Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar a situação do prazo prescricional das ações do art. 29, II da Lei 8.213/90, considerando o acordo firmado na ação civil pública n° 0002320.59.2012.4.03.6183/SP, o regramento específico da prescrição em face da Administração Pública, conforme Decreto 20.910/32 e os instrumentos administrativos editados pela Autarquia no que toca ao tema, notadamente o Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS e a Resolução nº 268 PRES/INSS de 24/01/2013.
Palavras Chaves: direito previdenciário; revisão; artigo 29; prescrição; suspensão; interrupção.
Abstract: The objective of this article is to analyze the situation of the preschool term of the actions of art. 29, II of Law 8,213 / 90, considering the agreement signed in public civil action no. 0002320.59.2012.4.03.6183 / SP, or special regurgitory of the prescription in the face of Public Administration, according to Decree 20.910 / 32 and the administrative instruments published by Autarchy With regard to this issue, notably Joint Circular Memorandum no. 21 DIRBEN / PFE-INSS and Resolution 268 PRES / INSS dated 01/24/2013.
Keywords: social security law; Review; Article 29; Prescription; Suspension; Interruption.
Sumário: 1. Introdução. 2. Prescrição e decadência. 2. Causas de interrupção e suspensão da prescrição. 3. Causas de interrupção e suspensão da prescrição. 4. A revisão do art. 29, II da Lei 821/99 e a suspensão do prazo prescricional. Conclusões. Referências.
INTRODUÇÃO
Quando da edição do Decreto 3.048 em 06 de maio de 1999 seu art. 32 dispunha regra de cálculo diferente da regra trazida pela Lei 9.876/99 implicando em uma maneira de cálculo mais prejudicial aos segurados no que toca aos benefícios de auxílio doença e aposentadoria por invalidez.
A próprio Autarquia Previdenciária posteriormente reconheceu o erro e se comprometeu a efetivar a revisão dos benefícios concedidos calculados de maneira equivocada.
Não obstante o reconhecimento administrativo da Autarquia, a demora em efetivar o direito dos segurados resultou no ajuizamento de uma ação civil pública na qual foi celebrado acordo para pagamento escalonado do quantum devido pelo INSS.
No presente artigo busca-se contextualizar a situação apresentada e analisa-la sob a ótica da prescrição. Questiona-se: na eventualidade de não ter sido realizada a revisão administrativa de algum segurado que teria direito, ou realizada esta à menor, ou ainda na hipótese de um segurado que teve seu benefício revisado não concordar com o prazo estipulado administrativamente para pagamento, teriam eles direito a questionar eventuais irregularidades judicialmente ou suas pretensões já teriam sido fulminadas pela prescrição?
É na resposta deste questionamento que se debruça o presente artigo com a pretensão de ao menos contribuir para o enriquecimento da discussão.
Para tanto inicia conceituando e distinguindo os conceitos de prescrição e decadência. Logo após passa a dissertar sobre a possibilidade de suspensão e interrupção dos referidos prazos e demonstra como estes institutos são aplicados nas relações cíveis em geral.
Não obstante, mais a frente chama a atenção para o fato do regramento específico da prescrição nas ações em que envolve a Administração Pública como uma das partes interessadas e contextualizando tal condição à situação decorrente da revisão do art. 29, II da Lei 8.213/90 desenvolve o estudo direcionado a buscar a resposta à problemática levantada alhures.
1. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA
Tanto a prescrição quanto a decadência são formas de perecimento do direito em razão da inércia do titular durante determinado lapso temporal estipulado em lei ou convencionado pelas partes, quando permitido.
A principal distinção entre os dois institutos reside no objeto sobre o qual incide cada um.
Na clássica lição de Pontes de Miranda, a prescrição incide sobre a relação jurídica anulando os potenciais efeitos da pretensão, enquanto a decadência acaba por extinguir a pretensão em si[1]. Daí porque as ações meramente declaratórias são imprescritíveis.
Nas lições do Professor Flávio Tartuce:
“(…) a prescrição mantém relação com deveres, obrigações e com a responsabilidade decorrente da inobservância das regras ditadas pelas partes ou pela ordem jurídica.
Por outro lado, a decadência está associada a direitos potestativos e às ações constitutivas, sejam elas positivas ou negativas. (…) A decadência, portanto, tem relação com um estado de sujeição, próprio dos direitos potestativos”[2].
Desta forma, o titular de um direito que deixa de exercê-lo no prazo razoável não poderá fazê-lo à destempo, isto pois, conforme a máxima jurídica: “o direito não socorre aos que dormem”.
2. CAUSAS DE INTERRUPÇÃO E SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
Os prazos decadenciais não se suspendem nem se interrompem, segundo dicção do art. 207 do Código Civil.
Da mesma forma é nula a renúncia à decadência fixada em lei, consoante art. 209 do referido diploma legal. In verbis:
“Art. 207. Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição. (…)
Art. 209. É nula a renúncia à decadência fixada em lei[3]”.
Por outro lado, os prazos prescricionais podem sofrer interrupção ou suspensão, a depender do caso.
