Resumo: A saúde mental é um direito fundamental conferido a toda pessoa. Ademais, aos trabalhadores são conferidos direitos inerentes a sua função social e a sua condição de pessoa. Paralelamente a essa realidade, com o advento das novas tecnologias no contexto da globalização, surge um novo modelo de empresa voltada para o setor de tecnologia da informação, produzindo trabalho intelectual humano mecanizado – são os Call Center. Nesse sentido, chama-se atenção a quantidade de litígios trabalhistas, os quais versam sobre as doenças ocupacionais de cunho psíquico adquiridas pela relação de trabalho nessas empresas. Isto posto, com fulcro no ordenamento jurídico brasileiro, nas doutrinas da psicologia e do direito, a partir de uma metodologia de levantamento bibliográfico e documental, adotando-se um raciocínio dedutivo, será abordado no presente texto as noções da saúde mental como direito fundamental do trabalhador. Para tanto, objetivamos, em específico, analisar a relação de causa e efeito das doenças ocupacionais de natureza psicológica adquiridas pela classe dos Operadores de Telemarketing.
Palavras chave: Call Center, Saúde Mental, Direitos Fundamentais do Trabalhador.
Introdução
A Terceira Revolução Industrial apresentou seu marco inicial em meados do século XX, propagando-se através desta a correlação entre a ciência, a tecnologia e a produção. Hoje, as descobertas científicas decorrentes da Revolução Técnico-Científica-Informacional se encontram, em grande parte, voltadas para o mercado.
Nessa orientação, a Revolução Intelectual proporcionou a redução das fronteiras entre o trabalho intelectual e comunicação, tendo em vista as consequências dos avanços tecnológicos. Partindo-se dessa premissa, emergiu-se um novo modelo de empresa voltada para o fornecendo de serviços de teleatendimento no mercado brasileiro – são as empresas de Contact Center[1].
No cenário econômico atual, as empresas de Call Center demonstram ter potencialidade econômica. Consoante pesquisa do Sindicato Paulista de Empresas de Telemarketing (SINTELMARK) [2], através de estudos da consultoria E-Consulting; da Receita Federal e do IBGE, o seguimento dessas empresas faturaram em 2014 o montante de 43,4 bilhões de reais, empregando 1,6 milhões de operadores de telemarketing.
Paralelamente as conquistas econômicas do empreendedorismo telemático, as ações reclamatórias trabalhistas que apresentam como partes processuais os operadores de telemarketing e as pessoas jurídicas dos call certers aumentam a cada ano. Nesse sentido, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicados na Revista Exame[3], constata-se que, em ranking nacional, as empresas do ramo telemático ocupam a oitava e nova posição de empresas que mais frequentam os tribunais do trabalho no Brasil.
Os motivos que tangenciam as ações reclamatórias trabalhistas as quais configuram os Call Centers como partes processuais são múltiplos, tendo em vista a complexa relação de trabalho em tela. No entanto, chama-se atenção para a reincidência dos litígios os quais versam sobre doenças ocupacionais de natureza psicológica adquiridas em detrimento do labor nos Call Centers.
Noutra perspectiva paralela à realidade vivenciada pelos operadores de telemarketing, o ordenamento jurídico pátrio compreende a saúde mental como um direito fundamental do trabalhador. Igualmente, compreendemos que o trabalhador, além de um sujeito de direitos sociais inerentes a sua função, conjuntamente, é sujeito de direitos humanos, haja vista que a dignidade do trabalhador deve ser observada em todo o contexto das relações trabalhistas.
Diante do exposto, o presente texto objetiva analisar de forma crítica a efetividade da saúde mental como direito fundamental nas relações de trabalho dos call centers do Brasil. Conseguintemente, analisaremos, em específico, as causas e efeitos que tangenciam a ocorrência reiterada das doenças psicológicas adquiridas pelos operadores de telemarketing em detrimento do labor nas empresas de Call Center. Para tanto, utilizaremos como metodologia o levantamento bibliográfico e documental, a posterior análise de conteúdo da doutrina, legislação, jurisprudência e pesquisas, adotando um raciocínio dedutivo e uma perspectiva interdisciplinar, em razão da interface entre Direito e Psicologia.
