Resumo: Este trabalho apresenta um reflexão acerca do trabalho da mulher, levando em consideração as significativas conquistas, e as inegáveis lutas ainda enfrentadas com mais frequência do que é realmente conhecido. Fazendo uma análise, sobretudo, das modificações que a legislação trabalhista tem passado, afim de ajustar-se aos avanços dos direitos da mulher em sentido amplo. As discussões aqui presentes baseiam-se em pesquisas bibliográficas, como também baseiam-se em dados estatísticos repassados pela ONU.[1]
Palavras-chave: Trabalho feminino. Igualdade de gênero. Discriminação. Direitos da mulher.
Abstract:This paper presents a reflection on women's work, taking into account the significant achievements and the undeniable struggles still faced more often than is actually known. Doing an analysis, especially, about the changes that the labor is legislation has passed in order to adjust to the advancements of women's rights in a broad sense. The discussions here today are based on literature searches, as well as based on statistical data passed by the UN.
Keywords:Female Labor.GenderEquality.Discrimination.Rightsofwomen.
Sumário: Introdução. 1. Breve digressão históricada evolução dos direitos das mulheres no âmbito da educação e do trabalho. 2. Atuação estatal na proteção do trabalho da mulher. 3. Importantes diferenças existentes no ambiente de trabalho. Conclusão. Referências.
Introdução
Assistimos, no atual cenário mundial, o crescimento dos direitos e das conquistas femininas em diversas áreas. No contexto nacional, recentemente vimos algumas aprovações de projetos de lei com o intuito de conceder maiores direitos e proteção a mulher, como por exemplo a tipificação da conduta do feminicídio, que segundo Russel e Radford (1992), seriam os homicídios intencionais e violentos de mulheres em decorrência de seu sexo, ou seja, pelo fato de serem mulheres.[2]
Sob críticas e alguns protestos, as mulheres têm conseguido se afirmar cada vez mais em suas comunidades, em todos os âmbitos de suas vidas, por exemplo a conquista da capacidade civil das mulheres, do direito ao sufrágio, ao estudo e ao trabalho.
O presente artigo tem como objetivo suscitar a reflexão quanto ao que já foi alcançado e o que ainda precisa de afirmação, com a atenção voltada aos direitos das mulheres em relação ao trabalho, fazendo uma avaliação da discriminação e preconceito em suas várias formas de manifestação. Levantando os prejuízos e os benefícios de uma atuação estatal quando se incube de proteger o trabalho feminino.
Inicialmente, foram levantados dados históricos a respeito das conquistas dos direitos femininos, com ênfase no trabalho e a educação, com a finalidade de se analisar os avanços e o que ainda precisa ser discutido, pois o trabalho conquistado e protegido legalmente nem sempre garante o devido bem estar que se espera da profissionalização. A saúde mental – também importante para uma vida profissional plena tem sido prejudicada, entre muitos grupos de trabalhadores, e com relação ao trabalho feminino, esse fator se dá devido ao acúmulo de tarefas (trabalho, filhos, casa, estudos, vida pessoal e etc), e também pelo já mencionado preconceito e discriminação enfrentada pelas mulheres. A busca por melhores qualidades de trabalho se faz importante sobretudo para a integridade física do indivíduo.
As mulheres são as mais afetadas com doenças trabalhistas, as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e os Distúrbios Osteomusculares (Dort)[3] são exemplos de doenças que vem agravando a saúde dos trabalhadores inclusive a das mulheres.
“Em geral, não são facilmente diagnosticadas – o que prejudica o processo de tratamento – e afetam sobretudo trabalhadores do sexo feminino, das mais variadas atividades, com maior incidência entre os dezoito e trinta e cinco anos. Parece até que, pelo encolhimento do mercado de trabalho, as lutas dos trabalhadores restringem-se apenas à sobrevivência, assim como o quadro histórico encontrado no início do século passado, em que a luta era para não morrer, não importando o preço que teria de ser pago… viver como um estado apenas emergencial.” [4]
“A relação entre saúde mental e trabalho tem recebido atenção crescente nas últimas décadas devido às várias mudanças ocorridas no ambiente de trabalho com o advento da globalização. Entre essas mudanças estão a intensificação do trabalho, a alta produtividade, o avanço tecnológico e a precarização das relações de trabalho que têm resultado em ampliação significativa no número de trabalhadores com problemas de saúde, estresse e burnout.”[5]
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, da legislação, de dados históricos e dados atualizados da Organização das Nações Unidas à respeito do tema tratado. Discutido as diferenças existentes entre o trabalho masculino e feminino, as necessárias e as que não são, a importância de se combater a discriminação para a sociedade como um todo e o que precisa ser feito para melhorar e efetivar a proteção do trabalho da mulher.
