Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução histórica e legislativa da adoção no Brasil e no mundo. 3. Adoção internacional e a proteção incondicional e irrestrita à criança e ao adolescente diante da problemática do tráfico internacional. 4. A evolução da legislação brasileira sobre adoção internacional. 5. Conclusão.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o objetivo de ressaltar algumas alterações legislativas que trouxeram a segurança tão esperada aos processos de Adoção Internacional.
Para tanto, destaca-se a evolução da própria concepção da adoção, instituto que originalmente atendia unicamente aos interesses dos adotantes, e que atualmente prioriza os interesses do adotando.
Destaca-se ainda, a necessária criação de medidas contra o tráfico internacional de crianças, e de regras que hoje permitem um melhor acompanhamento e fiscalização do processo, antes, durante e após a sua realização.
2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGISLATIVA DA ADOÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO
A adoção sofreu grandes modificações com o passar dos anos. Essas alterações decorreram da própria evolução da concepção de família e do reconhecimento dos direitos da criança e do adolescente.
Originalmente, o instituto surgiu para suprir a falta de descendentes, garantindo a continuidade do culto doméstico e o repouso dos antepassados. Esse objetivo é relatado na obra de Fustel de Coulanges, que ressalta “o dever de perpetuar o culto doméstico foi o princípio do direito de adoção entre os antigos”. [1]
O costume de se dar e receber crianças para que outras pessoas as cuidassem, foi uma prática muito conhecida e utilizada entre as civilizações da Antiguidade. Esta prática foi utilizada inicialmente em virtude da religião e, depois, foi se tornando tão habitual que houve a necessidade que tal atividade deveria ser regulamentada como instituto jurídico que hoje se conhece como adoção.
Um dos primeiros registros sobre a Adoção está no Código de Hamurabi, aplicado ao povo babilônico. A adoção, regulada por esta Lei, caracterizava-se pela criação de alguém como filho, com a transmissão do nome e ofício, sempre com a permissão de retorno do adotado à família biológica.
Outra referência antiga sobre a Adoção encontra-se nas Leis de Manu, que deixam bem claro o objetivo de utilização da adoção como recurso para garantir a continuidade do culto doméstico e suprir a falta de herdeiros.
Em Roma a adoção não perdeu o objetivo de perpetuação do culto doméstico, mas atendia também a outras necessidades da família romana, como a sucessão, por exemplo. O adotando passava a integrar a nova família, extinguindo-se os vínculos com a família natural.
Na Idade Média houve um declínio do instituto da adoção em decorrência de princípios cristãos. Segundo, Maria Cláudia Crespo Brauner[2], a adoção no período medieval caiu em desuso por influência dos princípios religiosos, que pregavam o nascimento de um filho como benção divina, e por outro lado, a esterilidade como castigo. Para a Igreja Católica, os castigados com a esterilidade deveriam se conformar e jamais recorrer a adoção para suprir a falta de descendentes.
Mas foi com as grandes revoluções ocorridas na Idade Moderna que o instituto da adoção renasceu na sociedade ocidental, em razão do grande número de crianças e adolescentes largados a própria sorte. Segundo ensinamento de Maria Cláudia Crespo Brauner[3], o marco foi o Código de Napoleão de 1804, que inspirado no Direito Romano fez renascer o instituto da adoção como ato jurídico capaz de estabelecer o parentesco civil entre duas pessoas.
No Brasil, todas essas alterações do instituto não passaram despercebidas. No período colonial, as regras eram ditadas pelas Ordenações do Reino de Portugal: Ordenações Manuelinas, Afonsinas e Filipinas, que introduziram no Brasil os requisitos para a adoção, seguindo as influências da Legislação vigente em Portugal.
Mesmo após a Independência, o Direito Civil Brasileiro não era ainda sistematizado em uma legislação própria. Nesta época, vigoravam no Brasil, para regular o Direito Civil, as Ordenações Filipinas. Só com a promulgação do Código Civil de 1916, o Direito Brasileiro passou a ser sistematizado e ter uma legislação escrita e própria regulando diversos institutos, entre estes, o da adoção disciplinado nos artigos 368 à 378.
