Resumo: Tomadas as recentes discussões no Congresso Nacional a respeito da possibilidade de ampliação da imputabilidade penal ao menor de dezoito anos, o presente estudo científico tem como propósito analisar a o cerne da proposta sob o viés da sua viabilidade e aplicabilidade. Serão observadas as searas da aplicabilidade e da eficácia da possível medida em relação às condições do sistema carcerário brasileiro, como também serão analisadas as questões da coerência e da constitucionalidade desta mesma medida frente à Carta Maior de direitos de 1988 afim de se aferir o quão interessante é a proposta e quais são seus limites práticos e legais. Para tanto, será feito uso do método metodológico dialético, assim como da documentação direta e indireta, seja por uso de pesquisas bibliográficas, seja por uso de estudos estatísticos, respectivamente. *
Palavras-chave: Redução da maioridade penal. Sistema penal. Imputabilidade penal.
Abstract: Taken the recent discussions in Congress about the possibility of the expansion of criminal responsibility to minors under eighteen years, this scientific study is to analyze the core of the proposal on the viability and applicability bias. The crops of the applicability and effectiveness of the possible extent on the conditions of the Brazilian prison system will be observed, but are also the issues of consistency and constitutionality of that measure across the 1988 Constitution in order to analyze how interesting is the proposal and what are its practical and legal limits. To do so, it will be made use of the dialectical method as well as the direct and indirect documentation, either by use of literature searches, either by use of statistical studies, respectively.
Keywords: Reducing of the criminal age. Criminal system. Criminal responsability.
Sumário: Introdução. 1.Redução da Maioridade Penal. 1.1Inaplicabilidade e Ineficácia. 1.2 Incoerência e Inconstitucionalidade. Considerações Finais
INTRODUÇÃO
Comumente, ao ligar a televisão no horário nobre ou abrir o jornal em um dia qualquer, é fácil se deparar com uma notícia de algum crime brutal, realizado da maneira mais desumana e aterradora possível. Aquele crime transmitido com uma eloquência inflamada e passional do repórter que, com seus exagerados brados por justiça e com seus argumentos aparentemente sensatos nos coloca no lugar da vítima ou de sua família e faz com que rompamos nossos próprios grilhões da sensatez e da imparcialidade e, assim, surge um pendente desejo de justiça, que mais beira à vingança do que a qualquer outro sentimento.
Não menos raro nesse mesmo tipo de situação, termos colocado à nossa frente que o agente dessa brutalidade é, na realidade, um menor. Aquele, chamado de frágil, em formação, essa “criança”, que foi o causador de um estupro, de um assassinato, de um latrocínio. É este tipo de situação que prolifera a indignação. Essa mensagem de raiva que o menor transmite na sua condição barbárica de dejeto social, e o afago do Estado, que prefere elevá-lo à uma condição de intocável. É aí que o povo, em alguns momentos, ao ter essa situação empurrada pela televisão, pede o suplício e a desforra do jovem por meio do cárcere.
Pelo tipo de situação exposto acima, o presente trabalho cientifico tem o intuito de estudar, justamente, a ideia do recrudescimento do sistema penal. Uma proposta séria, mas defendida às cegas pelos meios midiáticos brasileiros e pelas várias propostas políticas populistas, com uma retórica quase poética, a qual os dois primeiros parágrafos desse texto tentaram, talvez com um excesso metalinguístico, imitar.
Esquece-se, porém, que há mais ao assunto do que os estrondosos aplausos da população alfinetada pela raiva ao ver na TV o desamparo alheio. A questão abrange toda uma questão principiológica, legal e prática que, ao contrário do que pensam os que defendem incondicionalmente a medida, não pode ser esquecida e substituída pelo tipo de proposta imediatista que acompanha a política brasileira ancestral.
Cabe a reflexão acerca de ser viável ampliar a instituição da prisão, uma instituição com altos índices de reincidência, a uma camada da sociedade ainda em formação física e psicossocial, a qual se busca punir, mas que, via de regra, são as vítimas do desamparo familiar e do abandono estatal perante as condições positivadas, inclusive na Constituição Federal, que o Estado se compromete a cumprir.
Ainda é vital refletir a ampliação da prisão sob outra ótica: a própria condição da prisão no Brasil. Não mais do que centros de isolamento, as prisões no brasileiras que, segundo denúncias de diversas instituições, inclusive da ONU, se tornou uma casa de tortura e abandono, torna a idealizada função de ressocialização da pena privativa de liberdade uma utopia ideológica. Por outro lado, a prisão assume o papel de tornar invisíveis indivíduos que não interessam ao Estado, mas que em certo ponto vão retornar à sociedade, e que aí sim, após estadia em um ambiente inumano frente ao desamparo ao egresso, tornam pífias as possibilidades de uma reinserção.
