Resumo: No estudo a ser realizado será analisada a responsabilidade civil pré-contratual, também denominada de responsabilidade por culpa in contrahendo ou culpa na formação dos contratos, a qual corresponde à consagração do instituto do inadimplemento na fase pré-contratual. Inicialmente, será travada discussão acerca da adoção ou não pelo ordenamento jurídico pátrio do instituto da responsabilidade civil pré-contratual. Posteriormente, serão pontuados seus fundamentos jurídicos, para, em seguida, verificar os preceitos normativos adotados pelo Código Civil Brasileiro de 2002 aplicáveis à questão, em especial os conceitos gerais de boa-fé objetiva e função social do contrato. Por fim, serão apontados os dois enfoques da responsabilidade civil pré-contratual, a saber: a recusa de contratar e a quebra das negociações preliminares, de modo a demonstrar concretamente esta construção teórica.
Palavras-chave: Responsabilidade civil pré-contratual; Boa-fé objetiva; Negociações preliminares.
Sumário: Introdução; 1 Responsabilidade civil; 2 Responsabilidade civil pré-contratual, 2.1 Natureza jurídica e caracterização, 2.2 Classificação, 2.3 Fundamento jurídico; Considerações finais; Referências.
INTRODUÇÃO
Singular é a importância deste estudo, uma vez que se propõe a examinar o instituto da responsabilidade civil pré-contratual, que, como o próprio nome já evidencia, corresponde a uma das espécies da responsabilidade civil.
Esta análise será realizada à luz do conceito geral da boa-fé objetiva, consagrado expressamente pelo Código Civil Brasileiro[1], e, consequentemente, dos deveres acessórios de conduta por ela determinados.
Imprescindível se torna, pois, a verificação e distinção das teorias que justificam ou negam a aplicação da responsabilização civil nas hipóteses de ruptura das tratativas que antecedem o contrato e de recusa de contratar.
É bem de se ver, portanto, que a visão civil-constitucional das relações negociais, que enfatiza a boa-fé e a função social do contrato, permeará o desenvolvimento desse trabalho.
Em virtude de não haver previsão legal específica para a responsabilidade civil pré-contratual, trata-se, esta, de questão controvertida na doutrina e de ocorrência ainda incipiente na jurisprudência pátria.
Por tal razão, há posicionamentos bastante diversos no que concerne à possibilidade de aplicação da responsabilidade civil pré-contratual, motivo pelo qual é acentuada a necessidade de se firmar bases sólidas para a correta aplicação de tal norma jurídica pelos operadores do direito.
1 RESPONSABILIDADE CIVIL
A idéia que permeia a responsabilidade é a possibilidade de alguém responder por algo que causou a outrem por ação ou omissão. Partindo dessa premissa, Maria Helena Diniz conceitua a responsabilidade civil como
“[…] aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou ainda, de simples imposição legal (responsabilidade subjetiva).”[2]
O Código Civil a prevê em seu art. 927, estabelecendo que: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. O ato ilícito, por sua vez, é figura caracterizada pelo art. 186 do mesmo diploma jurídico, o qual a define como o ato causado por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência que viola direito e causa dano a alguém.
Além da recorrente caracterização da responsabilidade civil em subjetiva/objetiva, em razão da exigência ou não de configuração da culpa do agente, tal instituto também é comumente classificado de acordo com o critério da origem, da fonte da obrigação de reparar o dano causado.
Nessa vereda, a responsabilidade é contratual, quando possui como fonte uma relação jurídica obrigacional preexistente, ou extracontratual, também denominada de aquiliana, nas hipóteses em que a obrigação de indenizar é imposta por preceito geral de direito ou pela própria lei.
Conforme se demonstrará ao longo deste trabalho, há uma grande polêmica, tanto em sede doutrinária, quanto jurisprudencial, acerca do enquadramento da espécie de responsabilidade civil analisada, a pré-contratual, como responsabilidade contratual ou extracontratual.
