A responsabilidade civil das ONGs

Resumo: Tema oportuno na seara jurídica brasileira, este artigo traz á baila a responsabilidade da Organização Não governamental quando lesam dolosa ou culposamente, bem jurídicos de outrem ao atingir seu patrimônio ou sua moral. Tem-se por objetivo provar a importância do papel social que estas entidades realizam no desempenho da prestação de serviços públicos no Brasil. Abordaremos ainda que em sede de resumo, o conceito de responsabilidade civil, os elementos que o informam, suas consequências no mundo jurídico notadamente para o lesado – para este nasce um direito subjetivo. Apesar do tema abordar a concepção civilista da responsabilidade sob a ótica da pessoa jurídica, sabemos que a responsabilidade alcança, por vezes, seus representantes legais quando, por exemplo, há a confusão dos bens da ONG e de seus dirigentes, ou ainda quando estes se apropriam indevidamente de recursos públicos em ilícito desvio de finalidade.[1]

Palavras-chave: ONG; Responsabilidade civil; Reparação; Dano.

Abstract: Theme appropriate legal harvest in Brazil, this article brings to fore the responsibility of the government when no harm intentionally or negligently, legal and others to achieve his or her moral worth. It has been designed to prove the importance of the social role that these entities perform on the performance of public services. We will also established that in summary, the concept of civil liability, the elements that inform, its consequences in the legal world especially to the victim – this rises to a subjective right. While addressing the issue of civilian conception of responsibility from the perspective of the legal entity, we know that the responsibility goes, sometimes, their legal representatives when, for example, there is the confusion of the assets of NGOs and their leaders, or even when they misappropriate public funds for illegal misuse.

Keywords: NGOs, civil liability, Repair, Damage.

Sumário: I. Metodologia aplicada. II. Introdução. III. A responsabilidade civil das ONGs. IV. A responsabilidade civil dos dirigentes de ONGs. V. Conclusão. Referências bibliográficas.

I – METODOLOGIA APLICADA

Trata-se de uma síntese baseado nas principais conceitos doutrinários de autores da seara administrativa e civil. Recorremos a citações e reflexões de autores renomados sobre a matéria bem como a analise da legislação nacional pertinente. Usamos o método dedutivo na medida em que se analisamos a responsabilidade das ONGs ante os preceitos constitucionais; A dialética existente entre a responsabilidade solidária e subsidiária de seus dirigentes quando há o desvio de finalidade da ONG. Abstraímos a síntese consistente na obrigação da pessoa jurídica de reparar danos causados ao destinatário direto ou indireto do serviço.

II – INTRODUÇÃO

A Constituição Federal garante ser livre a associação de pessoas para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar (Art. 5º, XVII). Estas entidades gozam de alguns direitos previstos na Carta Maior, como por exemplo: a) a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas, independe de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento (artigo 5º, XVIII); b) as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado (artigo 5º, XIX).

A organização não governamental é uma modalidade de agrupamento de pessoas voltada à realização de atividades culturais, assistenciais, recreativas, ambientais etc. Maria Helena Diniz (2007:94) fala em: “associações de utilidade publica, que pelos seus serviços sócio assistenciais ou educacionais prestados de forma gratuita e desinteressadamente à coletividade”, ou seja, sem fins lucrativos, recebem benefícios (subsídios e/ou auxílios financeiros, isenção de impostos, etc.) governamentais para sua manutenção.

 Para que sejam reconhecidas é preciso que haja declaração de sua utilidade publica a nível federal estadual ou municipal. Preenchido os requisitos previstos nos artigos. 3º e 4º da Lei nº 9.790/99 dá-se o reconhecimento através de Portaria do respectivo Ministério a que se acham vinculadas.

III – A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS ONGs

Ordinariamente incube ao Estado a prestação de serviço público. Entretanto, em certas situações, ele firma contratos, convênios e termos de parceria com organizações da sociedade civil para que estas desempenhem o serviço a bem da coletividade. Alexandre Ciconello, advogado da ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais, em seu artigo, diz que na ultima década: “As ONGs fazem parte de uma esfera pública ampliada não estatal que tem legitimidade de receber recursos públicos para a realização de sua missão e de seus objetivos de construção de uma sociedade democrática, cidadã, igualitária e sustentável”.

Daí por que tais entes no desempenho de suas atribuições podem eventualmente lesionar o destinatário na execução de seus serviços. Para Maria Helena Diniz (2007, pág.279),

“[…] a indenização por danos decorrentes da intervenção estatal no domínio equivaleria a responsabilizar o Estado, não pela pratica abusiva de seus agentes, mas pelo exercício constitucional de fazer leis, regulamentos e atos normativos em geral, visando promover o bem comum e o desenvolvimento nacional, mandamentos insculpidos no art. 3º da constituição Federal.”

Clássico é o entendimento de comportamento culposo previsto no Art. 186 do Código Civil como “ação ou omissão voluntária, negligência ou impudência”. Com efeito, além de o agente agir objetivamente mal é essencial para qualificar a culpa a ação ou omissão do agente.[2] Uma vez verificada a culpa do agente nasce para o lesado o direito subjetivo consistente na ação de reparação pelos danos causados.

A teoria adotada no Brasil, a responsabilidade objetiva sob a modalidade do risco administrativo é a mais aceita pela doutrina. Segundo Hely Lopes Meirelles (2006, pág. 652), são suportes desta doutrina o risco e a solidariedade; estas tem espirito objetivo e de correspondente partilha de encargos pelas quais se alcançam a mais perfeita justiça distributiva. Esta é a razão porque tal teoria é a mais acolhida nos Estados Modernos, dentre eles o Brasil que a consagrou pela vez no art. 194 da CF de 1946.