Além do mais, será o enfoque central a questão prática da proposta: sua aplicabilidade diante do atual sistema carcerário brasileiro; da eficácia da redução frente à legislação especial já existente e da coerência da medida com os limites impostos pela Carta Maior do ordenamento jurídico brasileiro e em especial pela falsa noção de impunidade gerada por uma tosca interpretação da lei e do próprio conceito de inimputabilidade.
Tal discussão, por sua vez, perpassará pela situação do menor a quem se pretende punir: produto social e evidência concreta do abandono do Estado; vítimas da inflamada influência da mídia numa dita espetacularização da violência, em uma espécie de política do medo. Pretende-se, dessa forma, criminalizar o adolescente pobre, atribuindo-lhe elevados índices de criminalidade, mesmo que isso não se confirme pelas estatísticas oficiais.
Como o estudo proposto irá pautar-se no embate de argumentos contrários, a redação que se segue utilizar-se-á do modo metodológico dialético de reconstrução paradigmática, que se resume à desconstrução de um paradigma, chamado de tese, por meio de uma antítese cujo contato permutaria em uma nova tese, denominada de síntese[1].
Por meio dessa forma de pesquisa, será possível discutir a cultura do aparato penal como solução para a violência, em especial por meio da proposta de redução da maioridade penal.
Com enfoque nessa dialética, o proposto estudo tem o objetivo de trazer e esclarecer tal discussão controversa e tecer um comentário a fim de favorecer a formação de opinião sobre que se de fato, a proposta de redução da maioridade penal é viável, considerando sua aplicabilidade e eficácia frente a condição do sistema carcerário brasileiro, e sua coerência e constitucionalidade frente às normas do ordenamento jurídico brasileiro.
1 REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
A proposta de redução da maioridade penal é tema recorrente de diversos projetos que já tramitaram no Congresso Nacional. Tais projetos visam, em suma, alterar a redação do artigo 228 da Constituição Federal para que os menores possam sofrer a sanção legal imposta a um maior de 18 anos.
É importante frisar que esse tipo de medida não surgiu do nada, sendo, na realidade, resposta aos índices de violência e ao clamor da sociedade chocada pelo espetáculo feito da brutalidade que é televisionado todos os dias. A proposta, então, surge como uma possível solução para o problema da violência, no caso, praticado pelo menor.
O que nossos nobres deputados falham em perceber, no entanto, é que tal medida não é compatível com o atual sistema prisional brasileiro, mais um casa de tortura de dejetos sociais do que instituição de repreensão, prevenção e ressocialização. Quer-se ampliar o cárcere brasileiro, já sem investimento, com carência de vagas e perpetuador de índices de violência altíssimo a uma camada da população que pratica estatisticamente menos de 10% de todos os crimes ou contravenções no país, sendo que apenas 0,09% da população adolescente é identificada como infratora (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2013, p.4).
É mais fácil criminalizar o jovem sob o pretexto da ressocialização, do que efetivamente o socializar. Isso só mostra o fracasso do Estado frente à criança e ao adolescente, preferindo excluí-lo a garantir condições justas para o seu desenvolvimento.
Para melhor ilustrar essa situação, seguem as palavras do parecer do Conselho Federal de Psicologia sobre o assunto (2013, p.7).
“O Estado precisa se reconhecer nos adolescentes autores de atos infracionais, considerados “espelho” de uma sociedade esmaecida de parâmetros éticos, cuja adolescência tem servido de “bode expiatório” para seus recorrentes fracassos. Criar estratégias para manter a estigmatização e a exclusão, especialmente dos pobres, significa manter o falseamento da realidade de que os conflitos sociais serão resolvidos com o aprisionamento ou a internação e pouco se investirá nas potencialidades dos jovens, nos processos educativos, socioeducativos, articulados pelas diferentes políticas voltadas para essa população.”
Na realidade, a proposta de redução da maioridade penal se finda muito mais numa condição política do que realmente prática, de eficiência. É uma proposta imediatista, que foge da real situação do problema, e que mesmo que se aplicada, não terá nem de perto o efeito esperado de redução da violência.
Mesmo que a proposta possa parecer favorável e viável quando sentida por um ponto de vista passional, ao ver a história de um jovem cujos sonhos foram impedidos pelo disparo da arma de um menor, por exemplo, a redução encontra obstáculos práticos, seja no ordenamento jurídico brasileiro, seja na atual condição do sistema carcerário.
