A Responsabilidade Penal Das Pessoas Jurídicas Por Crimes Ambientais

Marcela Bahia de Sá Teles[1]

Agnaldo Dias Viana [2]

Resumo: A presente pesquisa objetiva analisar a possibilidade da responsabilização penal de pessoas jurídicas face o cometimento de crimes ambientais. Visa investigar a evolução histórica do ordenamento constitucional brasileiro frente a proteção legal ao meio ambiente. Pretende-se também abordar as diversas formas de responsabilização da pessoa jurídica, levando em consideração aspectos penais atinentes a diversos tipos de cometimentos infracionais. Por fim, busca-se abordar necessariamente a responsabilização das pessoas jurídicas por crimes ambientais, introduzida pela Constituição Federal de 1988.

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Nesse diapasão, ao decorrer deste trabalho, pretende-se compreender a real conjuntura da possibilidade referente a tal responsabilização penal, principalmente quanto à obediência aos preceitos constitucionais e aos princípios penais.

Palavras-chave: Proteção ao Meio Ambiente; Responsabilização penal de pessoas jurídicas; Legalidade.

 

Abstract: This present research aims to examine the possibility of criminal liability of corporations committing crimes against the environment. Investigates the historical evolution of Brazilian legal constitutional protection for the environment. It is also intended to address the various forms of corporate accountability, taking into account criminal aspects pertaining to various types of infractions commitments. Finally, we seek to address necessarily accountability of corporations for environmental crimes, introduced by the 1988 Federal Constitution.

In this vein, the course of this work, we intend to understand the real situation regarding the possibility that criminal accountability, particularly regarding obedience to constitutional precepts and principles criminal.

Keywords: Environmental Protection; Criminal accountability of corporations; Legality.

 

Sumário: Introdução; 1. Evolução da proteção constitucional ao Meio Ambiente; 2. Da responsabilização da Pessoa Jurídica; 3. Da responsabilidade penal da Pessoa Jurídica por crimes ambientais; Conclusão; Referências.

 

INTRODUÇÃO

A necessidade da apropriação da natureza frente a crescente demanda social vem gerando um descontrole principalmente por parte dos entes corporativos, o qual, visando legitimamente o lucro e a apropriação do patrimônio ambiental brasileiro, são reconhecidamente os maiores degradadores do meio ambiente.

Desta forma, procurando salvaguardar o patrimônio natural, ao longo dos anos foram editadas normas coercitivas e criados órgãos públicos, a fim de regulamentar a utilização consciente deste bem, o artigo 3º da Lei 6. 938 de 1981 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente) trouxe a definição legal de meio ambiente, estabelecendo “o conjunto de condições, leis, influencias e interações de ordem física, química e biológica que permite, obriga e rege a vida em todas as suas formas”, assim vislumbra-se que esta crescente preocupação com temas ambientais, retrata a atual ineficácia dos instrumentos de proteção e conservação do meio ambiente.

No Brasil, a responsabilização da pessoa jurídica no âmbito penal, gerou durante muito tempo uma discussão acalorada entre ambientalistas e penalistas, intensificada, no entanto, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a qual, especificamente em seu artigo 225, parágrafo 3º, inovou a matéria doutrinaria e incorporou a responsabilização penal das pessoas jurídicas por crimes ambientais, ainda assim, foi necessariamente a partir da edição da Lei 9.605 de 1998 que houve a concretização efetiva da tutela ao meio ambiente.

Em contraposição, os penalistas sustentam a preponderância do Princípio Penal “societas delinquere non potest”, ou seja, não existe a possibilidade de qualquer responsabilização penal coletiva.

Desta forma, a presente pesquisa acadêmica, visa compatibilizar os princípios do Direito Penal com a necessidade de sancionar aqueles entes corporativos que de algum modo prejudicam o desenvolvimento sustentável.

 

  1. EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO MEIO AMBIENTE

O incremento das normas de proteção ao meio ambiente é dividido pela doutrina em três fases, partindo-se do período compreendido entre o descobrimento do Brasil (ano de 1500) até quase metade do século XX, onde essa primeira etapa é manifesta como a fase da exploração desregrada, caracterizado pela ausência de regulamento frente à proteção do meio ambiente, muito em razão da livre iniciativa e consequentemente limitação da atuação Estatal.

Nas normas portuguesas que regeram o país até a promulgação da carta civil de 1916 encontramos tratamentos esparsos sobre o meio ambiente, mas com o intuito distinto do de amparo desse bem jurídico. Como exemplo, a proibição esculpida nas Ordenações Filipinas em seu Livro V, Título LXXVIII, quanto ao abate de animais por mera malícia, cuja violação culminava na pena de caráter perpétuo. Contudo, o real intento da referida norma se rege à conservação do patrimônio individual, dos interesses da Coroa Portuguesa e das classes dominantes, e não na proteção do ambiente, como expressa Edis Milaré: “Toda essa legislação antiga, complexa, esparsa e inadequada, deixava imune (se é que não o incentivava) o esbulho do patrimônio natural, despojado do seu caráter de bem comum e tratado ignominiosamente como propriedade privada, gerido e explorado sem escrúpulos, com discricionariedade acima de qualquer legislação coerente, de qualquer interesse maior”. [3]

A segunda fase de desenvolvimento da proteção jurisdicional ao meio ambiente ocorreu com a República brasileira e, mais especificadamente, com a promulgação do Código Civil de 1916.