Pelo Código Civil de 1916, a adoção tinha restrita aplicação, pois só poderiam adotar os maiores de 50 anos, sem descendentes legítimos ou legitimados, exigindo-se, para tanto a diferença de 18 anos entre adotando e adotado
Com as limitações do Código Civil de 1916, tornou-se necessária a alteração dos requisitos para a ampliação das possibilidades de adoção.
Assim, em 1957, foi promulgada a Lei n° 3.133, modificando o Código Civil vigente à época, alterando dispositivos legais sobre a adoção. Esta Lei trouxe importantes modificações pois reduziu a idade dos adotantes de 50 para 30 anos, reduziu a diferença de idade entre adotantes e adotados, de 18 para 16 anos, e eliminou a exigência de inexistência de prole.
Esta modificação legislativa foi importante para a reformulação da adoção, que, a partir desta lei, poderia ser utilizada por adotantes que tivessem filhos biológicos, deixando de lado a idéia de que o instituto servia para suprir a falta de filhos.
Além disso, esta lei introduziu outro requisito, o consentimento do adotando maior, ou dos representantes legais, em caso de menores. Esta modificação representou importante passo, pois garantiu a preservação dos direitos dos demais envolvidos, e não somente dos adotantes.
Anos depois, entrou em vigor a Lei n° 4.655, de 1965. Esta lei introduziu no ordenamento jurídico brasileiro outro avanço: a legitimação adotiva, que estabelecia um vínculo entre adotando e adotante, muito semelhante ao da família biológica.
Apesar dessas alterações legislativas, fez-se necessária a criação de um Código específico com o objetivo de disciplinar o referido instituto e outras questões relativas aos menores.
Assim, em 1979 entrou em vigor a Lei n° 6.697, sendo denominada de “Código de Menores”. Esta lei criou a adoção plena, que substituiu a legitimação adotiva, não revogando, contudo, o Código Civil de 1916, que continuava a regular a adoção simples.
Em suma, na vigência do Código de Menores, o ordenamento brasileiro admitia duas espécies de adoção: a plena e a simples, esta última podia ser realizada por escritura pública e gerava efeitos mais restritos no tocante ao vínculo estabelecido entre adotante e adotado.
Profundas alterações no instituto ocorreram somente após o advento da Constituição Federal de 1988, que consagrou a proteção a criança e o adolescente com a Doutrina da Proteção Integral fundada no Princípio da Prioridade Absoluta e garantiu a igualdade entre filhos de qualquer origem, com a proibição de qualquer forma de discriminação com base no art. 227 da Constituição Federal.
Tal proteção intensifica-se no ordenamento jurídico brasileiro com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que revogou o Código de Menores, criando e disciplinando com mais atenção toda a matéria envolvendo menores.
O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado para regulamentar as normas constitucionais, com o objetivo de assegurar e proteger a criança e o adolescente. O Estatuto eliminou as espécies de adoção (simples e plena), que foram unificadas em uma só.
O referido Estatuto regulamenta a adoção nos artigos 39 à 52 aplicada à todos os menores de 18 anos em qualquer situação, sem levar em conta a sua situação irregular, como previa o revogado Código de Menores.
Não existem mais espécies de adoção com efeitos limitados, hoje a adoção é única, é irrevogável e estabelece o vínculo de filiação entre adotado e adotante(s), extinguindo os vínculos do adotado com a família biológica (salvo para impedimentos matrimoniais). O filho adotivo é integrado a nova família com os mesmos direitos que são garantidos a qualquer outro filho, de qualquer origem.
Até 2009, a adoção estava regulada, também, pelo Código Civil Brasileiro de 2002, nos artigos 1618 à 1629. Quase todos os dispositivos sobre a adoção foram revogados pela Lei Nacional da Adoção, que também modificou o texto do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Trata-se da Lei n° 12.010, de 03 de agosto de 2009, denominada de Lei Nacional da Adoção que traz às crianças e adolescentes adotados tanto por brasileiros quanto por estrangeiros, mais segurança e fiscalização no trâmite processual.
Com relação a Adoção Internacional, a Lei n° 12.015 de 07 de agosto de 2009 trouxe maior rigor e segurança para as crianças e adolescentes que são encaminhados ao exterior. Esta lei complementa as regras introduzidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que à época foram responsáveis pela redução dos casos de tráfico internacional de menores, crime que entre os anos de 1988 a 1992 estava muito ligado às adoções internacionais fraudulentas.