Por isso, serão analisados esses obstáculos sob a ótica de quatro fatores primordiais; primeiro pela inaplicabilidade e a ineficácia da medida, quando posta em relação com a incapacidade estatal de gerir do sistema carcerário, seja pela já carência de vagas ou abandono da prisão, seja pela já existência de uma legislação mais eficiente para o menor ou pela ideia do aumento do índice de reincidência sugerido pelo contato do menor com a população carcerária. Em segundo lugar, pela incoerência e pela inconstitucionalidade do proposto frente ao que já é positivado na Constituição Federal de 1988.
Prima-se, aqui, pela questão prática da medida e seus possíveis efeitos, mesmo que haja fatores econômicos e sociais que explicam a falácia política de cunho eleitoreiro que enraíza à medida. Esses fatores, porém, serão deixados para outro estudo.
1.1 INAPLICABILIDADE E INEFICÁCIA
Partindo do ponto da inaplicabilidade, constata-se que a atual condição do sistema prisional brasileiro não tem capacidade para suportar a redução da maioridade penal, que ampliaria o número de presos a ingressar no sistema. Segundo dados estatísticos do Conselho Nacional de Justiça[2] o Brasil hoje possui um total de 542.728 presos, para um total de 350.742 vagas, o que demonstra um déficit total de 191.986 vagas. Desse número, 223.601 são presos provisórios, indevidamente misturados com presos comuns, e ainda 3.073 presos em delegacias, que não possuem condições adequadas para encarcerar detentos em caráter prolongado, sendo apenas o local para o conhecimento inicial do auto de prisão, com limite de 48 horas (LEMOS, 2007, p.41).
Ademais, há o relatório penitenciário do Ministério da Justiça[3], o InfoPen, o qual disponibiliza as informações do sistema penitenciário brasileiro, que, quando em um momento diverge um pouco em termos numéricos da informação do CNJ, no outro só confirma a situação alarmante do país.
Nos dados da pesquisa de dezembro do ano de 2012 foi constatado um total de 548.003 presos para um total de 318.739 vagas, evidenciando um resultado de um déficit de 229.264 vagas. Ressalve-se, aqui, nesse número também constam os presos provisórios, indevidamente misturados, e os presos em delegacias com caráter permanente, em clara situação irregular.
O problema não se esgota, pois a Lei de Execuções Penais, que define as regras do encarceramento em regime fechado, estabelece no seu artigo 88 que para o preso destinado à esse regime deve ser providenciado uma cela individual (BRASIL, 1984), o que certamente é uma utopia jurídica, que se verifica pelas constantes denúncias de superlotação de celas[4].
Nota-se, destarte, o já descumprimento do Estado frente à legislação, que apenas seria agravado caso fosse aumentado o contingente de indivíduos destinados ao sistema penitenciário. Dessa forma, seria inteligente destinar mais indivíduos a uma instituição que já descumpre a lei, e que mesmo descumprindo-a já carece de vagas, aumentando ainda mais essa carência?
Se já não bastasse o déficit no número de vagas, a prisão no Brasil figura como uma casa de tortura do que efetivamente um lugar que alegadamente, prima pela repreensão e prevenção crime, o que, de fato, só agrava a questão da superlotação carcerária. Sobre essa questão, Löic Wacquant (2001, p. 11), em seu estudo sobre a violência e desigualdade urbana definiu as prisões brasileiras como “campos de concentração para pobres”. Discorre:
‘É o estado apavorante das prisões do país, que se parecem mais com campos de concentração para pobres, ou com empresas públicas de depósito industrial dos dejetos sociais, do que com instituições judiciárias servindo para alguma função penalógica – dissuasão, neutralização ou reinserção. O sistema penitenciário brasileiro acumula com efeito as taras das piores jaulas do Terceiro Mundo, mas levadas a uma escala digna do Primeiro Mundo, por sua dimensão e indiferença estudada dos políticos e dos públicos: … condições de vida e higiene abomináveis, caracterizadas pela falta de espaço, ar, luz e alimentação… negação de acesso à assistência jurídica e aos cuidados elementares de saúde… difusão da tuberculose e do vírus do HIV… violência pandêmica entre detentos, sob forma de maus-tratos, extorsões, sovas, estupros e assassinatos em razão da superlotação superacentuada” [grifo nosso]
Ainda a respeito da situação dos estabelecimentos prisionais, o Juiz de direito Carlos Eduardo Ribeiro Lemos (2007, p.42), em sua experiência com relação aos estabelecimentos prisionais do estado do Espírito Santo, os definiu como “grutas úmidas e escuras” Tendo, além disso, criticado a péssima comida oferecida aos presos, as condições insalubres e de proliferação de doenças infectocontagiosas, à inexistência de assistência jurídica ao detento, o tráfico de drogas intramuros, o clima de guerra entre presos e agentes penitenciários, a presença de facções criminosas dentro dos presídios e a pífia atuação do Estado frente toda essa situação (LEMOS, 2007, p. 64-75).