Moacir Martini de Araújo conceitua essa segunda fase de fase fragmentária, em que se nota um aumento na atenção dada a preservação de recursos naturais. Todavia ainda se apresenta atrelada a áreas de interesse econômico, de modo a resguardar apenas de forma pontual alguns aspectos do ambiente.[4]

Esse avanço fica evidente nos artigos 554 e 584 da legislação civil de 1916:

 

“Art. 554. O proprietário, ou inquilino de um prédio tem o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam”

“Art. 584. São proibidas construções capazes de poluir, ou inutilizar para o uso ordinário, a água de poço ou fonte alheia, a elas preexistente”.

 

Tais normatizações alicerçaram a edificação da orientação jurisprudencial preocupada com a degradação ambiental, principalmente com a noção de vizinhança, entendida como a área em que eram sentidos os resultados lesivos do uso da propriedade, e com a poluição gerada pelas indústrias.

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Pode-se citar também como resultado dessa abordagem o surgimento de diversas codificações (Código de Águas, Código Florestal, Código de Pesca, etc., todos ainda em vigor) a regular a exploração de atividades econômicas e a utilização da propriedade de modo a prevenir danos ao meio ambiente.

Ainda assim, as questões relacionadas ao meio ambiente ainda eram tratadas de forma subsidiária pela legislação, dependentes de temas como saúde pública e preservação dos recursos naturais indispensáveis à vida humana, não havendo uma preocupação expressa com a  preservação do ambiente natural, como muito bem observa Raul Machado Horta[5], o “tema ambiental se confundia com a autorização conferida à União para legislar sobre defesa e proteção da saúde ou com a proteção aos monumentos históricos, artísticos e naturais, às paisagens e aos locais particularmente dotados pela natureza.”

Uma possível causa para a dificuldade ao se enfocar a preservação do ambiente de forma universal decorre de uma visão puramente econômica, vinculada principalmente à expansão de capital independentemente dos efeitos que possam causar, onde os limites sob a argumentação de preservação ambiental nada mais seriam do que justificativas para o progresso financeiro. Nesse sentido, o meio ambiente nada mais seria do que uma forma de exploração pela sociedade.

A terceira etapa, começou-se a substituir o termo crescimento econômico por desenvolvimento econômico, revelando assim, uma preocupação maior  com a proteção do meio ambiente.

Em 1964, com a implementação do regime militar, houve um retrocesso na relação protetiva do Estado para com o meio ambiente, sua administração discricionária e autoritária gerou uma hipertrofia dos poderes da União e a concretização do I e II Plano Nacional de Desenvolvimento, provocando verdadeiros desastres ambientais em pro do interesse econômico.

Juraci Perez Magalhães, em seu livro A evolução do Direito Ambiental no Brasil, retrata com exatidão esse catastrófico momento na evolução ambiental:

 

“Vale lembrar que ainda na década de 1960 tivemos uma nova Constituição, a de 1967, emendada em 1969, emenda esta que equivaleu a outra Constituição. Essa duas cartas não se preocuparam em proteger o meio ambiente de forma específica, mas sim de maneira diluída. Há referências separadas a elementos integrantes do meio ambiente, tais como florestas, caça e pesca. Analisando essas cartas, notamos que a Constituição de 1967 manteve, como a anterior, a necessidade de proteção do patrimônio histórico, cultural e paisagístico (artigo 172, parágrafo único) disse  ser atribuição da União legislar  sobre normas gerais de defesa da saúde, sobre jazidas, florestas, caça, pesca e águas (artigo 8º). A Constituição de 1969 manteve essa situação, trazendo uma novidade no artigo 172, ao dispor que a lei regulará mediante prévio levantamento ecológico, o aproveitamento agrícola de terras sujeitas a intempéries e calamidades, e que o mau uso da propriedade impedirá o proprietário de receber incentivos e auxílios do Governo.” 

 

Com a promulgação da Constituição de 1899, ocorreu um grande avanço em matéria ambiental, contendo um capítulo próprio para a matéria ambiental, elevando assim, o meio ambiente como bem autônomo e digno de ser considerado como direito fundamental, sendo considerada pela doutrina como a Constituição Verde e uma das normas mais avançadas do mundo em proteção ambiental.

