade de uma postura muito mais ativa do juiz, cumprindo-lhe compreender as particularidades do caso concreto e encontrar, na norma geral e abstrata, uma solução que esteja em conformidade com as disposições e normas constitucionais, mormente com os direitos fundamentais.”[93]
Neste sentido, cabe expor trecho da decisão da Quinta Turma do TRF4 de relatoria do Desembargador Rogério Fraveto que tratava sobre a concessão de acréscimo ao benefício de aposentados que necessitem de auxílio permanente de terceiros:
“O descompasso da lei com o contexto social exige especial apreciação do julgador como forma de aproximá-la da realidade e conferir efetividade aos direitos fundamentais. a jurisprudência funciona como antecipação à evolução legislativa.”[94]
Desta maneira, percebe-se que a evolução do direito ocorre, principalmente, através de intérpretes jurídicos que não se restringem à legalidade, mas que observam o contexto social e, sobretudo, a Constituição Federal. De modo que, a interpretação favorável à concessão do adicional de 25% ao aposentado que necessita ou venha a necessitar de auxílio permanente de terceiro é a mais condizente com os princípios constitucionais que serão examinados.[95]
4.1 Isonomia
O princípio da Isonomia ou da Igualdade de direitos foi adotado pela Constituição de 1988, prevendo a todos os cidadãos o direito de tratamento idêntico pela lei, conforme os critérios estabelecidos no ordenamento jurídico. De modo que são permitidas certas diferenciações, pois o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, o que é vedado são as discriminações arbitrárias e incoerentes, pois o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito.[96]
Ademais, MORAES expõe que o princípio da Isonomia atua em duas frentes distintas:
“De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que se encontram em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social”.[97]
Sendo assim, a desigualdade legal ocorre quando a norma diferencie de forma não razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas. Para que as distinções normativas não sejam discriminatórias e não afrontem o princípio da isonomia, sempre deve haver uma finalidade razoável e proporcional em conformidade com os direitos e garantias protegidos e visados pela Constituição.[98]
Portanto, no caso em comento, dos segurados já aposentados que necessitam do auxílio permanente de terceiros, a igualdade só será assegurada, caso os desiguais (aposentados de forma programada) sejam tratados de forma desigual (art. 45, Lei 8.213), não tratá-los de forma igual, pelas mesmas necessidades, é confrontar este princípio.[99]
Desta forma entende o Juiz Federal Savaris, que no caso existe uma identidade fática da situação dos segurados aposentados de forma programada com os aposentados por invalidez que também são totalmente incapazes e necessitam da assistência permanente de outra pessoa. E, portanto, em razão da necessidade de recursos para subsistência e do postulado da igualdade, é justo o acréscimo postulado pelos segurados já aposentados por idade, tempo de contribuição ou de forma especial.[100]
Neste sentido, cabe mencionar trecho de acordão do TRF4:
“A aplicação restrita do art. 45 da Lei nº. 8.213/1991 acarreta violação ao princípio da isonomia e, por conseguinte, à dignidade da pessoa humana, por tratar iguais de maneira desigual, de modo a não garantir a determinados cidadãos as mesmas condições de prover suas necessidades básicas, em especial quando relacionadas à sobrevivência pelo auxílio de terceiros diante da situação de incapacidade física ou mental”.
Desta forma, não se pode admitir no Estado Democrático de Direito Brasileiro, que garante constitucionalmente o princípio da isonomia como um de seus direitos fundamentais, o tratamento desigual para pessoas que se encontram em situação igual. Assim, todo aposentado totalmente incapaz que necessitar de acompanhamento em período integral deve ter o direito a complementação de seu benefício, sob pena de afronta ao princípio da igualdade.[101]
4.2 Dignidade da Pessoa Humana
A Constituição Federal de 1988 consagrou o princípio da proteção da dignidade humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro. O legislador constituinte estabeleceu a dignidade da pessoa humana como valor fundamental do ordenamento jurídico, garantindo uma vida digna em seus diversos aspectos, seja social, espiritual, intelectual ou moral.[102]
A dignidade da pessoa humana une todos os direitos e garantias fundamentais inerentes às personalidades humanas, visa garantir o mínimo necessário fisicamente e moralmente a cada pessoa. Também garante a liberdade individual contra atos arbitrários do Estado.[103]
Moraes conceitua sucintamente o princípio da dignidade humana:
“A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.”[104]
Ainda, o doutrinador Sarlet traz sua definição da dignidade da pessoa humana:
“Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.”[105]
O direito fundamental à previdência social, previsto no caput do art. 6º da Constituição Federal, é um dos direitos sociais mais importante, extremamente ligado com a dignidade da pessoa humana, pois a previdência muitas vezes é o que garante um mínimo existencial às pessoas.