Portanto, não prospera a ideia de ser interessante incluir nesse ambiente, já carente de espaço e vagas, os menores (dos quais devido ao péssimo gerenciamento estatal também entrariam os provisórios) ainda em formação bio-psicológica e em relação de hipossuficiência frente ao Estado. Será que introduzir esses indivíduos em uma masmorra, covil de facções criminosas, e aqui entra-se no plano da eficácia, contribuiria para sua eventual reinserção na sociedade?
É lógico pensar que um menor ao ser submetido à esse ambiente poderá ser claramente influenciado por ele. Isso porque, a condição de formação psicossocial do menor é notória, e o introduzir em um ambiente repleto de criminosos cuja taxa de ressocialização se mostra como estatisticamente pobre[5], nos leva a crer que esses menores sofrerão diretamente a influência do meio ao qual estão submetidos. Não sendo, destarte, retirados da situação de exclusão familiar e social da qual saíram, já que ainda no presídio serão cooptados pelas facções criminosas, ou até deliberadamente optarão por se envolver em tráfico de drogas ou outras atividades ilícitas.
No caso, a prisão se torna muito mais uma instituição da depravação da ética e da inversão de valores. Apoia-se, aqui, na crença de que um ambiente deletério e inumano, populado por aqueles que o Estado considerou como dejetos sociais, efetivamente também não terá eficácia em reinserir os menores, causando o efeito oposto: de proliferação da violência, já que esse menor brutalizado retornará à sociedade.
Por isso, partindo do pressuposto da influência do meio para a formação do menor, há de prosperar a tese da superioridade das medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente em relação ao sistema carcerário. Enquanto o primeiro dialoga com diversas possibilidades de educação e de formação, de contato familiar e de reinserção e ressocialização, essa seara é pobre e quase que inexistente na segunda opção, pautada em uma lógica muito mais repreensiva.
Sobre isso já dizia o renomado jurista Nelson Hungria (apud CUNEO, 2003, p.74):
“Não devemos crer no fatalismo da delinquência. O próprio adulto inveterado na trilha do crime é corrigível, pois, como diz Saldaña, não é ele uma pedra; (…) é preferível, sem dúvida, tentar corrigi-lo por meios pedagógicos.”
Para tanto, há a prevalência do propósito pedagógico da legislação especial em prol do convívio pró-social, é o que dizem Paula Inez Cunha; Raphaella Ropelato e Marina Pires Alvez (2006):
“A ciência comportamental ressalta que a melhor maneira de se desenvolver comportamentos pró-sociais ou de se inverter as tendências ou práticas infratoras está em implementar programas educativos que envolvam os pais e os próprios adolescentes ou crianças. O objetivo desse procedimento é propiciar a identificação das práticas educativas inadequadas e incrementar aquelas capazes de facilitar o aparecimento de comportamentos adaptativos sociais.” (2006, p.651)
O mesmo estudo aponta que “certamente, apenas o encarceramento não seria capaz de produzir os efeitos positivos desejados” (2006, p.655), e preconiza a importância do ECRIAD, na sua forma, em alcançar a problemática lançada à cima:
“O entendimento de que a gravidade do crime acontece em função das experiências vividas em gangs e na rotina do crime é que justifica um atendimento especial oferecido pelo ECA a partir de medidas socioeducativas. A política do ECA é de reabilitação com características não punitivas. Essa atitude diferencia fortemente as duas correntes de pensamento. Por um lado, o ECA estabelece uma política educacional que visa a reinserção do adolescente infrator ao meio social; por outro, o código penal preconiza que o infrator deve receber pena, considerada estratégia suficiente para inibir o crime futuro”. (2006, p.656)
No mais, o exposto acima se comprova pela prevalência, em questão de eficácia, do sistema de medidas socioeducativas frente ao aparato prisional regular, ao contrário do que se pensa, como em estudo realizado por Eros Roberto Grau e Telles Júnior (2003, p.31):
“Experiências bem sucedidas realizadas em diversos pontos do país demonstram claramente que uma aplicação correta das medidas socioeducativas, feita em conjunto com os familiares do menor, com a comunidade e com organizações não-governamentais, resulta em redução significativa da criminalidade juvenil. Tanto é assim que o índice de reincidência de adolescentes submetidos a medidas socioeducativas (…) perfaz 7,5% (sete e meio por cento), enquanto que, no sistema carcerário, 47% (quarenta e sete por cento) de todos os egressos voltam a delinquir.”