A saúde psicológica como um direito fundamental do trabalhador
A Dignidade da Pessoa Humana proclamada como fundamento da República Federativa do Brasil deve ser compreendida como uma declaração de natureza política, jurídica e social, e não uma mera criação legislativa. Conforme Luís Roberto Barroso e Ana Paula de Barcelos[4], esse princípio deve ser observado em todas as relações públicas e privadas, haja vista a compreensão deste como centro axiológico do Estado Democrático de Direito e de uma ordem mundial idealmente pautada pelos direitos fundamentais.
Compulsada tais premissas, cumpre ressaltar ainda que Carta Magna instituiu o Estado Democrático de Direito principiando o fundamento dos valores sociais do trabalho[5]. Nesse contexto, as relações de trabalho devem ser desenvolvidas a partir da observância aos direitos inerentes ao trabalhador por dois eixos: o trabalhador é sujeito de direitos inerentes a sua função social, ao passo em que também é sujeito de direitos humanos na sua condição de pessoa.
A partir dos atos internacionais que versam sobre os direitos humanos[6] e diante do processo de redemocratização do Brasil, foi conferida à saúde status de norma fundamental e social. Assim, o artigo 6º, em seu caput, como bem os artigos 196º ao 200º da CRFB/88 conferem as pessoas, independente de sua função social, o direito à saúde em sentido genérico.
Ademais, em caráter infraconstitucional, a lei 8.080 de 1990, que foi recepcionada pela Carta Magna, e que dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, aduz que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado promover as condições indispensáveis ao seu exercício pleno. Nesse mesmo contexto, este texto normativo afirma que a saúde se tangencia a partir do meio ambiente do trabalho, entre outros fatores determinantes e condicionantes.
Nesse sentido, ressaltamos que o contexto dos ambientes laborais dos Call Centers no Brasil apresenta gestão organizacional singular, haja vista o contrassenso que constatamos ao anarlizarmos de que o trabalho desenpenhado desenvolvido nessas empresas é de natureza intelectual, ao mesmo passo que se trata de uma prática laboal humana que se tangencia ao macanicismo, consoante Costa Araújo; Mendes Primo e Vasconcelos Araújo[7].
Nesse sentido, o modelo de gestão administrativo-funcional em questão se aproxima da concepção mecanicista do processo de trabalho exaurida a partir das obras de Taylor[8].
A Síndrome de Burnout como uma realidade no ambiente laboral dos Call Centers no Brasil
A psicologia da saúde se trata de um campo genérico da psicologia que objetiva o estudo a saúde mental diante de condição humana, consoante Rilda Alves[9]. Assim, tal difusão da psicologia se relaciona intrinsicamente com as relações humanas, especificamente àquelas que correspondem às relações de trabalho.
Insta expor que o arranjo organizacional do trabalho nas empresas de Call Center apresenta características que corroboram para o processo de sofrimento psíquico por parte dos trabalhadores, posto que a forma a qual se compõem as relações de trabalho nessas empresas partem dos objetivos de um rígido controle somada a escassa autonomia humana.
Nesse seguimento, constata-se que uma das principais consequências psíquicas oriundas dos ambientes laborais dos Call Center é o desenvolvimento de elevados níveis de stress somados a baixa qualidade de vida, resultando no sofrimento físico e psicológico do trabalhador.
Ademais, nesse contexto laboral, o stress é entendido como uma resposta às contingências estressores do ambiente que ameaçam o bem-estar[10]. Igualmente, o sofrimento emerge ao passo em que existe um conflito entre o equilíbrio das exigências das empresas e as necessidades fisiológicas e psicológicas do trabalhador[11].