Impõe ressaltar que não se trata de discussão meramente acadêmica, uma vez que o enquadramento da responsabilidade civil pré-contratual em uma dessas duas espécies é decisivo para a fixação do ônus da prova da culpa. Isto porque na responsabilidade extracontratual, a vítima tem que provar, além da conduta, do dano e do nexo causal entre estes elementos, a culpa do agente, o que, na maioria das vezes, não se trata de tarefa fácil. Na responsabilidade contratual, por sua vez, a culpa é presumida, o que significa que o ônus de sua prova é invertido, é repassado ao inadimplente, o qual deve provar não ter obrado em culpa.
Desse modo, são bastante distintas as conseqüências práticas da caracterização da responsabilidade civil pré-contratual em uma ou outra espécie de responsabilidade.
Todavia, antes de adentrar-se a esta análise, é imprescindível que sejam fixados os contornos e características essenciais deste instituto jurídico.
2 RESPONSABILIDADE CIVIL PRÉ-CONTRATUAL
2.1 NATUREZA JURÍDICA E CARACTERIZAÇÃO
A responsabilidade civil pré-contratual, também denominada de responsabilidade por culpa in contrahendo ou culpa na formação dos contratos, corresponde à obrigação de indenizar surgida anteriormente à conclusão do negócio juridico.
Nas palavras de Antônio Chaves,
“[…] há responsabilidade pré-contratual quando ocorre a ruptura arbitrária e intempestiva das negociações contrariando o consentimento dado na sua elaboração, de tal modo que a outra parte se soubesse que ocorria o risco de uma retirada repentina, não teria tomado as medidas que adotou.”[3]
A situação descrita corresponde, precisamente, à quebra das negociações preliminares, ou seja, ao rompimento injustificado da legítima expectativa de contratar, em prejuízo à parte que despendeu gastos, em razão de crer na celebração do contrato.
Contudo, a ocorrência de outra hipótese também configura a responsabilidade civil pré-contratual. Trata-se, precisamente, da recusa de contratar, caracterizada pela recusa injustificada na venda ou prestação de serviços, conduta esta que constitui, indubitavelmente, abuso de direito.
A primeira espécie de responsabilidade civil pré-contratual mencionada corresponde à quebra das tratativas preliminares, ao rompimento injustificado das negociações iniciais. Para que seja bem compreendida esta modalidade, é imprescindível analisar as distintas fases de formação do contrato, em especial a fase de puntuação, que abrange a negociação preliminar.
Neste sentido, ressalte-se que o processo de formação dos contratos é composto das seguintes fases: puntuação (correspondente às negociações ou tratativas preliminares), proposta e aceitação.
A proposta, também denominada de policitação, compreende a oferta de contratar que uma parte faz à outra. O Código Civil Brasileiro, em seu art. 427, estabelece o princípio da vinculação ou da obrigatoriedade da proposta, que determina que a proposta de contratar, regra geral, obriga o proponente.
Trata-se a aceitação, por sua vez, da aquiescência, por uma das partes, a uma proposta anteriormente formulada pela outra. Cumpre observar que o contrato só se forma com a junção destas últimas fases, com a reunião entre a proposta e a aceitação.
Em razão de estar absolutamente imbricada à temática da responsabilidade civil pré-contratual, a fase da puntuação será analisada de modo mais detalhado. Esta etapa se caracteriza pelas primeiras manifestações das partes a fim de demonstrar interesse em pactuar o contrato.
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, neste momento prévio “[…] as partes discutem, ponderam, refletem, fazem cálculos, estudos, redigem a minuta do contrato, enfim, contemporizam interesses antagônicos, para que possam chegar a uma proposta final e definitiva”. [4]
Ressalte-se que há quem defenda a independência da fase da minuta contratual em relação à etapa de puntuação, fundamentando-se no argumento de que esta última é caracterizada apenas por sondagens, enquanto a primeira pressupõe o estabelecimento de algumas condições mínimas, por meio do instrumento denominado “minuta de contrato”, cujo conteúdo servirá como base, como alicerce para o texto do contrato que será celebrado.
As negociações ou tratativas preliminares possuem como característica essencial a circunstância de não vincularem as partes a uma relação jurídica. Isto se justifica em razão de ser direito das partes a opção por celebrar ou não um contrato.
A responsabilidade passa a existir nesta fase, como via de exceção, quando este direito é exercido de modo puramente potestativo, ou seja, quando se verifica abuso do direito de contratar.