É claro que é possível arguir que os estabelecimentos para menores não são plenamente capazes da efetiva aplicação, como demonstram o Ministério da Justiça e o IPEA (apud CUNHA, 2006, p.655), que 71% das unidades de internamento do País não estão em condições para o cumprimento das medidas. Porém, aqui, a ideia é de que seria muito mais interessante investir no que é ditado por uma legislação avançada, com otimistas possibilidades, do que simplesmente lançar mão de uma medida falaciosa e consubstancialmente populista, de despejar mais seres humanos à uma barbárie já existente e não remediada do sistema prisional, a proporcionar, assim, uma imediata, mas falsa, sensação de segurança e de devido cumprimento do Direito Penal.
Alguns projetos de Emenda Constitucional, no entanto, como o da PEC 33, determinam que os menores a serem imersos no sistema prisional devem ficar em estabelecimento diverso dos presos adultos por assim eliminar o problema da influência deletéria do ambiente dos reclusos.
Todavia, mesmo que a proposta aconteça dessa maneira, ela continua sendo ineficaz frente ao sistema já existente. Primeiro, porque é lúdica a ideia do governo se dispondo a construir mais presídios especializados no Brasil, somente para os menores, quando já há um imenso déficit de vagas, inclusive sem ter onde colocar os presos provisórios. Além de que, em segundo lugar, em termos práticos, a medida socioeducativa se revela em certos casos, inclusive, mais rígida do que a própria pena privativa de liberdade. Entretanto, para isso, teremos de explicar como funciona o sistema progressivo penalístico em vigor no Brasil e visitar alguns artigos do Código Penal.
O Brasil adota, pelo § 2º do artigo 33 do nosso Código Penal e pelo artigo 112 da Lei de Execução Penal, o sistema progressivo, como explicado por Rogério Greco (2013, p. 498):
“(…) o art. 112 da Lei de Execução Penal diz que a pena privativa de liberdade será executada de forma progressiva, com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinado pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menor um sexto da pena no regime anterior (…)” (grifo nosso)
Para entender isso em numerologia palpável, tomemos o seguinte exemplo: um condenado a doze anos de reclusão em regime fechado. Após um sexto do cumprimento da pena, ou seja, 2 (dois) anos, o indivíduo tem a possibilidade de ingressar no regime semiaberto. Após esses dois anos, havendo a progressão e restando o cumprimento de 10 (dez) anos de pena, o indivíduo tem direito à outra progressão, em um sexto desses dez anos restantes (GRECO, 2013, p.499), ou seja, aproximadamente em um ano e oito meses.
Dessa forma, um indivíduo condenado a doze anos de reclusão em regime fechado, por um crime não hediondo, em três anos e oito meses, se estiver trabalho ao tempo da segunda progressão e se possuir bom comportamento, estará em regime aberto.
Se tomarmos a realidade do regime aberto, poderemos ter uma noção do quanto esse sistema não funciona. Isso porque, no Brasil inteiro só há 67 estabelecimentos para o regime aberto, as chamadas Casas de Albergado[6] [7]. Dessa maneira, graças à quase inexistência desses estabelecimentos, a progressão se torna uma forma velada de impunidade, à medida que alguns juízos, diante dessa situação, concedem a progressão de regime para o regime aberto em situação de cumprimento por prisão albergue domiciliar.
Nesse diapasão, Mirabete (2004, p.467-468) coaduna com o entendimento de que a falha do Poder Público em construir os estabelecimentos não permite a concessão da prisão domiciliar, que carece de total controle ou fiscalização das condições ditadas em juízo.
E ainda afirma que:
“A prisão albergue domiciliar passou assim a ser forma velada de impunidade, de que os juízes lançavam mão em último recurso, na impossibilidade de o benefício ser desfrutado em local adequado”. (MIRABETE, 2004, p.467-468)
Assim, tomado o exemplo acima, o indivíduo só ficaria preso efetivamente por dois anos, mais um ano e oito meses em regime semiaberto e o restante da pena praticamente em uma condição de quase liberdade, caso fossem supridas as condições para progressão para o regime aberto, e caso fosse concedido a prisão albergue domiciliar.
Agora, observe que essa realidade inexiste no sistema especial para os menores, regulado pelo ECRIAD. No caso do mesmo exemplo apresentado, o menor poderia ficar preso em privação de liberdade, segundo o art. 121 § 3º do ECRIAD por no máximo três anos, sujeito a reavaliação de medida socioeducativa de seis em seis meses e sob o tratamento pedagógico. Inexiste, aqui, a progressão de regime, sendo os 3 anos cumpridos efetivamente em caráter privativo de liberdade, aliado às já mencionadas políticas propostas pela legislação especial.