O artigo mais importante da Carta Magna é o 225, caput, onde prevê que: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Quando o meio ambiente é conceituado como bem de uso comum, fica retratada a titularidade de natureza difusa, estendendo sua aplicação tanto aos bens de natureza privada quanto aos bens de natureza pública, como nos relata o doutrinador Paulo de Bessa Antunes[6]:

“Não se olvide, contudo, que o conceito de uso comum de todos rompe com o tradicional enfoque de que os bens de uso comum só podem ser bens públicos. Não, a Constituição Federal estabeleceu que, mesmo no domínio privado, podem ser fixadas obrigações para que os proprietários assegurem a fruição, por todos, dos aspectos ambientais de bens de sua propriedade. A fruição, contudo, é mediata, e não imediata. O proprietário de uma floresta permanece proprietário da mesma, pode estabelecer interdições   quanto à penetração e permanência de estranhos no interior de sua propriedade. Entretanto, está obrigado a não degradar as características ecológicas que, estas sim, são de uso comum, tais como a beleza cênica, a produção de oxigênio, o equilíbrio térmico gerado pela floresta, o refúgio de animais silvestres, etc.”  

 

  1. DA RESPONSABILIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

O conceito de Pessoa Jurídica é definido como sendo a reunião de pessoas ou bens destinados a uma finalidade aceita pelo direito e dotada de direitos e obrigações em detrimento desse reconhecimento jurídico, ou seja, sua personalidade é distinta da de seus instituidores, decorrendo assim de uma existência lícita autônoma.

Dentre as diversas teorias que explicam a natureza jurídica do ente moral, três delas merecem destaque na presente pesquisa, a teoria da ficção jurídica, da realidade objetiva ou orgânica e da realidade jurídica.

A teoria da ficção teve como principal precursor Savigny, o qual defendia que apenas a pessoa natural terá capacidade de se tornar titular das relações jurídicas, por possuir a vontade real, essa teoria, no entanto cai por terra quando pensamos na figura do Estado, que mesmo possuindo uma natureza de pessoa jurídica possui a capacidade de ação, Roberto de Ruggiero subscreve a inconsistência dessa teoria:

Compreende-se facilmente como uma tal concepção seja inadequada para descrever a verdadeira essência da pessoa jurídica. A ficção é um mero artifício e não é com ela que se cria um ente, que seja distinto das simples pessoas dos componentes da corporação, ou dos administradores ou destinatários dos bens da fundação. Se o sujeito de direitos só pode ser o homem e aqui não existe tal sujeito, nada se obtém fingindo que ele existe. Nem vale de muito declarar que a ficção se deve reduzir a uma relação de analogia, em virtude da qual, devendo o direito referir-se a um sujeito diverso do homem, a entidade se concebe antromòrficamente, sendo a ela que como sujeito se atribui o direito, anàlogamente ao que sucede com a pessoa  física. Na verdade, também nada há de real no sujeito se a sua existência é  e permanece apenas imaginária”[7]

 

Já a teoria da realidade objetiva, a determinação da natureza da pessoa jurídica está presente na vontade, sendo esta o núcleo de surgimento do ente coletivo, estando no entanto, separada da vontade dos seus membros, tornando-se  uma vontade autônoma.

Contudo, a citada teoria sofreu duras críticas no sentido de que “desde que não se finja existir uma pessoa, se eleva à categoria de sujeito uma entidade abstrata: a vontade, personificando-se esta vontade com um procedimento que não corresponde à realidade das coisas” [8].

O citado empecilho gerou o surgimento da terceira teoria sob a argumentação de uma comparação entre um organismo humano e a estrutura organizacional da pessoa jurídica, sendo dotado de interesses próprios

Clóvis Bevilaqua defende a teoria orgânica da pessoa jurídica, explicando a maneira lógica da personificação dos entes morais:

 

“O direito é alguma coisa de vivo, que consiste em transformações constantes e que necessita de renovações ininterruptas, pois que a natureza se evolve, mudam as necessidades e, com estas, o direito. Daí resulta que o sujeito do direito deve ser formado de modo que possa acompanhar as mutações do movimento, de modo que possa entrar nesse movimento de uma maneira correspondentemente racional, isto é, conforme às [sic] determinações do direito. Por isso a ordem jurídica exige que os sujeitos de direito sejam, ao menos em sua generalidade, capazes de agir racionalmente. Na primeira linha, aparece o homem, que é um ser dotado de razão, e, depois, os seres aos quais se pode fornecer a razão humana pela anexação de órgãos.

Assim, naturalmente, se constituem dois gêneros de pessoas: as corpóreas ou físicas e as morais ou jurídicas. Umas e outras são igualmente reais; a distinção está em que uma são dotadas, naturalmente, de razão, ao passo que, às outras, a racionalidade é parcialmente adquirida, mediante um arranjo especial do homem;  umas receberam o seu organismo da própria natureza, ao passo que as outras somente conseguem a forma orgânica, porque as penetra a natureza humana”[9]

 

No trecho transcrito fica evidente o entendimento do aclamado autor, de que defende a personificação das pessoas jurídicas e sua conseqüente possibilidade de responsabilização por seus atos, mais especificamente por crimes cometidos.

