A possibilidade dos embargos infringentes em ação penal originária no Supremo Tribunal Federal

Resumo: Acirrou-se a discussão sobre a possibilidade da oposição do referido recurso na Ação Penal 470 que julga a responsabilidade dos que ali são réus no caso conhecido como Mensalão. Decerto que a lei 8.038/1990 de fato ao regular o processamento das Ações Penais Originárias não mencionou em seu texto a possibilidade da oposição de Embargos Infringentes.como deve ser entendido o silêncio da lei é a reflexão objeto deste artigo.

Embargos infringentes, é o recurso através do qual o acusado, em razão de votação apertada, tem direito a uma espécie de rediscussão em torno da improcedência do seu pleito, em relação à matéria objeto de divergência. Trata-se de recurso exclusivo da defesa em matéria penal, visa a segurança jurídica, a fim de conferir ao provimento jurisdicional certeza quanto a sua pretensão, ou seja, em razão do acórdão ser extraído de profundas discussões com votos dissonantes, quis o legislador que o tribunal pudesse analisá-lo novamente, para confirmá-lo ou reestudar a decisão. Está previsto no Código de Processo Civil art. 530, No Código de Processo Penal art.613, e no Regimento Interno do STF art. 333. Este último abaixo transcrito.

“Art. 333. Cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou da Turma:

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I – que julgar procedente a ação penal.

Parágrafo único. O cabimento dos embargos, em decisão do Plenário, depende da existência, no mínimo, de quatro votos divergentes, salvo nos casos de julgamento criminal em sessão secreta.”

Muito vem se discutindo, sobre a possibilidade da oposição do referido recurso na Ação Penal 470, que julga a responsabilidade dos que ali são réus no caso que se fez afamar pela alcunha de Mensalão. Decerto, que, a lei 8.038/1990, de fato, ao regular o processamento das Ações Penais Originárias, não mencionou em seu texto a possibilidade da oposição de Embargos Infringentes.

O sobredito silêncio da lei, não deve, entretanto, apressar conclusões. A lei 8.038/1990, se por um lado não prevê os Embargos Infringentes, também não os vedou, e fez mais, a referida lei, especificamente no seu art. 12, menciona que:

“Art.12. Finda a instrução, o Tribunal procederá ao julgamento, na forma determinada pelo regimento interno”.

Ora, ao afirmar, que finda a instrução prevalecerá o RISTF, o legislador está evidentemente, deixando claro até onde pretendeu disciplinar, resta cristalino, notório como o sol do Nordeste a pino, parafraseando o saudoso ministro Ayres Britto, que quis apenas ordenar a instrução, não se manifestando sobre o momento posterior a mesma, quiçá dizer que estabeleceu proibições ou vedações recursais de qualquer natureza, muito pelo contrário, a norma é expressa em afirmar que findando-se a instrução que é o objeto a ser regulado , sobrevém o regimento interno.

O art. 2º § 1º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro determina que:

“Art.2º § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.”

Os que pretendem a rejeição dos embargos aduzem que a lei 8.038 /90 de acordo com o dispositivo acima citado, revogou ao regimento interno do RISTF. Ousamos aqui discordar, no que pese as vozes dos mais autorizados mestres. Para uma corrente o RISTF é incompatível com a referida lei a exemplo de Lênio Streck, e o Relator do processo Joaquim Barbosa, não faz sentido, tal assertiva, no que pese o relevo dos autores em comento.

O que é incompatibilidade entre leis? É simplesmente regramentos antitéticos, colidentes, impossível de coexistência, exemplo: se uma lei ou um regimento interno fixa o prazo de uma hora para a sustentação oral do advogado, posteriormente advém uma nova lei que afirma que o advogado terá o tempo de uma hora e meia nos tribunais, está revogado o regimento ou a lei antiga pela lei posterior, passando o tempo de exposição ser o de uma hora e meia.

A lei 8.038/90, não fala em Embargos Infringentes, podemos apenas afirmar o seu silêncio, porém não é possível detectar incompatibilidade na medida em que não havendo manifestação não pode haver contraposições, muito menos incompatibilidades, a incompatibilidade pode ocorrer ainda, quando mesmo não dispondo sobre o tema de modo diverso a lei possuir qualquer espécie de comando totalmente contrário a alguma pretensão escorada em lei anterior. Assim, se a lei 8.038/90 afirmasse por exemplo: que finda a instrução não cabe mais recursos, estaríamos de fato diante de uma disposição contraria a um levante recursal, o que não constitui a hipótese.

Impende ainda avultar que o próprio STF já interpretou a omissão da lei 8.038/90 como mero silêncio e nada mais, uma vez, que a mesma também não prevê os Embargos de Declaração, indaga-se: porque os mesmos estão sendo julgados? A resposta é simples, porque nesta hipótese o STF interpretou corretamente, aplicou o RISTF depois da instrução, ao invés de ousar extrair do mero silêncio a hipótese de vedação, o que pretende fazer apenas com os Embargos Infringentes, caindo portanto em contradição irremediável. Restaria, portanto, inexplicável, a razão de dois recursos Aclaratórios e Infringentes ambos inexistentes na lei 8.038/90, ao primeiro ser dado o devido processamento, e ao segundo em situação de total semelhança, afirmar o seu incabimento, por razão que não foi hábil a obstar o primeiro.

O segundo argumento trazido pela ex ministra do STF e não menos ilustre Ellen Gracie, é a defesa da regulação plena da matéria pela lei 8.038/90 que não faz alusão a Embargos infringentes, uma vez que uma lei regula uma matéria ou um procedimento por completo, aquilo que a lei portanto não menciona não pode se constituir em faculdade recursal das partes. É por isso que os recursos existentes no em processo penal são os elencados no Código de Processo Penal, em um processo civil os que estão previstos no Código de Processo Civil etc…

Tal argumento, no que pese a eminência da nobre ministra, se mostra vulneravel, primeiro, cumpre assinalar que a matéria de fundo é Processo Penal, logo assiste ao acusado todas as garantias contidas no Código de Ritos Penais Brasileiro, segundo, de acordo com seus próprios termos, a lei não regulou a matéria por inteiro, regulou apenas a instrução, e não os recursos, a mesma admite que o disciplinamento após o fim da instrução ficará a cargo do RISTF carece ainda na a linha argumentativa adotada pela nobre ministra explicar a razão pela qual estão sendo julgados os Embargos de Declaração, que igualmente, não estão previstos na lei 8.038/90.

Além dos argumentos acima expostos, devemos nos lembrar que em caso de dúvida não se deve priorizar a interpretação que restrinja direitos, não é aconselhável nesta hipótese o estreitamento da ampla defesa por via de mera interpretação. “Aonde o legislador não restringiu, não cabe ao interprete fazê-lo.”


Informações Sobre o Autor

Hedler de Jesus Andrade

Advogado Criminal especialista em Direito Administrativo mestrando em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade Federal de Sergipe.


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