Dário Moura Vicente[5] ilustra com precisão esta modalidade de responsabilidade, apresentando a hipótese de um empresário estabelecido em uma cidade que convida um colega a viajar a outra cidade bem distante daquela, a fim de negociarem um contrato. Informa que este convidado efetua gastos com passagens de avião, aluguel de automóvel, reserva de hotel e que, posteriormente, após chegar ao escritório do anfitrião, este lhe informa já ter celebrado o contrato com um terceiro.
Após relatar esta hipotética situação, o autor admite a possibilidade de o convidado pleitear a responsabilização do anfitrião, solicitando o reembolso das despesas feitas, bem como indenização pela perda da oportunidade de celebrar o mesmo contrato com um terceiro, em razão de haver descumprido deveres de conduta que integram a relação entre as partes negociantes.
Ressalte-se que para que seja configurada a responsabilidade civil pré-contratual imperiosa se faz a verificação da seriedade nas negociações preliminares, a qual é a responsável por criar uma confiança entre estas. Ana Prata[6], com precisão, alerta que esta confiança não é a que uma parte, em razão de suas características psicológicas, depositou na outra, mas sim surge em razão de uma apreciação objetiva no quadro em que as negociações se desenvolveram.
É bem de se ver, pois, que o marco ensejador da responsabilidade civil pré-contratual é o descumprimento da boa-fé objetiva, e por conseguinte, dos deveres contratuais acessórios que dela advém.
Assim, a responsabilidade civil pré-contratual decorrente da quebra das negociações preliminares surge em razão do injustificado rompimento da legítima expectativa de contratação de uma parte, a qual incorreu em prejuízo em razão de gastos efetuados na certeza da celebração do contrato.
É inegável que o contrato não se esgota apenas com o cumprimento de sua obrigação principal de dar, fazer ou não fazer. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[7] precisamente relembram que ao lado desse dever jurídico, encontram-se outros, não menos relevantes, impostos pela boa-fé objetiva, como os deveres de informação, lealdade, confiança, assistência, de confidencialidade ou sigilo, dentre outros.
Há, indubitavelmente, na conduta daquele que rompe injustificadamente a justa expectativa de contratação, a quebra dos deveres de lealdade, probidade e de informação, gerando o dever de indenização dos danos dela decorrentes.
Não se pode admitir que as negociações preliminares sejam conduzidas com a omissão à outra parte de informações imprescindíveis para a decisão da contratação, tampouco que uma parte conduza negociações paralelas com terceiros sem informar à outra ou que rompa as tratativas iniciais arbitrariamente.
É bem de se ver, pois, que a boa-fé objetiva, distintamente da violadora da subjetiva, não exige a não a intenção de prejudicar, a inexistência de má-fé, mas apenas corresponde ao dever de se comportar com lealdade.
A responsabilidade civil pré-contratual decorrente da recusa de contratar, assim como a responsabilidade baseada no rompimento ilegítimo das negociações preliminares também se fundamenta no abuso de direito. Trata-se, nesta hipótese, do direito de contratar, decorrente do princípio da autonomia da vontade.
Assim, a recusa injustificada à contratação pode ensejar a discriminação do sujeito rechaçado. A análise de eventual responsabilização por recusa de contratar passa, portanto, pela necessidade de ponderação de dois princípios constitucionalmente assegurados, a autonomia da vontade e a igualdade, que possui como corolário a proibição à discriminação.
Também neste sentido entende Dário Moura Vicente, para quem:
“Avulta a este respeito a diferente hierarquização dos valores jurídicos que estão no cerne da problemática em apreço: a liberdade individual na negociação e conclusão dos contratos, por um lado, e a solidariedade traduzida no respeito pelos interesses legítimos da contraparte e na confiança que esta deposita na válida celebração do contrato, por outro”.[8]
Silvio Venosa também reconhece o inexorável liame entre a conduta abusiva da recusa injustificada de contratar e a obrigatoriedade de responsabilização:
“A recusa injustificada na venda ou na prestação de serviços constitui ato que se insere no campo do abuso do direito. O comerciante não está obrigado a vender, mas se dispôs a vender, não pode recusar-se a fazê-lo a quem pretende adquirir o objeto de sua mercancia. Essa conduta extravasa os limites do direito, é prática abusiva, pois existe um desvio de finalidade. (…) Quando um titular de uma prerrogativa jurídica, de um direito subjetivo, atua de modo tal que sua conduta contraria a boa-fé, a moral, os bons costumes, os fins econômicos e sociais da norma, incorre no ato abusivo. Em tal situação, o ato é contraditório ao Direito e ocasiona a responsabilidade do agente pelos danos causados.”[9]
2.2. CLASSIFICAÇÃO
Conforme mencionado anteriormente, interessante polêmica se trava, tanto em sede doutrinária, quando jurisprudencial, acerca do enquadramento da boa fé objetiva como espécie de responsabilidade civil contratual ou extracontratual. Relembra-se, ainda, que não se trata de discussão meramente acadêmica, uma vez que são impactantes os efeitos práticos que advém em razão da adoção de um ou outro entendimento.