1 Breve digressão históricada evolução dos direitos das mulheres no âmbito da educação e do trabalho
Desde o início da história da humanidade, a mulher exerce atividades fundamentais ao desenvolvimento da comunidade a qual está inserida, e na sociedade como um todo, contribuindo inclusive com a construção de toda a História.Ao tempo em que buscava a afirmação dos seus direitos, como contribuinte inegável dos avanços da humanidade, a mulher continuava a colaborar com esse crescimento histórico. Veremos alguns dos momentos em que marcaram o profundo sentimento de busca por essa afirmação dos direitos da mulher.
A busca pela igualdade em direitos se inicia com a procura pela instrução. Visto que, para se obter melhores posições sociais, a mulher precisava de ter conhecimento, não somente daquilo que já lhe era imposto, mas o conhecimento necessário para se inserir como determinante em uma sociedade, de forma mais expressiva, ou seja, buscava saber algo mais com a finalidade de uma futura profissão, ou apenas por querer ter conhecimento, e de uma independência financeira.
Essa conquista se deu lentamente, ganhando notoriedade em 1792 na Inglaterra quando Mary Wolstonecraft escreve um dos grandes clássicos da literatura feminista “A Vindicationoftherightsofwomen”, que defendia uma educação para meninas que aproveitasse seu potencial humano, porque antes disso, tinha a educação para moças que as ensinava a serem boas donas de casa, apenas.
No Brasil, em 1827 surge a primeira legislação relativa à educação de mulheres; a lei admitia meninas apenas para as escolas elementares, não para instituições de ensino mais adiantado como faculdades. Não contente com essa limitação, a brasileira Nísia Floresta, do Rio Grande do Norte, defendia mais educação e uma posição social mais alta para as mulheres, lança uma tradução livre da obra “A Vindicationoftherightsofwomen” de Mary Wolstonecraft.
Mesmo após essa busca por melhorias na educação para as mulheres no Brasil do século XIX, ainda em 1874 quem sonhava com o ensino superior tinha que se ausentar do país, Maria Augusta Generosa Estrella deixou o Rio de Janeiro para estudar medicina nos Estados Unidos. Ingressou três anos mais tarde no New York Medical Collegeand Hospital for Women. A ela se juntou uma segunda jovem, Josefa AguedaFelisbella Mercedes de Oliveira. As duas publicaram, depois, um jornal em New York: "A mulher". Apenas em 1879 o Governo Brasileiro abriu as instituições de ensino superior do país às mulheres; mas as jovens que seguiam esse caminho eram sujeitas a pressões e à desaprovação social, assim como, as que optavam por estudar no exterior também enfrentava, repressão social e até mesmo familiar.
As mulheres trabalhavam mesmo sem muita instrução, sem muito estudo, desempenhava funções de operárias, pois os altos cargos, ou até mesmo os de chefia se reservava aos homens, aqueles que podiam se graduar.
Em 8 de março de 1857 em Nova York, 129 operárias morrem queimadas numa fábrica têxtil, em Nova York. Elas ousaram reivindicar redução da jornada de trabalho de 14 para 10 horas diárias e o direito à licença-maternidade, dentre outros. Esse foi o marco internacional na luta contra a limitação dos direitos sociais das mulheres, incluindo os trabalhistas; O contexto anterior era caótico, ainda sentimos algumas dificuldades como por exemplo, a dificuldade de conciliar uma longa jornada de trabalho com a maternidade, ainda imposta quase que exclusivamente aos cuidados femininos, mas naquele momento as mulheres sem nenhuma perspectiva de melhores condições trabalhistas, preferiam se submeter a qualquer situação, mesmo que as privasse completamente de seus direitos.
Mais tarde foi instituído o 8 de março, Dia Internacional da Mulher, em homenagem a essas mulheres.