No caso dos aposentados que se tornaram dependentes de terceiros para os atos da vida, a não concessão do adicional ao benefício, é uma afronta ao princípio da dignidade humana, pois lhes retira um valor que seria utilizado para a contratação de cuidadores, não possibilitando a esses aposentados portadores de grande invalidez mínimas condições de sobrevivência, seja de ordem alimentar, física ou psíquica.
4.2.1 Direitos Humanos dos Deficientes
Além do mais, ao tratar de pessoas que necessitam de auxílio permanente de terceiros para todas as suas necessidades, estamos abordando o problema de pessoas portadoras de deficiência, que o Brasil mediante a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência se comprometeu a proteger.
Ressalta-se que esta Convenção em que o Brasil é signatário tem hierarquia no ordenamento jurídico brasileiro de Emenda Constitucional, pois se trata de um tratado sobre direitos humanos aprovado no Congresso Nacional conforme o procedimento do § 3º do artigo 5º da Constituição.
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência visa garantir o respeito à dignidade das pessoas portadoras de deficiência e busca fazer com que os Estados participantes combatam a discriminação dessas pessoas.
Analisando esta Convenção, os Juízes da Turma Nacional de Uniformização concluíram que é inaceitável que o Judiciário brasileiro mantenha uma situação de discriminação, como se pode ver do trecho do acordão colacionado:
“A referida convenção, que tem por propósito “promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente”, reconhece expressamente a “necessidade de promover e proteger os direitos humanos de todas as pessoas com deficiência, inclusive daquelas que requerem maior apoio”, em flagrante busca de minorar as diferenças existentes nos mais diversos ramos de atuação humana em detrimento dos portadores de deficiência, revelando-se inadmissível, portanto, que a lei brasileira estabeleça situação de discriminação, entre os próprios portadores de deficiência, ainda mais num campo de extrema sensibilidade social quanto o é o da previdência social.19. Em seu artigo 5.1, o Diploma Internacional estabelece que “os Estados partes reconhecem que todas as pessoas são iguais perante e sob a lei e que fazem jus sem qualquer discriminação, a igual proteção e igual benefício da lei”. Por sua vez, o artigo 28.2, e, estabelece que os “Estados partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência a proteção social e ao exercício desse direito sem discriminação baseada na deficiência, e tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar e promover a realização desse direito, tais como: assegurar igual acesso de pessoas com deficiência a programas e benefícios de aposentadoria”.[106]
Portanto, ao analisar o caso dos aposentados por contribuição ou idade que necessitam de auxílio permanente de terceiros e não recebem o acréscimo previsto no art. 45 da Lei 8.213 sob os princípios da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, percebe-se uma incompatibilidade, uma injusta discriminação que fere a dignidade humana de certas pessoas com deficiência. É ilegítimo o tratamento diferenciado a deficientes que estão na mesma situação de outros, não lhes assegurando a integridade física e moral.
4.3 Adequada Prestação Previdenciária
A previdência social ao cumprir sua finalidade de prover meios indispensáveis e suficientes para manutenção digna de seus segurados e dependentes é um dos principais instrumentos para a busca dos objetivos constitucionais de igualdade e dignidade da pessoa humana.[107]
A partir do princípio da justa e adequada proteção previdenciária, encontrado nos preceitos constitucionais, extrai-se que a previdência social deve proporcionar uma proteção que corresponda especificamente à contingência social que acomete o segurado.[108]
No sentido da especificidade de prestação do benefício que é exigida pelo princípio da adequada prestação previdenciária, cabe citar Savaris:
“Pela perspectiva da especificidade se pretende realçar a necessidade de que a proteção social previdenciária seja primeiramente adequada no sentido de que faça operar o mecanismo legal específico de cobertura para o evento que reclama a atuação da previdência social. Cada contingência é lida como requisito específico a uma determinada prestação previdenciária.”[109]
No entanto, além da obrigação da previdência atuar por meio de um mecanismo apropriado, com um benefício especificamente ligado à contingência social, exige-se também que a proteção previdenciária seja suficiente, de modo que alcance sua finalidade, qual seja, a de prover meios sem os quais o segurado não teria sua existência digna assegurada.[110]
Sobre a necessidade de a proteção previdenciária ser suficiente, Savaris expõe que:
“Pela perspectiva da suficiência, a ênfase é posta na adequação do nível de proteção e não na espécie do benefício (ou na concessão do benefício adequado). O nível do benefício, isto é, a sua renda mensal, deve ser suficiente, de acordo com os limites das prestações do RGPS, para que a previdência social cumpra a finalidade de realmente providenciar os meios indispensáveis que assegurem a manutenção digna de seus beneficiários quando da ocorrência das contingências sociais.”[111]
Portanto, percebe-se que para se obter uma adequada prestação previdenciária a proteção social deve estar de acordo quanto à especificidade e quanto à suficiência dos benefícios, pois se o benefício não cobrir a contingência social determinada ou não for suficiente para garantir um mínimo existencial aos segurados, a previdência social terá falhado em seu propósito constitucional.[112]
Desta forma, não será suficiente a proteção previdenciária quando o aposentado que necessitar de assistência permanente de um terceiro não receber o adicional de 25%, porque sem tal valor o segurado não terá condições de contratar um cuidador e também manter todos os gastos médicos que sofre um portador de uma grande invalidez, de maneira que é praticamente impossível para ele garantir sua sobrevivência.