Seguindo a mesma linha de pensamento, Rothenburg ressalta, a mudança comportamental do indivíduo quando atua de forma associada:

 

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“Admitindo-se que o princípio da personalidade não diz respeito somente às penas, mas principalmente à imputação, pretender sujeitar o indivíduo ao invés de o grupo em função do qual aquele agiu (ou vice-versa) seria desrespeitar a própria personalidade.

Vai daí que não apenas seria um equívoco desconhecer que a pessoa jurídica atua através de órgãos onde estão, nessa condição, antes ‘presentantes’ da entidade do que indivíduos em si considerados, mas igualmente um contra-senso: enquanto indivíduos particulares, não se teriam comportado como se comportaram enquanto ‘presentantes’ da pessoa jurídica”[10]

 

Em outros ramos jurídico, como o direito civil e o administrativo é admitida a capacidade de ação das pessoas jurídicas, possuindo ainda vontade própria e responsáveis por suas atuações, tanto licitas quanto ilícitas, não cabendo assim, uma aplicação diferenciada frente a outro ramo jurídico frente ao mesmo instituto.

Schecaira, ainda complementa:

 

“Já se verificou que um dos principais objetivos atribuídos modernamente à pena é exatamente o de reprovar a conduta em conflito, a fim de validar o conceito de bem jurídico para a maioria do grupo social. Disso decorre que a imposição da pena deve ter como objetivo precípuo sua relevância pública e não objetivos morais. Dessa forma, pensar em impor objetivos morais a uma empresa, mais do que um contra-senso, é tentar reavivar algo que mesmo relativamente às pessoas físicas já não deve ser aplicado” [11].

 

É de suma importância ainda, compreender as palavras do mestre Muñoz Conde:

 

“A culpabilidade não é um fenômeno individual, mas social. Não é uma qualidade da ação, mas uma característica que se lhe atribui para poder imputá-la a alguém como seu autor e fazê-lo responder por ela. É, pois, a sociedade, ou melhor, seu Estado representante, produto da correlação de forças sociais existentes em um determinado momento histórico, quem define os limites do culpável e do inculpável, da liberdade e da não liberdade”[12]

 

Ney de Barros Bello Filho também aponta para a necessidade de compreenção do conceito de culpabilidade dos entes coletivos:

“A base do pensamento segundo o qual a culpabilidade pode ser conceito presente na atitude da pessoa jurídica surge da certeza de que culpa não é algo que possa fluir de  uma realidade natural e que possa ser provada com base em uma atitude científica.

Culpa é, na verdade, um conceito de natureza filosófica que pode ser flexibilizado ou revisto a partir de uma tomada de postura diferenciada frente ao fenômeno que se quer estudar. Quando um comportamento está agredindo bens jurídicos tidos por relevantes, há um rompimento de regras de natureza social; é o próprio direito que conceitua o que vem a ser culpa, tratando-se, pois, de um conceito normativo e não de um conceito natural”[13]

 

Assim, fica evidente que o conceito de culpabilidade dos atos praticados por pessoas jurídicas vem sofrendo uma reestruturação, principalmente pela argumentação de que essa culpabilidade social é refletida no descumprimento do papel social que se espera de todo ente coletivo.

 

  1. DA RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES AMBIENTAIS

Em detrimento ao entendimento mundial na atualidade, o legislador inseriu na Constituição Federal, dispositivos que conferem ao ente moral a responsabilização penal por atos cometidos contra a ordem econômica, financeira e familiar, a exemplo dos artigos transcritos a seguir:

 

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. […]

  • 5º. A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

 

Ademais, introduziu no bojo constitucional um capítulo inerente ao meio ambiente, em que reza em seu artigo 225, § 3º a possibilidade de responsabilizar as pessoas jurídicas por crimes acometidos contra o ambiente, senão vejamos:

 

CRFB/88 – Art. 225, Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. […]

  • 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. […].

 

Apesar das divergências doutrinárias, Walter Rodrigues da Cruz (2000. p. 177), entende que a Carta Magna estendeu a responsabilização dos dirigentes de entes jurídicos por atos praticados pelo mesmo, visto que uma pessoa jurídica não tem a capacidade de cometer ilícitos penais sem a figura de seus dirigentes praticando tal ação.

Já Miguel Reale, (2001. p. 138), defende a perspectiva de que a Constituição deverá ser interpretada da seguinte forma: “as pessoas físicas ou jurídicas sujeitam-se respectivamente a sanções penais e administrativas”.

No entanto, arte da Doutrina, incluindo Luiz Regis Prado (2010 p.135), entende que “não são as pessoas jurídicas passíveis sequer de aplicação de medidas de segurança de caráter penal, já que para isso faz-se mister uma ação ou omissão típica e ilícita”.

Embora tal questionamento ainda não estivesse pacificado pela Doutrina, o legislador infraconstitucional, fez aprovar em 1998, a lei nº 9.605, que exprime:

“Lei 9.605/98 – Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.”