As primeiras mulheres que se formaram em Direito no ano de 1880, encontraram dificuldades em exercer a profissão, apenas nove anos depois uma mulher, Myrthes de Campos, foi admitida no Tribunal de Justiça Brasileiro, para defender um cliente.No ano de 1887, Rita Lobato Velho Lopes tornou-se a primeira mulher a receber o título de médica, no Brasil. As primeiras médicas encontraram, também assim como as que se formaram em Direito, muitas dificuldades para se afirmar profissionalmente e estiveram sujeitas a situações constrangedoras. Alcançado o direito de ingresso ao ensino superior, era o momento de vencer a discriminação e o preconceito, naquele momento o que seria alcançado era meramente a possibilidade de exercer a profissão, mas algumas opiniões preconceituosas ainda norteiam a nossa sociedade atual.
Em 1922 é instituída, no Rio de Janeiro, sob a liderança de Bertha Lutz, a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Três anos após, o Governador do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine, obteve uma alteração da legislação eleitoral para conceder, enfim, o direito de voto às mulheres no Rio Grande do Norte, mesmo assim não obtiveram sucesso. Elas foram às ruas, mas seus votos foram anulados pela Comissão de Poderes do Estado. No entanto, foi eleita uma prefeita, a primeira da História do Brasil: Alzira Soriano de Sousa, no município de Lages, no mesmo estado, por ironia, ou por consequência de muita revolução. Elas continuaram ainda sem participar do sufrágio, em 1932 Governo de Getúlio Vargas promulgou o novo Código Eleitoral pelo Decreto nº 21.076, garantindo finalmente o direito ao sufrágio universal, consequentemente o direito de voto às mulheres brasileiras, e no ano posterior nas eleições para a Assembleia Constituinte, foram eleitos 214 deputados e uma única mulher: a paulista Carlota Pereira de Queiroz, iniciava um novo momento na história das conquistas femininas.
A escritora francesa Simone de Beauvoir publica, no ano de 1949, o livro "O segundo sexo", uma análise da condição da mulher. Em 1951 aprovada pela Organização Internacional do Trabalho, a 19 de junho, a Convenção de Igualdade de Remuneração entre trabalho masculino e trabalho feminino para função igual. O Reino Unido aprova a igualdade salarial apenas em 1970.
No Sri Lank (Antigo Ceilão),SirimavoBandaransiketorna-se a primeira mulher chefe de Estado, em 1960. Na argentina em 1974, Izabel Perón torna-se a primeira mulher presidente. Em 1979, Eunice Michilles, então representante do PSD/AM assume a vaga de Senadora, por falecimento do titular, tornando-se a primeira mulher a ocupar o cargo, no Brasil. Seu mandato, de 8 anos, terminou em 1987. Júnia Marise foi a primeira eleita para o cargo, em 1990. Na Islândia, em 1980, VigdisFinnbogadottir tornou-se a primeira mulher eleita democraticamente presidente.
No Brasil em 1971 um grupo de mulheres liderado por Romy Medeiros se reúne no Restaurante da Mesbla, no Rio de Janeiro, para estudar uma estratégia visando comemorar um dia das mulheres, já que o Governo militar da época proibia a comemoração do 8 de março. Sugeriram a criação do dia 30 de abril, data de nascimento da pioneira Gerônima Mesquita, mineira de Leopoldina (MG) que chegou a servir na 1º Guerra Mundial. A data passou a ser comemorada em 1980.
Em 1979 acontece a Convenção contra todas as formas de discriminação contra a mulher. Os Estados que firmaram a Convenção, entre eles o Brasil, condenaram a discriminação contra as mulheres, em todas as suas formas. E concordaram em buscar, através de todos os meios apropriados e sem demora, uma política adequada para combater as distorções. Um ano após, acontece o Encontro Feminista de Valinhos, São Paulo. Recomenda a criação de centros de autodefesa, para coibir a violência contra a mulher. Surge o lema: "Quem ama não mata". Ganha fôlego o SOS-Mulher, que se traduziria, em seguida, na criação de delegacias especiais de atendimento à mulher – DEAM's.