Além do mais, a concessão de um benefício previdenciário não pode significar o fim do direito fundamental a uma justa cobertura previdenciária. Pois ainda que o benefício concedido seja uma aposentadoria, não isenta a previdência social de prosseguir cumprindo o dever fundamental de proteção adequada a seus segurados. De maneira que ao ocorrer uma grave contingência com o segurado, seja, por exemplo, em razão de acidente ou do avanço da idade, deve-se alterar a espécie de cobertura e também o nível de proteção social.[113]
Neste sentido, afirma Savaris:
“A ideia de proteção justa, aliás, traz o pensamento de que a previdência social deve atuar se for verificada a necessidade, isto é, diante da ocorrência e permanência de uma contingência social. Alterando-se os fatos, a cobertura previdenciária deve ser adaptada (modulada), podendo cessar ou, ao contrário, ser intensificada.”[114]
Portanto, o direito à proteção social justa, um dos fundamentos da seguridade social, não se extingue com a concessão de um benefício previdenciário e não se completa com a prestação adequada exclusivamente ao tempo da data de início do benefício. Assim, no caso do segurado já aposentado espontaneamente que for acometido de uma moléstia grave que o torne dependente de uma terceira pessoa para realizar os atos da vida civil, independentemente de o fato ser anterior ou posterior à aposentadoria, será devido um acréscimo que lhe garanta condições mínimas de subsistência.[115]
Conclusão
A questão-problema buscou orientar o desenvolvimento do trabalho sobre a possibilidade, no Direito Pátrio, de conceder aos já aposentados por idade ou contribuição, que passarem a necessitar de auxílio permanente de terceiros, o adicional previsto no artigo 45 da lei 8.213/91.
Esta hipótese foi confirmada no presente artigo, pois além de ser possível a concessão do adicional, foi observado também que é um dever do Estado e do Poder Judiciário para com os segurados garantir tal prestação. Chegou-se a esta conclusão a partir da análise da evolução do direito fundamental à previdência social no Brasil e do exame das mais novas jurisprudências pátrias, que consagram importantes princípios constitucionais que norteiam todo nosso ordenamento jurídico.
Inicialmente, foi determinado o conceito de previdência social, como sendo um seguro social mantido essencialmente através de contribuições dos trabalhadores e de toda sociedade, com a finalidade de garantir aos segurados e seus dependentes meios de subsistência quando eles não puderem alcançá-los.
E, observou-se que em qualquer sistema de previdência social o conceito é basicamente sempre o mesmo, podendo haver variação somente sobre a cobertura pessoal e o plano dos benefícios, ou seja, o que pode ser alterado são os riscos sociais abrangidos pelo sistema para adequá-lo à realidade social.
Portanto, cabe a cada sociedade eleger a melhor forma de proteger a sua população contra as consequências dos riscos sociais, conforme os objetivos constitucionais de seguridade social.
Neste sentido, foi definido que riscos sociais são os infortúnios naturais que ocorrem na vivência humana, causadores de perda da capacidade laborativa, gerando impossibilidade de obtenção dos víveres familiares.
Tais riscos sociais que assolam os indivíduos, que são componentes de um todo, se transferem para toda a coletividade. De modo que tais eventos são mais que meros infortúnios particulares, são riscos que devem ser superados por toda a sociedade.
Assim, a partir da ideia da superação de um estado de necessidade por meio do empenho coletivo que surgiram os primeiros projetos de proteção social.