No impedimento e na suspensão o prazo não começa (impedimento) ou para (suspensão) e depois continua de onde parou, já na interrupção o prazo para e volta ao início[4].
A lei Civil traz as normas gerais a respeito do tema.
Os artigos 197 e seguintes do mencionado Códex enumeram as hipóteses em que a prescrição é suspensa. São elas: entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela; contra os absolutamente incapazes; contra os ausentes do País em serviço da União, dos Estados ou dos Municípios; contra os que se acharem servindo as Forças Armadas, em tempo de guerra.
De igual modo, dispõe o Código que não corre prescrição, quando dos negócios jurídicos estiver pendendo condição suspensiva, não estando vencido o prazo ou pendendo ação de evicção.
Traz ainda o Diploma Civil a disposição da suspensão do prazo prescricional antes da sentença definitiva quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal[5].
Com relação a interrupção da prescrição, o caput do art. 202 do Código Civil dispõe que ela só poderá ocorrer uma vez. O Professor Flávio Tartuce chama atenção para o fato de que as hipóteses de interrupção do prazo prescricional “envolvem condutas do credor ou do devedor”[6].
Conforme art. 202 do Diploma Civilista:
“Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I – por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
II – por protesto, nas condições do inciso antecedente;
III – por protesto cambial;
IV – pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;
V – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper”[7].
Tais disposições não excluem outras constantes em legislação específica, como adiante será demonstrado.
Finalizando este tópico, válido se faz mencionar a possibilidade de se operar a interrupção da prescrição por qualquer interessado. Ou seja, o Código não traz um rol taxativo de quem pode fazer interromper o prazo prescricional, de modo que a expressão “qualquer interessado” transcende os próprios titulares da pretensão. Devendo, assim, o juiz, em cada caso analisar o interesse da parte ao efeito que alude o referido dispositivo legal à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
3. A REVISÃO DO ART. 29, II DA LEI 821/99 E A SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL
O parágrafo único do art. 103 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que "prescreve em 5 (cinco) anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil".
Não obstante, quanto aos demais critérios atinentes à prescrição, notadamente quanto a suspensão e interrupção, estes são regulados por outro diploma legal que não o Código Civil.
A prescrição, quando se trata de ação em que seja parte interessada a Fazenda Pública, segue regramento próprio, estipulado no Decreto 20.910/32, isto porque, em que pese ser um regramento anterior ao Código Civil de 2002, se trata de lei específica.
Logo, por critérios hermenêuticos, norma geral posterior não revoga norma anterior específica. Desta forma, para fins previdenciários a prescrição rege-se da seguinte forma: sendo omissa a lei n.º 8.213/91, deve-se preencher suas lacunas com os regramentos presentes no Decreto 20.910/32, e no que este for omisso aplicam-se as disposições do Código Civil.
Destaque-se que, à semelhança do art. 202 do Código Civil, o art. 8º do Decreto 20.910/32 dispõe que “a prescrição somente poderá ser interrompida uma vez”.
Fixadas, portanto, tais premissas, para que se avance no estudo ora proposto, se faz ainda necessário compreender os fatores determinantes da revisão do art. 29, II da Lei 8.213/90.
Dispõe o art. 29, inciso II da Lei 8.213/90, que:
“Art. 29. O salário-de-benefício consiste: […]
II – para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo”[8].
Ressalte-se que, na alínea “e” do artigo 18 da Lei 8.213 consta o benefício do auxílio-doença.
Dessa forma, após o advento da lei 9.876/99 que modificou o art. 29 da Lei de benefícios, o cálculo do valor do benefício a que o segurado faz jus será equivalente à média dos seus 80% maiores salários de contribuição.
Nas palavras do professor Hermes Arrais Alencar:
“Percebe-se que quanto maior forem as discrepâncias dos valores corrigidos dos salários de contribuição existentes no PBC, mais acentuada será a melhora da RMI em decorrência da exclusão dos 20% menores SC”[9].
Ocorre que, em 06 de maio de 1999 foi editado o Decreto 3.048 prevendo em seu art. 32 que para os benefícios de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez, caso o segurado contasse com menos de 144 (cento e quarenta e quatro) contribuições mensais no seu período contributivo, seu benefício seria apurado tomando por base a nédia aritmética de todas as contribuições apuradas.
Válido então perceber que neste ponto o decreto extrapolou o seu poder regulamentar ao inovar a ordem jurídica impondo ao segurado uma condição mais nociva do que a lei delimitou.
Com isso, até o reconhecimento da própria administração, os segurados tiveram seus benefícios calculados sem o descarte das 20% menores contribuições.
Em 15 de abril de 2010 foi publicado o Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS, determinando a realização do recálculo dos benefícios de auxílio doença e aposentadoria por invalidez conforme a disciplina do art. 29, II da Lei 8213/90. Todavia, em tempo exíguo o referido memorando teve a sua execução sobrestada por dificuldades operacionais.
No mesmo ano, no mês de setembro, foi editado o Memorando Circular nº 28 INSS/DIRBEN restabelecendo as orientações do Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS em relação às revisões de benefícios devidas pela revogação do §20 do art. 32 e da alteração do §4º do art. 188-A[10].