Criados em São Paulo e Minas Gerais os primeiros conselhos estaduais da condição feminina, para traçar políticas públicas para as mulheres, em 1983, ano da criação PAISM – Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher, pelo ministério da saúde, resultado da forte mobilização empreendida pelos movimentos feministas no final dos anos 70 e início dos 80. O PAISM surgiu fundamentado nos princípios mais importante do modelo de assistência: o da integralidade do corpo, da mente e da sexualidade de cada mulher.
Surge em 1985, a primeira Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher – DEAM, em São Paulo e, rapidamente, várias outras são implantadas em outros Estados brasileiros. Com a Nova República, as experiências das mulheres nos Estados são levadas ao âmbito federal. A Câmara dos Deputados aprova o Projeto de Lei no 7353, que criou o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. Em 1987 foi criado o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do Rio de Janeiro – CEDIM/RJ, a partir da reivindicação dos movimentos de mulheres, com a atribuição de assessorar, formular e fomentar políticas públicas voltadas para a valorização e a promoção feminina, através do Decreto no 9906, de 6 de maio de 1987. Atualmente é vinculado ao Gabinete Civil da Governadoria.
No início da década de 90, o Fórum Nacional de Presidente de Conselhos da Condição e Direitos da Mulher conseguiu diversos avanços acompanhando as ações do Congresso Nacional, estando articulado com os movimentos de mulheres para encaminhamento de projetos de lei. Junto aos Ministérios, o fórum encaminhou propostas de políticas públicas em favor das mulheres. Mantinha contatos formais com agências especializadas, organismos e fundos das Nações Unidas. Ano em que Júnia Marise é a primeira eleita para o cargo de Senadora, pelo PDT/MG.
Inicia-se nos anos seguintes, a participação ativa das mulheres na conferências internacionais versando direitos em prol das mulheres, e de outras questões sociais. Em 1993 na Áustria, Conferência de Direitos Humanos de Viena. Repúdio e condenação veemente a todas as formas de violência contra as mulheres. Durante o evento, a violação de Gênero assume o mesmo estatuto que outras violações brutais dos direitos humanos como o genocídio, a limpeza étnica, as torturas, a discriminação racial e o terrorismo; A violência contra as mulheres sairia de uma menor atenção, de mera questão filosófica, para algo que deveria ser discutido de forma imediata, ganhou o reconhecimento da urgência que sempre existiu. No Egito em 1994, a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento. As mulheres participaram ativamente, marcando sua presença e reivindicações nos documentos finais, demonstrando a capacidade de autoafirmação feminina. Inicia-se a articulação das mulheres brasileiras para a redação do documento reivindicatório para a IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher, realizada em Beijing, China, no ano seguinte. Foram realizados 91 eventos, envolvendo mais de 800 grupos femininos em todo o País. Na China realizada a IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher. Marcou o reconhecimento definitivo do papel econômico e social da mulher; Abriu os caminhos do futuro, consagrou todas as conquistas das mulheres – o princípio da universalidade dos direitos humanos, o respeito à especificidade das culturas, o fim da desvalorização da violência contra a mulher em todas suas formas: social, familiar e trabalhista.[6]
2 Atuação estatal na proteção do trabalho da mulher
A Constituição Federal de 1988 trouxe em seu texto referente aos direitos sociais e a proteção ao trabalho, a seguinte norma:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;"[7]
Por se tratar de uma norma de eficácia limitada pragmática, a lei que deveria tornar-se um instrumento em favor da proteção efetiva ao trabalho feminino é dispositivo inerte, em alguns aspectos, pois o legislativo e o executivo têm demorado na criação de políticas públicas, incentivos e leis. Não se pode negar, que foram editadas algumas leis afim de regulamentar o dispositivos. Porém, em vinte sete anos poucas modificações nesse âmbito tiveram uma real aplicação práticachegando a serem aprovadas.
“Observe que sem a edição de norma infraconstitucional o intento do legislador, com inequívoco intuito de proceder a tutela de um bem jurídico em estado de hipossuficiência ou desigualdade de fato, com vistas à almejada igualdade maior preconizada no art. 5.º, I, da CF/88, que ainda não se tornou realidade plena, redunda em profundo vazio. O dispositivo apenas cria uma obrigação ao legislador, que ao se omitir, torna inócuo o comando constitucional.”[8]
Neste sentido, foram criadas as leis nº 9.029/95 e a nº 9079/99,projeto de lei de autoria da Deputada Federal Rita Camata, promulgado em 26 de maio de 1.999, inseriu novos artigos no capítulo III da CLT, que trata da proteção ao trabalho da mulher.