No contexto laboral dos call centers, alguns sintomas psicológicos decorrentes do stress provido pela relação de trabalho se mostram comuns entre os trabalhadores, a saber: o decréscimo da concentração e atenção; aumento da desatenção; presença do desequilíbrio observatório; deterioração da memória de curto e longo prazo, com redução de sua amplitude e mudanças nos traços da personalidade.
Consoante Burger[12], o stress desenvolvido nas relações de trabalho nos call centers provoca outras doenças de cunho psicológico como: distúrbios do pânico, fobias, ansiedades e Síndrome de Burnout. Nessa mesma acepção Lima[13], em sua pesquisa, atribuiu nexo de causalidade genérico entre a Síndrome de Burnout e o trabalho desenvolvido pelos operadores de telemarketing nos Contact Centers.
Não obstante a tal realidade, grande parte dos estudos atribui relação de causa e efeito entre os fatores laborais inerentes ao call center e às doenças ocupacionais de natureza psíquica adquiridas pelos operadores de telemarketing.[14]
De certo, os indivíduos acometidos por tais doenças ocupacionais podem desenvolvem alterações na personalidade, apresentando como sintomas a paranoia e a despersonalização, passando a se isolarem socialmente, comportando-se diante da ausência de sensibilidade.
Conclusão
A saúde e o adoecer são formas pelas quais a vida se manifesta em suas diversificadas dimensões, integrando-se a partir de um processo binomial compreendido como saúde-doença. Tal processo é tangenciado por diversos fatores, dentre eles os ambientes laborais.
Nesse sentido, concluimos que o modelo de gestão-organizacional inerente aos Call Centers apresentam contribuição siginificativa para a promoção de doenças ocupacionais de cunho psiquíco, posto que a configuração organizacional dessas empresas objetiva uso da tecnologia informacional para promover a similaridade comportamental dos trabalhadores às máquinas, na tentativa de simplificar o gerenciomento administrativo e garantir um trabalho suspostamente perfeito.
A sindrome de Burnout apresenta-se, conforme pesquisas, como consequencia direta do ambiente laboral dos Call Centers. No mais, esta doença psiquica tem natureza de disturbio de carater depressivo precedido de esgotamento físico e mental intenso.
Insta destaque também queo stress se mostra como fator presente nos ambientes laborais dessas empresas. Consequentemente, consoante pesquisas, os operadores de telemarketing apresentaram os seguintes sintomas em comum: o decréscimo da concentração e atenção; aumento da desatenção; presença do desequilíbrio observatório; deterioração da memória de curto e longo prazo, com redução de sua amplitude e mudanças nos traços da personalidade.
Por fim, compreendermos que as empresas de teleatendimento representam espaço no desenolvimento economico no país. Contudo, concluimos que o Estado não pode se basear nesssa prerrogativa para se omitir diante do contexto laboral que se incerem os Operadores de Telemarketing, tendo em vista que a saúde é um direito fundamental do trabalhador, sendo assim, um direito irrenunciável.
Na condição de sugestão, apontamos que as decições do poder judiciário podem se apresentar mais ríspidas quanto aos fatos em tela, tendo em vista o carater pedagógico da atuação do Poder Judiciário. Não obstante a isto, sugerimos ainda que o Ministério Público do Trabalho exerca a defesa dos direitos dos Operadores de Telemarkeing, fiscalizando e punundo práticas patronais que visem à lesão dos direitos fundamentais dos operadores de telemarketing.
Informações Sobre os Autores
Petrúcio Araújo Reges
Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba 2017. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Previdenciário 2017. Pesquisador CNPQ por meio de Projetos de Iniciação Científica. Servidor Público Federal
Lucas Cristhian Almeida Duarte Ferreira
Graduando Psicologia pela Universidade Estadual da Paraíba.
Bolsista extensionista do Núcleo de Educação e Atenção em Saúde Neas