Nas palavras do brilhante mestre “não se cogita da culpa da Administração ou de seus agentes, bastando que o lesado demonstre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do Poder Publico” (MEIRELLES, 2006). Sem dúvida, surge a obrigação de indenizar a vitima – reparar o dano- pelo simples fato da ocorrência de ato lesivo e injusto causado pela Administração ou seus agentes que agem nessa qualidade; é que o Estado executa indiretamente o serviço firmado por meio de convênio.

O fundamento jurídico desta teoria está previsto no Art. 37 §6º da Constituição Federal, a saber:

“§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

Por outro turno, a última parte do §6º do Art. 37 da CF/88 assegura ao Estado o direito de regresso contra terceiros desde que ele demostre a intervenção de agente externo no evento danoso com culpa total ou parcial destes. Demostrada tal participação, as pessoas jurídicas públicas ou privadas prestadoras de serviços públicos não se eximirão da obrigação de reparar o dano. Tal situação implica que as ONGs também respondem objetivamente pelos danos que seus agentes causarem à terceiros.

Para elucidar ainda mais o tema, assim tem decidido nossos tribunais no RE 591874/MS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, de 26.8.2009, publicado em informativo Nº 557:

“[…] reputou-se comprovado o nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não usuário do serviço público, e julgou-se tal condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado, nos termos do art. 37, § 6º, da CF […]. Asseverou-se que não se poderia interpretar restritivamente o alcance do art. 37, § 6º, da CF, sobretudo porque a Constituição, interpretada à luz do princípio da isonomia, não permite que se faça qualquer distinção entre os chamados “terceiros”, ou seja, entre usuários e não usuários do serviço público, haja vista que todos eles, de igual modo, podem sofrer dano em razão da ação administrativa do Estado, seja ela realizada diretamente, seja por meio de pessoa jurídica de direito privado. […]”

IV – A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS DIRIGENTES DE ONGs

Na apuração de responsabilidade ou na ação judicial que busca reparar danos causados à vitima, é comum que tanto a pessoa jurídica como seus dirigentes respondam pelos danos causados à vitima.

 Entretanto, conforme preleciona o Código Civil no “Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”, na última acepção a solidariedade é definida no contrato.  Entendemos por contrato todos os tipos de acordos e espécies de contratos e, como abordagem do estudo, os termos de parceria, convênios e os estatutos da ONGs. Deste modo, quando houver a responsabilidade solidária estarão obrigados ao montante de toda a reparação, ou seja, o credor poderá executar o patrimônio tanto da ONG como de seus dirigentes. (Art. 264 do Código Civil).

Quanto à responsabilidade subsidiária das associações: É necessário que conste no estatuto das ONGs se os sócios respondem ou não subsidiariamente pelas obrigações sociais da organização (Art. 997, VIII do Código Civil). Nesta modalidade, os sócios são obrigados a arcar com a obrigação usando seu próprio patrimônio, complementando tudo aquilo que a sociedade não conseguiu cumprir sozinha.

A exclusão da responsabilidade solidária ou subsidiária dos dirigentes alcança somente aquele que agiu de boa-fé na administração da organização. Do contrario, conforme o artigo 50 do código Civil:

“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.” (Grifamos)

É o que a doutrina moderna chama de despersonalização da pessoa jurídica.

V – CONCLUSÃO

As pessoas jurídicas prestam serviços públicos dentro dos limites estabelecidos em lei e em seus estatutos e devem cumprir o disposto no convenio firmado com o Estado. Em eventual inadimplemento do contrato, os seus bens respondem a fim de reparar os danos causados a terceiros.

Convém lembrar que nem sempre a simples ocorrência de dano importará na total responsabilidade das pessoas jurídicas responsáveis pelo serviço que presta à sociedade. Com efeito, verificada a intervenção de terceiros que concorrem para o risco danoso, culminando em prejuízo moral ou material, o Estado goza da prerrogativa de reaver do agente responsável os valores que dispendeu para sanar o dano causado à vitima.

 

Referências bibliográficas
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro 1988. Brasília: Senado Federal, 2011.
BRASIL. Código Civil Brasileiro, de 01 de outubro 2002. Brasília: Senado Federal, 2011.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 1. Teoria Geral do Direito. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
GONCALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações. Responsabilidade Civil. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
Ciconello, Alexandre; Larroudé, Elisa Rodrigues Alves. Relações com a administração Pública (Contratos, Convênios e Termos de Parceria). Disponível em: <http://www.abong.org.br/ongs.php?id=855>. Acesso em: 05 nov. 2011.
BRASIL. Supremo Tribunal federal. Informativo STF. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/Informativo557.htm>. Acesso em: 12 dez. 2011.
 
Notas:
 
[1] Artigo Orientado pelo Prof. Franck Sinatra Bezerra, advogado, coordenador do curso de Direito da UESPI e professor orientador.

[2] Carlos Roberto Goncalves. (Direito das Obrigações, p. 17 e 18). Para o autor a culpa consiste na falta de diligência que se exige do homem médio. Adverte ainda que muitas vezes a prova de culpa é difícil de ser obtida e, em casos específicos, a responsabilidade é fundada no risco independentemente de culpa.


Informações Sobre o Autor

Jailson Lira Silva

Acadêmico do curso de Direito da Universidade Estadual do Piauí


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