A criação de novas leis que possibilita uma maior proteção à empregada, não soluciona o problemas sozinhas, se faz necessário uma aplicação conjunta de uma série de fatores, a saber:1) Incentivos governamentais de contratação efetivos, como temos o exemplo do direito ao salário-maternidade das empregadas gestantes, que é pago pelo estado. Apesar da nova lei majorar o benefício da gestante ao afastamento de 12 semanas para 120 dias, durante o afastamento a gestante receberá pelo estado, e não pelo empregado, numa tentativa de proteger o trabalho da mulher, afim de que o empregador não sinta-se prejudicado.
Houve uma enorme revolta por parte dos empresários, que não concordaram com a nova lei, inclusive questionando o período de estabilidade da gestante. Sobre isso, é importante que haja um maiores incentivos por parte do estado, afim de amenizar esses impactos financeiros aos empregadores.2) Criação de políticas públicas voltadas ao amparo a mulher empregada.3) Trabalhos de conscientização da população, com a finalidade de coibir e reprimir o preconceito e a discriminação.
Neste sentido, no combate à discriminação temos a lei 9.029/95 à qual foi criada com intuito de amenizar os conflitos ocasionados após a promulgação da constituição de 1988, que garante o direito a estabilidade da mulher gestante. Com o intuito de desviar-se da concessão dos direitos as empregadas gestantes, os empregadores passaram a solicitar atestado negativo de gravidez para as ingressantes no emprego, ou da comprovação de esterilização tanto dessas como para as atuais empregadas que pretendiam manter seu emprego. Além de fazerem uso de controle de natalidade de suas empregadas ou de ingressantes, atos discriminatórios e constrangedores, que violam diversos princípios, dentre eles o da dignidade da pessoa humana.
A referida lei passou a criminalizar as condutas punindo a pessoa física, do representante legal da empregadora e também do dirigente, direto ou por delegação, de órgãos públicos e entidades das administrações públicas direta, indireta e fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que solicitasse teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez.[9]
“Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.
Art. 2º Constituem crime as seguintes práticas discriminatórias:
I – a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez;
II – a adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que configurem;
a) indução ou instigamento à esterilização genética;
b) promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados através de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS).
Pena: detenção de um a dois anos e multa.”[10]
A questão do protecionismo das lei de que tratam do trabalho da mulher, tem suscitado conflitos a respeito dessas leis. Em uma situação de contratação, nada obsta que o empregador escolha dentre um homem e uma mulher, o homem, mesmo diante de inúmeras qualificações da mulher, com a intenção de se resguardar. Vemos que a lei, sozinha, não produz resultados positivos e eficazes. Uma vez que a lei surge para propor uma igualdade, resolver um conflito social, tem-se que nesse ponto, não está conseguindo satisfazer o pressuposto da justiça e igualdade sociais.
Neste sentido, temos a opinião de Sérgio Pinto Martins:
“A Lei 9.029/95 vai desestimular a empresa a contratar mulheres, em função de suas proibições. Em vez de proteger, irá desproteger a obreira, impedindo a admissão de trabalhadoras. Na verdade, em vez de se proteger o mercado de trabalho feminino da mulher, mediante incentivos específicos (art. 7.º, XX, da Constituição), aqui se está desprestigiando a contratação de mulheres pelo empregador, que não poderá exigir exame médico da mulher para admiti-la, o que poderá ser interpretado em prejuízo da própria trabalhadora. Pode a referida lei trazer como consequência o desemprego de mulheres. Enfim, a lei é que está prejudicando o trabalho da mulher, acabando afinal por discriminá-la indiretamente.”[11]
Outra lei importante que deve-se mencionar é a Lei 9.799/99, projeto de lei de autoria da Deputada Federal Rita Camata de 26 de maio de 1.999, que visa a proteção do trabalho da mulher coibindo práticas discriminatórias – como por exemplo, a proibição de revistas íntimas às empregadas – e garantindo o acesso ao emprego assim como as condições gerais de trabalho da mulher. A lei se destina a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher.[12] Além de proibir a exigência de atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez para admissão ou permanência no emprego, trouxe novos artigos para o capítulo III da CLT, incluindo na sua base outros direitos ao trabalho da mulher e modificando o que trazia a lei 9.029/95.