Em razão de já haver sido bem enfatizada as características peculiares à responsabilidade contratual e à extracontratual ou aquiliana, passar-se-á diretamente à verificação dos diferentes posicionamentos adotados.
Novamente cita-se Sílvio Venosa, para quem, “[…] Não se trata exatamente de uma responsabilidade pré-contratual, porque contrato ainda inexiste, mas de um aspecto da responsabilidade aquiliana que tem a ver com o universo contratual”. [10]
É a teoria da responsabilidade extracontratual a adotada pela maioria dos ordenamentos jurídicos.
Em que pesem as alegações dos defensores desta corrente, há ainda os que classificam a responsabilidade civil pré-contratual como modalidade de responsabilidade contratual. Fundamentam este entendimento na circunstância de haver a violação de deveres de conduta específicos, decorrentes de uma relação jurídica pré-existente.
Neste sentido, sustenta Carlyle Popp:
“Há muito foi o tempo em que havia uma separação absoluta entre contrato celebrado e negociações contratuais. Estas, da mesma forma que a publicidade e a oferta, regem-se pelo sistema contratual. […] A relação jurídica não nasce do ilícito, mas é a ele preexistente. O dever genérico de não prejudicar não nasce do ordenamento jurídico, mas sim, do conteúdo das tratativas e das condutas das partes”.[11]
Por fim, há entendimento minoritário que atribui à responsabilidade civil pré-contratual a natureza de uma responsabilidade sui generis. Esta vertente doutrinária classifica esta figura como espécie de responsabilidade objetiva.
Passar-se-á à classificação da responsabilidade civil pré-contratual em subjetiva ou objetiva, a depender da necessidade da existência ou não da culpa. Neste particular também pairam questionamentos.
Tradicionalmente se defende que na responsabilidade civil pré-contratual, regra geral, há a exigência da culpa, em sua modalidade in contrahendo (daí se origina uma das denominações da responsabilidade civil pré-contratual, a saber: responsabilidade por culpa in contrahendo).
Argumenta-se que o parágrafo único do art. 927 do Código Civil Brasileiro é bastante explícito: apenas há a obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos previstos em lei, ou quando atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Todavia, já há corrente doutrinária que defende a dispensabilidade da exigência da culpa em situações nas quais o dano se originou de quebra da boa-fé objetiva.
Foi este, inclusive, o entendimento adotado na Jornada de Direito Civil (realizada em setembro de 2002), por meio do Enunciado nº 24, o qual dispõe: “Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa”.
Por fim, imprescindível se torna a distinção entre a responsabilidade civil pré-contratual e a responsabilidade que surge do descumprimento de uma modalidade contratual, a saber: o contrato preliminar.
Este instituto, denominado ainda de pré-contrato, promessa de contrato, contrato preparatório ou pactum de contrahendo, corresponde ao ajuste por meio do qual as partes se comprometem a celebrar, no futuro, o contrato principal. Este negócio jurídico vincula as partes, obrigando-as à conclusão do contrato principal, possuindo por objeto, portanto, uma obrigação de fazer, que é a de celebrar um contrato definitivo.
O contrato preliminar é previsto no Código Civil Brasileiro em seu art. 162, o qual exige que esta espécie contratual possua todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.
Diferentemente das negociações ou tratativas preliminares, o contrato preliminar possui natureza jurídica de contrato, razão pela qual em sendo descumprido o seu objeto, ou seja, caso uma parte se recuse a celebrar o contrato principal, poderá a outra parte exigir a tutela específica da obrigação.