3 ADOÇÃO INTERNACIONAL E A PROTEÇÃO INCONDICIONAL E IRRESTRITA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE DIANTE DA PROBLEMÁTICA DO TRÁFICO INTERNACIONAL
A adoção internacional é uma medida excepcional e irrevogável de colocação de crianças e adolescentes em família substituta. Tal medida somente poderá ser utilizada como último recurso para inserir uma criança em uma família de nacionalidade distinta do adotando, sempre primando pelo princípio do melhor interesse da criança.
No passado, escândalos e denúncias surgidas nos meios de comunicação relacionando a adoção internacional com o tráfico internacional de crianças e adolescentes chamaram a atenção para a necessidade de regras mais rigorosas e fiscalização nos processos de adoção, para garantir maior segurança as crianças e adolescentes enviados ao exterior.
Assim foi feito, pois, nos anos seguintes, diversas convenções internacionais foram aprovadas com o objetivo de garantir os direitos das crianças e adolescentes e inibir adoções internacionais fraudulentas e o tráfico de menores. A legislação brasileira incorporou as medidas e princípios estabelecidos nas convenções ratificadas, proporcionando, assim, segurança e credibilidade a adoção internacional, antes fragilizada pelas constantes notícias que denegriam a imagem desse instituto.
Três Convenções sobre o tema merecem destaque nesta evolução: A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – 1989, a Convenção de Haia de 1993 e a Convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de Menores, de 1994.
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança surgiu face a necessidade de se reconhecer a dignidade da criança e a prioridade de seus interesses. Esta Convenção foi aprovada na Assembléia Geral das Nações Unidas, na data de 20 de novembro de 1989, e posteriormente ratificada no Brasil, pelo Decreto n° 99.710 de 21 de outubro de 1990.
A Convenção visa à proteção dos direitos de todas as crianças, enfatizando a prioridade do interesse da criança, e os direitos fundamentais que devem ser respeitados para o pleno e harmonioso desenvolvimento de sua personalidade.
Destaca-se que, mesmo antes da aprovação da Convenção sobre Direitos da Criança, os princípios do melhor interesse da criança e proteção integral, já haviam sido incorporados ao direito brasileiro pela Constituição de 1988, que neste ponto foi regulamentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 1990). A proteção integral e prioritária é garantida no artigo 227 da Constituição Federal:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Poucos anos depois, foi firmada a Convenção de Haia, em 1993, criada com a finalidade de estabelecer medidas para garantir a segurança e o atendimento dos direitos fundamentais da criança nas adoções internacionais, assim como prevenir o seqüestro e o tráfico de menores.
Em 1994, com o objetivo de regular os efeitos civis e penais do tráfico de menores, foi assinada a Convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de menores. Esta Convenção estabeleceu mecanismos para proteger toda a criança e adolescente vítima do tráfico, criando medidas de prevenção e punição para as possíveis vítimas dos traficantes.
João Delciomar Gatelli explica que
“As Convenções trazem, em seu bojo, um conjunto de medidas e procedimentos que, paulatinamente, com a sua ratificação ou adesão, é incorporado na legislação dos Estados. Elas representam, atualmente, de forma ampla, uma perspectiva de convergência de legislações internas que garantem ao adotado por estrangeiros não residentes direitos e garantias iguais ou semelhantes as que encontraria em seu país de origem”.[4]
Felizmente a legislação brasileira sobre o tema seguiu este caminho. A Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente são reconhecidas mundialmente como Leis avançadas e que recepcionaram os princípios e medidas estabelecidos na Convenção Internacional dos Direitos da Criança e a Convenção Relativa a Proteção e a Cooperação em matéria de adoção internacional – Haia 1993.
A legislação brasileira e os instrumentos internacionais referidos integram a legislação protetiva que hoje garante a segurança na adoção internacional, prevenindo a utilização do instituto para o tráfico internacional de crianças e adolescentes e enfatizando os direitos fundamentais da criança e adolescente que devem ser preservados nos processos de adoção.