“Da Duração, Condições do Trabalho e da Discriminação contra a Mulher
Art. 373A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:
I – publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir;
II – recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível;
III – considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional;
IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego;
V – impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez;
VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.
§ 4o É garantido à empregada, durante a gravidez, sem prejuízo do salário e demais direitos:
I – transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem, assegurada a retomada da função anteriormente exercida, logo após o retorno ao trabalho;
II – dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares.’"[13]
Não houve derrogação tácita, no que tange a matéria tratada na lei anterior e a lei 9.799, pois o texto da referida lei não regulamentou inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. E ainda assim, vale a lei mais benéfica para o réu que no caso será a 9.799/99 que prevê apenas pena pecuniária de 2 a 20 valores-de-referência regionais para a infração de qualquer dispositivo do capítulo “Da Proteção do Trabalho da Mulher” no passo em que a Lei 9.029/95 previa pena de um a dois anos de prisão e multa. No momento em que a referida lei beneficiou a mulher empregada, trouxe um pena mais branda que a lei anterior, buscando o equilíbrio, visto que a primeira lei ocasionou muitas insatisfações. É necessário que se proteja a mulher no trabalho, porém deve-se preservar o trabalho da mulher, isso que o legislador intencionava ao equilibrar na lei 9.799/99.
Outro direito a mulher empregada está ligado a maternidade, que foi usada por muito tempo na tentativa de barrar a mulher no mercado de trabalho, já que esta detinha a responsabilidade apenas de gerar e cuidar dos filhos. Porém, muitas mulheres eram as mantenedoras de suas casas tendo que trabalhar para sustentar seus filhos, portanto precisavam de um amparo diferenciado, já que não poderiam se abster do período gestacional nem do emprego.
Com a finalidade de proteger essas mulheres e seus filhos, a legislação previu diversos direitos como a dispensa para realizar consultas e exames, troca de função se necessário e amamentação. A constituição Federal de 1988 trouxe em seu texto a estabilidade desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto, e majorou a licença maternidade de 84 dias para 120 semanas.[14] Além de garantir o direito ao salário durante o afastamento sendo pago pelo INSS, o que tira do empregador a impressão de que o trabalho feminino é mais oneroso do que o masculino, como já mencionado.
“As diferenças biológicas entre os sexos, para efeitos de previdência social, ligam-se primordialmente à reprodução. Cabendo à mulher, na procriação, funções como a gestação e a amamentação dos filhos, as quais demandam tempo e cuidados médicos durante a gravidez e no período pós-natal. É, então, vista como natural a existência de benefícios diferenciados que assegurem proteção à mulher no desempenho dessas funções.
Esses mecanismos de proteção podem abranger diversas áreas, tais como: estabilidade no emprego durante a gravidez e no período pós-natal; afastamento do trabalho no período perinatal; vencimentos parciais ou integrais garantidos durante o período de afastamento; ajudas de custo para as despesas de parto; serviços de saúde antes, durante e depois do parto etc. Podem ser expressos em instrumentos legais de diversos níveis: constitucional, infraconstitucional, normativas de órgãos governamentais e de esferas centrais ou locais.[15]
Com o advento da lei 10.421 de 15 de abril de 2002, esse direito à estabilidade foi estendido as mães adotivas, em consequência ao princípio da igualdade. Sendo adotado o seguinte sistema: crianças até um ano, a mãe adotiva terá direito a 120 dias de licença; crianças entre 1 e 4 anos, geram o direito a 60 dias; e crianças entre 4 e 8 anos, 30 dias de licença.[16]
3 Importantes diferenças existentes no ambiente de trabalho
Além das diferenças biológicas e consequentemente as diferenças na proteção jurídica, estas últimas que são necessárias para se obter a igualdade e a justiça, que segundo Aristóteles: “Devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade.”Portanto, essa diferenciação é necessária. Passaremos para algumas diferenças que insistem em permanecer, porém não configuram uma situação de igualdade e tão pouco deveriam existir.