Nesse sentido dispõe o art. 463 do Código Civil Brasileiro:
“Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.”
A responsabilidade civil pré-contratual, por sua vez, somente surge quando há dano causado a uma das partes, em razão do rompimento injustificado da avença pela parte que criou no lesado a justa expectativa de contratação.
Além disto, a responsabilização civil pré-contratual engloba, conforme já mencionado, as despesas efetuadas pela parte prejudicada, bem como aquilo que deixou de ganhar, ou seja, os danos emergentes e os lucros cessantes. Ou seja, da responsabilidade civil pré-contratual não surge, para a parte prejudicada, a possibilidade de exigir da outra a celebração do contrato cuja celebração foi ilegitimamente rompida.
2.3 FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Por tudo o que foi exposto, é inexorável a conclusão de que o fundamento da responsabilidade civil pré-contratual é o descumprimento da boa-fé objetiva, e por conseguinte, dos deveres contratuais acessórios que dela decorrem.
A boa-fé objetiva é princípio consagrado expressamente pelo Código Civil Brasileiro, que, em seu art. 422, exige seja a mesma observada pelos contratantes, tanto na conclusão do contrato, como em sua execução.
Pela importância deste dispositivo, residente na obrigatoriedade de sujeição das partes contratantes à probidade e lealdade, merece ele ser transcrito: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé”.
Uma interpretação literal desta disposição legal permite a conclusão de que o legislador não exigiu a obrigatoriedade de observância da boa-fé objetiva das fases pré e pós-contratual, razão pela qual seria possível se afirmar que antes e depois da celebração do contrato não estariam os contratantes atrelados ao respeito aos deveres jurídicos acessórios. A leitura açodada deste artigo induziria o intérprete a concluir que a estes deveres devem ser respeitados apenas na fase de conclusão dos contratos, a qual corresponde à troca das declarações de vontade, ou seja, à junção entre a proposta e a aceitação.
Em que pesem estes argumentos, a melhor doutrina, a qual corresponde à grande maioria daqueles que se propuseram a tratar desta temática, defende que também a fase das tratativas preliminares está abrangida pela obrigatoriedade da observância da boa-fé e da probidade.
É neste sentido, inclusive, o Enunciado 25 da Jornada de Direito Civil (realizada em setembro de 2002), que assim dispõe: “O art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual”.
Cumpre ressaltar que já há, inclusive, Projeto de Lei (Projeto Fiuza – nº 6960/2002) tendente a corrigir esta deficiência de formulação do art. 422 do Código Civil Brasileiro, passando este a assim dispor:
“Os contraentes são obrigados a guardar, assim nas negociações preliminares e conclusão do contrato, como em sua execução e fase pós-contratual, os princípios da boa-fé e tudo mais que resulte da natureza do contrato, da lei, dos usos e das exigências da razão e da equidade.”
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Imprescindível era a comprovação da indispensabilidade da responsabilização dos indivíduos que causaram danos a outros, em razão do rompimento injustificado da legítima expectativa de contratar e por meio da recusa de contratar.
Outra não poderia ser a conclusão desta obra, uma vez que impera em nosso sistema jurídico o princípio da reparação integral dos danos causados. Por esta razão, a responsabilização civil se impõe, como o mecanismo mais útil de prevenção e sanção de atos ilícitos.
Por fim, impõe-se observar que o presente trabalho de modo algum pretendeu esgotar o tema proposto. As proposições aqui sugeridas representam apenas mais um instrumento hábil a conferir maior proteção aos indivíduos prejudicados por atos abusivos, por condutas que afrontam com as diretivas adotadas tanto pela Constituição Federal, quanto pelo Código Civil Brasileiro.
Um simples incentivo, um estímulo que o presente trabalho possa representar ao aprofundamento dos estudos relacionados à importantíssima temática da responsabilidade civil pré-contratual, já trará grande satisfação e sensação de dever cumprido.
Informações Sobre o Autor
Thais Borges da Silva
Auditora-Fiscal do Trabalho; Pós-Graduada em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Público e Pós-Graduanda em Direito Civil e Processo Civil.