Percebe-se que desde a Idade Média os seguros contra contingências sociais evoluem conforme as necessidades da população. Sendo que mais tarde, também em razão das necessidades da população, miséria e opressão, em grande parte por causa de levantes dos trabalhadores, o Estado foi obrigado a garantir o direito à previdência social, e sucessivamente aumentar os direitos dos trabalhadores e os riscos sociais a serem abrangidos pelo sistema.
Desta forma, compreendeu-se que o direito previdenciário é um direito de luta, que deve sempre se adequar a realidade social, de modo, que o sistema deve estar aberto para cobrir novas contingências.
Foi exposto que os riscos sociais cobertos pelo sistema brasileiro, listados pela legislação infraconstitucional, podem ter sua cobertura ampliada para uma melhor adequação à realidade. Pois, a Constituição de 1988 diz que podem ser eleitos outros riscos sociais a serem cobertos pela previdência social em decorrência do regime previdenciário e dos princípios constitucionais, ou, ainda, dos tratados internacionais que o Brasil seja signatário.
Ao analisar a lei 8.213/91, que rege os benefícios previdenciários no Brasil, viu-se que o adicional previsto para os aposentados que sofram de grande invalidez e necessitem do auxílio permanente de terceiros só é previsto literalmente para os aposentados por invalidez. Notou-se que o legislador esqueceu de muitos idosos já aposentados que contribuíram para a previdência por muitos anos, deixando-os desamparados, sem o provimento de condições mínimas de existência quando acometidos por uma moléstia grave que os faça necessitar do auxílio permanente de cuidadores.
Além do mais, foi visto que por muito tempo a jurisprudência foi conservadora, estando restrita a legalidade, não concedendo tal adicional de modo contumaz.
No entanto, a jurisprudência evoluiu, passando a considerar outros princípios constitucionais elencados na Constituição Federal de 1988, como da Isonomia, Dignidade da Pessoa Humana, Direitos Humanos dos Deficientes e Adequada Prestação Previdenciária.
Foram vistas as mais novas jurisprudências de tribunais federais e principalmente da TNU uniformizando o entendimento jurídico nacional de acordo com a hipótese deste trabalho, de possibilidade de concessão do adicional de 25% do artigo 45 da Lei 8.213 para os demais aposentados por tempo de contribuição, por idade e de forma especial.
Confirmou-se estes entendimentos ao verificar que os Juízes não devem estar restritos a lei escrita ao aplicar o direito, devendo se basear principalmente nos princípios constitucionais.
Neste sentido, ao analisar os fundamentos da jurisprudência, foi abordado o princípio da Isonomia, chegando-se a conclusão de que a negativa do adicional para segurados já aposentados, que se encontram na mesma situação dos aposentados por invalidez, seria uma afronta a tal princípio, pois trataria pessoas que estão em igualdade fática de forma desigual.
Ademais, foi analisado um dos princípios que serve de base essencial para todos os direitos fundamentais, inclusive o da seguridade social, o princípio da dignidade da pessoa humana. Verificando-se que a falta do adicional de 25% ao benefício, que deveria ser provido pela previdência social, no caso, um valor que seria utilizado para a contratação de cuidadores para os aposentados que necessitam, não garante aos segurados as mínimas condições existenciais, seja de ordem alimentar, física ou psíquica, de forma que confronta o mencionado princípio, que busca garantir uma vida digna para cada ser humano.
Além do mais, destacou-se que o Brasil ao ser signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência elegeu normas que protegem os deficientes e proíbem a discriminação e o desamparo dos que mais necessitam ao nível constitucional, de modo, que negar o acréscimo ao benefício dos aposentados que necessitam de auxílio permanente de terceiros, além de ir contra os direitos humanos internacionais dos deficientes, também fere a Constituição Nacional.
Também, foi observado que a negativa do adicional é contrária a Adequada Prestação Previdenciária, pois a lei não é específica ao risco social devido e insuficiente ao não prover condições mínimas ao segurado aposentado que sofre de grande invalidez. Ainda, foi verificado que a não continuidade de cobertura das contingências que acometem o segurado após a concessão de aposentadoria é incompatível com os objetivos constitucionais de uma prestação previdenciária adequada.
Assim, restou configurado que além de ser possível conceder o adicional, como já vem sendo feito por nossa jurisprudência pátria, negá-lo é uma afronta aos direitos fundamentais e aos objetivos de nossa sociedade atual, traçados na Constituição Federal de 1988.
Informações Sobre o Autor
Luiz Felipe Germani Ferreira
Formado em Direito na Faculdade de Direito de Santa Maria – FADISMA. Especialista em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal no Rio Grande do Sul em convênio com a Universidade de Caxias do Sul