4 A EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE ADOÇÃO INTERNACIONAL
No Brasil, a adoção internacional é regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que a define no seu artigo 51, como aquela postulada por pessoa ou casal domiciliado fora do Brasil. Recentemente, a Lei 12.010 de 2009, conhecida como Lei Nacional da Adoção alterou a redação do Estatuto da Criança e do Adolescente, definindo a Adoção Internacional e estabelecendo novas regras.
O inciso I do §1° do artigo 51 do Estatuto, que determina que a adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro ou domiciliado no Brasil somente será realizada quando restar comprovado que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto. Para tanto, no caso de adotando adolescente, deve-se consultá-lo sobre a medida (inciso III).
Esta regra demonstra a preocupação com o bem-estar e interesse do adotando, princípio que fundamenta a legislação que hoje reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de direito, que devem ter sua dignidade respeitada.
Por conseqüência, garante-se ao adotando o direito de manifestação sobre a sua colocação em família substituta. Garante-se, ainda, o direito de convivência familiar, incentivando a utilização de todos os recursos para sua manutenção na família biológica e encaminhamento para adoção somente quando isto não for mais possível. Incentiva-se ainda a manutenção dos vínculos entre irmãos, quando a adoção for inevitável.
Como se sabe, a adoção extingue o poder familiar dos pais biológicos. Assim se não há consentimento dos pais biológicos para a realização da adoção, deve-se recorrer ao processo de destituição do poder familiar.
Alguns anos atrás, brechas na lei facilitavam o trabalho dos aliciadores, que encaminharam muitas crianças ao exterior por meio de adoções internacionais simuladas. Os traficantes de menores se aproveitavam da miséria para obter o consentimento de algumas mães e pais, ou utilizavam a carência como fundamento para destituição do poder familiar e encaminhamento daquelas crianças a adoção.
Hoje, a destituição do poder familiar não pode ter fundamento exclusivo na falta de recursos da família, pois o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe expressamente essa situação:
“Art. 23: A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar.
Parágrafo único: Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.”[5]
Essa alteração é apenas uma das medidas que trouxe mais segurança aos processos de adoção, especialmente adoção internacional, evitando que a família natural seja penalizada com a perda do poder familiar, simplesmente por ser carente.
A perda ou a suspensão do poder familiar só devem ocorrer nos casos em que a família natural se desinteresse ou abandone o filho. A perda é a sanção mais grave aplicada aos pais que descumprem os deveres inerentes ao poder familiar. As crianças cujos pais foram destituídos do poder familiar serão encaminhadas para colocação em família substituta, por meio dos institutos da guarda, tutela ou adoção.
Aliás, conforme já mencionado, a retirada da criança da família biológica deve ocorrer em último caso, conforme o entendimento de Maria Claudia Crespo Brauner:
“A colocação em família substituta, em qualquer de suas formas (guarda, tutela e adoção), corresponde, na atualidade, a uma medida de proteção (art. 101, inciso VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente), aplicada quando se mostrar inviável a manutenção da criança junto à família natural. No caso específico da adoção, tratando-se de adotando adolescente, o seu consentimento será indispensável (art. 45, § 2°, do Estatuto da Criança e do Adolescente).”[6]
Somente quando não for possível a manutenção da criança ou adolescente na sua família natural, é que a adoção será pensada como alternativa. Com base no inciso II do artigo 51 do Estatuto, a adoção internacional é uma alternativa a ser considerada somente após esgotadas as possibilidades de colocação da criança em família substituta brasileira, mesmo assim, os brasileiros residentes no exterior terão preferência aos estrangeiros (§ 2°, artigo 51).
Essas alterações destacam o caráter excepcional da colocação da criança em família substituta estrangeira, conforme o dispositivo do artigo 31: “ A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção.”[7]
O objetivo é garantir a manutenção da criança ou adolescente em seu país de origem, preservando, assim, sua cultura e facilitando a adaptação.
Como a adoção internacional é exceção, serão encaminhadas para o exterior aquelas crianças e adolescentes que não são adotados no Brasil. Por conseqüência, pesquisas demonstram que os estrangeiros são responsáveis por um número maior de adoções tardias, ou de irmãos, ou de crianças e adolescentes com problemas de saúde, pois no Brasil ainda prevalece a busca por crianças recém nascidas, com determinadas características, como destaca Rolf Madaleno:
“Viceja no Brasil uma preferência por crianças recém nascidas, de saúde perfeita, com notória predileção por menores de tez clara e de olhos azuis, enquanto inúmeros estrangeiros interessados na adoção de brasileiros desconsideram essas exigências, e como dispõem na mais das vezes, melhores condições financeiras, maior acesso à saúde e à educação, podem proporcionar aos adotados uma formação privilegiada e integral.”[8]
Diante da preferência dos brasileiros por bebês, uma pesquisa comentada por Lidia Natalia Dobrianskyj Weber, demonstra que a adoção internacional garante às crianças de mais idade, maiores chances de integração em família substituta.