No contexto mundial, podemos identificar que o problema das diferenças desnecessárias presentes no ambiente de trabalho da mulher e do homem, tem tomado uma dimensão preocupante, além de incomodar os envolvidos – no caso, as mulheres, que ainda buscam igualdade de tratamento, mesmo com tantos avanços na história da humanidade, prejudicam toda a sociedade que ao não conferir igualdades de salários, igualdade de tratamento e igualdade nas contratações, acabam por contribuir com o mundo obscuro da pobreza, criminalidade, prostituição, dentre outros. A não garantiadessa igualdade, sozinha não garante a ocorrência desses fatores, mas contribui.
As mulheres são as maiores vítimas do tráfico humano, em 2013 no exterior foram registrados 62 casos de brasileiros traficados a maioria mulheres, esse alarmante número são de mulheres seduzidas por propostas de emprego no exterior, sendo esta apenas uma das consequências decorrentes dessa problemática, elas acabam tornando-se prostitutas e até mesmo mortas para venda de órgãos no mercado negro. [17]
O que contribui para que isso ocorra é a preferência na hora da contratação por empregados do gênero masculinopois terão menos direitos a serem concedidos, e além disso, existe outro fator que está ligado diretamente ao contexto social da mulher, como por exemplo, a maternidade,que passou a ser objeto de uma análise cuidadosaquando terá de ser conciliada com o trabalho, ou a mulher quando não consegue conciliar os dois acabatendo que escolher entre o trabalho e a maternidade.
A questão da diferenciação social ainda é outro fator tema de desigualdade muito criticado no contexto mundial. Essa desigualdade não decorre do fato de se realizar tarefas distintas, ou como no caso dos artistas, por se tratar de um ator mais popular ou que desempenhe um “papel” de destaque, estamos falando de privilegiar o trabalho masculino em detrimento do trabalho feminino.
“Em todo o mundo, mulheres ganham em média o equivalente a 77% do salário recebido por homens, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Mas a diferença de salários baseada no gênero pode ser abismal para artistas de Hollywood. A atriz Amanda Seyfried, que ficou famosa por seu papel em “Meninas Malvadas”, disse ter recebido apenas 10% do salário de seu colega em um filme de grande orçamento.”[18]
Recentemente tivemos o caso da atriz vencedora do Oscar 2015, Patricia Arquette que fez a seguinte declaração a respeito das diferenças salariais entre os atores e atrizes de Hollywood:
“A cada mulher que deu à luz, a cada cidadão e contribuinte desta nação, nós lutamos pelos direitos iguais de todos. É nossa hora de termos igualdade salarial de uma vez por todas e direitos iguais para mulheres nos Estados Unidos da América”, disse em seu discurso de agradecimento. A atriz Meryl Streep a aplaudiu em pé.[19]
Essas desigualdades que não se fundam em diferenças funcionais estão presentes em quase todas as áreas profissionais, manifestando-se de diferentes formas. Quando as desigualdades não se constroem dentro da remuneração, temos a questão do preconceito ou do tratamento desigual que favorece um lado, o masculino, que teria “maiores aptidões e habilidades” para determinadas profissões, segundo os percussores do discurso de que existem profissões para homens e outras profissões para mulheres.
Na polícia militar e civil as mulheres policiais encontram dificuldade para exercer sua profissão, para ter acesso a postos de comando em suas carreiras e enfrentam preconceito relacionado ao gênero dentro da corporação, existe uma falsa igualdade nas oportunidades internas, porém impede que os altos cargos da profissão sejam ocupados por elas.
O preconceito limita a atuação dessas mulheres, que chegam a mencionar que existe um certo direcionamento da mulher policial ao administrativo, pois segundo elas “a rua é um ambiente de natureza masculina”. Além disso, as mulheres policiais enfrentam constrangimentos relacionados a piadinhas com conotações sexuais, por serem mulheres, ou ainda tem que todos os dias provarem suas habilidades afim de evitar críticas relacionadas ao seu gênero, sentem-se pressionadas e provocadas, pois os homens policiais não admitem que mulheres possam realizar as tarefas “masculinas” tão bem quanto eles.