 

Seguindo SHECARIA, 2011, p. 91, não é possível responsabilizar penalmente a pessoa jurídica sem desobedecer ao princípio da personalidade das penas, consagrado no nosso ordenamento jurídico:

 

“A condenação de uma pessoa jurídica poderia atingir pessoas inocentes como os sócios minoritários, que votaram contra a decisão, os acionistas que não tiveram participação na ação delituosa, em fim, pessoas físicas que indiretamente seriam atingidas pela sentença condenatória.”

 

Em contrapartida,  favorável a responsabilização penal da pessoa jurídica, José Afonso da Silva (2000, p. 87), conclui que:

 

“[…] o dispositivo constitucional prevê a possibilidade de responsabilização das pessoas jurídicas, independente da responsabilidade de seus dirigentes, sujeitando-as ás punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica que tem como um de seus princípios a defesa do meio ambiente.”

 

Fausto Martin de Sanctis (1999, P. 09), defende que:

 

“O legislador constitucional, atento às novas e complexas formas de manifestações sociais, mormente no que toca à criminalidade praticada sob o escudo das pessoas jurídicas, foi ao encontro da tendência universal de responsabilização criminal. Previu, nos dispositivos citados, a responsabilidade penal dos entes coletivos nos delitos praticados contra ordem econômica e financeira e contra a economia popular, bem como contra o meio ambiente.”

 

Cabe transcrever o posicionamento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (STF), atento as novas tendências mundiais e como guardião da carta maior, vem admitindo a responsabilização penal do ente jurídico nas violações ao meio ambiente, senão vejamos:

 

  1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de ANTONIO CARLOS DA SILVA, contra decisão proferida pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça nos autos doHC nº 43.751, que lhe foi denegado:”HABEAS CORPUS . CRIMES AMBIENTAIS. INÉPCIA DA DENÚNCIA: INOCORRÊNCIA. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. EXAME DE PROVAS. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CABIMENTO. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO” SOCIETAS DELINQUERE NON POTEST “. RESPONSABILIDADE SOCIAL.VIOLAÇÃO DO ART. 225§ 3º, DA CF/88 E DO ART.  DA LEI 9.608/98. POSSIBILIDADE DO AJUSTAMENTO DAS SANÇÕES PENAIS A SEREM APLICADAS À PESSOA JURÍDICA. NECESSIDADE DE MAIOR PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE.Descabe acoimar de inepta denúncia que enseja a adequação típica, descrevendo suficientemente os fatos com todos os elementos indispensáveis, em consonância com os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, de modo a permitir o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa.A alegação de negativa de autoria do delito em questão não pode ser apreciada e decidida na via do habeas corpus , por demandar exame aprofundado de provas, providência incompatível com a via eleita.Ordem denegada”(HC nº 43.751, rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ de 17.10.2005)”.Alega o impetrante que o paciente está sendo processado pela prática dos delitos previstos nos arts. 42 e 65 do Decreto-Lei nº 3.688/41 e art. 54, § 3o, c.c art. 56, caput, Lei9.605/98, em razão de a denúncia, reputada de genérica, atribuir a ele responsabilidade objetiva por tais ilícitos.Diante disso, requer a concessão de liminar para suspender o andamento da Ação Penal nº 049.03.000109-0, em trâmite na 2a. Vara Criminal da Comarca de Venda Nova do Imigrante/ES e, no mérito, pleiteia o seu trancamento.2. Incognoscível o writ.A denúncia, que deu origem à mencionada ação penal, foi oferecida exclusivamente contra Rodrigo Sgaria Zandonadi e Roncar Indústria e Comércio Exportação Ltda. (anexo 1 – fls. 21-23).O ora paciente, que se afirma representante legal da Roncar Indústria e Comércio Exportação Ltda., apenas foi citado para que, nos termos do art. 12, inc. I, do Código de Processo Civil, representasse a pessoa jurídica denunciada, porque não pode esta, como é óbvio, presentar-se por si mesma em juízo para a realização dos atos processuais.É o que se extrai da denúncia (anexo 01):”Requer o Ministério Público Estadual a citação dos denunciados, para serem interrogados, a segunda na pessoa de seu representante legal e nos termos do artigo 12 inciso VI do Código de Processo Civil, apresentarem suas defesa, pena de revelia, com oitiva das testemunhas de acusação abaixo arroladas para finalmente serem condenados o primeiro acusado nas penas dos artigos 42 e 65 do Decreto Lei 3688/41 e artigo 54da Lei 9605/98 c/c 29 e a segunda denunciadas nas penas dos artigos 42 e 65 do Decreto Lei 3688/41 e artigos 54§ 3o c/c artigo 56, caput, da Lei 9605/98, e, artigo 29 na forma do artigo 71, ambos do Código Penal“(fls. 22. Grifei).Assim, a ação penal não foi instaurada contra o paciente, mas, sim, contra a pessoa jurídica de que ele é presentante legal e que, nos termos dos incs. do art. 21da Lei nº 9.605/98, somente poderá ser punida com multa, pena restritiva de direitos e/ou prestação de serviços à comunidade.Dessa forma, não vislumbro interesse que legitime o paciente ao uso de habeas corpus, pois inexiste risco de constrangimento ilegal à sua liberdade de locomoção em razão da Ação Penal nº 049.03.000109-0, em trâmite na 2a. Vara Criminal da Comarca de Venda Nova do Imigrante/ES.3. Isto posto, não conheço deste habeas corpus, nos termos dos arts.38 da Lei nº 8.038, de 28.05.1990, e 21, § 1º, do RISTF.Publique-se. Int.Brasília, 12 de maio de 2006. HC 88747 ES – Relator Ministro CEZAR PELUSO – Julgamento 12/05/2006, Publicado no DJ em 22/05/2006 – PP – 00022. (grifo Nosso).