Basicamente, o que se pretende mostrar aqui é existem condições que beneficiam o recluso e o detento, podendo ele ficar, inclusive, pouco tempo, ou até menos tempo preso do que o menor internado. Outrossim, o preso do sistema carcerário possui várias circunstâncias que podem atenuar a pena, assim como causas que podem diminuí-la, como o rol de atenuantes do artigo 65 do Código Penal (1940) ou como por exemplo, o arrependimento posterior (art. 16) e a tentativa (art. 14, II, parágrafo único) como causa de diminuição.[8] Esse tipo de “benefício” não é previsto pelo ECRIAD e, portanto, não pode ser aplicado ao menor infrator por ele estar sujeito, em caso de internação, aos 3 anos fixados em lei.
No entanto, ao contrário da privação de liberdade em regime prisional, é muito mais vantajoso para o Estado, privar o menor de liberdade (nos casos em que a medida é cabível) em um ambiente de contato familiar e com apoio pedagógico e psicossocial, do que lançá-lo em uma masmorra criminosa.
Isso posto, já foi vencida a questão da proposta de redução sob uma ótica funcional: da aplicabilidade e da eficácia. No primeiro caso, o sistema se revela ineficiente e desprovido de qualquer possibilidade de suportar um acréscimo, e, no segundo, mesmo que aconteça esse acréscimo, e mesmo ignorando os problemas e obstáculos, o resultado ainda não seria o almejado, havendo legislação superior muito mais eficaz que deve ser posta devidamente em prática.
1.2 INCOERÊNCIA E INCONSTITUCIONALIDADE
Afim de analisar a possibilidade da proposta tomados os aspecto da incoerência e da inconstitucionalidade da medida, verificar-se-á o conceito de inimputabilidade e sua confusão com impunidade, sob a ótica da doutrina constitucional que protege os menores. Em seguida, analisar-se-á o reforço da impossibilidade da medida pelo fato da imputabilidade penal se resguardar na égide constitucional, tendo sua alteração caráter imaleável, embora nossos doutos legisladores ignorem esse feito.
O primeiro passo para se discutir a proposta de redução da maioridade penal, sob uma ótica legal, é saber efetivamente qual é a exceção imposta pela legislação no caso do menor. Há uma certa tendência na sociedade brasileira em acreditar que a legislação brasileira imuniza a criança ou o adolescente e por isso, quaisquer sejam seus atos, ele continuará impune. O que não é verdade.
Vejamos: o Constituinte brasileiro elevou o menor à situação de inimputável, como exposto pelo artigo 228 da Carta Magna: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. (BRASIL, 1988)
Nesse caso, a imputabilidade para o menor brasileiro, decorre de um fator puramente biológico, por considerar que os menores de 18 anos não gozam do pleno entendimento que lhes permita imputar a prática de um crime (GRECO, 2013, p. 387). Como implícito no artigo 26 do Código Penal Brasileiro:
“É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”
Dessa forma, o menor não pode se sujeitar às sanções normalmente impostas a um crime, pois é isento de pena. O que acontece, na realidade, é uma confusão conceitual. O menor não recebe pena, porque, por ser inimputável, não recebe a retratação dada à prática de um crime, mas isso não quer dizer que não há previsão de retratação para o menor que subverte a lei. Isso significa que o menor apenas não se qualifica ao que tange os conceitos de crime e pena propriamente ditos, mas se enquadram em uma outra área, da legislação especial, que define os parâmetros para sua punição.
Munir Cury (2003, p.84), por sua vez, afirma que o limite legal de 18 anos para imputabilidade penal baseia-se, na realidade, em um critério de política criminal, não vinculado a uma capacidade ou não de entendimento. Afirma também que os adolescentes são “capazes de perceber que é reprovado furtar, danificar, matar”, mas que não são submissos às regras penais porque a Criminologia não entendeu o sistema aplicado aos adultos como eficaz para o propósito de repressão e prevenção desses jovens além de que o legislador primou pela eficiência de um conjunto de medidas protetivas e/ou socioeducativas “capazes, conforme o caso, de proteger, educar, e até punir, prevenindo práticas antissociais”.
Note, portanto, que isso não significa que o menor é “imune” à lei, pois mesmo que não sujeito às penas, está sujeito às medidas da legislação especial vigente, o ECRIAD.
Esse mesmo dispositivo dá o nome do crime ou contravenção praticado pelo menor de ato infracional (BRASIL, 1990, art. 103), e regula sua prática do artigo 103 ao artigo 128. Assim, na prática de um ato infracional, o indivíduo estará sujeito a uma série de medidas socioeducativas (advertência, semiliberdade, liberdade assistida e internação).
Nos casos mais graves, há a internação do indivíduo nas chamadas unidades educacionais de internação, com caráter privativo de liberdade, como explicado no tópico anterior, pelo prazo de até 3 anos como dispostos nos artigos 122 e 123 do estatuto:
“Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.(…)
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.
Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:
I – tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;
II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves;
III – por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.”
As medidas ainda se configuram como resposta devida aos atos infracionais cometidos, pois estabelecem que o critério de resposta estatal é o menor e não o ato cometido por ele, diferentemente das penas. Assim, reforçando essa primazia das medidas previstas no ECRIAD, como exemplificado em capítulo anterior, segue trecho do parecer do Conselho Federal de Psicologia (2013, p.3):
“A medida socioeducativa como resposta aos atos infracionais está corretamente relacionada à estrutura burocrática-formal destinada ao processo de emancipação socioeconômica da juventude no Brasil, considerando que há uma expectativa de que, aos 18 anos, jovens já tenham concluído o ensino médio, profissionalizante, estando preparados para inserção no mercado de trabalho. A medida socioeducativa tem caráter pedagógico e de responsabilização e, diferentemente das penas, inclui medidas de proteção, tais como o direito à convivência familiar e comunitária a partir de seus territórios, a matrícula em escola, a inclusão em programas sociais."
Diante do exposto, fica evidente que mesmo que haja certa confusão conceitual, não há dúvidas de que a legislação responsabiliza o menor pelos seus atos, inclusive em caráter privativo de liberdade, mesmo que de forma especial. Não há de se falar, portanto, em impunidade.
No mais, mesmo que o Código Penal, no seu artigo 26, veicule a ideia de incapacidade de discernimento do menor, e esse fator seja argumento a favor das propostas de redução, essa ideia não prospera na Carta Magna de 1988.
O Código Penal brasileiro surge em 1940, que mesmo após reformas, ainda carrega traços das convicções da época. Só em 1959, com a Declaração Universal dos Direitos da Criança, promulgada pela ONU, é que as crianças começam a ser sujeitos de direito e sujeitos de proteção por parte do Estado.[9] Daí surge o que é chamado de Doutrina da Proteção Integral, positivada no ECRIAD e também no já citado artigo 228 da Constituição Federal e também no artigo 227 do mesmo dispositivo:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”
Por isso, segundo a doutrina seguida pela nossa própria Carta Maior de direitos, o menor se encontra em peculiar condição de desenvolvimento, com base nas dimensões sociais, políticas e econômicas afetadas (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2013, p.3), sendo assim, a garantia estabelecida pela Constituição não se vincula à capacidade de discernimento, mas a essa qualidade de hipossuficiente.
Figura como insuficiente, portanto, a ideia de curvar a garantia constitucional positivada sobre o pretexto de que ela na realidade se submete à capacidade de discernimento dos adolescentes, quando a realidade é, como já explicado, outra.
Contudo, a discussão não se encerra pelo plano da incoerência. Além de existir um devaneio acerca do conceito constitucional de inimputabilidade e além de existir doutrina constitucional positivada que rechaça a proposta de mudança, há ainda outra questão a qual essa se submete: a questão do artigo 228 da Constituição Federal como sujeito às condições limítrofes à alteração do dispositivo constitucional, sendo, portanto, cláusula pétrea.
Isso acontece porque o Constituinte estipulou critérios para atuação do Poder Reformador (responsável pelas emendas à Constituição) elencados no art. 60 da Carta Maior. Dentre eles, destaca-se o interessante à discussão em voga, que é justamente a impossibilidade de extinção ou supressão dos direitos chamados de individuais. Assevera o referido diploma:
“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
IV – os direitos e garantias individuais”
Desta maneira, a Constituição nos remete precipuamente ao artigo 5º, que dispõe, dentre outros, dos direitos e garantias individuais que fazem parte do rol de direito que não podem ser abolidos, nem por força de emenda constitucional. Contudo, verifica-se que o rol elencado pelo dispositivo não é taxativo, nem exaustivo, e o próprio artigo, por força de seu parágrafo segundo, institui que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ele adotados (…)” (BRASIL, 1988).
Em consonância com essa ideia, à luz da interpretação do art. 60, §4º, IV, fica claro que este não institui a necessidade de que toda garantia e direito individual esteja disposto no rol do art. 5º. Isso, por sua vez, dialoga com a ideia de que por todo corpo do texto podem haver outros direitos e garantias a serem tutelados pela rigidez constitucional disposta pelo art. 60. (MAIA, 2011, p.5)
Portanto, fica sujeita à proteção da égide constitucional, o art. 228 que postula o menor como inimputável, se este for considerado um direito individual, que é justamente o entendimento de Daniel Maia (2011, p.6):
“Restando, dessa maneira, uma responsabilização especial, não penal, o que, sem dúvida, denota que essa garantia é um direito individual do adolescente e, portanto, inserido inegavelmente em uma cláusula pétrea, absolutamente impossível de sofrer reforma ou alteração mesmo por emenda constitucional que importe no seu extermínio ou restrição”.