Em 2012, o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical e o Ministério Público Federal ingressaram com a ação civil pública n° 0002320.59.2012.4.03.6183/SP contra o INSS buscando a revisão dos benefícios por incapacidade com data de início a partir de 29/11/1999, através da aplicação do art. 29, II, da Lei 8.213/91.
Nos autos dessa ação foi realizado acordo consistente no escalonamento de 10 anos para a revisão dos benefícios e pagamento dos atrasados em razão da idade do segurado e do valor que lhe seria devido.
Destarte, foi elaborado um cronograma de pagamento em âmbito nacional, de modo que o último pagamento a ser realizado pela Autarquia Previdenciária será em Maio de 2022, conforme Resolução nº 268 PRES/INSS[11] de 24/01/2013.
Em razão do acordo celebrado nos autos da mencionada Ação Civil Pública, muitos segurados foram ao judiciário buscar a antecipação do pagamento por entenderem que o acordo firmado foi prejudicial por postergar desproporcionalmente o prazo de pagamento.
Ademais, a existência de ação civil pública não impede a propositura de ação individual que verse sobre o mesmo tema, ainda mais quando trata de direito individual homogêneo, e a decisão da ação civil pública somente faz coisa julgada erga omnes quando favorável aos substituídos.
Nas palavras do professor Hermes Arrais Alencar:
“A bem da verdade, a ACP atuou como espécie de empréstimo compulsório, fazendo que com a Administração Pública Federal retivesse parte do dinheiro devido aos segurados da Previdência, e restitua apenas os cinco anos anteriores à ACP (não o período todo, como ocorreria com o empréstimo compulsório), sem a necessidade de edição de lei complementar exigida no art. 148 da CF”[12].
O ponto fulcral da discussão a que se predispõe este artigo está em determinar se houve tão somente a interrupção da prescrição quando da edição do Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS em 15 de abril de 2010, pois, caso esta seja a hipótese prevalecente, os segurados que ajuizaram ação após 15 de abril de 2015 teriam sua pretensão fulminada pela prescrição.
É bem verdade que não há muita discussão acerca dos impactos jurídicos decorrentes do Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS. Doutrina e jurisprudência já possuem posicionamento claro de que o r. instrumento operou a interrupção da prescrição, inclusive com a sua renúncia de maneira tácita por parte da Autarquia, nos termos do art. 191 do Código Civil.
Contudo, em uma análise mais criteriosa, observa-se que, o prazo prescricional da referida ação se encontra suspenso, ante a disposição constante no art. 4º do Decreto 20.910/32, in verbis:
“Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano.”[13].
Observe-se, em que pese a interrupção da prescrição quando da edição do Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS, o prazo prescricional ainda não foi retomado, ou seja, ainda não voltou a correr, isto porque enquanto pendente a satisfação da dívida reconhecida administrativamente pela Autarquia, o cômputo do prazo prescricional não deve ser reiniciado, nos termos do artigo retro mencionado.
É de se notar então que não há, neste caso, resistência do devedor em pagar o que reconheceu ser devido, pelo menos até Maio de 2022, quando, aí sim, o lapso prescricional voltará a correr. Assim, a prescrição somente voltaria a fluir quando a Administração viesse a praticar algum ato incompatível com o interesse de saldar a dívida[14].
Válido perceber que, em que pese o art. 9º do Decreto 20.910/32 dispor que “A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo” a Resolução nº 268 PRES/INSS estabelece que:
“Observar-se-á o prazo prescricional de cinco anos a partir do término do cronograma que ocorrerá em 31 de maio de 2022, para que o beneficiário possa requerer o pagamento administrativo das diferenças que não tenham sido pagas na forma deste artigo”[15].
Esta disposição constante na Resolução que disciplina os pagamentos da revisão administrativa reforça a hipótese de renúncia tácita à prescrição, tanto que o prazo, que voltaria a correr pela metade consoante Decreto 20.910/32, será integralmente devolvido aos segurados por disposição expressa da Autarquia.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que o prazo prescricional das ações do art. 29, II da lei 8.213/90 até a presente data não voltou a fluir após a sua interrupção operada em razão da renúncia tácita do INSS quando da edição do Memorando Circular Conjunto nº 21 DIRBEN/PFE-INSS.
Dessa forma, o segurado que se sentiu prejudicado seja pela revisão administrativa realizada, ou não, pela Autarquia Previdenciária, seja pelo acordo celebrado na ACP 0002320.59.2012.4.03.6183/SP, mantém viva a sua pretensão.
Isto porque, considerando o regramento específico da prescrição em face da Administração Pública, bem como os prazos de pagamento da revisão administrativa estipulados na Resolução nº 268 PRES/INSS, pode-se verificar que ao menos até maio de 2022 a Autarquia previdenciária não opõe resistência em saldar a dívida.
Deste modo, o prazo prescricional somente voltará a correr quando a Administração Previdenciária realizar alguma ação contrária ao interesse de efetivar o pagamento do montante devido.
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