 

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. HABEAS CORPUS PARA TUTELAR PESSOA JURÍDICA ACUSADA EM AÇÃO PENAL. ADMISSIBILIDADE. INÉPCIA DA DENÚNCIA: INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE RELATOU A SUPOSTA AÇÃO CRIMINOSA DOS AGENTES, EM VÍNCULO DIRETO COM A PESSOA JURÍDICA CO-ACUSADA. CARACTERÍSTICA INTERESTADUAL DO RIO POLUÍDO QUE NÃO AFASTA DE TODO A COMPETÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA E BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. EXCEPCIONALIDADE DA ORDEM DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM DENEGADA. I – Responsabilidade penal da pessoa jurídica, para ser aplicada, exige alargamento de alguns conceitos tradicionalmente empregados na seara criminal, a exemplo da culpabilidade, estendendo-se a elas também as medidas assecuratórias, como o habeas corpus. II – […] III – Em crimes societários, a denúncia deve pormenorizar a ação dos denunciados no quanto possível. Não impede a ampla defesa, entretanto, quando se evidencia o vínculo dos denunciados com a ação da empresa denunciada. IV – Ministério Público Estadual que também é competente para desencadear ação penal por crime ambiental, mesmo no caso de curso d’água transfronteiriços. V – Em crimes ambientais, o cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta, com conseqüente extinção de punibilidade, não pode servir de salvo-conduto para que o agente volte a poluir. VI – O trancamento de ação penal, por via de habeas corpus, é medida excepcional, que somente pode ser concretizada quando o fato narrado evidentemente não constituir crime, estiver extinta a punibilidade, for manifesta a ilegitimidade de parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal. VII – Ordem denegada HC 92921 / BA – BAHIA, relator Ministro Ricardo Lewandowski – Primeira turma – Julgamento em 19/08/2008. (grifo Nosso)

 

É importante ainda admitir o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), reconhecendo também essa responsabilização:

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE QUALIFICAR-SE A PESSOA JURÍDICA COMO PACIENTE NO WRIT. SISTEMA OU TEORIA DA DUPLA IMPUTAÇÃO. DENÚNCIA. INÉPCIA NÃO VERIFICADA. I – A orientação jurisprudencial desta Corte firmou-se no sentido de não se admitir a utilização do remédio heróico em favor de pessoa jurídica (Precedentes). II – Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que “não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio” cf. Resp nº. 564960/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes). III – A denúncia, a teor do que prescreve o art. 41 do CPP, encontra-se formalmente apta a sustentar a acusação formulada contra o paciente, porquanto descrita sua participação nos fatos em apuração, não decorrendo a imputação, de outro lado, pelo simples fato de ser gerente da pessoa jurídica ré. Ordem parcialmente conhecida e, nesta parte, denegada. (HC 93867/GO HABEAS CORPUS 2007/0259606-6, 5ª Turma, rel. min. Felix Fisher, j. 08/04/2008, v.u, DJe 12/05/2008). (grifo nosso)

 

CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL PRATICADO POR PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DO ENTE COLETIVO. POSSIBILIDADE. PREVISÃO CONSTITUCIONAL REGULAMENTADA POR LEI FEDERAL. OPÇÃO POLÍTICA DO LEGISLADOR. FORMA DE PREVENÇÃO DE DANOS AO MEIO-AMBIENTE. CAPACIDADE DE AÇÃO. EXISTÊNCIA JURÍDICA. ATUAÇÃO DOS ADMINISTRADORES EM NOME E PROVEITO DA PESSOA JURÍDICA. CULPABILIDADE COMO RESPONSABILIDADE SOCIAL. CO-RESPONSABILIDADE. PENAS ADAPTADAS À NATUREZA JURÍDICA DO ENTE COLETIVO. RECURSO PROVIDO. I. Hipótese em que pessoa jurídica de direito privado, juntamente com dois administradores, foi denunciada por crime ambiental, consubstanciado em causar poluição em leito de um rio, através de lançamento de resíduos, tais como, graxas, óleo, lodo, areia e produtos químicos, resultantes da atividade do estabelecimento comercial. II. A Lei ambiental, regulamentando preceito constitucional, passou a prever, de forma inequívoca, a possibilidade de penalização criminal das pessoas jurídicas por danos ao meio-ambiente. III. A responsabilização penal da pessoa jurídica pela prática de delitos ambientais advém de uma escolha política, como forma não apenas de punição das condutas lesivas ao meio-ambiente, mas como forma mesmo de prevenção geral e especial. IV. A imputação penal às pessoas jurídicas encontra barreiras na suposta incapacidade de praticarem uma ação de relevância penal, de serem culpáveis e de sofrerem penalidades. V. Se a pessoa jurídica tem existência própria no ordenamento jurídico e pratica atos no meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de responsabilização penal. VI. A culpabilidade, no conceito moderno, é a responsabilidade social, e a culpabilidade da pessoa jurídica, neste contexto, limita-se à vontade do seu administrador ao agir em seu nome e proveito. VII. […]. A atuação do colegiado em nome e proveito da pessoa jurídica é a própria vontade da empresa. […] X. A Lei Ambiental previu para as pessoas jurídicas penas autônomas de multas, de prestação de serviços à comunidade, restritivas de direitos, liquidação forçada e desconsideração da pessoa jurídica, todas adaptadas à sua natureza jurídica. XI. Não há ofensa ao princípio constitucional de que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado…”, pois é incontroversa a existência de duas pessoas distintas: uma física – que de qualquer forma contribui para a prática do delito – e uma jurídica, cada qual recebendo a punição de forma individualizada, decorrente de sua atividade lesiva. XII. A denúncia oferecida contra a pessoa jurídica de direito privado deve ser acolhida, diante de sua legitimidade para figurar no pólo passivo da relação processual-penal. XIII. Recurso provido, nos termos do voto do Relator. Recurso especial nº 564.960 – SC (2033/0107368-4) – Relator Ministro Gilson Dipp – Quinta turma – Data do julgamento 02/06/2005. (grifo nosso).

 

RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE.  OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIZAÇÃO SIMULTÂNEA DO ENTE MORAL E DA PESSOA FÍSICA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Aceita-se a responsabilização penal da pessoa jurídica em crimes ambientais, sob a condição de que seja denunciada em coautoria com pessoa física, que tenha agido com elemento subjetivo próprio. (Precedentes) 2. Recurso provido para receber a denúncia, nos termos da Súmula nº 709, do STF: “Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela” Processo REsp 800817/SC – 2005/0197009-0 – Relator Ministro Celso Limongi (desembargador convocado do TJ/SP) – Sexta Turma – Data do julgamento 22/02/2010. Revfor vol. 406 p. 543. (grifo nosso).

 

E por fim, cabe apreciar as decisões tomadas por Tribunais Federais, senão vejamos:

 

213611 – CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE – EXTRAÇÃO DE PRODUTO MINERAL SEM AUTORIZAÇÃO – DEGRADAÇÃO DA FLORA NATIVA – ARTS. 48 E 55 DA LEI Nº 9.605/98 – CONDUTAS TÍPICAS – RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA – CABIMENTO – NULIDADES – INOCORRÊNCIA – PROVA – MATERIALIDADE E AUTORIA – SENTENÇA MANTIDA – 1. Segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial predominante, a Constituição Federal (art. 225, § 3º) bem como a Lei nº 9.605/98 (art. 3º) inovaram o ordenamento penal pátrio, tornando possível a responsabilização criminal da pessoa jurídica. 2. Nos termos do art. 563 do CPP, nenhum ato será declarado nulo, se dele não resultar prejuízo à defesa (pas de nullité sans grief). 3. Na hipótese em tela, restou evidenciada a prática de extrair minerais sem autorização do DNPM, nem licença ambiental da fatma, impedindo a regeneração da vegetação nativa do local. 4. Apelo desprovido. Appelação Criminal 213611 – TRF 4ª R. – ACr 2001.72.04.002225-0 – SC – 8ª T. – Rel. Des. Fed. Élcio Pinheiro de Castro – DJU 20.08.2003 – p. 801 – JCF.225.3 JCPP.563. (grifo nosso).

Assim, fica patente que esse acolhimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica mostra que houve uma atualização do papel das pessoas jurídicas mundo contemporâneo. O cotidiano brasileiro mostra uma grande omissão da Administração Pública na imposição de sanções diante das agressões ambientais. Essa possibilidade de serem responsabilizadas penalmente as pessoas jurídicas irá impor um mínimo de corretivo, para que a nossa descendência possa encontrar um planeta habitável (MACHADO, 2000).

 

CONCLUSÃO

Ao final da presente pesquisa, concluímos que a responsabilização das pessoas jurídicas por crimes ambientais é uma realidade mundial e adotada por vários países.