“Comparando-se os brasileiros com os estrangeiros pode-se verificar que, enquanto a maioria dos adotantes estrangeiros (55,5%) aceitava adotar crianças com mais de 2 anos, realizando adoções tardias, somente 4% dos adotantes brasileiros apresentou a mesma disponibilidade. Parece claro, portanto, que as crianças brasileiras com mais de 2 anos têm uma chance muito maior de encontrarem uma família, se casais estrangeiros habilitarem-se no Brasil.”[9]
A autora supramencionada explica os motivos dos dados apresentados na pesquisa:
“Essa diferença também pode ser explicada pelo fato de que, pela legislação vigente (ECA), a preferência é sempre dada aos casais brasileiros, ou seja, casais estrangeiros não podem adotar crianças que são adotáveis aqui no Brasil. Provavelmente, os estrangeiros sabem que se não forem mais flexíveis, aceitando crianças maiores, será muito mais difícil para eles realizarem o sonho de ser tornarem pais. Apesar desta situação, vale ressaltar que, para os estrangeiros, o fato de ter um filho é muito mais importante do que ter um bebê”.[10]
O §3° do artigo 51 determina que “A adoção internacional pressupõe a intervenção das Autoridades Centrais Estaduais e Federal em matéria de adoção internacional.” O procedimento tem início no exterior, onde os candidatos estrangeiros serão cadastrados por uma Agência especializada e autorizada e que contata as autoridades nacionais para a realização do processo (Artigo 52, I, ECA). A lei só permite a adoção internacional a candidatos oriundos de países signatários da Convenção de Haia.
O artigo 52 do ECA, introduzido pela Lei 12.010 de 2009, prevê detalhadamente todas as etapas, desde o cadastramento, até a aprovação da adoção pelas autoridade brasileiras.
Lidia Natalia Dobrianskyj Weber esclarece o procedimento de cadastro de candidatos estrangeiros através de uma Agência de Adoção Internacional:
“O candidato estrangeiro pode realizar sua adoção por intermédio de uma Agência de Adoção Internacional e só comparecer ao Brasil no momento em que é providenciado o encontro com a criança. Entretanto, não é obrigatória a intermediação das associações para a adoção, basta que o candidato esteja habilitado junto ao órgão oficial de adoção no seu país ou no estrangeiro”.[11]
Passada a fase de habilitação dos adotantes junto ao órgão responsável, é necessária a preparação dos candidatos para o encontro com o adotando, e vice-versa, esse encontro é pessoal, não se admite a adoção por procuração (art.39, §2°, ECA). Para isto, existe um grupo interdisciplinar preparado para acompanhar e orientar os envolvidos.
Uma fase essencial no processo de Adoção Internacional é o estágio de convivência, pois além da inserção em nova família, a criança ou adolescente terão que se adaptar a nova língua e uma nova cultura. Com relação ao cumprimento do estágio de convivência a Lei 12.010, introduziu a seguinte alteração no art. 46 do ECA:
“Art. 46: A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso.
§1° O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente par que seja possível avaliar a conveniência da constituição do vínculo.
§2°A simples guarda de fato não autoriza, por si só, a dispensa da realização do estágio de convivência.
§3°Em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de no mínimo, 30 (trinta) dias
§4°O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso acerca da conveniência do deferimento da medida.”[12]
De acordo com o novo dispositivo legal passa-se a ter somente um prazo fixado de estágio de convivência independentemente da idade da criança adotada. Diferentemente do que antes se aplicava, quando a lei previa prazos diversos dependendo da idade da criança adotada.