E ainda dispõe Rolf Koerner Júnior (1996), cujo parecer se coaduna com o exposto a respeito do artigo 228:
“Apesar de a norma do art. 228, da Carta Magna, encontrar-se no Capítulo VII (Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso), do Título VIII (Da Ordem Social), não há como lhe negar, em contraposição às de seu art. 5º (…), a natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias. Escreveu J.J. Gomes Canotilho que “os direitos de natureza análoga são os direitos que, embora não referidos no catálogo dos direitos, liberdades e garantias, beneficiam de um regime jurídico constitucional idêntico aos destes. Então, nesse aspecto, na regra do art. 228, da Constituição Federal, há embutida uma ‘garantia pessoal de natureza análoga’, dispersa ao longo do referido diploma ou não contida no rol específico das garantias ou dos meios processuais adequados para a defesa dos direitos”.
À vista disso, não é só possível, mas é correto afirmar que o artigo 228 da Constituição Federal 1988, que preconiza o menor de 18 anos como inimputável, é um direito individual, na medida que protege o menor, sujeito às normas do ECRIAD, da aplicação do Direito Penal, o que se perfaz como liberdade negativa frente ao Estado.
Logo, se configura como cláusula pétrea, haja vista que se enumera ao rol dos direitos e garantias individuais resguardados de qualquer abolição ou restrição, sujeitos apenas à ampliação e, por isso, qualquer tentativa de aplicação da redução da maioridade penal por meio de emenda constitucional ao referido artigo figura como uma tentativa supérflua e claramente inconstitucional.
A proposta de redução da maioridade penal, destarte, encontra limitações não só na qualidade e na eficácia a que se submete o sistema prisional, mas, outrossim, na ordem jurídica imposta pela Constituição Federal, e na própria Constituição, na forma da cláusula pétrea em que consiste o artigo 228 e na forma da Doutrina de Proteção Integral.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tratou-se nesse breve estudo sobre a viabilidade da ampliação da imputabilidade penal as limitações às quais essa se submeteria se aplicada hodiernamente. E, mormente, verificou-se o sistema carcerário na sua atual condição como inapto para receber a ampliação no contingente de presos. Constatou-se, ainda, a supremacia da legislação especial avançadíssima brasileira em detrimento de um Direito Penal ineficaz que a cada ano fortalece seu anacronismo pungente. Não esgotado o tema, a proposta de redução encontrou barreiras na Constituição, norma fundamental e raiz de todo o ordenamento jurídico brasileiro, se mostrando completamente incoerente frente à doutrina adotada pela própria Lex Matter e claramente inconstitucional, ao se analisar os instrumentos dispostos para a emenda da Carta Maior.
Por consequência, em resposta ao questionamento lançado no texto que introduz este trabalho cientifico, não há outra afirmativa a não ser a de que a ideia de tornar imputáveis os menores de 18 anos não é só inviável, como também não é inteligente.
Ora, é lógico afirmar que ao tempo que a sociedade deseje a punição do infrator, ela também espera que este deixe de cometer crimes, contravenções e afins. O que, de fato, não acontece. À medida que o sistema penal atende a primeira noção, ele falha espetacularmente bem em cumprir a segunda, o que se prova pelas pesquisas de reincidência e pela própria violência sentida pela população diariamente.
O que realmente prospera é uma tentativa de proposta imediatista, de cunho indiscutivelmente eleitoreiro, que amparada pela espetacularização do medo proporcionaria elevados índices de aprovação, mas que, no entanto, só agravaria a situação carcerária alarmante do país.
Deve-se procurar cumprir o que a lei especial, o tão citado ECRIAD, preleciona, para que, aí sim, haja uma verdadeira tentativa, não só de responsabilização pelo ato, mas também de ressocialização de menores que, em sua maioria, são produtos de uma condição de abandono familiar, econômico, afetivo, psicológico, moral, ético, e, na realidade, sequer foram socializados.
Por fim, ampliar a imputação de crimes aos menores de dezoito anos é fugir aos limites impostos pela hodierna estrutura do sistema carcerário e pelo Constituinte, além de primar por uma lógica política que se apossa da consciência cidadã de que ampliar a prisão combateria a violência, quando, de fato, a prisão, falida, criminaliza e brutaliza àqueles que já em primeiro momento foram ocultados pelo manto da pobreza.
WACQUANT, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
Informações Sobre o Autor
Gabriel Sardenberg Cunha
Acadêmico da Faculdade de Direito de Vitória