Contrariando o princípio “societas delinquere non potest”, a lei brasileira (Constituição Federal/88 e Lei dos Crimes Ambientais) aceitou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, visando, com isso, conter os abusos contra o ambiente. Tal coibição adveio da urgência da tutela necessária ao meio ambiente, um bem de uso comum do povo cuja sua preservação está intrinsecamente ligada ao direito à vida.

A carência dos instrumentos de tutela civil e administrativa na limitação da degradação ambiental justificou a adoção de meios mais drásticos com finalidade de promover a proteção do ambiente, recorrendo-se assim ao direito penal, no seu papel de “ultima ratio”.

Verificou-se que a maior parte dos abusos ao meio, deriva da atividade empresarial, na qual a responsabilidade pelos danos gerados é diluída pela forma como é estruturada, resultando na ineficácia da apenação de um ou alguns membros do ente coletivo, o que exigiu assim, a implementação de meios adequados à conformação da postura adotada pela sociedade. Tal necessidade foi observada pelo constituinte, e na Constituição de 1988 foram incluídos os arts. 173, § 5º, e 225, § 3º que conceituaram os fundamentos necessários à implementação dessa responsabilização penal e abrindo caminho ao desenvolvimento de novos meios de lidar com o problema da criminalidade empresarial.

Cabe ressaltar que quer sejam com multas, suspensão de atividades e outras sanções semelhantes, essa matéria deve tomar o rumo da proteção do meio ambiente, pois, a degradação entes coletivos, é um fato que merece nossa preocupação.

Acreditamos que a responsabilidade penal da pessoa jurídica pela prática de danos ambientais deve ser entendida como forma de prevenção a pratica de tais, já que o dano causado ao meio ambiente quase sempre é irreparável, e a sociedade como um todo não deve arcar com os custos de atividades econômicas que ofendem o meio ambiente e por conseqüência trazem prejuízos a coletividade.

Por fim cabe elucidar que tanto a doutrina quanto a jurisprudência, no que tange a matéria dos crimes ambientais, apesar de dominante na questão de responsabilização penal da pessoa jurídica, na ao caso concreto, fazem a ressalva de que deve haver uma imputação simultânea, a pessoa jurídica e a pessoa física que atua em nome do ente moral ou em seu benefício.

 

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 7ª Edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

 

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Considerações penais sobre pessoa jurídica. Disponível em

<http://www.direitopenal.adv.br/artigos.asp?pagina=5&id=123>, acessado em 20/10/2009.

 

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência, relator Ministro Cezar Peluso, julgamento, HC 88747/ES em 12/05/2006, publicado no diário da justiça em 22/05/2006. Disponível em:   prudencia.asp>, acesso em 29/10/2011.

 

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. Criminal. Crime ambiental

praticado por pessoa jurídica. Responsabilização penal do em coletivo. Possibilidade. Resp. nº 564960. Recorrente Ministério Público de Santa Catarina e Recorrido Auto Posto 1270 LTDA-ME. Relator Ministro Gilson Dipp. 13 de junho de 2005.

 

BREDA, Juliano: in PRADO, Luiz Regis (coord.). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. São Paulo: RT, 2010.

 

CARO, Lara Mariana Zanella Martinez, Teoria da responsabilidade Penal da pessoa Jurídica Face à Teoria geral do delito, 2003, Disponível em: <www.busca     legis.ufsc .br /revistas/files/anexos/11189-11189-1-PB.pdf>, acesso em 27/09/2011.

 

Machado PAL. Direito Ambiental Brasileiro. 8ª ed. São Paulo: Malheiros; 2000.

 

 

[1] Acadêmico de Direito pela Universidade Católica do Salvador. E-mail: [email protected].

[2] Advogado (OAB-BA n.º 5525). Especialista em Direito Civil e Penal, Professor de Direito Penal da Universidade Católica do Salvador. E-mail:[email protected].

[3] MILARÉ, Edis. op. cit. p. 136

[4] ARAÚJO. Moacir Martini de. op. cit. p. 62

[5] Horta, Raul Machado. Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 3 edª, 2002, p.271.

[6] ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 7ª Edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 68

[7] RUGGIERO, Roberto. Instituições de Direito Civi – Introdução e Parte Geral, Direito das Pessoas, vol. I. 3ª .

Edição, São Paulo: Saraiva, 1971, p.382-383.

[8] Idem. Ibidem. p. 383.

[9] BEVILAQUA, Clóvis. op. cit., p. 127-128

[10] ROTHENBURG, Walter Claudius. A pessoa jurídica criminosa. 1ª Edição, 2ª Tiragem, Curitiba: Juruá, 2005, pg. 54-57.

[11] SCHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 2ª Edição, São Paulo: Método, 2002, p. 107.

[12] MUÑOZ CONDE, Francisco. Teoria geral do delito. Tradução: Juarez Tavares e Luiz Régis Prado. PortoAlegre: Sergio Fabris, 1988, p. 128.

[13]  FILHO, Ney de Barros Bello. op. cit., p. 157

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