Lídia Natalia Dobrianskyj Weber relata os resultados de uma pesquisa realizada sobre o estágio de convivência e da adaptação das crianças adotadas:
“Com relação ao Estágio de Convivência que não é dispensado ao adotante estrangeiro, observou-se durante este período que 53% apresentaram uma boa adaptação: O relacionamento afetivo entre eles está favorável, havendo clara manifestação de carinho e muita disponibilidade de afeto. A menina demonstrou um ótimo entrosamento com o casal, apresentando um clima harmonioso entre os mesmos. Ela mostra-se feliz com o fato de poder ter um novo lar. É uma criança educada, comunicativa, alegre e com facilidade para conversar e expressar suas idéias. A adaptação está adequada e expressou ter afeto e satisfação por iniciar uma nova vida; 30% apresentaram dificuldades no início que foram superadas: Durante os primeiros dias o menino apresentava reações agressivas, ele é uma criança sem limites para nada, hiperativo, no começo se jogava no chão, rolava e chorava quando queria que lhe comprassem algo, como se mostravam indiferentes, deixou de agir assim. Aos poucos os comportamentos dele vêm mudando para melhor. Ele se alimenta bem e tem um sono tranqüilo.”[13]
A importância do estágio de convivência não se limita a aproximação e adaptação entre adotantes e adotandos. O estágio é mais um requisito que garante o objetivo da adoção internacional, que é a integração segura de criança ou adolescente em família substituta estrangeira, pois permite a avaliação dos adotantes por profissionais do Brasil que avaliarão se os candidatos estão aprovados para adotar.
A saída do adotando do território nacional somente será admita após o trânsito em julgado do processo, mediante alvará judicial que autorizará a emissão do passaporte e a viagem para o país onde passará a residir (art. 52, §§8º e 9º, ECA). A Autoridade Central Federal Brasileira poderá, a qualquer momento, solicitar informações sobre a situação das crianças e adolescentes adotados (art. 52, §10, ECA).
Não há dúvidas de que a adoção internacional tornou-se uma alternativa segura e confiável em razão da evolução da legislação que regulamenta o procedimento da adoção internacional.
5 CONCLUSÃO
Pela análise da evolução legislativa sobre a adoção verifica-se que, com o tempo, os requisitos do instituto foram sendo alterados para permitir a utilização do instituto com o objetivo de garantir o sonho da maternidade e paternidade por um número maior de adotantes.
Os efeitos da adoção também foram alterados pela legislação que evoluiu a ponto de garantir aos filhos adotivos os mesmos direitos dos filhos naturais.
Hoje, a adoção deve ser aplicada não só para garantir direitos dos adotantes, devendo ser observado no processo o melhor interesse dos adotandos.
A preocupação com o bem-estar do adotando, e a constatação de inúmeros casos de adoções fraudulentas para a realização do tráfico internacional, fez com que regras fossem introduzidas para garantir a segurança na adoção internacional.
Atualmente, diante do rigor da legislação, pode-se afirmar que a adoção internacional não é mais utilizada com o objetivo de captar crianças para serem traficadas no exterior.
Aliás, a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989, a Convenção de Haia de 1993 e a Convenção Interamericana sobre o Tráfico internacional de menores foram criadas com o objetivo de barrar as negligências e violências ocorridas contra a criança e o adolescente.
Além disso, a uma forte fiscalização e controle dos órgãos conveniados que realizam a adoção internacional, ou seja, são a eles que casais estrangeiros interessados em adotar uma criança ou adolescente de outra nacionalidade deverão dirigir-se e cadastrarem-se como possíveis pais para uma determinada criança.
Os casais estrangeiros também serão avaliados com o escopo de verificar se realmente estão aptos para a adoção, e só depois com toda a documentação pertinente poderão vir buscar a criança designada, não antes de passar por um estágio de convivência a ser cumprido no território da criança.
Com o intuito de trazer mais credibilidade ao instituto, ainda, após efetivada a adoção internacional, é de responsabilidade da agência credenciada internacional acompanhar por um certo período toda a adaptação da criança no seu novo lar e repassar os relatórios para o Juizado da Vara de Infância e Juventude brasileira.
Finalizando, não resta dúvida que a adoção internacional, hoje, é uma alternativa de colocação de criança e adolescente em família substituta estrangeira perfeitamente segura e sem riscos para a criança, pois a fiscalização e o controle dos órgãos responsáveis impede a utilização do instituto para outros fins.
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