Sobre a sua experiência na polícia militar, uma policial fez a seguinte afirmação:“As minhas experiências dentro da polícia são desagradabilíssimas com relação a ser mulher, como policial nem tanto, mas como mulher eu posso discorrer sobre várias histórias tanto minhas quanto de minhas amigas.”[20]
A Organização das Nações Unidas tem realizado pesquisas e trabalhos sobre discriminação contra mulheres na lei e na prática e tem alertado sobre a invisibilidade dos danos causados às mulheres tanto no âmbito trabalhista dos negócios como no comercial. Os dados mostram que as mulheres têm contribuído ativamente com o crescimento e desenvolvimento das empresas onde atuam, o que propicia o desenvolvimento dos países onde estão.
Atualmente, menos de 10% são chefes de departamentos dos bancos centrais e apenas 4,8% desempenham funções de diretora executiva nas empresas listadas na Fortune 500, revista que anualmente apresenta uma compilação das 500 maiores empresas do mundo com base em sua receita.[21]
Segundo a ONU, as mulheres mesmo sendo mais instruídas e com o grau de escolaridade mais elevado que os homens, ainda se encontram numa posição desfavorável, incompatível com seu currículo profissional.
“O relatório — “Igualdade de Gênero e Crescimento Econômico no Brasil” — trabalha com leis hipotéticas de equiparação salarial de gênero e consequentemente o aumento da renda familiar. Com maiores ganhos consegue poupar mais, o que traz um impacto direto no crescimento econômico e na arrecadação de impostos, segundo o estudo. Além disso, uma arrecadação mais alta pode dar origem a mais investimentos em saúde e educação. ‘Em longo prazo, a redução da desigualdade de gênero ajuda a melhorar a saúde das mulheres e traz um aumento de 0,15 ponto percentual na taxa de crescimento do produto’, dizem o Vice-Presidente do Banco Mundial, Otávio Canuto, e o professor da Universidade de Manchester (Reino Unido), Pierre-Richard Agénor, autores do relatório.”[22]
Outro estudo feito pela ONU apresentou o relatório “Progresso das Mulheres no Mundo 2015-2016: Transformar as economias para realizar os direitos” reafirmando a existência de diferenças salariais, mostrou que as mulheres atualmente estão recebendo cerca de 24% a menos que os homens para desempenhar as mesmas funções. Além disso traz outros apontamentos:
“O estudo mostra que 50% das mulheres com idade para trabalhar fazem parte da população ativa. No caso dos homens, o índice é 77%. A pesquisa revela que, em todas as regiões, as mulheres fazem quase duas vezes e meia mais trabalho doméstico e de cuidados de outras pessoas não remunerados do que os homens. Segundo a ONU, as mulheres são responsáveis por uma carga excessiva de trabalho doméstico não remunerado referente aos cuidados com filhos, com pessoas idosas e doentes e com a administração do lar.”[23]
Conclusão
A discriminação nas suas diversas formas está notadamente presente no ambiente de trabalho feminino. A discussão da questão de gênero no âmbito trabalhista, não se trata de mera reflexão filosófica, mas uma discussão de uma necessidade urgente, pois a busca por igualdade proporcionará uma sociedade que aproveita o real intelecto das pessoas, sem distinção de características pessoais ou biológicas inerentes ao ser humano. Esse aproveitamento da capacidade humana poderá contribuir para o crescimento e desenvolvimento da própria sociedade.
Quando pensamos em uma solução para o problema exposto e para qualquer que seja o impasse, e sabendo que a educação e o conhecimento é o ponto inicial para a resolução de qualquer conflito, partimos desse princípio: conscientizar a população.
A conscientização da população a respeito dos prejuízos que a desigualdade pode trazer, e os benefícios que uma sociedade justa e igualitária pode nos proporcionar, seria o primeiro passo importante, abordando mais o tema de forma a fixar na mente das pessoas a urgência da questão. As políticas pública e os incentivos para as empresas que contratem e treine mulheres deve agir em conjunto com a população conscientizada, assim como a criação e aprovação de projetos de lei nesse sentido.
Diante do exposto nesse artigo, notamos que ainda há muito a ser feito para se obter a igualdade efetiva.Vemos que a busca pelo equilíbrio pode tornar o trabalho da mulher mais satisfatório e digno, rendendo mais lucro para todos.
Informações Sobre o Autor
Ilana Driele Mendes da Cunha Lima
Acadêmica em Direito pela Faculdade Maurício de Nassau em Campina Grande. Membro pesquisador do grupo de pesquisa em Criminologia e assuntos relacionados a Gênero